Fabio Giambiagi
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Fabio Giambiagi
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Fabio Giambiagi

Economista


Meu primeiro artigo sobre Previdência é de 1992. A reforma previdenciária, que Paulo Tafner, Marcelo Caetano, Leonardo Rolim e outros estudiosos do tema pregamos durante 25 anos, só vingou em 2019.

Quem quer que tenha ingressado na arena do debate público sobre o assunto aprende rapidamente que a política domina: não há consideração técnica que prevaleça se não há espaço político para as ideias avançarem.

Cientes disso, Tafner e eu acabamos de lançar “A reforma inacabada — O futuro da Previdência Social no Brasil” (Editora Altabooks), onde procuramos contribuir para o “pontapé inicial” de uma futura reforma. Uma mudança de envergadura precisa alcançar certo grau de apoio, sem o qual é impossível aprovar algo no Congresso. E esse apoio pressupõe dois grandes requisitos: i) lastro técnico; e ii) tempo de debate.

Maiorias não se conquistam da noite para o dia. A alteração das regras previdenciárias, antes apoiada só por três “gatos pingados” no final da década de 1990, teve em torno de 380 votos na Câmara dos Deputados (muito acima do quórum requerido de 308) em 2019. Nesses 20 anos, foram sendo divulgados estudos técnicos que construíram os pilares que permitiram o trânsito da matéria no Parlamento.

O mundo, aos poucos, muda. Nesse sentido, vale para a Previdência o mesmo que se aplica ao meio ambiente: o mundo hoje é praticamente o mesmo que 30 dias atrás, mas, em duas ou três décadas, a realidade muda muito, quando o ser humano é descuidado.

Assim, uma série de pontos, que ficaram de fora na reforma de 2019, merece atenção. Entre eles, a definição da idade de quem se aposenta por idade; uma maior redução do diferencial entre gêneros; as regras da aposentadoria rural; e uma mudança das condições de elegibilidade para o Loas. Apesar dos ajustes ocorridos há cinco anos, há regras vigentes que são anacrônicas e incompatíveis com as tendências demográficas atuais. Cedo ou tarde, essas questões precisarão ser encaradas pela sociedade brasileira.

Sabemos que os governos tendem a “empurrar com a barriga” o enfrentamento dos desafios que implicam assumir ônus políticos. O problema é que o tempo passa... e os problemas se agravam. O livro tem como epígrafe um trecho de uma peça inglesa de 1977 (“Professional foul”), onde um dos personagens diz: “Amanhã é outro dia”, ao que outro responde: “Amanhã, na minha experiência, é geralmente o mesmo dia”. A passagem remete a uma frase usada em outro livro de minha autoria, a de que “yesterday came suddenly” (“ontem chegou de repente”), tirada de uma das mais icônicas músicas dos Beatles, alusiva à passagem do tempo.

O Brasil fez a Reforma da Previdência em 2019. Depois de 2003, Lula tinha “driblado” a questão e optou, em que pese a sua enorme popularidade, por não fazer novas reformas. Como resultado, a despesa do INSS, que tinha sido de 6,2% do PIB em 2003, saltou para 8,1% do PIB em 2016, após 14 anos do PT no poder.

Agora, em 2024, a despesa atual do INSS será da ordem de 8% do PIB e, novamente com o PT no governo, o script parece se repetir. O Brasil precisa avançar rumo a uma nova reforma previdenciária. É necessário dar o primeiro passo para que ocorra uma discussão intensa e criar condições políticas para aprovar uma reforma, em 2027 ou 2031. Nossa modesta contribuição é procurar dar o lastro técnico para que seja possível aprovar essa futura mudança.

Resta um esclarecimento importante: em linhas gerais, não defendemos apertar as regras para quem já foi afetado pela mudança de 2019. Aquela reforma foi muito importante e, basicamente, aumentou bastante o período contributivo para quem se aposentaria por tempo de contribuição. Essas pessoas, vale ressaltar, irão contribuir, na prática, em muitos casos, durante 40 anos ou mais. Em algum momento, porém, será preciso mudar as regras das outras modalidades de benefício. É disso que o livro trata. Para quem se adentrar nesses detalhes, boa leitura.

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