Marcelo Ninio
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Marcelo Ninio

Repórter desde 1989, passou por O GLOBO, Jornal do Brasil, EFE e Folha de São Paulo.

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Marcelo Ninio

Passou pelas redações do Jornal do Brasil, Agência EFE e Folha de S.Paulo. Tem mestrado em relações internacionais pela Universidade de Jerusalém.

Por — Pequim

Em visita à China na semana passada, o vice-presidente Geraldo Alckmin exaltou a todo momento o aumento do comércio com o Brasil nos últimos 20 anos, de US$ 9 bilhões para US$ 157 bilhões. Após três dias em Pequim, porém, Alckmin partiu deixando dúvidas sobre a capacidade do Brasil de dar um passo a mais na relação com seu maior parceiro comercial. Nos números, vai tudo muito bem: exportações recordes, com amplo superávit para o Brasil.

Se o volume agrada, o país ainda patina na antiga meta de incorporar mais qualidade à relação econômica, que continua a se sustentar no que alguns chamam de um modelo “colonial”: a China compra matérias-primas do Brasil e vende manufaturados. Não há ilusões de que a dinâmica será alterada em breve. Enquanto isso, há que se olhar com pragmatismo as oportunidades que a China oferece.

Uma delas é o financiamento de projetos de infraestrutura. Entre as ideias apresentadas na visita de Alckmin, destacou-se a promovida pela ministra do Planejamento, Simone Tebet, de cinco rotas de integração da América do Sul. O objetivo é criar condições para que a produção brasileira seja escoada para o Sudeste Asiático pelo Pacífico, o que, diz Tebet, poderia encurtar o tempo de exportação em até três semanas.

Rotas bioceânicas não são novidade, mas no passado elas eram pouco mais que utopia. Faltavam meios para viabilizá-los e elas faziam pouco sentido, já que a maior parte das exportações brasileiras ia para os EUA, disse Tebet no intervalo de um evento empresarial em Pequim. O eixo econômico mudou, e a infraestrutura precisa facilitar os novos rumos. O balanço para o Oriente é principalmente em direção à China, destino de um terço das exportações brasileiras.

— O Brasil não consegue crescer de forma sustentável e duradoura sem a China. Eu sou do agronegócio e sei o que estou dizendo: o agronegócio brasileiro não se sustenta mais sem a parceria da China — disse Tebet.

Falar em mudança do eixo econômico global e da necessidade de projetos de infraestrutura é música para ouvidos chineses. Afinal, foi essa combinação que inspirou a “Nova Rota da Seda”, megaprojeto lançado pelo governo de Pequim em 2013. Parece natural que as novas rotas de integração de Tebet se encaixem na Nova Rota da Seda, e a ministra deixou claro em Pequim o interesse do governo brasileiro em captar investimentos chineses, sobretudo em ferrovias.

Mas Tebet acha que não há pressa para aderir à iniciativa chinesa. O compromisso político do Brasil com a China está claro mesmo sem a assinatura formal, diz ela. Ferrovias ajudariam a agilizar o transporte de carga, mas não são essenciais, afirma. Aeroportos, portos, rodovias e hidrovias previstos no Orçamento do governo são suficientes para que, do lado do Brasil, esteja tudo pronto para inaugurar as cinco rotas até 2027, prevê.

Na mão inversa, o Brasil poderia se tornar uma plataforma de exportação chinesa, diz Jorge Viana, presidente da Apex-Brasil. O risco é não se livrar do modelo colonial, apenas aplicar-lhe uma maquiagem. Viana reconhece o risco, por isso defende que haja não só importação de produtos chineses, mas fabricação no Brasil, com geração de empregos e transferência de tecnologia.

— Podemos ser uma base industrial para a China, mas é preciso que isso nos beneficie. Caso contrário, continuaremos a ser apenas compradores de manufaturados e vendedores de commodities — diz Viana.

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