As relações entre as mulheres de “Mal viver” — filme de João Canijo que forma um díptico com “Viver mal” — são atravessadas por mágoas, rancores, traumas. Confinadas durante a maior parte do tempo no hotel que administram, elas se mostram emocionalmente defendidas. Evitam proximidade física e lidar com questões trazidas à tona nas conversas. A pouca disponibilidade para escuta é evidente.
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Os conflitos se manifestam nos embates da deprimida Piedade (Anabela Moreira) com a mãe, Sara (Rita Blanco), e a filha, Salomé (Madalena Almeida). As filhas se sentem rejeitadas pelas mães num quadro familiar não exatamente marcado pela inexistência de afeto, e sim pela dificuldade em demonstrá-lo devido a histórias de vida abaladas por longo e permanente desgaste. “O amor é uma agonia”, resume Piedade.
Os homens quase não aparecem no decorrer da projeção. A figura masculina mais realçada está, inclusive, ausente. É o pai de Salomé, mencionado com constância, que acaba de morrer. Nesse filme sobre mulheres, as atrizes apresentam ótimos trabalhos — em especial, Anabela e Rita.
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Também cabe elogiar a concepção estética, centrada em planos fixos, e, sobretudo, a coragem de investir numa realização árida, que exige esforço do espectador. São qualidades que superam os problemas, como a reduzida importância das outras personagens e o roteiro (do diretor) um tanto estacionado em torno de repetidas expressões de melancolia. Os méritos, porém, garantiram a Canijo o Prêmio do Júri no Festival de Berlim.