Pedro Doria
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Pedro Doria

Jornalista

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Pedro Doria

Elon Musk, que até a semana passada era o homem mais rico do mundo e agora tem de amargar ser o número dois na lista da Forbes, está processando a OpenAI. Ele foi um dos fundadores da empresa. Uma empresa, sim, mas criada para não ter fins lucrativos, com o objetivo de desenvolver inteligência artificial para benefício da humanidade. A intenção era até mais arrojada: chegar antes de todos os outros à inteligência artificial geral (AGI, na sigla em inglês). O equivalente à inteligência humana. Musk não acusa a companhia dirigida por Sam Altman apenas de trair o princípio de não ter fins lucrativos. Ele a acusa, também, de já ter alcançado o nível da AGI e de estar escondendo do mundo.

Há muito para desempacotar nessa história.

Começa pelo fato de Musk ter razão. Criada sem fins lucrativos, a OpenAI traiu esse princípio. Ao menos, quase traiu. A OpenAI ongueira continua lá, em cima da hierarquia. É uma casca jurídica dona de uma empresa com fins lucrativos. É um truque legal. A empresa-ONG é dona das patentes que a empresa com lucros gera. Mas a empresa com lucros pode fazer dinheiro. Existe uma razão para isso ter ocorrido, e ela não é apenas a ganância que o olhar simplista sugere.

Os problemas são dois, e eles obrigam a OpenAI a se tornar uma companhia que gera muito valor. O primeiro é que desenvolver inteligência artificial é muito caro. Treinar um algoritmo como o GPT exige acesso a uma nuvem de computadores como poucas no mundo. Exige um dispêndio de energia imenso, uma quantidade de processamento não usada em mais nenhuma função digital, tudo em chips de última geração contados às centenas de milhares, aos milhões. Sem muito recurso à mão, não se desenvolve inteligência artificial. O acordo da OpenAI com a Microsoft é, em essência, esse. A companhia fundada por Bill Gates paga os bilhões de dólares que investiu não em dinheiro, mas em uso de suas máquinas.

O segundo problema é tão delicado quanto. Não há muito cientista da computação com doutorado em IA no mundo. Eles vêm sendo formados todos os anos, mas não são tantos assim. A demanda é farta, e a oferta diminuta. Sem esse tipo de cérebro, não se desenvolve IA e, ali no Vale do Silício, uma meia dúzia de companhias quer contratá-los às dezenas, se possível às centenas. Gente com esse tipo de valor não se contrata, no Vale, com salário. Porque salário nenhum paga o tipo de valor em bilhões de dólares que essas pessoas geram para quem as contrata. O que vale, na proposta de contratação, é quanto em participação acionária cada cientista ganha.

São essas ações a garantia de que trabalharão por cinco ou dez anos gerando uma quantidade abissal de valor de mercado para uma companhia e, ao fim, se tornarão milionários. Empregador que não faz oferta nesse nível não tem por que achar que atrairá alguém.

A OpenAI foi criada em 2014, um ano depois de o GooglePhotos mostrar ao mundo que a IA era capaz de reconhecer rostos e lugares, meses antes de a Amazon informar que tinha uma caixa de som capaz de compreender o que falamos. Três anos antes de um grupo de doutores do Google propor o modelo Transformer, que tornou viável a IA que gera textos e imagens. Quando a empresa nasceu ONG, não estava tão claro quanto o processamento pesado e a expectativa de riqueza dos matemáticos seriam as forças motrizes dessa indústria.

Musk disputou poder para ter controle da OpenAI lá atrás e perdeu. Criou agora uma empresa nova para concorrer nesse mercado. Está muito atrasado na briga de trilhões enquanto se distrai com o ex-Twitter de milhões e vê os chineses se aproximando nos carros elétricos. Seu problema é outro.

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