Precisamos aprender a fazer as perguntas certas

Precisamos aprender a fazer as perguntas certas

Vivemos em um mundo repleto de desafios complexos e interconectados, desde crises ambientais até desigualdades sociais. No entanto, em meio a essa complexidade, a forma como o mainstream aborda esses problemas frequentemente falha em resolver as questões essenciais. Em vez de buscar soluções reais, fazemos as perguntas erradas, desviando o foco do que realmente importa.

Tomemos como exemplo a tragédia climática. Diante de um fundo de investimento que se propõe a combater as mudanças climáticas, a pergunta que prevalece nas reuniões que faço é sobre a volatilidade esperada do fundo. Este enfoque financeiro e de curto prazo ignora a questão central: como este fundo vai efetivamente mitigar as mudanças climáticas e contribuir para a sustentabilidade a longo prazo? Perguntas sobre o impacto ambiental das iniciativas financiadas, sobre as estratégias de redução de emissões e sobre o suporte a tecnologias limpas são cruciais, mas frequentemente negligenciadas. A volatilidade de retorno se torna uma distração que nos impede de focar no impacto verdadeiro e duradouro. Os investidores estão mais preocupados com o retorno financeiro imediato do que com o efeito de longo prazo no meio ambiente.

Outro exemplo emblemático é a questão racial no mercado de trabalho. Quando um candidato negro se apresenta, a primeira pergunta muitas vezes é sobre qual faculdade ele frequentou. Este enfoque limita a compreensão das habilidades e da trajetória individual do candidato. Ignora-se a resiliência, a capacidade de adaptação, as habilidades adquiridas fora do ambiente acadêmico formal e as experiências de vida que moldaram o candidato. Perguntas sobre a capacidade de resolver problemas, a ética de trabalho e a contribuição potencial para a equipe são mais relevantes, mas frequentemente esquecidas. Este tipo de abordagem perpetua a desigualdade, ao invés de reconhecer e valorizar o potencial real do indivíduo. "As barreiras invisíveis no mercado de trabalho continuam a marginalizar talentos baseados em critérios irrelevantes" (Gomes, 2022).

A mesma lógica pode ser aplicada a diversas outras esferas da sociedade. Na educação, por exemplo, a preocupação central parece ser com as notas e resultados de testes padronizados, ao invés de questionar como as escolas estão preparando os estudantes para o pensamento crítico, a criatividade e a cidadania ativa. Segundo Freire, "o sistema educacional atual está mais preocupado em medir do que em educar, transformando estudantes em meros números de desempenho".

No sistema de saúde, o foco muitas vezes recai sobre a eficiência dos procedimentos e custos, em vez de perguntar como melhorar a qualidade do atendimento e o bem-estar geral dos pacientes. Estudos mostram que a saúde pública frequentemente ignora a experiência do paciente, concentrando-se apenas em métricas de eficiência.

Esses exemplos ilustram uma tendência preocupante: estamos priorizando métricas superficiais e de curto prazo ao invés de buscar uma compreensão mais profunda e soluções duradouras. Fazer as perguntas certas significa ir além da superfície, explorar as causas subjacentes dos problemas e considerar o impacto de longo prazo das nossas ações.

Precisamos reavaliar nossas prioridades e reformular as perguntas que fazemos, direcionando nosso foco para o que realmente importa e buscando, assim, respostas que possam levar a um futuro mais justo, sustentável e inclusivo.

Ao reavaliar nossas perguntas, começaremos a ver mudanças reais. No campo ambiental, ao invés de perguntar sobre a volatilidade dos investimentos, deveríamos perguntar como esses investimentos podem acelerar a transição para uma economia de baixo carbono. No mercado de trabalho, em vez de questionar a instituição de ensino, deveríamos nos concentrar em como podemos criar ambientes que valorizem a diversidade de experiências e perspectivas. Na educação, deveríamos perguntar como podemos inspirar um amor pelo aprendizado e preparar os alunos para os desafios do futuro. E no sistema de saúde, deveríamos focar em como proporcionar um cuidado mais humano e holístico.

Se continuarmos a fazer as perguntas erradas, perpetuaremos um ciclo de superficialidade e ineficácia. No entanto, se começarmos a questionar de maneira mais profunda e significativa, poderemos abrir caminho para soluções inovadoras e transformadoras. Afinal, o futuro depende das perguntas que fazemos hoje.

Tainara Pereira dos Santos

Outplacement | Recolocação Profissional | Jobhunter | Transição de carreira | Headhunter | Assessoria de Carreiras | Projetos para todas as áreas | Primeiro emprego

2 sem

Em um dos treinamento que realizei para desenvolvimento e mentoria, a grande pauta é que as gerações passadas não foram ensinadas a questionar, até porque crianças não tinham voz. E hoje saber questionar é ensinado, e as novas gerações são questionadoras, em função da era tecnológica. Então quando li o seu texto, fez muito sentido que questionar, realmente fazer a pergunta certa, é o movimento necessário que gerará novas tendências, quebras de paradigmas e evolução.

Joanna Sultanum Calazans

Construo pontes entre filantropia e infância

3 sem

Concordo com você, fazer as preguntas certas é a chave para soluções mais eficazes ao problemas complexos do mundo atual. As perguntas erradas, no entanto, servem ao status quo, que frequentemente tem visão míope sobre o futuro.

Nayanne Brito

Engenheira de energia | Comercialização | Regulação | Inteligência de Mercado de Energia | Professora

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As perguntas que fazemos são direcionadas às metricas que a sociedade valoriza. Infelizmente, "amor ao aprendizado" não aprova ninguém no vestibular. Agora como fazer essa mudança em escala global e mesmo em épocas de farinha pouco meu pirão primeiro? Eu gosto muito da proposta de Economia Donut da Kate Raworth, mas ainda precisamos amadurecer uma abordagem prática dela.

Patrícia Almeida

Doutor(a) em Ciências da Eng. Ambiental | Sustentabilidade | ESG | ODS 5, 6 e 10 | Prof.(a) FGV Online | Conselheira Consultiva Certificada | Conselheira filial Paraná Capitalismo Consciente | Colunista Business Moment

1 m

Parabéns, Fábio! Eu me questionei exatamente isso, na semana passada. Estou morando na Alemanha e meu filho sofreu preconceito por ser brasileiro. A escola, tradicional católica alemã, não está preparada para receber estrangeiros. E, em reunião com o diretor, ele questionou qual o motivo dele acordar cedo todos os dias, fazer as lições se os professores não olham as lições dele e o ignoram em sala de aula? Qual o motivo dele ir para escola e fazer a prova se quando ele pergunta sua nota, o professor apenas diz "sem nota". Como que o próprio professor ri dele ao tentar falar alemão? Acho que nunca o diretor teve esse feedback de um estrangeiro, caso contrário, ou não mais aceitariam estrangeiros, ou não teriam esse tipo de atitude. Por 40 minutos o diretor ficou sem reação e sem saber responder meu filho. Sem problemas. Eu, mãe, fiquei por demais orgulhosa e tenho certeza que ele foi para casa pensando muito sobre o assunto. Pelo menos, assim espero. Esse fato me inspirou até escrever o artigo abaixo.

Priscila Rohem dos Santos

LideraGov 3.0 (2023)| Pesquisadora | ESG Sustentabilidade @Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI) | MBA@PBS | Dr. Políticas Públicas IE@UFRJ | BSc.MSc. Microbiologia@UFRJ | mãe de 2

1 m

Excelente texto!

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