Edu Lyra
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Edu Lyra

Fundador e CEO da Gerando Falcões

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Edu Lyra

Fundador e CEO da Gerando Falcões

O Brasil tem uma espécie de mania de concentrar o debate público no eixo Rio-São Paulo. Essa mania, cujas raízes estão na própria história do nosso desenvolvimento, marcado por desigualdades geográficas e econômicas, explica por que o jornalismo, a divulgação e o financiamento da cultura, os encontros empresariais ou as lideranças políticas às vezes parecem dar as costas a regiões inteiras do país.

Por isso fiquei muito animado quando Ticiana Rolim, fundadora e CEO da Somos Um, ONG dedicada ao fomento de negócios de impacto, me convidou para participar do evento Conexão ODS, realizado no Ceará, em parceria com o braço brasileiro do Pacto Global da ONU.

Ver um evento desse calibre realizado num estado do Nordeste deve ser motivo de alegria para qualquer brasileiro. Fiquei ainda mais feliz quando soube que o principal palestrante seria o banqueiro, economista, professor e empreendedor social bengalês Muhammad Yunus, vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

O “banqueiro dos pobres” é o idealizador do Grameen Bank, com seu sistema revolucionário de microcrédito, que transformou por completo o panorama econômico de Bangladesh. Graças em grande parte a esse trabalho, o país asiático, que já esteve entre os dez mais pobres do mundo, registrou melhora impressionante em seus indicadores.

Yunus é uma inspiração para qualquer empreendedor social. Veio ao Brasil divulgar seu livro mais recente, em que imagina um futuro marcado por “três zeros”: zero pobreza, zero desemprego e zero emissões líquidas de carbono. Um futuro que exige, portanto, reformulação completa na maneira como organizamos a economia e a sociedade.

Haveria lugar mais adequado para debater esse programa que o Nordeste? Seus estados concentram quase metade dos brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza. Ao mesmo tempo, a região é campeã na produção de energia limpa. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o Nordeste responde por mais de 80% da energia eólica e solar produzida no país, ou 15% da nossa capacidade de geração de energia elétrica.

O Nordeste representa essa curiosa interseção entre a demanda por políticas urgentes de combate à pobreza e, simultaneamente, a construção prática de trilhas para o crescimento sustentável. A região carrega muitas das carências e potencialidades que são a chave para compreender e transformar o Brasil.

Ticiana, que também sonha com um futuro sem pobreza, teve muita ousadia ao trazer Muhammad Yunus para conhecer de perto a realidade cearense e falar diretamente com empreendedores sociais nordestinos e de vários outros cantos do país.

Escutando o “banqueiro dos pobres”, reforcei minha convicção de que existe um caminho além da filantropia no terceiro setor. É preciso enxergar as ONGs como empresas sociais, instituições sustentáveis financeiramente, com governança profissional, que oferecem produtos e serviços demandados pelo mercado e que, no entanto, convertem seus lucros em serviços sociais. Um caminho que, segundo o próprio Yunus, não é fácil, mas é realizável.

Utopia? Talvez. Mas, vindo de alguém que já transformou sonho em realidade em seu próprio país, vale a pena tentar.

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