Leo Aversa
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Leo Aversa

Fotógrafo e colunista.

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Leo Aversa

O garçom, gentil, a conduziu até a mesa. A de sempre. Ela viu, ao longe, o movimento na rua: turistas, senhorinhas, jovens, solitários.

Copacabana.

O garçom já sabia o que ela ia pedir. O médico havia recomendado cuidado com o colesterol, a glicose, as emoções. Não nesta noite. Quantas décadas se passaram desde que sentaram ali pela primeira vez?

A memória.

Ele apareceu na casa dos seus pais bem-vestido, com um buquê de rosas e, no cartão, o Vinicius que ela adorava. Que seja infinito enquanto dure. As palavras, os gestos, o olhar. Ela acreditou.

Viram um filme no Rian, caminharam pela Atlântica. Veio a surpresa: o jantar. Ela ficou tão feliz quanto preocupada com o gasto, o restaurante era caro. Os dois estava começando a vida, não sobrava um centavo. Coquetel de camarão para os dois, ele fez questão. A gente merece, disse, sorrindo.

Foi uma noite inesquecível, o primeiro Dia dos Namorados. A conversa, os sorrisos, o ar. Ele também acreditou.

Casa comigo?

O sim. A emoção na igreja. A festa no clube. A lua de mel em Campos do Jordão. O início. A felicidade da vida a dois. O primeiro filho. As noites mal dormidas, o trabalho duro. O futuro. Os primeiros passos. E se? A filha. As dificuldades. Os sacrifícios. O apartamento. É pequeno, mas é nosso. As prestações, as horas extras. A praia com os filhos, o cinema no sábado à noite, o almoço de domingo. O especial do Roberto Carlos no sofá. O Natal, o ano-novo, os aniversários em família.

Passa voando, ela pensou, olhando os jovens.

O sacrifício para pagar o colégio, as férias na Serra. A rotina. Será que ele tem outra? Será que ela ainda me ama? O medo. O café na cama, o jornal de domingo. As pequenas coisas. Esse vestido te deixa linda. Você fica bem, grisalho. A experiência. O toque. O vestibular. Passou! A formatura. A música do “Fantástico” fechando o domingo à noite. Você ainda lembra do Vinicius? O olhar. As bodas de prata. O que importa. O dia que os filhos saíram de casa. O orgulho da missão cumprida. A tristeza do quarto vazio. Os novos planos. A viagem tão sonhada. Como é linda, Paris! A alegria de sonhos que se realizaram.

A vida construída a dois.

Ela levantou, com ajuda do garçom. Foi para casa, andando devagar. Ali na esquina era a Barbosa Freitas. Do outro lado da avenida, a Ducal. Mais em frente, o Cirandinha, onde tinha o ice cream soda de coco que ele adorava. A Suprema de um lado da Santa Clara, do outro a Dom Pixote, onde compravam os brinquedos das crianças. O Autorama, a Susi. O Velotrol.

A longa estrada.

O casamento da filha, os conselhos, o primeiro neto. A aposentadoria. A felicidade da família toda reunida na mesa. A cumplicidade. Temos que aproveitar a vida. Vamos conhecer Gramado? Dizem que é lindo. Os planos para as bodas de ouro. A doença. O hospital. A angústia. O adeus.

Em casa, ela pegou de novo o álbum de fotografias. As do casamento, na Torre Eiffel, brincando com o neto. A lembrança imensa dos sorrisos, das lágrimas. A foto naquela mesa, a última juntos, anos atrás. Dormiu entre as imagens, sonhou mais uma vez com o abraço, acordou feliz.

O Rian fechou, a Barbosa Freitas virou um banco, a Dom Pixote, uma loja de informática. Em Copacabana, seguem os turistas, as senhorinhas, os jovens, os solitários.

O amor mora em nós.

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