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Por O Globo Com Agências Internacionais

O Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, emitiu uma ordem de prisão contra o presidente da Rússia, Vladimir Putin, por crimes de guerra cometidos na Ucrânia, sob invasão russa há mais de um ano. Há também uma medida contra sua comissária de direitos das crianças, Maria Alekseyevna Lvova-Belova, pela "deportação ilegal" de ucranianos, em particular as crianças. Mas pôr o chefe do Kremlin atrás das grades não será uma missão simples.

Direto ao ponto: afinal, por que é quase impossível que Putin seja preso?

  • Criado em 1998, o Tribunal Penal Internacional (TPI) é uma corte independente e permanente ratificada por 123 países com o objetivo de julgar os acusados por violações como genocídio, crimes contra a humanidade e crimes de guerra;
  • o TPI é acionado apenas quando um crime não é investigado por um tribunal nacional, quando um país tenta proteger o acusado de sua possível responsabilidade penal, ou quando um Estado for incapaz de julgar um indivíduo devido ao colapso de seu sistema jurídico;
  • a jurisdição da corte, entretanto, é restrita a crimes cometidos em um país que tenha ratificado o Tratado de Roma, sob o qual o tribunal foi criado, ou por cidadãos de um Estado signatário;
  • a Rússia e a Ucrânia assinaram o tratado, mas não o ratificaram;
  • além disso, o tribunal não pode julgar sem que o réu esteja fisicamente presente e, como não tem jurisdição na Rússia, a prisão de Putin torna-se inviável dentro do país;
  • os magistrados consideraram emitir mandados secretos, mas decidiram que torná-los públicos poderia "contribuir para a prevenção" de outros crimes;
  • um inquérito pode ser aberto pelo procurador a pedido de um Estado que tenha ratificado o tratado ou por iniciativa própria, desde que previamente autorizado por três juízes independentes;
  • o Conselho de Segurança das Nações Unidas também pode pedir ao procurador que abra uma investigação envolvendo um país que não tenha assinado o Tratado de Roma;
  • o procurador do TPI, Karim Khan, anunciou em 2 de março do ano passado a abertura de uma investigação sobre possíveis crimes de guerra cometidos na Ucrânia, afirmando haver fortes evidências de que houve violações ao Direito Internacional Humanitário no conflito.

Investigação da ONU

A ordem de prisão contra o presidente Putin foi dada um dia após a divulgação de um relatório de investigadores da Organização das Nações Unidas (ONU) apontar que a transferência de crianças ucranianas para regiões da Ucrânia sob controle de Moscou e para o território da Rússia constitui um "crime de guerra" e também possíveis crimes contra a humanidade.

No primeiro relatório elaborado desde que a Rússia iniciou a ofensiva contra a Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a comissão de investigação da ONU conclui que "as situações que examinou a respeito da transferência e deportação de crianças, dentro da Ucrânia e para a Federação da Rússia, respectivamente, violam o direito humanitário internacional e constituem um crime de guerra".

De acordo com Kiev, 16.221 crianças foram deportadas para a Rússia até o fim de fevereiro deste ano, mas a comissão não conseguiu comprovar o número. O relatório destaca, no entanto, que as autoridades russas tomaram medidas legais e políticas relativas à transferência de crianças ucranianas e que Putin assinou um decreto em maio do ano passado para facilitar a concessão da cidadania russa a alguns menores.

Os investigadores também acusaram o governo russo de ter cometido possíveis "crimes contra a humanidade".

"A comissão constatou que as ondas de ataques executados pelas Forças Armadas da Rússia desde 10 de outubro de 2022 contra as infraestruturas de energia ucranianas e o recurso à tortura por parte das autoridades russas podem constituir crimes contra a humanidade", afirma o relatório, que recomenda a abertura de investigações adicionais.

O grupo descobriu um "sistema de detenção ilegal generalizado" nas áreas controladas pelas tropas russas, contra várias pessoas, incluindo mulheres e crianças.

Entre as pessoas detidas nas "instalações especializadas" localizadas na Ucrânia e na Rússia, algumas eram sistematicamente torturadas, segundo os investigadores. Um ex-detento foi agredido como forma de "punição por ter falado ucraniano e por não recordar a letra do hino da Federação da Rússia", afirmou a comissão. Isso é um tipo de tortura que pode "constituir crimes contra a humanidade" e que deve ser objeto de uma investigação mais aprofundada, destacaram os investigadores em um comunicado.

Moscou nega desde o início da guerra que viola os direitos humanos ou comete crises lesa-Humanidade em sua operação militar especial na Ucrânia, que começou em 24 de fevereiro. Minutos após a decisão ser anunciada, a porta-voz da Chancelaria, Maria Zakharova, repetiu pelo Telegram que a Rússia não reconhece a jurisdição do TPI:

"As decisões do Tribunal Penal Internacional não têm nenhum significado para o nosso país, inclusive do ponto de vista jurídico", escreveu a representante. "A Rússia não é parte do Tratado de Roma do Tribunal Penal Internacional e não tem nenhuma obrigação sob ele."

Putin é o quarto chefe de Estado a ter a prisão decretada pelo TPI estando no poder, ao lado de Omar al-Bashir (Sudão), Muamar Gadafi (Líbia) e Laurent Gbagbo (Costa do Marfim).

Processo pode se arrastar por anos

Para o especialista em genocídios e direitos humanos Flávio de Leão Bastos, da Faculdade Mackenzie, a possibilidade de Putin ser preso existe em tese, mas, se ocorresse, demandaria muitos anos, além de uma mudança no cenário geopolítico. De acordo com ele, mesmo que fosse emitido um mandado de prisão com bases mínimas comprovadas para uma potencial punição do presidente russo, ainda haveria dificuldade para cumprir a determinação.

— Um exemplo real foi o caso da doutora Sylvia Steiner, nossa juíza brasileira que, quando ainda estava no TPI, expediu dois mandados de prisão contra Omar al-Bashir, ex-presidente do Sudão, mas eles nunca foram cumpridos. Então, é possível a prisão de Putin um dia, pois o crime não prescreve, mas isso vai depender também da conjuntura política do momento — afirmou ao GLOBO em entrevista publicada março do ano passado, por ocasião do início do conflito na Ucrânia.

A própria Sylvia Steiner, que foi juíza do TPI entre 2003 e 2012, explicou ao podcast Ao Ponto, do Globo, sobre o longo processo de tramitação de um processo internacional.

— Nós temos, primeiramente, a fase de investigação, da qual apenas a procuradoria se encarrega. A partir do momento em que o procurador do tribunal encerra a procuração, ele remete o caso a uma das câmaras preliminares do tribunal para que o tribunal expeça mandados de prisão contra os acusados. A partir do momento que o acusado é preso e entregue ao tribunal se inicia uma fase preliminar, que é o exame das provas que foram colhidas na investigação, para ver se são suficientes para mandar o acusado a julgamento — afirma. — Se a câmara preliminar entender que sim, o acusado é mandado para uma câmara de julgamento, e aí se inicia o julgamento de fato daquele acusado. Se ao final de todo o processo de julgamento, o acusado for condenado, ele pode receber uma pena de até 30 anos de reclusão ou até de prisão perpétua se houver uma soma de circunstâncias agravantes.

Tribunal eurocêntrico?

A grande maioria dos indiciados pelo TPI desde que começou a funcionar em 2002 vêm de países africanos, alimentando críticas de que o tribunal é demasiadamente eurocêntrico. Isso ocorre tanto pela ausência das grandes potências entre os signatários do Tratado de Roma quanto pela determinação de que o tribunal só pode agir quando as Justiças nacionais forem consideradas omissas diante dos crimes aos quais o tribunal se destina.

Até o momento, 31 processos já passaram pelo tribunal, alguns deles com mais de um suspeito. Das 38 ordens de prisão emitidas, 21 foram cumpridas, com os réus estando no centro de detenção do TPI e comparecendo ao tribunal. Há 14 foragidos. Acusações contra cinco pessoas foram abandonadas devido à sua morte.

Até o momento, o tribunal já emitiu 10 condenações, todas elas para africanos. Outras quatro pessoas foram inocentadas.

Além do TPI, há a possibilidade de Putin ser alvo de um tribunal ad hoc sob ordem das Nações Unidas — e que ocorre para casos específicos, como em Ruanda, nos anos 1990, ou Nuremberg após a Segunda Guerra Mundial. Também é algo distante, já que a Rússia tem poder de veto no Conselho de Segurança da ONU e poderia barrar a medida.

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