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Por Eduardo Graça — São Paulo


Rodrigo (esq.) e Felipe Simas vivem a dupla sertaneja em 'As aventuras de José & Durval', estreia de sexta-feira (18) no Globoplay — Foto: Divulgação
Rodrigo (esq.) e Felipe Simas vivem a dupla sertaneja em 'As aventuras de José & Durval', estreia de sexta-feira (18) no Globoplay — Foto: Divulgação

Contrariando as evidências, a história de Chitãozinho e Xororó ainda não havia sido contada na televisão em todos os seus detalhes. Pois a sofrência acabou. Nesta sexta-feira (18) entram no ar os três primeiros episódios, de um total de oito, de “As aventuras de José & Durval”, nova produção do Globoplay. Ainda bem. É impossível entender uma das mais consequentes transformações da música popular brasileira do século passado sem ouvir com atenção as vozes e as histórias dos irmãos José Lima Sobrinho, de 69 anos, e Durval de Lima, quatro anos mais novo.

Batizados há 52 anos de Chitãozinho e Xororó, eles foram pioneiros na construção do sertanejo, com seus arranjos que bebiam do caipira mas também da Jovem Guarda e de Nashville, dos Beatles e de Nelson Gonçalves, enquanto o país que cantavam se urbanizava rapidamente.

— Quando olhamos o que virou o sertanejo, temos orgulho. Nossa música era tão marginalizada que parece que não tínhamos permissão nem para sonhar — diz Xororó, em entrevista por videochamada de Campinas, onde estavam gravando a primeira música inédita em dois anos, “Chuva”, um tributo aos agricultores, que chega amanhã ao YouTube e ao streaming.

A série de Hugo Prata (de “Elis”) tem tom mais lúdico do que seu paralelo óbvio, o longa “Dois filhos de Francisco”, de Breno Silveira, sobre Zezé di Camargo e Luciano, herdeiros diretos dos amigos.

Chitãozinho (esq.) e Xororó: há 52 anos em atividade — Foto: Marcos Hermes/Divulgação
Chitãozinho (esq.) e Xororó: há 52 anos em atividade — Foto: Marcos Hermes/Divulgação

Ela vai da infância de José e Durval (os meninos Pedro Tirolli e Pedro Lucas e depois os irmãos Felipe e Rodrigo Simas) no interior paranaense até a explosão comercial, nos anos 1990. Da falta de dinheiro e comida ao desafio consciente e vitorioso a certo bom gosto — que louva, para ficar em universos retratados pelo próprio Prata, “Romaria” com Elis mas nem sempre “Saudade da minha terra” com a dupla. Do calvário da doença mental da mãe (Andréia Horta, arrepiante) às imperfeições de um pai dedicado (Marco Ricca, idem). Dos primeiros amores aos casamentos e aumento da família.

Do que “As aventuras de João e Durval” e nem Chitãozinho e Xororó na entrevista falam é de política, tema polêmico no universo sertanejo. Já Sandy e Júnior aparecem sim, mas os spoilers terminam nesta linha. A seguir, trechos da entrevista de Chitãozinho e Xororó ao GLOBO:

Vocês já viram a série?

Chitãozinho: Sim, maratonamos. Teve muito choro, bateu forte no coração.

Onde pegou mais?

Chitãozinho: Ver assim o que a gente viveu tem duas magias, a da dramatização e a de se voltar no tempo, a memória.

Xororó: Vendo a série eu, inclusive, compreendi melhor episódios de nossa infância... Me enxerguei melhor.

Deu mais saudade do quê?

Xororó: Da convivência com a família na infância. Não tínhamos em mente que poderíamos ser artistas e que aquelas vidas seriam transformadas pela força da música.

Na série, seu pai enfatiza a importância de vocês seguirem juntos, viesse o que viesse. Vocês se separaram alguma vez?

Xororó: Só na ficção, mas foi licença poética. Na vida, não.

Chitãozinho: Os anos passaram e nunca pensamos…

Xororó: …em seguir caminhos diferentes. Nossa música é a dupla, os fãs, e somos fiéis a isso.

Chitãozinho: Surgiram propostas de trabalho solo, mas não topamos. Queremos ser sempre os dois. Um ao lado do outro.

Os gostos musicais sempre foram e seguem afinados?

Chitãozinho: Sou mais da roça, ouço música caipira e os sertanejos contemporâneos, pra ficar ligado, né? Xororó é MPB, música internacional. Ele tem gosto musical mais apurado que o meu. Sou o popularzão da dupla (risos).

Xororó: O Chitão não deixa perder a raiz e eu levo a música pro lado mais pop. Desde o início queríamos fazer música sertaneja não só pra quem já a curtia, mas para os jovens, estudantes. Foi o tempero que deu certo.

Chitãozinho: O pai era o artista da família, cantava, escrevia, tocava violão. Mas, quando ele descobriu que a gente cantava, como na cena com “Galopeira”, aquele momento exato encerrou a carreira dele. Ele passou a se dedicar a nós e à nossa música, até o fim.

Xororó: Ele viu em nós a possibilidade de realizar o sonho frustrado de ser artista profissional.

'Galopeira' foi a primeira música que cantaram juntos?

Chitãozinho: Foi a primeira que gravamos no disco de estreia.

Xororó: A gente não lembra a primeirona, mas “Tocando a boiada”, que também gravamos nesse disco, foi certamente uma das primeiras, e composta pelo nosso pai.

Chitãozinho: Começamos a cantar com as músicas que ele escrevia no caderninho dele, exatamente como aparece na série.

Xororó: Eram músicas que nossa mãe cantava com o irmão mais novo dela, o Tio Tiãozinho. Que ficaram agora, tirando “Tocando a boiada”, que está no disco, para sempre na nossa memória.

Qual a sensação ao verem o tamanho do sertanejo hoje?

Chitãozinho: De orgulho. Nossa Senhora, deu muito certo. Iniciamos um trabalho e abriu-se uma porteira gigante. Ouvíamos Beatles, Roberto Carlos, Bee Gees e sonhávamos em cantar sertanejo com arranjos feitos pra bandas de rock. Mas as gravadoras diziam que era caro. O sertanejão, a viola, era muito mais barato.

Xororó: Só no sexto disco, em 1978, foi que conseguimos gravar como queríamos. E vendemos 200 mil cópias, nosso primeiro de ouro. Aí foi uma sequência pelo menos duplicando a venda em relação ao anterior, até “Fio de cabelo” explodir, com 1,5 milhão de cópias em 1982.

Chitãozinho: Passamos a fazer de cinco a seis shows por semana com a banda afiada.

Xororó: E a gente era muito fã do Raul Seixas. Cada LP que ele lançava a gente comprava também as cassetes pra escutar na estrada. Ouvíamos até estragar as pobres das fitas (risos).

Uma das cenas mostra como ouvir no rádio 'Tente outra vez' os impediu de desistir da carreira. Foi daquele jeito?

Chitãozinho: A única diferença é que não estávamos na estrada, mas em São Paulo.

Xororó: Mas é fato. Não paramos de cantar porque ouvimos, no momento mais desanimador de nossas carreiras, 'Tente outra vez'.

Chitãozinho: Quando tocou no rádio, num dia de 1975, ela nos deu a força que precisávamos para não parar.

E vocês tiveram a oportunidade de agradecê-lo?

Chitãozinho: Infelizmente, não. A gente viu o Raul só uma vez, na estrada. Estávamos num hotel, saindo, ele jantando, lembra, Xororó?

Xororó: Sim, em Itapetininga…

Chitãozinho: Não, Jaú. E ficamos com vergonha de chegar perto dele.

Xororó: Aquela coisa de fã, né? E foi em Itatiba!

Chitãozinho: Humm…acho que não, hein?

Xororó: Foi interior de São Paulo (risos), e ele estava estourado com “Cowboy fora da lei” (1987). Éramos da mesma gravadora, mas não nos esbarramos. Pena, ter conversado com ele seria a realização de um sonho.

Outras cenas fortes são as da doença de sua mãe, tema sobre o qual não haviam tratado publicamente. Por que decidiram fazê-lo agora?

Xororó: Por ser algo forte para entender nossa história. Em alguns momentos, ficávamos muito tristes por saber que quando voltaríamos para casa a encontraríamos alterada. Chegávamos das apresentações de madrugada, ela acordava e não dormia mais. Passávamos horas com ela falando coisas que não tinham nada a ver. Foi bem pesado.

Chitãozinho: E como a Andréia (Horta) nos emocionou! Ela foi muito além do que imaginava. Vê-la na tela me assustou mais do que quando a gente vivia aquilo.

Xororó: Sim. Viver, claro, teve um peso. Mas tem outro peso voltar, pensar em como ela sofreu, e refletir sobre o que acontecia lá em casa. Jamais me esqueço de um momento muito triste, em que eu e o nosso pai estávamos a levando para ser internada. Quando descobriu, ela nos deu guarda-chuvadas. Não entendia, à época, o motivo daquela agressividade toda. Quando fomos conversar sobre nossa história com a equipe do Hugo (Prata), bem no começo do projeto, e me lembrei disso, refleti: claro, ela sabia que iria levar eletrochoque. Se fosse hoje, teria sido diferente.

Chitãozinho: No fim da vida, ela morou numa chácara bem legal em Campinas, mas ainda lidava com a doença. Medicada, tratada, mas nunca teve uma vida saudável.

Embarcar na série foi quase uma terapia pra vocês?

Xororó: Sim. E aí me lembro do (maestro, pianista e parceiro da dupla) João Carlos Martins dizendo que a música salva. A música salvou, sim, a nossa família.

Na série, Inezita Barroso (Giovanna De Toni) implica com vocês, meninos querendo modernizar a música caipira. Vocês perdoaram os que chamavam sua música de 'sertanojo'?

Chitãozinho: Ela falava muito isso mesmo (rindo), mas a gente não ligava. No início, ela não entendia por que queríamos um som pesado, mais pop. Com o passar dos anos, nos aproximamos, e ela compreendeu que o que trazíamos era necessário. Ela nos convidava para o programa dela na TV já dizendo: “Vocês vêm pra cantar ‘Fio de cabelo’, as caipiras (rindo), hein?” E a gente adorava aquilo!

Xororó: E depois nós é que fomos entender que ela era uma pesquisadora, professora de todos nós, cultíssima. Ela tocava a raiz da música caipira, Serrinha e Caboclinho, Zé do Rancho e Mariazinha…

Chitãozinho: Se é possível consumir música caipira hoje, é graças ao trabalho dela. E ela tinha licença para ser do contra (risos).

Xororó: Ela depois viu como a gente também era muito importante, de outra maneira, para não deixar a música sertaneja morrer. Quando começamos, os espaços para música caipira já estavam se esgotando.

E vocês queriam conscientemente levar a música sertaneja para os centros urbanos...

Chitãozinho: Sim! Até porque a grande migração rural para as cidades já era realidade. Uma das músicas sertanejas mais completas, mais lindas, é “Saudade de minha terra” (dos versos “De que me adianta viver na cidade se a felicidade não me acompanhar?/ Adeus, paulistinha do meu coração/ lá pro meu sertão eu quero voltar”), que é a história dessa nova realidade. E que, aliás, é a nossa também, né? Viemos para São Paulo, do sertão do Paraná, para ganhar a vida.

A série termina com o show do Palace...

Chitãozinho: Até então um palco exclusivo na capital paulista da MPB e de nomes internacionais como Julio Iglesias. Lá, fizemos nossa primeira coletiva de imprensa. Quando vi aquele auditório cheio de repórteres, falei para o Xororó: “A partir de hoje nossa vida vai mudar”. A música sertaneja tinha vindo pra ficar, lembra?

Xororó: É. Pensamos: “A partir de agora todos vão entender que há uma música sertaneja para ser tocada na cidade também”. E, cara, lá já fizemos um espetáculo com uma luz como a que víamos nos shows do Roberto Carlos, da Rita Lee, da Gal Costa. Nossa música merecia esse tratamento. E, por cantar uma música na época marginalizada, simplesmente não sonhávamos. Era como se, para a gente, fosse proibido sonhar. Não tinha como imaginar o que alcançaríamos com o sertanejo. Um dia demos de cara com os Bee Gees na nossa plateia em Miami. Quando sonharíamos que iríamos cantar com eles, com o Roberto? Fazer essa série?

Chitãozinho: Nosso primeiro sonho era o de contar nossa história. Está realizado.

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