Salário milionário, sem-teto e pastor: 'Andava fedendo na rua', disse primeiro Bozo, que morreu aos 73 anos

Vítima de um infarto, Wanderley Tribeck atuou como o palhaço infantil de 1980 a 1985 e sofreu com a dependência química

Por O GLOBO


Wanderley Tribeck e o personagem Bozo Reprodução

RESUMO

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GERADO EM: 19/06/2024 - 11:35

Vida e legado de Wanderley Tribeck como Bozo

Wanderley Tribeck, primeiro intérprete do Bozo no Brasil, faleceu aos 73 anos após infarto. Sua vida foi marcada por lutas contra dependência química e redenção através da fé. A maldição que assombrou os atores que interpretaram o palhaço é destacada, mostrando os desafios enfrentados por Tribeck e seus sucessores.

Morto na noite de terça-feira (18), aos 73 anos, em Balneário Camboriú, no Litoral Norte de Santa Catarina, o ator Wanderley Tribeck ficou conhecido nacionalmente como o primeiro a vestir no Brasil a roupa do palhaço Bozo, personagem criado nos Estados Unidos em 1946, por Alan Livingston. Tribeck ele estava internado no Hospital Municipal Ruth Cardoso, após passar mal pela manhã, e, de acordo com a família, teria sofrido um infarto.

Tribeck interpretou o palhaço Bozo de 1980 a 1985, sob o nome artístico de Wandeko Pipoca. Em 1979, ele conseguiu a autorização de Larry Harmon, intérprete do palhaço nos EUA e dono dos direitos do personagem, de vivê-lo no Brasil. Em 1980, foi contratado pelo SBT (então TVS), para estrear um programa em setembro do mesmo ano, lançando um LP e uma série de brinquedos e produtos infanto-juvenis. Ele ficou na emissora até 1982, quando, segundo ele, teria sido demitido após confrontar decisões de Silvio Santos sobre o programa.

Após sair do SBT, Tribeck seguiu com o tipo até 1985, na TV Gazeta, na Record (onde apresentou a Turma da Pipoca) e na Band (onde participou da TV Criança, ao lado da apresentadora Sandra Annenberg). Segundo a autobiografia "Da morte para a vida", lançada no ano passado, o ator e comediante teve problemas com álcool e drogas na década de 1990, após deixar o figurino de palhaço. Ele contou ter perdido a família, e creditou a conversão à Assembleia de Deus o fato de ter retomado o contato com a mulher e os filhos. Antes de morrer, Tribeck atuava como pastor evangélico na Assembleia de Deus em Criciúma (SC).

'Era um bêbado inveterado, cheirador de cocaína'

Em uma pregação registrada em vídeo, posteriormente disponibilizado no YouTube, Tribeck contou aos fiéis da igreja alguma das situações pelas quais passou no auge da fama, época em que relata que recebia um salário milionário, "o maior da emissora, maior que o da Hebe" e era amigo de Silvio Santos: "almoçava e jantava na casa dele, andava com ele de carro por São Paulo toda".

"Eu era um bêbado inveterado, cheirador de cocaína. Batia na minha esposa, maltratava meus filhos", contou, em seu testemunho no púlpito. No vídeo, Tribeck diz que, após sua mulher ter saído de casa levando os filhos, ele a foi procurar armado, mas ela se escondeu e depois figiu do país com a família.

Wanderley como Bozo, junto aos personagens Vovó Mafalda (Valentino Guzzo), Salci Fufu (Pedro de Lara), Papai Papudo (Gibe) e Garoto Juca — Foto: Reprodução

"Bastou cinco meses sem minha esposa e meus filhos para eu virar um mendigo em Balneário Camboriú. Perdi meu apartamento, perdi carro, perdi fama, perdi todo o meu dinheiro. Dormia na sarjeta, andava fedendo na rua", contou o ex-palhaço, antes de relatar como a conversão o fez procurar um novo emprego e mudar de vida.

Em entrevista há dois anos, ao podcast "Inteligência Ltda.", Tribeck contou que recebeu oferta boa para voltar a interpretar o Bozo em 2017, mas não aceitou. Ele explicou na época: "Não seria bom para mim ser pastor e voltar a ser palhaço. A Bíblia diz: 'e alguém está em Cristo, nova criatura é'. Era uma grana alta. Quem vai para Jesus não sai mais".

Nos últimos anos, ele brincava com o fato do ex-presidente Jair Bolsonaro ter ganhado o apelido de "Bozo" dos seus detratores. "“A esquerda está elogiando o nosso presidente quando chamam ele de Bozo, porque o Bozo conquistou uma legião de amigos", disse em um vídeo postado nas redes sociais.

'Maldição do Bozo'

Tribeck foi o primeiro Bozo, mas não o último. Os três atores que representaram o palhaço no Brasil se envolveram em tantos dramas que um jornal chegou a cunhar o termo “A maldição do Bozo”, em 1991. Trajetória semelhante à de Tribeck teve Arlindo Barreto, que o substituiu como Bozo de 1982 a 1987. A vida desregrada de Barreto nos anos em que interpretou o palhaço inspirou o filme "Bingo", de 2017.

Até mesmo os atores-suplentes, que ficavam na reserva para entrar em caso de emergência, narraram ter tido uma história turbulenta. Marcos Goés contou ter cheirado cocaína no camarim antes de entrar no palco.

Terceiro ator a assumir Bozo como titular, Luis Ricardo pegou fogo ao vivo no Programa do Ratinho em 2017, quando fazia a sessão de merchandising da atração. Ele foi atendido no ambulatório da emissora e sofreu apenas queimaduras superficiais.

Em nota, o SBT lamentou a morte de Wanderley Tribeck: "Toda a diretoria do Sistema Brasileiro de Televisão vem a público agradecer Wanderley pelo pioneirisimo do início do SBT, construindo e pavimentando uma estrada de muito sucesso na história da emissora, que marca gerações e gerações com seus programas infantis. Pedimos que Deus conforte os corações de sua esposa, seu filho e netos. Estamos certos que ninguém jamais se esquecerá do primeiro intérprete do tão amado palhaço Bozo".

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