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O ritmo da opinião pública

Informações da coluna

Vera Magalhães

Jornalista especializada na cobertura de poder desde 1993. É âncora do "Roda Viva", na TV Cultura, e comentarista na CBN.

Pablo Ortellado

Professor de Gestão de Políticas Públicas na USP

Por Bianca Gomes — São Paulo

Enquanto os olhos do eleitorado se voltam para as pesquisas quantitativas, aquelas que revelam, como fotografias, os números de intenção de voto e rejeição de cada candidato dia após dia, as campanhas eleitorais se debruçam sobre uma abordagem menos conhecida do grande público, mas fundamental para os estrategistas políticos e amplamente usada: as chamadas “pesquisas qualitativas” — apelidadas simplesmente de “quali” no dia a dia de campanhas. Abaixo, entenda como funciona essa modalidade e o seu valor em eleições.

O QUE É

O principal objetivo de uma pesquisa qualitativa é entender o comportamento do eleitor e o que está por trás da escolha de seu voto. Por meio de entrevistas longas, que podem chegar a até duas horas, os pesquisadores identificam quais são os interesses dos eleitores, suas percepções sobre o cenário político, imagem acerca de determinados candidatos e expectativas em relação à solução de problemas sociais, explica Luciana Veiga, cientista política e professora titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Uni-Rio), uma das principais especialistas no assunto no Brasil.

— Usamos a pesquisa qualitativa para identificar tudo aquilo que estrutura a escolha do eleitor. Quais são os valores, expectativas e opiniões que fazem parte da realidade daquele eleitor e como ele lança mão desse arcabouço para elaborar sua decisão de voto e também para justificá-la — explica a especialista.

COMO AS CAMPANHAS UTILIZAM

Diferentemente das pesquisas quantitativas, cujo resultado muitas vezes é tornado público, as qualis são pesquisas de bastidor, contratadas pelas equipes de marketing dos candidatos para ajudar no desenho das estratégias de campanha. Outra diferença fundamental das qualis é que os experimentos não tem como objetivo generalizar os resultados, ou seja, buscar números que representem, o mais fielmente possível, o universo total dos eleitores. Já as quantitativas, aquelas que mostram os percentuais de cada candidato, usam milhares de entrevistas com técnicas estatísticas para simular o universo eleitoral como um todo.

Segundo Luciana, as pesquisas qualitativas podem ser utilizadas ao longo de todo o processo eleitoral, como para analisar a recepção de peças publicitárias ou entender qual o efeito, para os eleitores, de mudanças partidárias e alianças eleitorais:

— Neste momento, por exemplo, temos muitas pesquisas analisando os aspectos positivos e negativos de cada pré-candidato, o quanto determinado apoio ajuda ou atrapalha na campanha, quais as satisfações ou insatisfações que o eleitor tem com o atual governante e o quanto ele o responsabiliza — explica a cientista política.

OS TIPOS DE 'QUALI' MAIS UTILIZADOS

1. Grupo focal

Grupo focal - pesquisas qualitativas — Foto: Ilustração de André Mello
Grupo focal - pesquisas qualitativas — Foto: Ilustração de André Mello

São entrevistas organizadas em grupos de sete a dez pessoas por um período de até duas horas. A grande vantagem em relação à entrevista em profundidade é que os grupos focais permitem a interação do grupo, em uma reprodução do que ocorre na vida real. Há também a possibilidade de minigrupos focais, de quatro a seis pessoas. Essa opção geralmente é usada quando é difícil reunir mais de sete pessoas dada a característica do grupo que se quer ouvir.

Minigrupo focal - pesquisas qualitativas — Foto: Ilustração de André Mello
Minigrupo focal - pesquisas qualitativas — Foto: Ilustração de André Mello

— Na entrevista em profundidade (detalhes abaixo), você não permite ter a interação do grupo. E, com isso, você perde muito. Na interação do grupo, alguém tem uma escolha, racionaliza essa escolha e apresenta o arcabouço que permitiu e o levou àquela escolha. O outro do grupo vai legitimar ou deslegitimar o argumento apresentado pelo outro integrante. E é exatamente isso que acontece na vida real — afirma Veiga. — Aqui, a unidade da análise é a conversação, a interação social. Você está reproduzindo a interação social que existe no dia a dia.

2. Entrevista em profundidade

Minigrupo focal - entrevistas em profundidade — Foto: Ilustração de André Mello
Minigrupo focal - entrevistas em profundidade — Foto: Ilustração de André Mello

É utilizada quando se quer conhecer melhor a realidade de determinado tipo de eleitor e entender como ele interpreta os acontecimentos sociais e políticos. Esse modelo permite compreender quais informações, sentimentos e expectativas são utilizados para justificar o voto ou postura política daquele eleitor, explica Luciana Veiga.

— A grande vantagem da entrevista em profundidade é que você fica uma hora conversando com a pessoa. O grupo focal tem duração de 1h40min a 2h. Você consegue ir muito mais além na entrevista em profundidade. É mais fácil de executar, pois não precisa reunir várias pessoas no mesmo local e na mesma hora — diz a professora.

As entrevistas em profundidade têm duração de aproximadamente uma hora. Podem ocorrer de forma isolada, uma única vez, ou em sistema de painel, quando a pessoa selecionada é entrevistada várias vezes ao longo do processo eleitoral.

Assim como os grupos focais, as entrevistas em profundidade são feitas com entrevistados selecionados a partir de variáveis como classe social, escolaridade e sexo. Essa seleção, no entanto, pode variar de acordo com o objetivo da pesquisa e incluir outros componentes, como tendência de voto e religião.

Os entrevistados são selecionados por recrutadores profissionais. Via de regra, é preciso que haja anonimato, ou seja, nem o pesquisado saiba o motivo da pesquisa, e para quem ela está sendo feita, e nem quem faz a pesquisa saiba quem são os entrevistados.

As pesquisas em profundidade não têm um padrão de quantas pessoas precisam ser ouvidas. Mas, para uma eleição nacional, Veiga fala que são necessárias, no mínimo, cem entrevistas para contemplar a diversidade do país. O valor deste tipo de pesquisa gira em torno de R$ 1 mil por entrevista.

As dinâmicas dos grupos focais e entrevistas em profundidade

Os grupos focais ocorrem sempre na chamada sala de espelho, um local neutro, onde os participantes ficam sentados em uma mesa redonda junto ao entrevistador. Pode haver uma televisão para exibir propagandas políticas e outros materiais publicitários. Do lado de fora da sala, pesquisadores e clientes que contrataram a pesquisa observam a dinâmica através de um vidro espelhado.

O roteiro também segue um padrão: antes de tudo, o entrevistador faz uma apresentação aos participantes dizendo qual o tema da pesquisa. Imaginando uma disputa ao governo do estado, o primeiro bloco de perguntas aborda a situação da atual gestão, explorando aspectos positivos e negativos. No segundo bloco, se faz uma avaliação da disputa: se os eleitores estão animados, se conhecem os candidatos e o que pensam sobre cada um. O terceiro bloco explora os apoios políticos: quais grupos estão com determinado candidato e o que eles agregam à campanha dele. O último bloco é mais aberto e costuma ser utilizado para explorar temas específicos sobre o cliente.

3. Análise de conteúdo qualitativo das coberturas

Seu uso é mais comum nas universidades. Consiste na análise do conteúdo que é publicado na mídia e em outros meios de comunicação, como as redes sociais. Campanhas políticas também usam essa modalidade.

— No caso de uma campanha presidencial, você acompanha não só o que diz respeito à eleição propriamente dita, mas tudo o que é publicado nas demais editorias, porque é a partir do que está nas outras editorias que vai se construindo o cenário de representação, onde, em última instância, vai se dar o processo de escolha (do eleitor). Ou seja, qual a situação do país, quais os principais temas, quem está sendo responsabilizado pelos problemas do país. Tem toda essa construção que é a partir da qual as pessoas vão tomar a sua decisão. Como as mídias pautam tudo isso é extremamente importante esse acompanhamento — explica Veiga.

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