As cortinas vermelhas que abrem “O crime é meu” não deixam dúvidas sobre suas referências teatrais. O novo filme de François Ozon é livremente inspirado em uma comédia boulevard escrita por Louis Verneuil e George Berr nos anos 1930. Pode soar velho, bolorento, mas não é: uma das grandes sacadas do prolífero diretor francês nessa releitura foi recriar o texto, sobre mulheres emancipadas envolvidas no assassinato de um homem poderoso, à luz do ideário feminista de hoje. Outra foi entregar à sempre hipnótica Isabelle Huppert um dos personagens mais deliciosos da trama.
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No centro da cena estão Madeleine Verdier (Nadia Tereszkiewicz), jovem atriz acusada de matar um produtor de cinema durante um “teste do sofá” mal sucedido, e Pauline Mauléon (Rebecca Marder), advogada também em início de carreira. As duas dividem o mesmo quarto minúsculo de um mafuá de Paris e as frustrações comuns às mulheres independentes da época. Assumir o crime sob a alegação de defesa da honra parece ser o caminho para o sucesso profissional para ambas. Até que Odette Chaumette (Isabelle), uma excêntrica e decadente estrela da era muda, aparece clamando autoria do crime, enciumada com a projeção que o caso dera às jovens.
Tal como no gênero teatral que lhe serviu de fonte, as sequências de “O crime é meu” se sucedem de forma ágil, como o entra e sai de personagens de uma comédia de variedades, sem nunca se render totalmente à rigidez do palco. Na verdade, há muito das comédias malucas americanas da primeira metade do século passado, como as dirigidas por Billy Wilder e Ernst Lubitsch, em seu desfile de personagens de língua afiada, reações inesperadas e credulidade diante dos momentos mais absurdos. Tudo isso reencenado com um olhar moderno.