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A economia mundial: instabilidade, inflação e política monetária

Em menos de três anos, a situação da economia mundial mudou notavelmente. No início do quarto trimestre de 2019, a debilidade do crescimento era generalizada entre as economias avançadas. Por conta da crise de 2008, a macroeconomia não chegou a alcançar a estabilização e nos Estados Unidos, União Europeia, Reino Unido e Japão os bancos centrais mantiveram baixas as taxas de juro de referência, próximas de zero, e em alguns países foram inclusive negativas. Além disso, foram executados programas de injeção de recursos nos sistemas financeiros, a compra de títulos de dívida, e a denominada flexibilização quantitativa (QE, por sua sigla em inglês) dos bancos centrais teve uma notável dimensão. Assim, a flexibilização da política monetária incluiu a denominada QE.

Com a pandemia da COVID-19 e diante da drástica queda dos mercados de ações e de títulos de dívida nas principais economias avançadas, a QUE se aprofundou, enquanto as taxas de juro se mantinham baixas. Nas economias de mercados emergentes, foram implementadas versões específicas da QE, e entre os principais bancos centrais, foram realizadas operações de troca de moedas, principalmente de dólares pelas moedas de diversos países, para manter a estabilidade monetária. 

A tese defendida nos principais círculos acadêmicos e em organizações financeiras internacionais de que a política monetária é o que permite chegar à estabilidade e recuperar o crescimento não só foi mantida, como aprofundada até ao extremo. O uso da política fiscal foi pontual e principalmente de suporte ou apoio ao consumo de grupos da população ou de segmentos empresariais, para atenuar a redução de rendimentos, e se manteve, assim, a ideia de considerar o equilíbrio fiscal como variável-chave. 

Em 2020, os mercados de ações se recuperaram e vários dos principais índices como o S&P 500, o Dow Jones 30 ou o Nasdaq 100 atingiram níveis históricos.  Os mercados da dívida também se recuperaram. Em meados de 2020, o FMI observou que a ação dos bancos centrais produziu resultados positivos, de tal forma que, nas economias com setores financeiros de importância sistêmica, os mercados de ações se sobrepuseram.

Em 2021, continuou o avanço nos mercados de ações e até há poucas semanas atrás o Dow Jones, Nasdaq e S&P continuaram a reportar máximos recordes. No conjunto da economia, não existe uma situação semelhante. A finais de 2021, ainda não se chegava à recuperação contínua da economia mundial. Contudo, surgiam novos problemas como resultado da pandemia, como as dificuldades em algumas cadeias de valor; atrasos no transporte de mercadorias, com saturação nas rotas marítimas; diferenças notáveis na recuperação de algumas atividades econômicas; e inclusive a falta de alguns insumos importantes para certos produtos.

Neste contexto, reapareceram problemas inflacionários e em um prazo relativamente curto os índices de preços ao consumidor nas principais economias desenvolvidas ascenderam a níveis não vistos durante vários quinquênios.   

Neste contexto, e para complicar ainda mais a situação, ocorreu a invasão da Rússia à Ucrânia, desencadeando uma guerra com um alcance indefinido e com um impacto negativo imediato nos preços da energia e em alguns grãos básicos. Dados recentes sobre o conflito bélico indicam que este pode prolongar-se enquanto o governo dos Estados Unidos e o resto dos membros da OTAN procuram derrotar a Rússia, através da aplicação de sanções econômicas e o armamento ao governo da Ucrânia..

O petróleo, o gás, o milho e o trigo foram cotados nos mercados futuros com grande instabilidade e uma tendência de alta, uma vez que Rússia e Ucrânia são produtores de importância global. A inflação, portanto, se viu ainda mais impulsionada com a guerra. 

No entanto, a reação das instituições financeiras internacionais, de vários dos mais importantes bancos centrais e ministérios da fazenda ou finanças de algumas economias avançadas é totalmente convencional: mais política monetária. Se impõe o recurso a um aumento permanente da taxa de juros de referência.

A Reserva Federal (FED) dos EUA começou em 16 de março um ciclo de alta nas taxas de juros a curto prazo, com um aumento de 25 pontos base. Semanas depois, em 4 de maio, e alegando que se trata de uma medida para restaurar a estabilidade dos preços, a FED aumentou as taxas de juro em meio ponto e indicou que aumentos semelhantes estão sobre a mesa para as próximas reuniões.

No México e no Brasil, considerando a notável vulnerabilidade dos seus mercados financeiros e a dificuldade de manter capitais no país que detenham títulos de dívida do governo federal e de empresas, ambos os bancos centrais vêm realizando,  já há meses, algumas altas maiores em sua taxa de referência. 

No México, em novembro de 2021, a taxa foi fixada em 5% e em março de 2022 tinha sido aumentada em 150 pontos base a 6,5%. No Brasil, foi aumentado em 150 pontos base em dezembro de 2021. Em março foi feito outro aumento e no momento que foi efetuada a subida das taxas da FED, o Banco Central do Brasil aumentou a sua taxa de juro em um ponto percentual até chegar a 12,75%.

Os aumentos das taxas de juros continuam a somar-se ao argumento do combate à inflação, mas não se observam resultados positivos e, pelo contrário, verifica-se uma diminuição das expectativas de crescimento. O aumento das taxas de juro inibe a atividade econômica, o que é uma péssima notícia quando o investimento tem um comportamento tão debilitado, particularmente em países como o México e o Brasil.

Autor

Professor e Pesquisador Sênior no Departamento de Economia da Univ. Autônoma Metropolitana (UAM), Unidade Iztapalapa. Coordenador do Prog. de Pesquisa Universitária sobre Integração nas Américas. Doutorado em Estudos Latino-Americanos pela UNAM.

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