Leonardo Sakamoto

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Desvio de milhões em dinheiro público era estratégia golpista de Bolsonaro

A Polícia Federal afirma, em relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal, que há indícios de que dinheiro proveniente da venda de ouro e diamantes desviados por Bolsonaro do acervo público brasileiro pode ter sido utilizado para custear suas despesas em dólar enquanto estava em solo norte-americano entre dezembro de 2022 e março de 2023.

Isso conectaria duas investigações: a das joias doadas por governos árabes que teriam sido surrupiadas do Jair com a ajuda de 11 aliados (dos quais, nove vestem ou já vestiram farda) e os ataques ao Estado democrático de direito levados a cabo pelo bolsonarismo.

O ex-presidente se escafedeu para as proximidades da Disney, na Flórida, em 30 de dezembro, dois dias antes de passar a faixa presidencial para Lula. Duas hipóteses colocam sua estadia nos Estados Unidos como parte de um plano golpista: ele deixou o país para evitar ser preso pelas movimentações golpistas ocorridas nos meses anteriores ou para construir um álibi aos ataques que vandalizariam as sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.

Se um pedaço dos recursos públicos desviados por ele (a PF calcula que o total ultrapassa R$ 6,8 milhões — a conclusão do relatório informou inicialmente o valor de R$ 25 milhões, depois, a polícia se corrigiu) foram gastos para mantê-lo enquanto estava lá, então um crime ajudou a financiar outro, ou seja, joias bancaram um plano de ataque direto à democracia.

"Os elementos acostados nos autos evidenciaram a atuação de uma associação criminosa voltada para a prática de desvio de presentes de alto valor recebidos em razão do cargo pelo ex-presidente da República Jair Bolsonaro e/ou por comitivas do governo brasileiro, que estavam atuando em seu nome, em viagens internacionais, entregues por autoridades estrangeiras, para posteriormente serem vendidos no exterior", afirma o relatório.

"Identificou-se, ainda, que os valores obtidos dessas vendas eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente da República, por meio de pessoas interpostas e sem utilizar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores."

A Polícia Federal aponta que Bolsonaro tinha no momento em que deixou os EUA de volta ao Brasil o mesmo saldo em suas contas que ostentava em 27 de dezembro de 2022. Ou seja, a sua manutenção em dólares veio de outra fonte.

A investigação aponta indícios de que o valor arrecadado com as vendas das joias desviadas do acervo público brasileiro foi entregue a Bolsonaro por meio de lavagem de dinheiro enquanto estava nos EUA.

Por exemplo, em uma troca de mensagens, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, enviou ao seu pai, o general Mauro Lourena Cid, endereços de lojinhas de ouro na Flórida para ele cotar parte das joias desviadas.

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O general, amigo de Bolsonaro e seu colega na Academia Militar das Agulhas Negras, morava no Estado norte-americano por ter ganho do ex-presidente a chefia do escritório brasileiro da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) em Miami.

Em outra troca de mensagens, de 18 de janeiro do ano passado, Mauro Cid disse a um auxiliar de Jair que seu pai estava com dinheiro para entregar ao presidente. E que o melhor seria evitar contas bancárias.

"Tem 25 mil dólares com meu pai. Eu estava vendo o que, que era melhor fazer com esse dinheiro levar em 'cash' (dinheiro vivo) aí. Meu pai estava querendo inclusive ir aí falar com o presidente (...) E aí ele poderia levar. Entregaria em mãos. Mas também pode depositar na conta (...). Eu acho que quanto menos movimentação em conta, melhor né? (...)", disse.

De acordo com o relatório da PF, "a utilização de dinheiro em espécie para pagamento de despesas cotidianas é uma das formas mais usuais para reintegrar o 'dinheiro sujo' à economia formal, com aparência lícita".

A investigação sobre as joias surrupiadas não é a única que pode se conectar àquela que trata dos atos golpistas. O inquérito sobre a fraude nos registros no cartão de vacina do ex-presidente analisa se ele utilizou a falsa informação sobre sua vacinação de covid-19 para entrar e permanecer nos Estados Unidos.

Caso isso se comprove, teremos três inquéritos convergindo para a tentativa de transformar a democracia brasileira em vinagre.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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