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    Estreia de Chaplin no cinema completa 100 anos

    AN�LIO BARRETO
    COLABORA��O PARA A FOLHA

    09/02/2014 03h30

    In�cio de 1914, 100 anos atr�s: Charles Chaplin vai �s telas em seu primeiro filme, "Making a Living" (no Brasil, "Carlitos Rep�rter").

    Este foi Chaplin. Carlitos surgiria cinco dias depois, como Chaplin conta:

    "Eu n�o sabia o que vestir. Entretanto, a caminho do guarda-roupas, pensei: usaria uma cal�a larga, sapatos grandes, uma bengala e um chap�u coco."

    "Eu queria contradi��es em tudo: as cal�as largas, o palet� apertado; o chap�u pequeno, os sapatos grandes. Estava indeciso se pareceria velho ou jovem, mas, lembrando que Sennet esperava que eu fosse bem mais velho, acrescentei um pequeno bigode, o qual, ponderei, acrescentaria idade sem esconder minha express�o."

    Divulga��o
    Charles Chaplin em cena do curta 'Corrida de Autom�veis para Meninos', de 1914
    Charles Chaplin em cena do curta 'Corrida de Autom�veis para Meninos', de 1914

    O Sennet citado era o grande diretor de com�dias Mack Sennet, brilhando em Hollywood naquele 1914.

    Havia visto Chaplin no palco, gostara muito e decidira cham�-lo. Quando ficaram frente a frente, assustou-se com a juventude dele, mas o contrato foi assinado.

    No dia seguinte ao t�rmino das filmagens de "Carlitos Rep�rter", Sennet estava no est�dio e Chaplin tamb�m. Sennet olhava para um set simulando um lobby de hotel, vazio, e Chaplin n�o tinha o que fazer.

    "Precisamos de algumas piadas aqui, gritou Sennet, enquanto mascava uma ponta de charuto", lembra Chaplin. "Ent�o ele se virou para mim e disse, 'Vista-se para com�dia, qualquer coisa serve'."

    Nascia Carlitos.

    O "Carlitos Rep�rter" veio a p�blico no dia 2 de fevereiro, e o t�tulo dado no Brasil � for�ado, porque o filme tinha Chaplin, mas n�o Carlitos. Carlitos apareceu nas telas pela primeira vez em "Kid Auto Races at Venice" (aqui, "Corridas de Autom�veis Para Meninos"), lan�ado no dia 7.

    Mas esse, na verdade, n�o foi o primeiro filmado com ele.

    O filme em que Carlitos desfila para a c�mera pela primeira vez, e que talvez por problemas de montagem s� foi exibido dois dias depois de "Kid", � aquele que Sennet dirigiu quando convocou Chaplin e pediu que ele se vestisse para com�dia: "Mabel's Strange Predicament" (no Brasil, "A Estranha Aventura de Mabel").

    A a��o em "Mabel's" come�a em um lobby de hotel, aquele set que estava vazio. Carlitos, um vagabundo b�bado, se envolve com uma mo�a e seu c�o, cai diversas vezes pelo ch�o e depois sobe aos corredores, onde come�a uma confus�o em que as pessoas mudam de quartos sem parar. Ele chama o noivo dela para brigar.

    Em "Corridas de Autom�veis Para Meninos", Carlitos vai a uma corrida de kart para garotos em Venice, Calif�rnia. � um acontecimento, com centenas de espectadores. A corrida est� sendo filmada, mas Carlitos aparece na frente da c�mera.

    No final, o diretor chuta Carlitos no traseiro. Carlitos se vinga fazendo caretas para a c�mera.

    Na trama de "Carlitos Rep�rter", um trapaceiro ganha a vida usando propriedade alheia para obter lucros. Ele convence um cavalheiro a lhe dar um anel, e d� o anel a uma garota rica que estava cortejando. O cavalheiro aparece e faz a corte � mesma garota, reconhece o anel que era dele e come�a uma briga.

    Algumas horas depois, o cavalheiro assiste a uma batida de autom�vel e a fotografa, pensando em tornar-se rep�rter do jornal local.

    O trapaceiro aparece, rouba a m�quina fotogr�fica e vende as fotos para o jornal.

    Divulga��o
    Charles Chaplin em cena do curta 'A Estranha Aventura de Mabel', de 1914
    Charles Chaplin em cena do curta 'A Estranha Aventura de Mabel', de 1914

    ANTES DAS TELAS

    Charles Spencer Chaplin, nascido em 16 de abril de 1889 em Walworth, Londres, Inglaterra, recebeu o mesmo nome de seu pai.

    A m�e, Hannah Chaplin, e o pai foram atores e cantores. O pai era alco�latra, e Hannah, com o tempo, tornou-se inst�vel emocionalmente -foi internada duas vezes.

    Aos cinco anos, Chaplin fez sua primeira apresenta��o em um palco. Foi totalmente improvisada e consequ�ncia de um incidente com a m�e. Ela cantava em uma cantina de Aldershot, no condado ingl�s de Hampshire, e a voz dela falhou. O p�blico come�ou a vaiar e a lhe atirar objetos. Chaplin conta:

    "Minha m�e foi obrigada a deixar o palco. O gerente, que tinha me visto atuar para amigos dela, pegou-me pela m�o e me levou para l�."

    "Ent�o, diante dos holofotes e rostos enfuma�ados, comecei a cantar, acompanhado pela orquestra. Era uma can��o muito conhecida, 'Jack Jones'. Estava na metade quando uma chuva de dinheiro caiu sobre o palco."

    "Eu parei e anunciei que ia apanhar o dinheiro primeiro e cantar depois. Isso provocou muitas risadas."

    As lembran�as de Charles Chaplin neste texto foram tiradas de sua �tima autobiografia, publicada no Brasil como "Minha Vida", editora Jos� Olympio.

    NO TEATRO

    Chaplin fez parte de um grupo teatral juvenil, The Eight Lancashire Lads (Os Oito Rapazes de Lancashire), e depois iniciou uma carreira como comediante do empres�rio teatral Fred Karno. Ele desembarcou nos EUA com a equipe de Karno, em 1910.

    Apresentaram-se em Nova York e em outras cidades durante dois anos. Foi em Nova York que tiveram uma performance na rua 42, quando Chaplin despertou a aten��o de Mack Sennet, na �poca apenas um extra no cinema.

    Chaplin voltou para a Inglaterra, aos 19 anos, como o principal comediante de Karno. Cinco meses depois, a 2 de outubro de 1912, estariam todos novamente em Nova York. Chaplin trabalhou com Karno durante mais um ano, e em dezembro de 1913 recebeu um chamado do Keystone Studios, onde estava o agora poderoso diretor Mack Sennet. L�, Sennet pediu que se vestisse para com�dia, e ele criou Carlitos. Chaplin explicou:

    "Esse sujeito tem muitas facetas, � um vagabundo, um cavalheiro, um poeta, um sonhador, um solit�rio, sempre com esperan�a de romance e aventuras. Ele o far� acreditar que � um cientista, um m�sico, um nobre, um jogador de polo. Entretanto, ele pode pegar tocos de cigarro ou roubar o doce de um beb�. E, � claro, se a ocasi�o necessitar, ele chutar� o traseiro de uma dama -mas s� se estiver com muita raiva."

    Em novembro de 1914, transferiu-se, a convite, para o Essanay Studios de George Spoor e Gilbert Anderson, com o sal�rio de US$ 1.250 por semana. Deixou o Essanay em 1916, contratado pela Mutual Film Corporation.

    Pelo contrato, ele receberia US$ 670 mil por ano, o sal�rio mais alto de um ator naquela �poca. Ficou um ano na Mutual.

    Eis o que saiu publicado na "The New York Times Magazine" de 1� de julho de 1917:

    "Broadway e astros do cinema se assustaram ontem quando ouviram que Charles Chaplin, o comediante ingl�s, recebeu uma oferta salarial de um milh�o de d�lares pelos servi�os de um ano, come�ando por volta de 1� de setembro. Chaplin, que est� agora trabalhando em Los Angeles no final de seu contrato com a Mutual Film Company, receber� mais de US$ 20 mil por semana em seu novo emprego, j� que ter� um b�nus de US$ 50 mil."

    Chaplin estava ganhando muito dinheiro e achou que devia gastar um pouco. Um dia, passando por um show-room de autom�veis, viu um Locomobile, uma limusine de sete lugares que era considerado o melhor carro dos EUA.

    Ele entrou e perguntou o pre�o ao vendedor. US$ 4.900, este respondeu -uma fortuna naqueles dias. "Pode embrulhar", disse Chaplin. O vendedor ficou perplexo. "Mas o senhor n�o vai nem ver o motor?", perguntou. "N�o, n�o faria diferen�a, n�o entendo nada disso."

    No entanto, "para dar um ar mais profissional ao neg�cio", Chaplin se dirigiu ao carro e apalpou um dos pneus.

    O novo contrato foi com a First National Pictures, mas havia uma quest�o: ela n�o tinha est�dio. Isso n�o seria problema para Chaplin. Ele construiu o seu pr�prio, o Charlie Chaplin Studios, no Sunset Boulevard.

    De l� sa�ram obras-primas como "Vida de Cachorro", "O Garoto", "Em Busca do Ouro", "Luzes da Cidade", "Tempos Modernos", "O Grande Ditador", "Monsier Verdoux" e "Luzes da Ribalta".

    Depois que deixou a First National, foi anunciada, no dia 5 de fevereiro de 1919, a cria��o da United Artists Pictures, de Charles Chaplin, Douglas Fairbanks, Mary Pickford e D.W. Griffith.

    MUITOS AMORES

    Charles Chaplin foi um conquistador de garotas, o que escandalizou o p�blico. Dizia-se que ele empregava garotinhas e depois as levava para a cama, e em v�rios casos isso parece ter realmente acontecido. Ele casou-se com tr�s delas.

    A primeira foi Mildred Harris, em 1918. Ele tinha 28 anos, e ela, 16. Harris era uma atriz de sucesso e j� havia feito mais de uma dezena de filmes quando o conheceu. Tiveram um filho, Norman, que viveu apenas tr�s dias. Eles se divorciaram em 1920.

    Em 1924, Chaplin casou-se com Lita Grey, 16. Tamb�m atriz, trabalhou em dois filmes dele, mas em pap�is menores. Tiveram dois filhos, Chaplin Jr. e Sydney. O div�rcio foi em 1926.
    Em junho de 1936, aos 47 anos, o casamento foi com Paulette Goddard, 25. Divorciaram-se em 1942.

    No dia 16 de junho de 1943, aos 54 anos, Charles Chaplin casou-se com Oona O'Neil, 17. Oona era filha do dramaturgo Eugene O'Neil e havia sido namorada do escritor J.D. Salinger, que passou a vida com dor de cotovelo por ter sido trocado por Chaplin.

    Foi um casamento feliz de Chaplin, que durou at� a morte dele, em 1977, aos 88 anos. Tiveram oito filhos: Geraldine, Michael John, Josephine, Victoria, Eugene Anthony, Jane Cecil, Anette Emily e Christopher James.

    DUAS GUERRAS

    Outras pol�micas envolveram Chaplin, por oca si�o das duas Guerras Mundiais. Ele fez seu primeiro filme em 1914, seis meses antes de Inglaterra, Fran�a e R�ssia irem � guerra contra Alemanha e o imp�rio Austro-H�ngaro. Ele n�o se alistou no ex�rcito brit�nico e foi muito hostilizado.

    Durante a Segunda Guerra, teve novo problema ao apoiar a R�ssia contra a invas�o nazista, quando enfrentou acusa��es de ter tend�ncias comunistas.

    Em 1952, Chaplin decidiu ir � premi�re de "Luzes da Ribalta", em Londres, e embarcou com sua fam�lia em 18 de setembro. No dia seguinte sua permiss�o de entrada nos EUA foi cancelada. Chaplin decidiu que n�o voltaria.

    Mudou-se ent�o para a Su��a, comprou uma propriedade de 150 mil metros quadrados, chamada Manoir de Ban, em Corsier-sur-Vevey, em frente ao lago Genebra.

    Em 1972, quando voltou aos EUA especialmente para a ocasi�o, um Oscar honor�rio foi dado a ele, "pelo efeito incalcul�vel que teve em tornar o cinema a obra de arte deste s�culo". Recebeu a maior ova��o em p� da hist�ria do pr�mio: dez minutos.

    Em Corsier-sur-Vevey, Charles Chaplin viveu seus �ltimos 25 anos. Morreu de causas naturais, enquanto dormia, no Natal de 1977.

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