Patrícia Kogut
PUBLICIDADE
Por

Para seguir no Instagram é @colunapatriciakogut

Fim — Foto: Divulgação
Fim — Foto: Divulgação

Lançado em 2013 e muito bem recebido, “Fim” marcou a estreia de Fernanda Torres na literatura. A escrita fina da atriz já era conhecida pelas crônicas dela. Na próxima quarta-feira, chega ao Globoplay a adaptação do livro para o streaming. Criada por Fernanda, com supervisão de adaptação de Maria Camargo, a produção tem direção artística de Andrucha Waddington (e direção de Daniela Thomas). Serão dez episódios e esta crítica se baseia nos primeiros dois. Aproveito para recomendar o romance juntamente com a série.

Seguimos um grupo de amigos da juventude à velhice. O enredo se fragmenta em cronologias entre 1968 e 2012. Esse recurso, de contar uma história somando fatos transcorridos em mais de uma fase, se generalizou nas séries a ponto de ter se tornado um jogo cansativo e previsível. Aqui, contudo, ele não é um truque. É que a passagem do tempo e a memória estão no centro de tudo. A dança entre o passado e o presente diz respeito ao próprio tema da narrativa.

Conhecemos primeiro Ciro. Personagem de Fábio Assunção (irreconhecível, num trabalho fantástico de caracterização), ele está no leito de morte, no hospital. Dialoga com uma enfermeira (Valentina Herszage) e a cena tristemente erótica que se segue faz pensar em Nelson Rodrigues. Essa impressão paira sobre a história o tempo inteiro enquanto ela vai abrindo a intimidade de cada um dos personagens.

Ciro morre e seu velório é um ponto de partida para apresentar os protagonistas. Assim, vamos acompanhando a entrada em cena de alguns dos maiores talentos da nossa televisão. O elenco impressiona. A escalação — a escolha certeira de cada ator para seu papel —, também.

A grande ausência no cemitério é a da ex-mulher de Ciro, Ruth (Marjorie Estiano). Mas estão lá Ribeiro (Emilio Dantas), Sílvio (Bruno Mazzeo), Álvaro (Thelmo Fernandes), Neto (David Júnior), Célia (Heloisa Jorge) e Norma (Laila Garin). A complexidade dos personagens se mostra primeiro através de Ciro. É que o elogio fúnebre cita Eclesiastes (“Tudo tem seu tempo/tempo de nascer e de morrer/tempo de afastar pedras e tempo de juntá-las”). Mas, em seguida, Sílvio pede a palavra e convoca os presentes para homenagear o morto “com uma bacanal na minha garçonnière na Rua da Glória”.

O enredo recua e foca na turma na Praia de Copacabana, nos anos 1960. O grupo, então de jovens, desfia refrões machistas aos ouvidos de hoje. Ribeiro é um “papa anjo”. Ciro, um sedutor; Célia manteve o marido “no cabresto” e ele é fiel. “Fim” retrata uma geração e faz um painel da evolução de costumes. É triste e amarga, sobretudo quando os personagens estão mais velhos e as suas relações, já envenenadas por acontecimentos do passado. Antes de a inocência ser rompida, entretanto, testemunhamos suas alegrias, suas paixões e seus carnavais.

Há muitas sequências bonitas no Rio e a abertura encanta. Merece a sua atenção.

Mais recente Próxima 'Beckham' entra na intimidade do ex-jogador e faz um perfil irresistível. Cotação: cinco estrelas (ótima)