Ruth de Aquino
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Tudo sobre a política de nossa vida e não de Brasília

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Ruth de Aquino

Tudo sobre a política de nossa vida e não de Brasília. Cidadania, família, educação, amor, sexo, drogas, religião, envelhecimento, saúde, arte e viagens.

Por Ruth de Aquino

Moradores versus turistas. Essa guerra vem provocando exageros em várias cidades. Em Barcelona, moradores atacaram com pistolas d’água turistas que almoçavam no restaurante. Uma passeata com milhares de espanhóis exibia faixas com “Barcelona não está à venda”. Entendo a revolta contra o turismo excessivo no verão. As Ramblas ficam intransitáveis e sujas. A Pedrera e a Sagrada Família, de Gaudí, impossíveis de entrar.

O prefeito de Barcelona decidiu proibir aluguéis de curto prazo, para combater “os efeitos negativos do turismo de massa”. Objetivo é devolver ao mercado os 10 mil apartamentos destinados a plataformas digitais. Barcelona recebeu mais de 12 milhões de turistas no ano passado. O Rio de Janeiro recebeu 1,2 milhão.

No mundo, essa discussão é acalorada. Envolve direitos e liberdades. Sobre a forma de viajar. Sobre como ganhar uma renda extra com o próprio imóvel, em tempos tão bicudos. Sobre como evitar que um condomínio se torne um hotel de alta rotatividade. Ou como estimular as viagens de quem não pode pagar uma fortuna em hotéis na Europa e nos EUA, ficando refém de restaurantes.

A reação ao Airbnb se explica por vários motivos – e um deles é a escassez crônica de habitação convencional nas metrópoles. O Airbnb domina o aluguel de curto prazo, com mais de 50% de todas as reservas online. Eu não conheço viajantes que nunca tenham usado seus serviços. A BBC publicou uma reportagem esclarecedora sobre o que está em discussão e como as grandes cidades estão reagindo.

Aluguéis em moradias particulares oferecem experiência local, mais espaço do que quartos de hotel, e também mais autonomia, com cozinhas equipadas. Mas prejudicam o mercado de aluguel de longo prazo. Valores sobem muito e os inquilinos de contratos de 30 meses ficam com pouca opção. Reclamam. Será por causa do Airbnb?

Em setembro do ano passado, Nova York proibiu os aluguéis de curto prazo. Só permite locação de quarto, com a presença do dono do imóvel. Com o Airbnb banido, o que aconteceu com as diárias de hotéis? Aumentaram demais. Porque o negócio é este: lucro máximo. A média dos quartos de hotel em NY passou a US$ 300 por noite. Quem pode pagar isso? Eu não posso.

Berlim e Londres limitam proprietários a no máximo 90 dias de aluguel por ano. Acho sensata essa escolha. Permite uma renda extra a proprietários que precisam de grana por qualquer motivo – viagem, saúde, pagamento de dívidas. E também evita que se prejudique a atmosfera de um condomínio, colocando em risco sua segurança.

Em Paris, o proprietário pode alugar sua própria casa até 120 dias por ano. Em Amsterdã, o limite é de 30 por ano e o proprietário precisa obter uma autorização específica. Em Florença, está proibido no centro histórico. Lisboa agiu de maneira ambígua. Não concede mais novas licenças de Airbnb, com exceção de zonas rurais.

No Rio, muitos prédios mudaram suas convenções, inserindo cláusulas que proíbem qualquer aluguel por plataforma digital. Proprietários se queixam de que essas mudanças ferem o Código Civil e o direito de propriedade, porque o dono tem direito de alugar seu imóvel para uso residencial (não comercial) por um fim de semana ou outras temporadas. Tribunais começam a receber ações.

No meu prédio, agora só são permitidos aluguéis de no mínimo três meses, com contratos de imobiliárias. A convenção mudou depois de um proprietário alugar por Airbnb seu apartamento para um grupo de torcedores de futebol argentinos, que tocaram o terror. E foram devidamente expulsos.

Episódios extremos assim acabam por punir quem aluga por curta temporada a famílias exemplares – mais civilizadas do que alguns condôminos que violam a convenção com festas barulhentas no playground. E não são multados.

Medindo os prós e contras do Airbnb – para moradores e turistas –, banir nas grandes cidades não é o caminho. Melhor regulamentar. Até porque esses mesmos moradores exaltados de Barcelona (ou do Rio) buscam o Airbnb para viagens mais flexíveis, originais e baratas. Hipocrisia? Sim, o mundo é hipócrita.

Protesto em Barcelona contra o turismo de massa e curta temporada. O prefeito baniu o Airbnb e outras plataformas a partir de 2028 — Foto: Josep Lago/AFP
Protesto em Barcelona contra o turismo de massa e curta temporada. O prefeito baniu o Airbnb e outras plataformas a partir de 2028 — Foto: Josep Lago/AFP
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