Quem circula pela cidade, principalmente no Centro e em Icaraí, sem estar grudado no visor do celular tem a clara impressão de que a população em situação de rua só cresce em Niterói. Tal impressão acaba de ser comprovada por um relatório elaborado pela Sala de Situação de Saúde e pela Secretaria municipal de Assistência Social e Economia Solidária, que traçou um perfil dessa população na cidade. Foram identificadas 740 pessoas nessa condição, representando um aumento de 27,6% em relação aos dados anteriores, de setembro de 2021. O levantamento revela a heterogeneidade deste grupo, com predominância de homens adultos negros. O estudo baseou-se em informações extraídas da base de dados do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
Esse aumento reflete uma tendência nacional, conforme destacado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que aponta um crescimento de 38% da população em situação de rua no Brasil entre 2019 e 2022, situação possivelmente agravada pelos impactos da pandemia de Covid-19.
A maioria destes indivíduos é do sexo masculino (86,4%) e adulta, com idades entre 18 e 59 anos (93,1%). A autodeclaração racial revela que a maior parte destes se identifica como pessoa preta ou parda (76,7%). O estudo revelou ainda que cerca de 93% possuem habilidades de leitura e escrita, com uma proporção significativa envolvida em atividades laborais informais. Entre essas atividades destacam-se catadores (26%), vendedores ambulantes (21,6%), operários da construção civil (7,6%), auxiliares de serviços gerais (7,4%), guardadores de carro (4,3%) e carregadores (1,8%). O levantamento indica também que 7,8% atuam como pedintes.
As razões que levam à condição de rua são diversas, com destaque para o desemprego (44,1%), problemas familiares ou com companheiros (41,8%) e abuso de substâncias (17,7%). Quanto ao tempo em que esses indivíduos estão nas ruas, um total de 237 (32%) encontram-se há seis meses ou menos nessa condição, e 96 (13%) disseram viver assim entre seis meses e um ano. Os dados destacam que 55% dos indivíduos estão enfrentando essa situação de rua há mais de um ano.
Processo migratório
No que diz respeito à naturalidade, a maioria dos registros, totalizando 632 (85,9%), corresponde a indivíduos nascidos na Região Sudeste, enquanto 85 cadastros (11,5%) têm origem no Nordeste. Dos nascidos no Sudeste, 569 (76,9%) são pessoas naturais de municípios do estado do Rio.
O mapeamento dos municípios de origem destes indivíduos aponta que 27,2% da população são naturais de Niterói, seguida pelos municípios vizinhos, com destaque para Rio de Janeiro (15,90%), São Gonçalo (14,81%), Duque de Caxias (2,04%) e Nova Iguaçu (2,04%).
— Há um processo migratório das cidades mais pobres para as mais ricas e uma crise imobiliária em que o preço da moradia só aumenta. Em Niterói, esse processo não é diferente. A cidade, pela alta renda per capita da população, acaba sendo um polo de atração de pessoas em busca de emprego e de rede de serviços públicos de qualidade — observa o secretário da pasta, Elton Teixeira.
Em relação a esse aumento, a prefeitura informa que tem intensificado o monitoramento e criado novas iniciativas. A Secretaria de Assistência Social e Economia Solidária diz que começou em outubro a realizar intervenções diárias nas ruas da cidade. Nos últimos 15 dias, foram conduzidas mais de cem abordagens. Para auxiliar na reintegração ao mercado de trabalho, as equipes oferecem atendimento médico e acolhimento, além de encaminhamento para cursos e oportunidades.
— Só no último ano, mais de 70 pessoas acolhidas conseguiram reverter a condição de situação de rua — conta Teixeira.
A infraestrutura de atendimento da prefeitura inclui o Centro de Referência Especializado para pessoas em situação de rua (Centro Pop), além de dez Centros de Referência da Assistência Social (Cras), dois Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) e cinco unidades de acolhimento (abrigos). A ocupação atual dos abrigos da cidade é de 75% dos mais de 350 leitos disponíveis.