Cultura
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Por Silvio Essinger e Talita Duvanel — Rio de Janeiro

Os astros do rock Bruce Dickinson e Eddie Vedder, a funkeira Tainá Costa e o Rei Roberto Carlos se encontram num bar. Sobre o que eles conversariam? Nesta situação hipotética e surreal, os quatro artistas poderiam desabafar sobre como suas apresentações ao vivo têm sido impactadas pela euforia, ansiedade e até falta de compostura do público nesse momento de retomada cultural depois do recesso provocado pela pandemia. Todos estes ídolos, recentemente, andaram perdendo a paciência com seus fãs.

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Numa apresentação na Grécia, no sábado passado, Dickinson, vocalista do Iron Maiden, chamou de “babaca” uma pessoa que acendeu um sinalizador luminoso na plateia. “Eu tenho que cantar!”, explodiu ele, soltando um sonoro palavrão. O líder do Pearl Jam, também no fim de semana passado, expulsou uma pessoa que havia se enfurecido com outra, por conta de um celular ligado, num show na Suíça. “Eu vi a coisa, estava te irritando. Você ficou chateado porque ele estava filmando o tempo todo, mas violência não é permitida”, disse Vedder. Por aqui, no início do mês, a funkeira Tainá interrompeu um show em Santarém (PA) para dar um recado curto e grosso a um desavisado: “Amor, não fica de costas para mim não, baby, é falta de educação.” Já o Rei dominou as redes sociais com um vídeo em que aparece mandando um fã super falante calar a boca, num show no Rio. Vai dizer que os quatro não teriam assunto?

— Tenho notado um comportamento eufórico, sim — diz Isaira de Oliveira, pesquisadora na área de entretenimento e comportamento de público, autora do livro “Fãs e artistas: Relações de amor e consumo” (Editora APGIQ) e fotógrafa de shows em São Paulo há 30 anos. —As pessoas ficaram bastante reclusas, em frente ao computador, e se permitiam qualquer coisa: levantar, mudar de posição. No meio social, há regras de conduta que, às vezes, percebo serem desrespeitadas. E o artista pode se perder no palco com essas manifestações.

Necessidade transbordante

Desde a volta dos shows presenciais, o cantor e compositor João Cavalcanti diz já ter vivido a mesma situa��ão de zum-zum-zum da qual Roberto Carlos reclamou. Só que, no caso, ele era parte da plateia.

— Já me vi num show que estava muito a fim de ver e, de repente, estava conversando com uma pessoa que não via desde antes da pandemia — admite o artista. — O que está acontecendo é, em grande medida, um frenesi das pessoas se encontrando e colocando o papo em dia. Amigos normalmente ficam um tempo sem se ver, mas desta vez ficaram mais tempo ainda. Disso veio uma necessidade exacerbada, transbordante, de conversar, de interagir com o show e de louvar a própria sobrevivência. Isso se reflete no comportamento da plateia como um todo.

Programador do Circo Voador, no Rio, Alexandre Rossi tem uma opinião semelhante à de Cavalcanti. Os ânimos andam turbinados porque os tempos de reclusão foram inéditos e sombrios. O ser humano, afinal, é um ser de contato e está fazendo de tudo para socializar. Mesmo que passe do ponto e atrapalhe quem está do lado ou no palco.

—A galera voltou muito mais intensa. (É um pensamento de) “Sobrevivi à Covid-19, então tenho que comemorar muito”. A urgência é maior — diz Alexandre.

Essa premência acaba externada de diversas formas, seja no bate-papo de costas para a funkeira, ou na tentativa de chamar a atenção do ídolo metaleiro com um sinalizador.

— Estamos numa situação que junta a fome com a vontade de comer. Há uma grande oferta de eventos, com uma voracidade do público de tirar o “tempo perdido” — diz Arthur Danila, psiquiatra e coordenador do Programa de Mudança de Hábito e Estilo de Vida do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP. — Esse cenário amalgamado nos traz a sensação de excesso. E, diante do excesso, existe uma dificuldade de manter os limites.

‘Não é possível que este seja o novo normal’

Não são somente as estrelas que se incomodam com uma plateia com sede excessiva de sociabilidade e diversão. Muitos espectadores reclamam de como a experiência tem sido diferente. Uma delas é a cientista social Thais Rodrigues, de 34 anos. Ela diz que frequentar rodas de samba no Rio, programa de que tanto gosta, tem sido um “inferno”:

— Não sentia que acontecia tanto antes, mas, agora, muita gente fala alto em paralelo à música e até toma cerveja em cima dos músicos, sem se importar se irá molhá-los ou não. Tem sempre alguém gritando coisas aleatórias, e muito celular levantado o tempo todo — diz Thais. — Antes, havia um protocolo maior em ouvir e cantar junto. Não é possível que este seja o novo normal.

Os códigos de conduta para se aproveitar ao máximo uma experiência musical não parecem, realmente, os mesmos do passado. Pense num show realizado num espaço mais intimista, daqueles com serviço de garçom, em que uma pessoa da plateia resolve pedir nada mais nada menos do que uma champanhe —e estourá-la no meio de uma música. Foi o que aconteceu numa apresentação de Luiza Possi que Isaira Oliveira fotografou em São Paulo. O barulho, claro, chamou a atenção da artista, que levou a situação na esportiva e pediu um gole.

— Tem show que virou barzinho. O artista parece que não é tão protagonista assim — diz Isaira, que acredita que as pessoas, depois de tanto tempo assistindo a lives em casa sem outros para compartilhar (ou atrapalhar), hoje podem estar mais impacientes diante do convívio social.

Tela quente

Nem todo mundo tem champanhe a um estalar de dedos, mas o celular está sempre na palma da mão. E ele também é acionado a todo momento, interferindo não apenas na própria experiência, como na de quem está do lado e em cima do palco. No caso do show do Pearl Jam, a confusão começou exatamente porque uma pessoa da plateia estava incomodando a outra com tanta filmagem.

Essa guerra já estava em curso antes da pandemia, mas, com o confinamento, a sociedade ficou ainda mais dependente do ambiente digital. Hoje, é difícil ficar longe do WhatsApp ou do Instagram. Alessandra Debs, curadora artística da casa de espetáculos Manouche, no Rio, tem travado uma luta para concentrar plateias e fazê-las olharem para o palco com os olhos e não com as telas.

— É impressionante como se normatizou essa questão de não conseguir deixar o aparelho de lado, de não conseguir parar de ver o WhatsApp ou filmar o show — diz ela, que já recebeu reclamações de clientes incomodados com os excessos de outros.

Recentemente, num show de Silvia Machete na casa, foi pedido para que os smartphones ficassem guardados. A cantora achou maravilhoso não ver pontos luminosos na plateia.

— Quando você está numa sala com poucas pessoas, no escuro, qualquer luz perturba o vizinho — diz Silvia.

Para o psiquiatra Arthur Danila, é cada vez mais importante estar presente no espaço que se ocupa e no tempo.

— O ser humano não consegue, do ponto de vista neurobiológico, administrar muitas tarefas ao mesmo tempo com a mesma competência. Quem está no celular não consegue assistir a um show.

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