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O passado com um pé no presente.

Informações da coluna

William Helal Filho

Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Editora Globo pelo programa de estágio, foi repórter e editor. Hoje é responsável pelo Acervo.

Era uma casa muito engraçada, numa vila da Rua Bulhões de Carvallho, em Ipanema. Ali ficava a sede da revista "Bundas", que o cartunista Ziraldo criou, em 1999, para fazer crítica política com bom-humor. A ideia era resgatar o espírito de "O Pasquim", jornal que irritou tanto os generais da ditadura militar que Ziraldo e boa parte da redação passaram quase um verão inteiro no xadrez.

O nome da então nova publicação era uma resposta irônica a "Caras", revista dedicada ao mundo das celebridades criada em 1993 e que fazia muito sucesso na época. Ziraldo implicava com esse tipo de imprensa, achava fútil o interesse na vida privada dos ricos e famosos, e gostava de brincar falando: "Quem mostrar a bunda em 'Caras' nunca vai mostrar a cara em 'Bundas'".

Mas a paródia com o periódico das celebridades ficava só no nome. Ao reunir colaboradores como Jaguar, Chico e Paulo Caruso, Lan, Millôr Fernandes, Zuenir Ventura e Luís Fernando Veríssimo, o que o inventor de "Menino Maluquinho" queria era fazer critica política com humor. O regime militar havia acabado em 1985, e o Brasil vivia o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da República. Mas, segundo Ziraldo, não faltavam problemas para motivar o espírito jornalístico.

"A gente quer mostrar o Brasil que não é oficial ou emergente e expressar, com muito humor, o nosso desagrado com ele", explicou o cartunista ao GLOBO de maio de 1999, dias antes do lançamento da revista, com o slogan: "'Bundas, uma revista que é a cara do Brasil". "A gente não sabe como a revista será recebida. Hoje, não há o consenso dos anos 1960, quando nossos leitores odiavam a ditadura".

Capa do primeiro número da revista "Bundas" — Foto: Reprodução
Capa do primeiro número da revista "Bundas" — Foto: Reprodução

Não teve pesquisa de marketing para saber se haveria público. Mas foram três anos de trabalho para lançar a publicação. De acordo com Ziraldo, os jornalistas envolvidos estavam esperando o momento adequado. Enquanto a revista era gestada, teve gente dizendo o nome seria obstáculo para conseguir anúncios publicitários. Mas o cartunista decidiu que a revista se chamaria "Bundas" e "ponto final".

Antes do lançamento, a animação era total. Ziraldo, Jaguar, Lan e Chico Caruso posaram para as fotos do GLOBO em uma van da revista batizada de "fio dental". O primeiro número tinha uma entrevista com o advogado Barbosa Lima Sobrinho. Um trecho do editorial dizia: "Nos vemos como um complemento de ‘Caras’ na tarefa de oferecer um retrato mais arredondado da multifacetada realidade brasileira

"Bundas", porém, durou pouco mais de um ano. A primeira edição passou a marca de cem mil cópias vendidas. Mas a publicação simplesmente não atraiu anunciantes e, com o tempo, apenas a receita com as vendas não foi o bastante para sustentar o negócio. "O anunciante paulista fica constrangido de anunciar num lugar chamado 'Bundas'", disse Ziral em uma entrevista à "Folha de S. Paulo".

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