Marcelo Ninio
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Marcelo Ninio

Repórter desde 1989, passou por O GLOBO, Jornal do Brasil, EFE e Folha de São Paulo.

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Marcelo Ninio

Passou pelas redações do Jornal do Brasil, Agência EFE e Folha de S.Paulo. Tem mestrado em relações internacionais pela Universidade de Jerusalém.

Por — Pequim

RESUMO

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GERADO EM: 09/07/2024 - 04:30

Visitas de Orbán e Modi a Moscou e Pequim: desafios e oportunidades

Os líderes autoritários Viktor Orbán e Narendra Modi visitam simultaneamente Moscou e Pequim, buscando equilibrar relações com o Ocidente e o Oriente. Ambos são vistos como potenciais mediadores na crise da Ucrânia, mas enfrentam desconfiança devido a históricos autoritários e interesses nacionais em jogo.

O premier da Hungria, Viktor Orbán, desembarcou ontem em Pequim para uma visita que é mais uma bofetada na fachada de coesão em política externa da União Europeia (UE). É a segunda viagem disruptiva de Orbán em apenas uma semana, desde que a Hungria assumiu a presidência rotativa da UE. Na sexta, ele havia se reunido em Moscou com o presidente russo, Vladimir Putin, em outra visita-surpresa.

Enquanto Orbán chegava a Pequim, Moscou estendia o tapete vermelho no mesmo dia a outro líder controverso, o premier da Índia, Narendra Modi. O destino escolhido para a primeira viagem internacional de Modi após conquistar seu terceiro mandato consecutivo, quebrando a tradição de ir a um país vizinho, mostra a importância que o líder indiano dá à Rússia neste momento.

Apesar da distância e das diferenças geopolíticas, Orbán e Modi têm pontos em comum. Ambos mantêm uma aliança com o Ocidente sem romper os laços com o eixo adversário, formado por Rússia e China. E, apesar de ocuparem espaços democráticos, são governantes com pendor autoritário, o que facilita a aproximação com Moscou e Pequim.

Nos dois casos, é uma proximidade com acenos ambivalentes. Gera preocupação por fortalecer a parceria de governos antidemocráticos, mas também oferece uma fresta de diálogo para o Ocidente com seus rivais. É o que apresenta Orbán como justificativa para suas viagens a Moscou e Pequim, onde foi buscar formas de negociar um fim à guerra na Ucrânia. A China é a “potência fundamental” para criar condições à paz, disse em Pequim.

É uma oportunidade que não deveria ser desperdiçada, caso houvesse alguma chance de conduzir à solução do conflito. Mas elas esbarram numa desconfiança sobre as reais intenções de Orbán em Kiev e na cúpula da UE, que o desautorizou a falar em nome do bloco. As condições da Ucrânia e da Rússia para um cessar-fogo continuam a quilômetros de distância, e falta um mediador com mínimo de credibilidade para romper o impasse.

O Brasil, que aspirava ocupar essa posição, perdeu de vez o crédito com os ucranianos ao subscrever uma resolução da China que soa como reconhecimento da invasão russa. Assim como Orbán, a posição brasileira é de que Pequim tem papel central no processo de negociação, por sua relação íntima com o Kremlin. Justiça seja feita, antes de ir a Moscou e Pequim, o húngaro foi a Kiev. Mas ninguém lá esquece que ele é o melhor amigo europeu de Putin e se opôs seguidamente ao apoio militar da UE à Ucrânia.

Já o indiano Modi também se apresenta como potencial mediador, tendo a seu favor o elo histórico entre Índia e Rússia. Em dez anos no poder, o premier indiano se encontrou 16 vezes com Putin, mas nenhuma desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022. Neste período, Moscou se aproximou mais e tornou-se dependente de Pequim, enquanto cresceram as tensões entre Índia e China. Essa é a maior preocupação de Modi. Nesse emaranhado de fatores, pode até ser que os astros se alinhem a favor de uma negociação eficaz para a guerra na Ucrânia. Mas acima de tudo estão os interesses nacionais e pessoais, certamente no caso de líderes como Modi e Orbán.

Se de fato a China é uma peça-chave para resolver o conflito, a Índia pouco terá a contribuir. Há indícios de que Modi dirá a Putin que não irá à cúpula do Brics em outubro, na Rússia. Tudo para evitar um encontro com o presidente chinês, é o que suspeitam observadores indianos.

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