Um cruzamento de dados feito pelo Ministério Público do Rio e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) mostra que 941 funcionários públicos também receberam salários da Fundação Ceperj, o que configura uma irregularidade. Os órgãos consideraram irregulares quem possui duas matrículas diferentes além da contratação pelo Ceperj ou ocupantes de cargos com regime de dedicação exclusiva. Na lista de cargos acumulados há até um fiscal de contratos do governo do Rio, além de 13 bombeiros, 22 policiais militares e 87 contratados por secretarias estaduais. Também chamaram a atenção sete CPFs que seriam de pessoas já mortas.
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Na lista de vínculos duplicados com irregularidades há recordistas em saques na boca do caixa que constavam na lista de ordens de pagamento deste ano do Ceperj. Luiz Antonio Anelli Filho recebeu, de fevereiro a julho, R$ 43.452,01 em 18 ordens de pagamentos da Fundação. Em todas as ordens de pagamento, Anelli sacou o dinheiro na ‘boca do caixa’ nas agências de Laranjeiras e no Catete, ambas na Zona Sul do Rio.
Além de figurar na lista de cargos secretos da Fundação, Luiz Antonio Anelli Filho deu expediente entre outubro de 2021 a junho de 2022 na Secretaria de Governo do Rio (Segov), pasta que comanda parte dos projetos do Ceperj — Observatório do Pacto RJ e RJ para Todos, que custaram aos cofres públicos R$ 66 milhões este ano.
Entre suas atribuições na Segov, onde recebia cerca de R$ 5 mil mensais, Luiz Antonio Anelli Filho era fiscal de contratos do governo estadual. Representando o programa RJ Para Todos, onde era coordenador de serviço social, ele integrava a comissão de acompanhamento e fiscalização de contratos da secretaria. Entre as atribuições da cadeira está a certificação que o serviço foi prestado pelo contratado antes que o poder público faça o pagamento.
Outra servidora da Secretaria de Governo do Rio, que também consta na lista dos recebimentos irregulares e entre os que mais vezes receberam do Ceperj é Gilvania de Souza Coutinho. Além de receber mensalmente R$ 6 mil pelo seu cargo na Segov, ela ganhou 17 ordens de pagamento neste ano do Ceperj. Destes, Gilvania sacou 16 na boca do caixa em uma agência de Laranjeiras, Zona Sul do Rio e ao todo recebeu R$ 31 mil da Fundação nos primeiros sete meses de 2022.
A folha secreta do Ceperj tem 27.665 beneficiados que receberam R$ 248 milhões de janeiro a julho deste ano — com 91% do montante pagos na boca do caixa. Alvo de uma investigação do Ministério Público, os pagamentos são referentes a projetos implantados em parceria com secretarias estaduais, mas os sites de Transparência não dão informações sobre os valores e os serviços prestados. Segundo o RJTV, em um dos documentos do Ceperj enviados ao TCE, o órgão admite que as contratações não foram publicadas no Diário Oficial.
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Atividade noturna e aos fins de semana
Procurada, a Fundação Ceperj afirma que os servidores Gilvania Coutinho e Luiz Anelli atuavam na coordenação do serviço social e operacional do Programa RJ para Todos, da Secretaria de Governo, de segunda a sexta , das 9h às 17h. Na Fundação Ceperj, com atividades noturna e aos finais de semana, com carga horária compatível. O GLOBO não conseguiu localizar os servidores.
A Comissão Especial de Auditoria e Transparência criada pela Secretaria estadual da Casa Civil para apurar os convênios e contratações do Ceperj — investigado pelo Ministério Público e alvo de uma auditoria do Tribunal de Contas Estadual — identificou mais de 300 pessoas que constavam na folha de pagamentos da fundação referente ao mês de julho (que está suspensa) e, ao mesmo tempo, têm vínculos com outros órgãos de governo. A Comissão pediu para todos que aparecem na lista comprovar a regularidade da prestação de serviços.
Leia o posicionamento do governo estadual na íntegra
"Os servidores Gilvania Coutinho e Luiz Anelli atuavam na coordenação do serviço social e operacional do Programa RJ para Todos, da Secretaria de Governo, de segunda a sexta , das 9h às 17h. Na Fundação Ceperj, atuavam na função de apoio institucional de pesquisa e extensão do Projeto Cenários da População em situação de rua e vulnerabilidade social, fazendo jus a remuneração pecuniária de caráter indenizatório, seguindo o regramento jurídico das Leis Estaduais de Inovação ( 9.809/22 e 5.361/08) com atividades noturna e aos finais de semana, com carga horária compatível.
Lembramos que todos os servidores públicos, efetivo ou comissionado, podem realizar atividades da Ceperj (que tem natureza jurídica de ICT), conforme previsto no Decreto Estadual 42.302/2010 e artigo 1º, parágrafo único, do Decreto Estadual 47.642/2021), seguindo a legislação estadual o mesmo modelo da Lei Federal 10.973/2004), desde que sem prejuízo das suas funções.
Destacamos que a indenização recebida pelos funcionários no Ceperj envolve expediente extra, não acumulativo com os horários de atividade exercidos na Segov, e realizados nos finais de semana e em instruções e capacitações. Além do soldo pelas atividades, as ordens de pagamentos se referem, ainda, ao custeio de translado, alimentação e hospedagem em viagens a serviço, também em conformidade com a legislação vigente (Decreto 41644/09, o que justifica a expedição de OPs distintas pela Fundação Ceperj).
Ainda fazemos a ressalva da excepcionalidade do serviço realizado pelos servidores no cadastramento do aluguel social, acolhimento e no atendimento das vítimas das tragédias ocorridas no Rio de Janeiro, amplamente divulgada pelas TVs, redes sociais e imprensa.
Ressaltamos que o servidor Luiz Antônio Anelli durante o exercício das suas funções na Segov, foi fiscal de contrato de serviços e aquisições de materiais da secretaria, cuja a gestão destes contratos é realizada institucionalmente pela Casa Civil, conforme legislação vigente."
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