Washington Olivetto
PUBLICIDADE
Washington Olivetto

Publicitário

Informações da coluna

Washington Olivetto

Publicitário

Desde 2017, quando me mudei para Londres, não visito uma agência de publicidade no Brasil. Mas, mesmo à distância, continuo acompanhando tudo de perto.

Converso com profissionais da minha confiança, que me contam como vão as coisas e o que acontece no dia a dia das agências brasileiras. As informações que tenho recebido são preocupantes para um sujeito como eu, eternamente apaixonado por esse ofício.

Segundo me contam, o astral nas agências brasileiras, com raríssimas exceções, anda baixo, o que é um enorme problema. Numa agência de publicidade, a administração do astral é tão importante quanto a administração do caixa. Uma agência que não tem um clima alegre normalmente tem um trabalho triste, coisa que em comunicação não funciona.

Muitos me dizem que a maioria das agências não parece agência. Apesar de ninguém usar máscaras, são assépticas como um consultório odontológico. Não há layouts em cima das mesas, jingles tocando alto nos corredores, nem provas de anúncios penduradas nas paredes. E não há novas conquistas comemoradas com champanhe e fogos, até porque a maioria delas não tem novas conquistas para comemorar.

Capa do audio - Bernardo Mello Franco - Conversa de Bastidor

Segundo me garantem, se você visitar uma agência nos dias de hoje, dificilmente alguém lhe mostrará os últimos trabalhos, coisa que durante anos acontecia por iniciativa da maioria dos profissionais, desde os mais experientes até os mais jovens.

Hoje, o máximo que é mostrado são as peças que foram premiadas no último Cannes Lions ou as criadas para o próximo. A maior parte delas sem a mínima preocupação de resolver um problema mercadológico real. Feitas apenas para conquistar algum prêmio. Lamentavelmente, a ideia de conquistar consumidores, antes de conquistar prêmios, perdeu a importância, desapareceu.

Outro problema que os profissionais mais conscientes e experientes detectam nas agências atuais é o individualismo, a falta de integração e de diálogo. Anos atrás dizíamos que era fundamental ter a consciência de que é melhor ser coautor de um trabalho brilhante do que autor solitário de algo medíocre. Essa consciência foi extremamente responsável pelo sucesso da DPZ, da W/Brasil, da Talent e de algumas outras agências. Parece que hoje, lamentavelmente, isso se perdeu. Profissionais preferem ficar ouvindo seus fones de ouvido, em vez de trocar ideias com os colegas. Assim fica praticamente impossível criar comunicação brilhante.

Como fica impossível aprovar comunicação brilhante sem gente com coragem e personalidade para dizer “não”. Quando um profissional de um anunciante recusa uma ideia boa, ou insiste numa ideia errônea, é fundamental que alguém da agência diga “não”:

— Não, não vamos fazer assim porque assim não dará certo.

Mas, hoje, quando o medo de perder um cliente é maior que a vontade de fazer um trabalho exuberante, esse tipo de atitude não acontece mais. Deixou-se o prazer pela excelência no passado, assim como deixou-se de falar português nas agências brasileiras, que parecem empresas dubladas pelos acionistas internacionais.

Separei alguns exemplos para este meu artigo — que, em algumas agências, periga ser chamado de article.

As agências brasileiras não fazem mais trabalhos, fazem jobs. Não fazem mais reuniões, fazem meetings. Em vez de convidarem seus clientes para um almoço, convidam para um lunch. Agendam reuniões de produção para as five pm, em vez de agendarem para 5 da tarde.

Devido ao pavor das denúncias de assédio, as saudáveis paqueras entre os solteiros que aconteciam não acontecem mais, mas, se por acaso acontecer, não será marcado um encontro, será marcado um date. Da mesma maneira que, em vez de apresentações, as agências marcam presentations.

Nos dias de hoje, muitos publicitários só não estão utilizando a palavra algorithms, como no original em inglês, porque andam apaixonados por algoritmos em qualquer língua. As agências deixaram de ser geradoras de ideias, para ser checadoras de dados.

Não perceberam que não adianta nada reach o consumidor, sem touch o consumidor.

Idiots.

Mais recente Próxima O jornal nosso de cada dia