Quando pensamos sobre a resistência do analista e a repetição da situação traumatogênica, devemos também pensar na clínica com crianças negras. Desmentidas diariamente no que se refere às suas dores e fantasias, a criança negra corre sério risco de experienciar na clínica um silêncio ou uma interpretação deslocada, que repetirá seu trauma.
Ferenczi destaca a necessidade de o analista estar em dia com sua própria análise e aqui também é preciso pensar a necessidade deste sujeito implicar-se em seu próprio racismo, sua não racialização e sua ignorância quanto ao letramento racial. Reconhecer-se racista e racializar-se numa sociedade onde o racismo é pilar da cultura é um importante passo para problematizar o tema.
Ao pensarmos sobre o reconhecimento da dignidade humana e como tal reconhecimento se dá nas relações étnico-raciais, podemos observar que, pessoas racializadas, em específico pessoas negras, não têm sua dignidade humana reconhecida social e culturalmente.
Se o reconhecimento da humanidade antecede o reconhecimento da dignidade humana, a clínica e o analista não devem estar alheios à demanda por um letramento racial. O desmentido da criança negra antecede sua relação com o meio, com o outro, pois está posto mesmo antes de seu nascimento. Pensar no que seria a cura para o trauma de uma criança negra desmentida é pensar o que seria, na experiência dela, a linguagem da ternura.
O texto acima é um trecho do meu artigo apresentado na Conferência Internacional de Ferenczi.
Em meu trabalho na clínica, como psicanalista, de crianças negras e não negras, tem a linguagem do afeto, tão fortemente trabalhada por Ferenczi, como um pilar. Também na clínica com adultos, afinal, nossa escuta é (também) da criança no adulto.
Meu texto: Confusão de línguas, letramento racial na clínica e a linguagem da ternura com crianças negras, fala da urgente racialização do psicanalista branco e do efeito psicotizante do racismo em crianças pequenas.
Tanto na Piraporiando como na clínica é alarmante o que acompanho dos danos causados pelo racismo. As escolas, na sua maioria ainda ''perdidas'' sobre o que fazer, precisam de suporte e acompanhamento. A família também. Não só as famílias negras, mas as não negras também.
A Conferência foi incrível, 12 países representados. Alegria de ter a presença de amigos, amigas e colegas da psicanálise do Brasil e de outros países e claro, honra de ser ouvida por eles e elas.
Feliz em compartilhar que este trabalho será traduzido e, em breve, publicado no Brasil e França.
Sigamos!
#racializar
#implicar
#humanidades
B.ONUZ - Simplificando o jurídico de centenas de empresas e startups.
4 mParabéns Janine, seu trabalho é lindo!