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O passado com um pé no presente.

Informações da coluna

William Helal Filho

Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Editora Globo pelo programa de estágio, foi repórter e editor. Hoje é responsável pelo Acervo.

Cartola tinha 61 anos de idade quando pisou, pela primeira vez, na sede do Fluminense, seu time do coração, no bairro das Laranjeiras, no Rio. Naquela quinta-feira, dia 9 de outubro de 1969, o célebre sambista, cujo nome de batistmo era Angenor de Oliveira, autor de clássicos como "O mundo é um moinho" e "As rosas não falam", foi o convidado de honra de um almoço no clube carioca.

O sambista, que nesta quarta-feira estaria completando 115 anos e foi homenageado pelo Doodle do Google, tornou-se tricolor quando era criança. Na visita em outubro de 1969, ele contou que, aos 11 anos, morava com a família na Rua das Laranjeiras 285 e começou a torcer pelo Fluminense na época em que jogava "peladas" num terreno baldio perto do clube.

"Assisti ao início da construção do estádio das Laranjeiras", disse o artista, segundo a reportagem do GLOBO publicada na edição do dia seguinte à visita, quando foram clicadas as imagens deste post. "As carretas trazendo terra do morro trabalhavam o dia inteiro. Vi o local sendo todo aterrado e, quando estavam para fincar os primeiros alicerces, mudei-me para o Morro da Mangueira".

Cartola observa troféu na sede do Fluminense, em outubro de 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Cartola observa troféu na sede do Fluminense, em outubro de 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO

O compositor, cujo nome de batismo era Angenor de Oliveira, não frequentava estádios. Preferia ouvir a narração das partidas no rádio e ver a gravação, depois, na TV. Quando o Fluminense perdia, ele ficava mudo. Sua mulher, Dona Zica, e o filho, Ronaldo, era eram o rubro-negros, procuravam não fazer graça com ele. A família não brigava por futebol. "Gozo nas vitórias e choro nas derrotas", disse Cartola.

No fim dos anos 1960, o carioca já era um autor reconhecido, ex-parceiro de Heitor Villa-Lobos, criador de sambas tocados em rádios e gravados por estrelas da música nacional. Mas o retorno financeiro por seu talento ainda era pífio. Depois de trabalhar como gráfico, pedreiro e até lavando carros, em 1969, o cantor atuava como contínuo no Ministério da Indústria e do Comércio.

Cartola com dirigentes do Fluminense ao lado do gramado das Laranjeiras, em 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Cartola com dirigentes do Fluminense ao lado do gramado das Laranjeiras, em 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO

Apenas na última década de vida, o baluarte da Mangueira se sustentar com sua genialidade. Seu primeiro disco, "Cartola", foi lançado em 1974, com clássicos como "O sol nascerá" e "Alegria". Ele morreu em dezembro de 1981, aos 72 anos, e recebeu muito mais reconhecimento póstumo do que quando andava sobre a Terra. Nesta quinta-feira, por exemplo, o Fluminense lançou uma camisa verde e rosa em homenagem ao aniversário do sambista.

Da visita ao estádio, ocorrida há mais de 50 anos, participaram todos os diretores do Fluminense no período, liderados pelo então presidente do clube, Francisco Laport, que, fizera o convite ao músico e, ao se despedir do compositor, deu a ele um passe-livre para voltar a qualquer momento. "Basta dizer ao porteiro que você é o Cartola, o clube vai te receber de braços abertos".

O tricolor estava em um bom momento. Meses antes, em junho, o clube se sagrara campeão carioca pela 19ª vez, uma rodada antes do fim do torneio, ao vencer o Flamengo por 3 a 2, num Maracanã com mais de 170 mil pessoas. A vitória inspirou uma crônica do autor Nelson Rodrigues, nomeada "Chega de Humildade". Fluminense e Flamengo fizeram uma dessas partidas imortais", escreveu ele.

Cartola com um dirigente do Fluminense e jogador do time  — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Cartola com um dirigente do Fluminense e jogador do time — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Cartola na sala de troféus do Fluminense, em 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
Cartola na sala de troféus do Fluminense, em 1969 — Foto: Arquivo/Agência O GLOBO
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