Malu Gaspar
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Informações da coluna

Por Malu Gaspar

A deputada estadual do Rio Lucia Helena Pinto de Barros, ou Lucinha (PSD), alvo da operação da Polícia Federal desta segunda-feira, é acusada pela PF de usar o cargo e a estrutura da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) em favor dos interesses da milícia do Zinho, a mais poderosa do Rio de Janeiro.

De acordo com fontes da PF e Ministério Público, Lucinha era ela própria uma integrante da milícia, que em outubro passado promoveu um quebra-quebra com a queima de 35 ônibus no Rio, depois que o sobrinho e braço direito do chefe da organização morreu num confronto com a polícia.

A apuração que baseou a operação Batismo mostra que a deputada era chamada de "Madrinha" pela cúpula e executou várias missões para a organização criminosa – entre elas a de trabalhar para afastar dos cargos policiais que poderiam atrapalhar os negócios da quadrilha e interferir politicamente para soltar milicianos que tinham sido presos em flagrante.

A operação teve acesso a materiais de quebras de sigilo de celular obtidas em outras investigações. Para a PF, Lucinha se valeu do mandato para "para patrocinar os interesses de um dos grupos mais sanguinários do Rio de Janeiro".

O "Bonde do Zinho", uma referência ao apelido do chefe da quadrilha, Luís Antônio da Silva Braga, domina boa parte da região Oeste da cidade, base eleitoral de Lucinha.

Numa das missões mais ousadas entre as mapeadas pela PF, Lucinha atuou para tirar o tenente-coronel Claudio Eduardo Lopes de Oliveira do comando do 27º Batalhão da PM, em Santa Cruz, área dominada pela milícia.

Na mesma época, Lucinha também trabalhou pela saída do major Elton de Lima Marques da 8ª delegacia de Polícia Judiciária, que investiga a participação de policiais e ex-policiais em narcomilícias.

É nesta unidade que trabalhava a PM Vaneza Lobão, de 31 anos, morta a tiros de fuzil no final de novembro, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio.

"Tem que promover pra outro lugar", diz, nas mensagens, Domício Barbosa, o caixa da milícia, conhecido como Dom, à assessora de Lucinha, Ariane Lima, que também é alvo da operação de hoje. Em outra mensagem, o miliciano conhecido como Cansado, que atua na milícia como assistente de Zinho, escreve para Dom que "Esse Welton (sic) aqui vai nos dar problema".

Em novembro de 2021, (poucos dias depois da posse do tenente -coronel no batalhão e um mês depois da posse do major na delegacia), Dom diz a Cansado que tinha estado com Lucinha. "Pedi para ela intervir na posse do major aqui em Santa Cruz. Ela vai falar com o comandante-geral da PM na terça . E com o presidente para ele também fazer o pedido".

Os PMs que incomodavam a milícia acabaram deixando os cargos apenas em agosto de 2022. Domício segue foragido da Justiça.

Em outra ocasião, Lucinha ajudou a soltar quatro milicianos presos em flagrante numa operação do Batalhão de Rondas Especiais e Controle de Multidões da PM.

No início da tarde do dia 6 de novembro de 2021, Dom pede a Lucinha para “ver se consegue falar com alguém", porque "levaram os meninos” (sic) Lá pro 24”, referindo-se ao 24º Batalhão da PM, que fica na região de Queimados. Nessa troca de mensagens, o miliciano também dá o nome do policial que fez a prisão e o telefone celular dele.

Menos de uma hora depois, Lucinha encaminha em resposta a mensagem recebida de alguém: “Falei com o CMT do RECOM (o batalhão de rondas especiais) Cel Silvio que me fez ctt e me disse que o sargento está junto com o tenente encaminhando a ocorrência pra 35 DP, sem presos, apreenderam armas e fardamentos”.

Naquela tarde, a conta da PM no Twitter informava que policiais do 24º batalhão tinham apreendido armas, capas de colete balístico, automóveis e roupas similares a fardas em uma ação para coibir a guerra entre milícias pelo domínio do território.

Numa conversa com o miliciano, a deputada Lucinha afirma que "Ontem eu fiz minha parte. Acho que ajudei em tudo". E completa: "Vou quebrar meu leve fone agora”, com a recomendação: "Apaga tudo aí das conversas e fotos".

Para a PF, há "robustos indícios de que policiais militares do Recom (o batalhão de ronda especial) prenderam os milicianos, e após interferência de Madrinha, os soltaram. Em seguida, apresentaram a ocorrência na 36ª DP sem presos e com uma versão fantasiosa de que localizaram o automóvel com perfurações, abandonado, e com farto material vinculado à milícia privada."

Investigadores apontam ainda uma série de episódios em que Lucinha trabalhou para a milícia do Zinho – de reuniões para defender regulamentações que favoreciam a circulação de vans operadas pela quadrilha na cidade à tentativa de fazer deslanchar uma operação que vinha sendo planejada contra um miliciano rival, Danilo Dias Lima, conhecido como Tandera.

Além de busca e apreensão nos endereços da deputada e de sua assessora, Ariane Lima, o desembargador Benedicto Abicair, do Tribunal de Justiça do Rio, também determinou o afastamento cautelar da deputada de suas funções. A PF pediu ainda a prisão temporária da assessora, mas não foi atendida.

O grupo criminoso é comandado por Zinho desde 2021. O miliciano está foragido desde 2018 e era o principal alvo da operação policial de outubro, que terminou com a série de atentados promovida pela quadrilha na cidade para facilitar sua fuga.

Zinho sucedeu dois irmãos que morreram em confronto com a polícia na região dominada pela milícia: Wellington da Silva Braga, o Ecko, considerado um dos milicianos mais temidos do Rio; e Carlos da Silva Braga, o Carlinhos Três Pontes, mortos em 2021 e 2017, respectivamente.

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