Crítica
PUBLICIDADE

Por Patrícia Kogut

A morte da Rainha Elizabeth II se impõe como um filtro invisível entre a TV e o público na quinta temporada de “The Crown”. Lançada em novembro (Netflix), cerca de um mês depois do acontecido, ela acrescenta uma dose de emoção à narrativa. O público sabe que parte daquilo é ficção, como fez questão de frisar Imelda Staunton, que interpreta a monarca, em entrevistas e nas redes sociais. Mas as comparações com a realidade são inevitáveis.

Por isso, para começar, é preciso falar da escalação cheia de soluços. A criticada escolha de Dominic West para interpretar o Príncipe Charles é difícil de entender e por razões alheias ao talento do ator. Ele não tem o physique du rôle para o papel. Essa falha poderia ter sido compensada de alguma forma com a caracterização e, claro, com um trabalho de composição. Mas West abandona a ambição de emular o personagem e cria seu Charles. Com isso, a direção da série se afasta de suas próprias escolhas artísticas anteriores. A quinta temporada é toda assim: parece obra de uma equipe diferente. O mesmo acontece com o Duque de Edimburgo. Jonathan Pryce é um gigante, mas busca uma construção tão diferente da de Matt Smith, seu antecessor, que temos a impressão de estar vendo uma outra série.

“The crown” teria virado alguma chave e desistido do seu formalismo nos detalhes? Não: Imelda Staunton faz uma Elizabeth II perfeita, a exemplo de Claire Foy e Olivia Colman, titulares do posto no passado. Elizabeth Debicki, a Diana de agora, também envereda pela imitação.

Essas dissonâncias não se limitam ao elenco. “The Crown” desde a estreia enxergava a realeza com encantamento e condescendência. Agora, para usar um termo que andou em voga na política brasileira, dá um “apoio crítico” àqueles que retrata. O rompimento de Diana e Charles representa um dos pontos centrais do enredo. É ao mesmo tempo sua força (em cenas de embates dos dois) e também quando ele perde fôlego (narrando as origens da família Al Fayed). Num dado momento, quando finalmente o casal está prestes a oficializar a separação, a série passa a mostrar cenas de divórcios de pessoas comuns. A intenção é ao mesmo tempo igualar a tragédia real, das “melhores famílias”, à do povo em geral. Mas o resultado é uma quebra de linguagem.

Essa oscilação na rota abala a temporada, a mais fraca de todas. Dizer, entretanto, que “The Crown” é ruim ou que não merece a atenção do leitor seria uma injustiça.

Os figurinos e a cenografia continuam irretocáveis, assim como a cinematografia suntuosa. E a sensação que o público tinha de estar olhando pela fresta da porta para a intimidade da família e testemunhando a História do Reino se desenrolar segue viva.

Assim, vale assistir aos episódios todos, mas torcendo para que, na sexta temporada, “The Crown” retome a pose de antes.

Mais recente Próxima