Pôr do sol na Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre. Foto: Nanda Melonio
ARTIGO
POR – MARIA LIZA SPANHOLI* e CARLOS EDUARDO YONG*, PARA NEO MONDO
Parcerias com organizações sociais envolvem apoio operacional, conscientização das comunidades do entorno e pesquisa científica, facilitando intercâmbio de informações com instituições de todo o mundo
Manter a biodiversidade e os ecossistemas é um dos grandes desafios da atualidade, tendo em vista a pressão provocada por ações antrópicas, como o crescimento urbano desordenado, o desmatamento ilegal, as mudanças climáticas e diversos outros fatores. O bem-estar da sociedade depende de maneira significativa do fluxo de bens e serviços que resultam da dinâmica dos ecossistemas, os chamados serviços ambientais.
As Unidades de Conservação (UCs) são os principais instrumentos de política pública para a conservação da biodiversidade e serviços ecossistêmicos associados. Entre esses serviços estão os de suporte, necessários para produzir todos os outros serviços ambientais, como a formação dos solos e os ciclos de nutrientes, a polinização e a dispersão de sementes; os serviços de provisão, que se referem a bens ou produtos extraídos, tais como água, alimento e madeira; os serviços de regulação, que são os benefícios promovidos pela regulação dos processos, como a purificação do ar, regulação do clima e desintoxicação e controle de pragas e doenças; e os serviços culturais, que se relacionam aos benefícios não materiais, como a recreação, a educação, o valor espiritual e o valor religioso.
O estudo “Quanto vale o verde: a importância econômica das unidades de conservação brasileiras�� apresenta estimativas da importância das atividades de extrativismo, uso público, transferência de recursos através do ICMS Ecológico, reserva de carbono, proteção de recursos hídricos e erosão evitada. O valor de cada um desses serviços foi estimado na casa de bilhões de reais anuais. Por exemplo, a presença de cerca de 17 milhões de visitantes em 2016 nas UCs, com impacto total sobre a economia estimado entre R$ 2,5 bilhões e R$ 6,1 bilhões anuais, e gerando entre 77 mil e 133 mil ocupações de trabalho.
A atual pandemia mostra como é importante manter o equilíbrio ecológico das áreas silvestres, e que uma das consequências desastrosas do distúrbio dessas áreas é a potencial irradiação de zoonoses de grande impacto nas sociedades humanas. Por causa do uso inadequado de recursos silvestres, o coronavírus migrou de espécies silvestres para o ser humano e a Covid-19 transformou-se no maior desastre econômico e social deste século. Isso incluiu a visitação em UCs, paralisando quase totalmente o setor de ecoturismo e turismo de natureza.
Durante a pandemia, diversas ameaças às UCs têm se agravado. É evidente o descaso com que estão sendo tratadas pelo setor público, especialmente o federal. Uma série de medidas administrativas no ICMBio, órgão gestor das UCs federais, reduziu o poder de ação de técnicos qualificados. Há campanhas contra parcerias com organizações da sociedade civil da área ambiental. Parcerias esta que envolvem apoio operacional, conscientização das comunidades do entorno e pesquisa científica, facilitando o intercâmbio de informações com instituições de todo o mundo.
O desmatamento é estimulado por diversos projetos legislativos, no Congresso Nacional e Assembleias Estaduais, buscando reduzir as áreas das UCs e restringir o poder de fiscalização e controle dos órgãos ambientais.
Portanto, além de todas as perdas humanas e econômicas que a Covid-19 está nos trazendo, estamos reduzindo ainda mais o patrimônio natural riquíssimo e único protegido pelas UCs. Entre os inúmeros efeitos negativos que isso traz para a economia e o bem-estar humano, deve-se alertar para o risco adicional de expor a sociedade a novas pandemias, por desequilibrar habitats com desmatamento e outras interferências que aproximam perigosamente seres humanos aos micro-organismos ainda desconhecidos que habitam nesses locais.
*Maira Luiza Spanholi – é mestre em Ciências Ambientais pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), doutoranda pela Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) e pesquisadora do GEMA/UFRJ.
*Carlos Eduardo Young – é membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor titular e coordenador do Grupo de Economia do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (GEMA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Itapuã – Foto: Parque Estadual de Itapuã