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Por Nupec

Mais de 1.500 ações judiciais contra a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) questionando a distribuição dos royalties do petróleo revelam a necessidade de modernizar a interpretação da legislação e de buscar soluções conciliatórias. A excessiva judicialização torna o processo de distribuição ainda mais complicado e, ao contrário do que se pretende, pode resultar em imbróglios jurídicos que impactam a engrenagem de um dos mais importantes segmentos econômicos do Estado do Rio.

Mas há formas de promover uma distribuição justa sem judicializar? Especialistas, profissionais e representantes de instituições do setor de petróleo de bateram o assunto no seminário Royalties e o Rio”, promovido pela Editora Globo e pela Rádio CBN, com o apoio do Núcleo de Pesquisas, Estudos e Consultoria (Nupec), no último dia 7 de junho, no auditório da editora.

ANP recebe, em média, 30 novas decisões judiciais a cada mês, o que demanda de seus técnicos um complexo esforço para cumprir as sentenças preponderantemente favoráveis aos respectivos requerentes. “Modernização do processo de distribuição: como novas ferramentas podem ajudar a diminuir o atrito no processo de distribuição” foi o tema do primeiro painel do seminário. Participaram do debate o diretor-geral da agência, Fernando Moura; o deputado federal Hugo Leal; o presidente da OABRJ, Luciano Bandeira; o advogado Vinicius Peixoto; e professor Claudio Pinho. O âncora da CBN Milton Jun foi o mediador.

— Está mais do que comprovado que se trata de um tema de alta judicialização — admite o diretor-geral da agência, sobre a distribuição dos royalties do petróleo.

Regido por leis diferentes e quatro tipos distintos de contrato, o processo de distribuição de royalties e participações, que cabe à ANP, “gera uma engenharia complexa e se tornou dos temas mais complicados que a ANP enfrenta”, acrescentou Moura.

Advogados que tratam do assunto afirmam que um dos desentendimentos mais comuns entre a ANP e os municípios requerentes, responsável por mais de 300 ações, é o fato de a reguladora desconsiderar como alvo de parâmetros para pagamento de royalties tipos de unidades de produção de petróleo que evoluíram ao longo dos anos.

Segundo juristas presentes ao evento, foram desconsiderados nos cálculos da reguladora para pagamento de royalties FPSOs plataformas e sistemas flutuantes de produção de petróleo, que hoje se tornaram praxe nas contratações das petroleiras.

Os especialistas destacam que a reguladora está perdendo as ações em mais de 90% dos casos,em maioria ampla para os municípios. Hoje, segundo a agência, mais de mil cidades recebem royalties. No Rio, todos os municípios são contemplados.

De acordo com o advogado Vinicius Peixoto Gonçalves, que trabalha nas causas de vários municípios pelo recebimento de royalties, um bom exemplo do que tem acontecido é o caso da cidade de Areal, no centro-sul do estado fluminense, que conseguiu na Justiça o recebimento médio de R$ 500 mil. O valor é pequeno se comparado aos bilhões que recebem cidades como Maricá e Niterói,

contempladas pelos royalties e pelas participações especiais de Tupi, o maior campo produtor do Brasil, de mais de um milhão de barris diários, mas fundamental para um município de menor porte.— Para uma cidade com apenas 12 mil habitantes, os royalties são uma receita fundamental, que já contribuiu para diversas melhorias nos últimos cinco anos de recebimento. Um erro de 30 anos foi resolvido — destaca Vinicius Peixoto Gonçalves. Além de Areal, outros

quatro municípios que não recebiam royalties passaram a ser contemplados nos últimos anos, e atualmente todas as cidades do Estado do Rio contam com essas compensações do petróleo.

INCONSTITUCIONALIDADE

O presidente da OABRJ, Luciano Bandeira, faz coro aos que afirmam que o Brasil enfrenta hoje um ambiente de insegurança jurídica que precisa ser revertido.

— Precisamos avançar no sentimento de segurança jurídica. Como podemos falar de segurança jurídica no Brasil se só no STF para tratar royalties temos as ADIs (ação direta de inconstitucionalidade) 4.917, 4.916, 4.918, 4.920? Tudo isso esperando julgamento,e ninguém sabe o que será decidido — observa.

Estado do Rio produz 85% do petróleo nacional

A produção de petróleo nacional alcançou 3,2 milhões de barris diários, quanto no Rio chega a 2,7 milhões, de acordo com os dados mais recentes de produção da ANP. O estado responde hoje por nada mais nada menos que 85% da produção de petróleo do Brasil, bem mais que os 68% registrados há dez anos, quando o pleito de estados não produtores ganhava força, para ser, anos depois, adormecido.

O advogado Vinicius Gonçalves explica que é natural que o Rio concentre o recebimento dos recursos, pois trata-se de uma compensação dos recursos naturais, que são finitos.

— Antes de tudo, é bom lembrar que os royalties são compensações por sua exploração e, para que sejam usados a fim de preparar a região para a sua exaustão, para gerações futuras — explica o advogado.

Para tirar o direito dos estados e municípios produtores de receber pelos royalties, seria necessário haver mudança no próprio conceito de royalties, pensar em outro motivo para sua existência.

A legislação já garante ao restante do país uma parcela significativa dos recursos, que vai para a União. Essa fatia é superior à que é destinada aos estados produtores.

— Fica parecendo que vai tudo para o Rio. Mas os royalties são divididos para o país todo, a maior parcela é da União — destacou o deputado Hugo Leal, que é ex-secretário de Energia e Economia do Mar do Estado do Rio.

Em média, a União fica com 39,4% das receitas de royalties e participações especiais; os estados, com 33,8%; e os municípios, com 26,8%.

As fatias que cabem a estados e municípios, estas sim, são divididas segundo a questão geográfica. O primeiro litígio dos vários em andamento para o assunto, diz ele, é a inconstitucionalidade da lei que determinou distribuição equânime.

— Já passou da hora de o Supremo Tribunal Federal revisar a natureza jurídica dos royalties. Porque ao definir que era receita originária, se por um lado permitiu aos entes federados que os utilizassem para fins de elaboração de orçamento e controle dos respectivos tribunais de contas, por outro lado, deixou uma enorme discricionariedade para o governo que o aplica, gerando grande distorção quando falamos de municípios — ressalta o especialista Claudio Pinho, professor da pós-graduação em Transição Energética da Mackenzie Rio.

INFOGRÁFICO NUPEC — Foto: DIVULGAÇÃO
INFOGRÁFICO NUPEC — Foto: DIVULGAÇÃO

Conciliação é apontada como alternativa para resolver o problema de distribuição

Palestrantes do seminário “Royalties e Rio” são unânimes em defender a conciliação como caminho para reduzir a judicialização que tem marcado a repartição dos royalties e das participações especiais de petróleo e gás. O segundo painel, “Royalties do petróleo: qual o caminho para uma distribuição justa?”, reuniu a diretora da ANP Symone Araújo, o advogado Djaci Falcão, além de Hugo Leal e Claudio Pinho.

O advogado Djaci Falcão, que pela consultoria Nupec coleciona vitórias na Justiça em favor de municípios antes excluídos da divisão de royalties do petróleo, destacou o uso da Lei 13.140, que trata da conciliação. Ressaltou que o Judiciário atualmente valoriza o acordo e acrescentou que o Tribunal de Contas da União (TCU) também segue o caminho da conciliação.

A diretora da ANP Symone Araújo e o advogado Djaci Falcão se juntaram ao grupo de debatedores no segundo painel — Foto: Marco Sobral
A diretora da ANP Symone Araújo e o advogado Djaci Falcão se juntaram ao grupo de debatedores no segundo painel — Foto: Marco Sobral

— Em um caso que tivemos no TCU, argumentei com o relator que minha maior preocupação é viabilizar uma forma para que a ANP consiga chegar a uma conclusão sobre esses problemas de um modo mais simples — observou Falcão.

— Nossa busca hoje é que se faça conciliação, com a AGU e agência. O problema da distribuição tomou uma proporção tão grande que não interessa a mais ninguém a judicialização — disse.

A diretora da ANP Symone Araújo respondeu que a agência já está trabalhando junto à AGU levando teses aos tribunais no sentido de uniformar decisões. A diretora também adiantou que a agência atua “para fixar critérios claros sobre embarque e desembarque”, um dos principais pontos de conflitos judiciais.

— Mas não posso deixar de trazer aqui o aspecto da efetiva dificuldade quando se está falando de royalties. Estamos distribuindo para 1.092 municípios — observa.

As sentenças judiciais acabam causando um efeito dominó na distribuição dos royalties, na opinião de Symone.

— Quando se fala da montanha de critérios, significa que para cada um se tem um montante de rateio daquele critério, e qualquer mudança que se faça para cá ou para lá afeta esse montante. Uma decisão para um requerente vai impactar outros requerentes — afirmou a diretora da ANP.

ANÁLISE JURÍDICA

Os juristas presentes no evento observaram que é fundamental utilizar mecanismos de conciliação para promover uma distribuição mais justa e evitar embates na Justiça. Vinicius Gonçalves destaca o protagonismo da Advocacia-Geral da União nesse processo.

— A AGU tem um papel importante na questão dos royalties, tem um braço de conciliação, um mecanismo. É preciso usá-lo, passar a utilizar melhor esses mecanismos e desmistificar, se não, vamos afetar as outras riquezas naturais além do petróleo — adverte.

Independentemente da ferramenta usada para se tentar um acordo, dois pontos são fundamentais segundo orienta o presidente da OABRJ:

— A conciliação depende basicamente de dois elementos: o primeiro elemento deve mostrar que há justiça, mesmo que não se ganhe tanto. O segundo é a certeza de que os fatos que estão baseando a discussão são verdadeiros, indisputáveis. O segundo elemento fundamental para a conciliação, que trata da veracidade das bases da discussão, foi um dos pontos também abordados no seminário. O uso de ferramentas mais sofisticadas para auxiliar na distribuição de royalties, por exemplo, é um dos itens levantados pelos especialistas.

No âmbito dos estados, a discussão sobre a distribuição atual para produtores e a divisão equânime entre as unidades federativas continua, nas palavras do deputado federal Hugo Leal, adormecida.

— O primeiro litígio é a inconstitucionalidade da lei que determinou distribuição equânime e está adormecida — Segundo ele, o debate aumenta com a dificuldade de entendimento da população. É preciso, segundo ele, explicar melhor e tornar mais transparentes os critérios e as razões para a distribuição de royalties do petróleo.

— As ações judiciais precisam tomar um novo rumo, por meio de conciliações, para conseguirmos promover a distribuição justa para produtores e não produtores — afirma o advogado Djaci Falcão — Normas claras facilitam a compreensão da lei, tanto quem está ganhando quanto quem está perdendo conseguem entender melhor.

SAIBA O QUE A LEGISLAÇÃO DETERMINA EM RELAÇÃO À DISTRIBUIÇÃO DOS ROYALTIES

Plataforma de petróleo na Baía de Guanabara: o valor dos royalties e das participações especiais pagos pelas empresas petrolíferas disparou a partir do advento do pré-sa — Foto: Getty images
Plataforma de petróleo na Baía de Guanabara: o valor dos royalties e das participações especiais pagos pelas empresas petrolíferas disparou a partir do advento do pré-sa — Foto: Getty images

Desde 1989, municípios onde estão localizadas as instalações de embarque e desembarque de petróleo, originado da produção terrestre ou marítima, passaram a ter direito a royalties. O Decreto 1/1991, que regulamentou a Lei 7.990/1989, classificou como instalação de embarque e desembarque as monoboias, os quadros de boias múltiplas, os píeres de atracação, os cais acostáveis e as estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de óleo bruto e gás natural.

A partir de 1997, a legislação estendeu o direito de receber royalties aos municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque, o que inclui todos as cidades vizinhas àquelas onde estão localizadas as instalações. O enquadramento por instalações de embarque e desembarque é feito pela reguladora e tem gerado muitos contenciosos judiciais.

O valor dos royalties e das participações especiais pagos pelas empresas petrolíferas disparou a partir da guinada na produção com o advento do pré-sal. Em 2000, eram R$ 6,4 bilhões, que passaram a quase R$ 54 bilhões no ano passado.

A Lei 7.990/1989 estabelece as regras de distribuição referentes à primeira parcela de 5% dos royalties, enquanto a Lei 9.478/1998 trata das regras de distribuição da parcela excedente (acima de 5%) e da participação especial. Para cada uma dessas cobranças, existe uma diferente regra de repartição, que também varia se a produção é em terra ou mar.

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