• Cotidiano

    Friday, 02-Aug-2024 03:45:23 -03

    Ministro do STF defende fim da restri��o � doa��o de sangue por gays

    NAT�LIA CANCIAN
    LET�CIA CASADO
    DE BRAS�LIA

    19/10/2017 19h06

    Fabio Braga - 10.ago.2012/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 10-08-2012: O operador de trafego, Claudio de Lima, 46, doa sangue no hemocentro. Agentes da Compania de Engenharia de Trafego (CET) fazem paralizacao parcial em ato de doacao de sangue na fundacao Pro-Sangue, no Hospital das Clinicas. Os agentes reivindicam melhores salarios e condicoes de trabalho. (Foto: Fabio Braga/Folhapress, COTIDIANO).
    O ministro Edson Fachin defendeu a doa��o de sangue por homens gays

    O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), defendeu nesta quinta-feira (19) que homens gays n�o sejam impedidos de doar sangue por conta de sua orienta��o sexual.

    Fachin votou em uma a��o que questiona duas portarias do Minist�rio da Sa�de e da Anvisa (Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria), as quais impedem que homens gays possam doar sangue por at� 12 meses ap�s terem rela��es sexuais. Ele entendeu que a proibi��o estimula o preconceito.

    "O estabelecimento de grupos - e n�o de condutas - de risco incorre em discrimina��o, pois lan�a m�o de uma interpreta��o consequencialista desmedida que concebe especialmente que homens homossexuais ou bissexuais s�o, apenas em raz�o da orienta��o sexual que vivenciam, poss�veis vetores de transmiss�o de variadas enfermidades, como a Aids", afirmou o ministro.

    "O resultado de tal racioc�nio seria, ent�o, o seguinte: se tais pessoas vierem a ser doadores de sangue devem sofrer uma restri��o quase proibitiva do exerc�cio de sua sexualidade para garantir a seguran�a dos bancos de sangue e de eventuais receptores", afirmou.

    Hoje, as regras gerais de doa��o de sangue s�o definidas pelas portarias 158/2016, do Minist�rio da Sa�de, e pela resolu��o 34/2014, da Anvisa.

    O texto do minist�rio considera "inapto" a doar sangue por um per�odo de 12 meses "homens que tiveram rela��es sexuais com outros homens e/ou parceiras sexuais destes". Trecho semelhante consta na norma da Anvisa.

    Em geral, o governo atribui essa restri��o "tempor�ria" a dados epidemiol�gicos que apontam aumento no risco de infec��o por doen�as sexualmente transmiss�veis entre esses grupos -caso do HIV, por exemplo.

    Ao votar, Fachin rebateu esse argumento. "Entendo que orienta��o sexual n�o contamina ningu�m. O preconceito sim", afirmou ele, para quem a regra � inconstitucional. "Tais normas limitam sobremaneira a doa��o de sangue de algumas pessoas pelo fato de serem como s�o", disse.

    Segundo o ministro, as normas para sele��o de doadores de sangue "podem e devem estabelecer exig�ncias e condicionantes". Estes, por�m, n�o devem ser baseados "na forma de ser e existir das pessoas", nem em grupos de risco, mas em comportamentos de risco, disse. Ap�s o voto do relator, a sess�o foi suspensa. A previs�o � que o julgamento seja retomado na pr�xima quarta-feira (25).

    'DISCRIMINAT�RIA'

    A a��o que questiona a restri��o � doa��o de sangue por gays partiu do PSB (Partido Socialista Brasileiro), para quem a norma � discriminat�ria. "Muito sangue tem sido derramado em nosso pa�s em nome de preconceitos que n�o se sustentam. E � isso que a a��o pretende evitar", afirmou o advogado Rafael Carneiro, que representa o partido, durante o julgamento. Para Carneiro, a atual medida vai contra outras normas do minist�rio, que apontam que a orienta��o sexual n�o deve ser impeditiva para doa��o de sangue.

    "Um dos argumentos � a incid�ncia maior de DSTs [doen�as sexualmente transmiss�veis] nos homossexuais. Mas tamb�m � maior entre aqueles sem curso superior. E na popula��o parda em rela��o � popula��o branca", compara.

    "Ser� que teremos que considerar essas pessoas como pessoas de segunda classe? � o que est� acontecendo hoje. [Homossexuais] v�o aos bancos de sangue e saem de l� com um n�o, pelo simples fato de serem quem s�o", defendeu a advogada Patr�cia Gorisch, do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Fam�lia).

    Para advogados que representam os direitos dos homossexuais, a atual norma retoma o conceito de grupo de risco, enquanto novas pol�ticas em sa�de j� consideram a an�lise de "comportamentos de risco".

    "Ningu�m se op�e a rigoroso processo de triagem em raz�o da janela imunol�gica", disse o advogado Rafael Kirchhoff, do Grupo Dignidade, para quem o ideal seria analisar crit�rios espec�ficos para inaptid�o, como maior rotatividade de parceiros e aus�ncia da pr�tica de sexo seguro.

    Segundo ele, a regra atual acaba indiretamente por proibir rela��es sexuais entre homossexuais. "Para alcan�ar um direito, o de doar sangue, � negado outro: o direito de viver e expressar sua sexualidade", afirma.Outro argumento citado por advogados para mudan�a na norma � a escassez nos bancos de sangue, situa��o que poderia ser contornada caso n�o houvesse a restri��o atual � doa��o por gays.

    "Deixa-se de doar anualmente, com base nessa restri��o imposta, 19 milh�es de litros de sangue. H� um n�mero assombroso de vidas que poderiam ser salvas e acabam desassistidas", afirmou Gustavo da Silva, da Defensoria P�blica da Uni�o.

    S�rgio Lima/Folhapress
    O diretor-presidente da Alian�a Nacional LGBTI Toni Reis
    O diretor-presidente da Alian�a Nacional LGBTI Toni Reis, que diz que restri��o estigmatiza gays

    OUTRO LADO

    Representantes do Minist�rio da Sa�de e da Anvisa n�o se manifestaram no julgamento.

    Em nota enviada na quarta (18), no entanto, o Minist�rio da Sa�de negou discrimina��o e disse que os crit�rios para sele��o de doadores de sangue "est�o baseados na prote��o dos receptores, visando evitar o risco aumentado para a transmiss�o de doen�as" por meio da transfus�o.

    "De acordo com a portaria, homens que fazem sexo com homens s�o considerados inaptos para a doa��o de sangue por 12 meses e n�o de forma definitiva", informa a pasta. A restri��o, diz, atende a recomenda��es da Organiza��o Mundial da Sa�de "e est� fundamentada em dados epidemiol�gicos presentes na literatura m�dica e cient�fica nacional e internacional, n�o tendo rela��o com preconceito do poder p�blico ou que leve em considera��o a orienta��o sexual do candidato".

    Entre esses dados, o minist�rio cita indicadores que apontam que homens que fazem sexo com homens apresentam maior preval�ncia de infec��o por HIV quando comparados com a popula��o em geral –10,5%, enquanto a taxa geral � de 0,4%.

    Para a pasta, o prazo de 12 meses segue o princ�pio da precau��o. "� de acordo com o princ�pio da precau��o que se estabelece o per�odo de 12 meses de inaptid�o para situa��es espec�ficas, ainda que a janela imunol�gica esteja atualmente reduzida, tais como a realiza��o de tatuagens e procedimentos cir�rgicos variados."

    J� a Anvisa, por meio de nota t�cnica, afirma que "as normativas brasileiras consideram v�rios crit�rios de inaptid�o de doadores de sangue associados a diferentes pr�ticas e situa��es de risco acrescido e n�o se restringe apenas aos homens que fizeram sexo com outros homens". Entre os outros casos em que a doa��o � impedida por 12 meses est� ter feito sexo em troca de dinheiro ou drogas, ter sido v�tima de viol�ncia sexual, ter feito piercing ou tatuagem sem condi��es de avalia��o quanto � seguran�a do procedimento, hist�rico recente de infec��es, etc.

    A ag�ncia diz ainda que medidas semelhantes s�o adotadas em outros pa�ses, como os Estados Unidos –que passou em 2015 de uma inaptid�o definitiva para que gays doassem sangue para restri��o de 12 meses ap�s a rela��o sexual, como ocorre na norma brasileira.

    No documento, a Anvisa defende ainda que as regras atuais n�o excluem homens que fazem sexo com outros homens de doarem sangue, "desde que atendam aos requisitos de triagem cl�nica estabelecidos".

    "Cabe ao servi�o de hemoterapia atender e orientar com respeito ao candidato a doa��o de sangue explicitando da melhor forma poss�vel sobre os crit�rios t�cnicos e condi��es de aptid�o para coleta de sangue com seguran�a", informa.

    Fale com a Reda��o - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024