Tchella: do sonho de atriz nasce uma cantora e compositora

Projetada pela atuação em musicais e com passagens por palcos de diversos países, artista se reinventou durante a pandemia e apresenta novo trabalho que conjuga dramaturgia com composições autorais.

Tchella  – ou Marcella Brito Pena, seu nome na certidão de nascimento – nasceu em 22 de setembro de 1988, na cidade de São Paulo, e desde os 12 anos começou a traçar a trajetória artística que a tornaria cantora e compositora. Mas seu amor pela arte levou-a a integrar também companhias de teatro e de circo, nacionais e internacionais, e soube alimentar sua carreira musical com o aprendizado trazido pelas vivências no teatro e no cinema. 

“Não havia artistas na minha família. Ao contrário, na minha casa, ser artista era um tabu”, lembra. “Meu pai queria que eu fosse médica, minha mãe, fisioterapeuta e minha avó, professora.” Seus pais temiam a opção por uma profissão incerta, sem remuneração adequada, e que não lhe proporcionasse a valorização pessoal e profissional esperada. Ela diz que não sabe exatamente como encontrou a força para que, ainda na idade precoce de 12 anos, externasse sua vontade de ser atriz, ingressasse no teatro e começasse a buscar seus caminhos.

“Eu cresci no bairro do Peruche, periferia de São Paulo. Aos 15 anos, conheci uma amiga que me indicou alguns caminhos. Mas, para me tornar profissional, tinha que buscar estudos, formação. Pedi orientação para amigos e aos 18 anos entrei no curso de Artes Cênicas na Universidade São Judas Tadeu”, conta.  Na universidade, ingressou em um estágio em que trabalhava no teatro da própria universidade das 9hs às 18hs e em seguida entrava para sala de aula para estudar no período noturno.

Nesse período, Tchella começou a participar de musicais. Esta foi a porta para que aprendesse a cantar e a tocar vários instrumentos, o que lhe abriu novas portas. “Inicialmente, queria ser atriz de teatro. Mas, quando percebi que minhas habilidades musicais me proporcionavam mais opções de trabalhos, e também me fazia bem, fui criando estratégias para seguir minha trajetória. Acabei me inserindo no universo musical que me trouxe até aqui.” 

Já faz 23 anos que Tchella vive entre palcos e telas. Neste período, conseguiu se pós-graduar em canção popular e brilhar em diversos palcos dentro e fora do país, e diante de diferentes tipos de público. A artista paulistana foi premiada pelo Festival de Criatividade de Cannes em 2015, e também foi finalista do Prêmio Profissionais da Música em 2019, na categoria artista de groove e pop.

Seu primeiro álbum musical, intitulado Transmutante, foi lançado em 2018 e  recebeu bastante destaque na mídia. “Transmutante me abriu espaço no mercado musical. Em pouco tempo, realizei uma série de shows em teatros e casas de shows importantes em São Paulo. Em 2019, iniciei uma turnê nacional com o álbum. Eu me preparava para turnê internacional em 2020, mas a pandemia de Covid-19 barrou o projeto.” 

Durante a pandemia, decidiu se mudar para Joanópolis, cidade no interior de São Paulo, o que lhe suscitou uma série de reflexões pessoais e artísticas. Ela e seu marido, Josué Torres, que é cenógrafo, ator e diretor artístico, se reinventaram dentro das possibilidades do show online. Decidiram então transformar sua casa em 10 cenários diferentes, e criaram uma história contada em plano sequência e colorida por diversos efeitos especiais, incluindo uma máquina de fumaça baseada em um  ferro de passar roupas e um canhão de luz feito com uma lanterna.

A partir das experiências vividas nos últimos anos, atualmente Tchella vive processo de criação e produção do seu segundo álbum musical, intitulado A Mulher Fora do Tempo. “Os elementos que geraram A Mulher Fora do Tempo se constituíram no decorrer de alguns anos. Entretanto, após mergulhar nessa vida com uma relação mais próxima com a natureza, as coisas se encaixaram melhor”, diz.

A obra on-line envolve dramaturgia, música, cinema e literatura para contar a história de Val, uma menina órfã que atravessa a floresta escura para mergulhar no mundo dos mortos em busca da sua família. Nesse contexto, o público é convidado a vivenciar a peça, que além de apresentar as novas canções autorais de Tchella, explora a bagagem teatral e cinematográfica da artista. Agora, a obra está saindo do formato on-line para os palcos e contará com cenários e projeções de Josué Torres e trilha sonora ao vivo do multi-instrumentista Pedro Lauletta.

A Mulher Fora do Tempo estreou em março de 2023 no formato de show online. Mas ainda neste ano vamos iniciar a produção musical e gravações do álbum digital, que deve chegar no início de 2024 nas principais plataformas digitais”, diz Tchella.

O roteiro e a performance da própria Tchella procuram estimular a reflexão sobre temas como morte,  ancestralidade, renascimento, iniciação feminina, o medo de seguir sozinha pelos mistérios que circundam a natureza e a construção da própria identidade.

“O processo de criação dessa história, das canções e personagens, foi inspirado no livro “Mulheres que Correm com os Lobos”, da psicanalista Clarissa Pinkola Estes. É um clássico da literatura feminina que ganhei da minha mãe, Rafaela Brito Pena, que é psicóloga, durante um processo terapêutico. Eu fui conhecendo a fundo aspectos essenciais da psique da mulher, que foram silenciados ao longo dos sistemas patriarcais, como a sexualidade feminina, a criatividade, a intuição e a maternidade, dentre outros aspectos existentes dentro de toda mulher”, explica.

Entre 2019 e 2021 Tchella criou o novo repertório. Os arranjos e a produção musical foram feitos pela própria artista. Neste novo trabalho, Tela empreendeu uma pesquisa musical para refletir sua ancestralidade e identidade, abrindo-se a influências ibéricas, nordestinas, latino-americanas e balcânicas. Assim, o espectador pode sentir nuances da nova MPB, e saborear sotaques de baião, maracatu, tango, música dos balcãs e folk, com uma pitada de pop e rock. 

Além de criar e produzir trabalhos autorais, Tchella e seu companheiro Josué também se dedicam a ensinar e dirigir outros artistas e empreendedores nas áreas de  preparação artística, musical e cênica de shows físicos e online, além de videoclipes e sessões de fotos. Desde 2019 desenvolvem o método  DNA (Direção da Natureza Artística), que analisa aspectos psicofisiológicos de cada personalidade (sua natureza e essência) para direcionar performance e posicionamento em palcos, vídeos, fotos e entrevistas. Em 2020, por meio de seu método e sua arte atingiram quase 20 mil músicos de todo Brasil,  Europa e América Latina através das redes sociais.

Confira abaixo entrevista completa no Podcast MPB Unesp

Foto: Josué Torres.