Com mais de 800 músicas gravadas, compositor fala do sucesso de 'Evidências': 'Ela virou um fenômeno'

“É o maior sucesso da minha carreira. Tive músicas de muito sucesso, mas como ‘Evidências’, nunca. Ela virou um fenômeno, uma coisa impressionante”

Os jovens fãs que hoje entoam o refrão sofrido e cheio de sentimento da música sertaneja nos karaokês de todo o país nem poderiam imaginar, se vissem o simpático senhor com cabelos brancos e sorriso fácil que gosta de levar uma vida pacata – com espaço para alguns hobbies inusitados, como sair com sua moto para pequenas viagens pelo Rio –, que, no alto de seus 77 anos, ele é o responsável por alguns dos maiores sucessos da música brasileira.

“Escolhi ser compositor porque isso faz parte da minha personalidade. Eu sou assim, não gosto de me expor muito. Sempre preferi ficar no meu canto”

Paulo Sérgio Valle conta que começou a carreira ainda garoto ao lado do irmão mais novo, o também músico e compositor Marcos Valle. A dupla, junto com Nelson Motta, também é responsável pelo sucesso que marca o fim de ano na Globo há mais de 40 anos, 'Um Novo Tempo'.

“A gente ouvia mais música americana, ele se ligando nas músicas e eu nas letras. Aí veio a bossa nova e apareceu uma dupla fantástica, que era Tom e Vinícius. Aquilo nos conquistou e, de uma certa maneira, nos seduziu para a música brasileira. E começamos nós dois, ele no piano, eu sentado ao lado, a ficar rascunhando músicas”, recorda ele, que nessa época lançou sucessos como 'Samba de Verão' e 'Preciso Aprender a Ser Só' – este último gravado por Elis Regina.

Depois da bossa nova, o compositor começou a apostar em canções mais populares – e não poderia ter tomado melhor decisão. “Até então, eu não tinha essa noção de público. As músicas faziam sucesso, mas eu não via um auditório cantando, raramente via uma pessoa cantando na rua uma daquelas músicas, eram muito sofisticadas. E aí, de repente, eu comecei a ver o rosto do público”, conta.

“Para mim, o grande julgador da música é o público. Os críticos antigamente eram muito severos, só gostavam de músicas mais sofisticadas. Às vezes eles achavam formidável e o público nem tomava conhecimento. Eu sempre quis atingir o grande público”

Compondo com nomes como José Augusto, Chico Roque e Eduardo Lages, Paulo Sérgio virou uma fábrica de hits. Só o Rei Roberto Carlos gravou 20 músicas escritas por ele – “Todo mundo mandava músicas para o Roberto. Todo mundo que você possa pensar na música popular queria gravar com ele”.

De lá para cá, já são mais de 800 músicas lançadas – entre elas, sucessos de variados ritmos, como 'Essa Tal Liberdade', com Só Pra Contrariar; 'Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim', com Ivete Sangalo; e 'Você Me Vira a Cabeça', com Alcione. Mesmo com tantas composições ao longo da carreira, Paulo se surpreende com o fenômeno que se tornou 'Evidências' e tenta encontrar uma explicação para tamanho sucesso:

“Acho que Evidências é uma história que todo mundo, a partir de uma certa idade, já viveu. O segredo dessa música talvez seja esse, é um drama que todo mundo já passou, ou está passando”

O compositor conta que já foi abordado por pessoas na rua e algumas delas até lhe pediram conselhos amorosos por estarem vivendo situações parecidas com as da música. Ele credita boa parte do sucesso à interpretação de Chitãozinho & Xororó para a canção. “O sucesso está na música, na letra, na interpretação e no arranjo. Esse casamento é fundamental. Quando gravaram, eles passaram toda a emoção da música, foram fundamentais. Tanto que a versão que mais toca até hoje é a deles”.

Apesar de ter diminuído o ritmo de composições, Paulo não pretende parar tão cedo. Ele continua criando em parceria com outros artistas, é presidente da União Brasileira de Compositores e está escrevendo seu sétimo livro, uma espécie de autobiografia em forma de contos. “O sujeito que se autobiografa é sempre um pouco pretencioso, e eu não me considero assim um cara tão importante para fazer uma autobiografia. Mas queria contar essas coisas que vivenciei e que me aconteceram dentro da música e também na literatura”, diz. Apesar de todas essas memórias, ele não guarda em casa nenhum disco com músicas gravadas por ele e garante não se apegar ao passado:

“Não sou passadista. Quem se apega ao passado não faz nada novo”

Reveja algumas interpretações de 'Evidências' realizadas por variados artistas: