Rio
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Por e — Rio de Janeiro

Há 15 dias, uma forte ressaca atingiu a orla do bairro Fronteira, em Macaé, no Norte do Estado do Rio, levando ao desmoronamento de 15 casas, o que deixou mais de 180 pessoas longe de seus lares. Na mesma semana, o mar invadiu ruas de Itaipuaçu, em Maricá, na Região Metropolitana do Rio. As cheias do Rio Grande do Sul — causadas por inundações em decorrência da chuva — dão contornos definitivos ao potencial catastrófico de áreas urbanas tomadas pelas águas.

No Rio, o perigo vem do mar: às vésperas do Dia do Meio Ambiente, que se comemora hoje, O GLOBO ouviu de especialistas que a ocorrência de ondas fortes deve aumentar em 2024, sobretudo por conta do fenômeno climático conhecido como La Niña. Segundo relatório da National Oceanic and Atmospheric Administration, uma instituição ligada ao governo norte-americano, é possível que seus efeitos voltem a se fazer sentir entre julho e setembro deste ano.

— Durante condições de La Niña, temos possibilidade de receber um número maior de eventos de ressaca porque os ciclones que chegam do Sul do país e geram as tempestades no oceano (que originam as ressacas) não ficam bloqueados, como acontece em épocas de El Niño — explica Eduardo Bulhões, geógrafo da UFF.

Rastro de destruição

Segundo levantamento divulgado pela Marinha, em 2023 foram registrados 19 avisos de ressaca no estado. Neste ano, só até maio, o número chegou a dez. Na capital, apontam especialistas, a faixa da orla mais vulnerável ao impacto de ondas fortes é a Praia da Macumba, no Recreio, Zona Oeste da cidade. A área urbana daquela região já teve afundamento do calçadão, e pelo menos dois quiosques desabaram nos últimos anos. Geógrafos criticam o avanço da urbanização até a faixa de areia, que resulta em danos à natureza, à estrutura construída e prejuízo financeiro.

— A Macumba tinha (antes de 2005) uma faixa de areia descoberta de vegetação, ou seja, que estaria em movimento a cada ressaca. Essa parte, chamada de “área ativa da praia”, foi urbanizada. As praias arenosas tendem a se adaptar diante das condições de ondas que ocorrem. Para absorver as ondulações, perdem um pouco de areia, que vai para o fundo do mar. Depois, em condições de calmaria, essa areia vai gradualmente voltando para a praia. É o mecanismo que esses ambientes têm para se adaptar às condições variáveis de onda. Aí, quando há uma ressaca, a praia tenta buscar a areia, mas ela não está mais disponível porque em cima foram feitas uma terraplenagem, um calçadão, quiosques, ruas, deques — ensina Bulhões.

Em 2017, quando houve o desmoronamento de um trecho da orla construído na Praia da Macumba, o valor de um muro de contenção foi orçado em R$ 14,5 milhões. Na avaliação de Bulhões, um dos colaboradores do livro “Panorama da erosão costeira no Brasil”, publicado com o selo do Ministério do Meio Ambiente, construções e reformas em áreas que as praias usam para se refazer são como “enxugar gelo”:

— Isso vai dar problema sempre. A cidade cresce muito em direção às praias. Às vezes, avança tanto que suprime a área “ativa” das praias. Em 2005, quando a orla da Macumba foi inaugurada, menos de um mês depois a ressaca destruiu uma parte. Existe o lado perverso da engenharia costeira porque às vezes se ganha muito para reconstruir. É perverso porque quando se artificializa uma orla marítima, a gente gera erosão. E a resposta do homem para isso é, em vez de recuar as estruturas, refazê-las.

Lei não é cumprida

Flavia Lins-de-Barros, professora da UFRJ com doutorado em Geografia Marinha e Gestão Costeira, faz coro e pondera sobre uma das possíveis soluções para o problema: a aplicação de projetos previstos em legislação nacional e ainda não implementados no Rio:

— No país há muitas leis de gestão costeira. Tem o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, tem o Projeto Orla. Uma das diretrizes que embasam esse Projeto Orla, por exemplo, é o Decreto n° 5.300 (2004), que prevê que deve haver uma proteção da faixa litorânea de pelo menos 50 metros do final da praia para trás. Isso seria o ideal para garantir que esse trecho não fosse ocupado. A capital também não tem Plano Municipal de Gerenciamento Costeiro, previsto no Brasil há mais de 30 anos — diz a professora.

Procurada pela reportagem, a prefeitura não explicou o motivo de os projetos previstos em lei ainda não terem sido implementados.

— Quando a gente fala da cidade do Rio, provavelmente, se pensa: “como vou explicar que os quiosques, por exemplo, que são tantos e têm poucos donos, precisam ocupar uma faixa mais à retaguarda, que precisam recuperar melhor as restingas e as dunas à sua frente?” Mas a gente tem que enfrentar. Porque vai ser pior deixar do jeito que está e continuar sem planos, sem pensar nas adaptações e deixar, por exemplo, impactos ocorrerem e até mortes, como a da Niemeyer (com a queda da ciclovia Tim Maia, em abril de 2016) — acrescenta Flavia Lins-de-Barros.

O Mirante do Leblon, na Avenida Niemeyer, é outro ponto crítico, apontam os pesquisadores. Em dia de ressaca intensa, não deve ser visitado, como informam avisos do Corpo de Bombeiros. Nada disso impediu que um grupo de turistas gaúchos, há pouco mais de duas semanas, levasse um banho de uma onda mais forte — e um tremendo susto — por insistir em permanecer na área.

Uma alternativa ao processo de urbanização já estabelecido é o que os especialistas chamam de “soluções híbridas”.

— A resposta não deve ser construir muros mais pesados, estruturas maiores. A resposta é se adaptar, seja movimentando areia, seja criando pequenas dunas artificiais, plantando vegetação de restinga, favorecendo a recomposição do ecossistema, olhando para ele como estrutura de defesa do litoral. Em áreas urbanas, avenidas e calçadões não vão ser tirados de lugar. Mas aí existem soluções híbridas. Não dá para a gente ficar nesse eterno embate com o litoral porque no fim das contas a gente vai perder.

ONU faz alerta

Estudo feito pela ONU em parceria com o Climate Impact Lab (CIL), que produz a plataforma Human Climate Horizons (HCH), aponta que o nível do mar pode subir 21 centímetros até 2050. No cenário pessimista, 7% do território do Rio pode ser permanentemente inundado até 2100 por causa do aquecimento global.

— Essa é uma quantidade maior e uma taxa mais rápida do que a que tem sido vista ao longo de muitas das outras costas do mundo. O número não é estático. Se a gente conseguir reduzir as emissões globais de gases do efeito de estufa e limitar o aquecimento da Terra em 2 graus Celsius, pode ser possível reduzir a perda de território do Rio a 3%, em um cenário otimista — explica Hannah Hess, diretora associada do Climate Impact Lab.

Os níveis mais elevados do mar são causados pelo derretimento das camadas de gelo e das geleiras. O fato de o Rio estar em um nível mais baixo, segundo Hannah, faz com que a cidade seja particularmente vulnerável a inundações por elevação do nível do mar. Eventos como erosão costeira e enchentes mais intensas e frequentes são outras consequências.

— Isso pode empurrar as pessoas cada vez mais para o interior das cidades. Também significa menos terra possível de ser ocupada pela população e a necessidade de políticas públicas para retirar essas pessoas de zonas de inundação — afirma a diretora do Climate Impact Lab.

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