Por Larissa Pandori, Pâmela Ramos, g1 Sorocaba e Jundiaí e TV TEM


Família circense mantém espetáculos tradicionais a preços populares

Família circense mantém espetáculos tradicionais a preços populares

A grande lona estendida e os letreiros luminosos chamam atenção de longe. Os mais jovens podem não entender logo de cara do que se trata mas, assim que descobrem, a curiosidade de assistir a um espetáculo de circo vem à tona.

A manifestação artística — que surgiu há pelo menos 4 mil anos — permanece viva graças ao legado de famílias que construíram a vida dentro de trailers, de cidade em cidade, nunca deixando de levar a arte circense para todos os públicos.

Desde as últimas semanas de abril, Sorocaba (SP) tem sido "casa" para dois circos. Um deles está montado na zona leste da cidade, às margens da Avenida Dom Aguirre. O outro, na zona norte, às margens da Avenida Ipanema.

José Renato, ao lado da esposa, Semada Regina, com os filhos e funcionários do circo — Foto: Larissa Pandori/g1

Mas se engana quem pensa que os dois circos disputam público. José Renato Mello, de 50 anos, proprietário do circo Top Irmãos Mello, montado na zona norte de Sorocaba, afirma que a intenção é levar espetáculo para públicos diferentes e que é comum para famílias circenses se conhecerem e se ajudarem.

"Quando minha família montou circo em Sorocaba, pela primeira vez, já haviam muitas famílias circenses por aqui. Pessoal do Circo-Teatro Guaraciaba, do Circo Xixinelo. A gente sempre se ajudou. Ainda mais um circo do estilo da minha família, que é de porte médio para pequeno. Um sempre socorreu o outro. Assim é a vida do circo", afirma.

José Renato Mello, proprietário do circo Top Irmãos Mello, que passa temporada em Sorocaba (SP) — Foto: Pâmela Ramos/TV TEM

De geração em geração

E foi a vida no circo que permitiu que José Renato e a esposa Semada Regina Lacerda Portugal Mello criassem os cinco filhos, que agora são a 6ª geração a participar e comandar os espetáculos.

Filho e neto de artistas circenses, José Renato decidiu abrir o próprio circo em 2004. Esta é a segunda vez que faz temporada em Sorocaba, depois de quase 10 anos sem montar a lona na cidade.

Como os circos se reinventam para manter tradição com o passar dos anos

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Apesar do sustento da família de José Renato vir da bilheteria do circo, o homem afirma que cuidar do negócio vai muito além das preocupações financeiras.

"A gente tenta passar para os filhos o amor que a gente sente pela arte circense. É um legado", afirma José Renato.

Entre a prole, está José Renato Mello Filho, ou Renatinho, como é conhecido entre os colegas de profissão. A rotina do jovem se divide entre a administração do circo e os ensaios para se apresentar no picadeiro.

Ele é o responsável por encarar o "globo da morte", atração que chama atenção de crianças e adultos. Apesar de jovem, Renatinho diz que sente orgulho de ter acompanhado boa parte do crescimento da empresa familiar.

"O nosso circo é aquele raiz, vamos dizer assim. Lona costurada à mão, começou bem pequenininho e aos poucos foi evoluindo. Aumentamos a qualidade do espetáculo, da estrutura de som e iluminação," cita Renatinho.

José Renato Mello Filho faz a atração "globo da morte" no circo da família e ajuda a administrar a empresa — Foto: Pâmela Ramos/TV TEM

O palhaço Dica não queria dizer quantos anos tem, pois, segundo ele, "palhaço não tem idade". Mas durante a entrevista relevou que dedicou grande parte dos seus 63 anos à profissão. "63 anos bem vividos no mundo do circo". afirma Wladimir Augusto, o palhaço Dica.

A primeira atuação no picadeiro foi aos seis anos, já como palhaço. Personagem que ele nunca quis abandonar ao longo da vida. O artista, que viu de perto as transformações do circo, conta os desafios de permanecer na profissão no mundo atual.

"Antigamente, o circo era visto de forma diferente. Quando chegava um carro do circo na cidade, as crianças ficavam malucas. Não minha época [de infância] não existia televisão. Então, o circo era a majestade, era tudo de bom que tinha para acontecer na cidade", relembra.

Palhaço "Dica", interpretado pelo artista circense Wladimir Augusto — Foto: Pâmela Ramos/TV TEM

Para Wladimir, a arte circense enfrentou três situações que moldaram os espetáculos ao longo dos anos:

Espetáculos de circo divertem famílias em Sorocaba (SP) — Foto: Rodrigo Santos/TV TEM

Apesar das mudanças, o artista enxerga um longo caminho ao circo e acredita que a expressão artística tem papel fundamental para aproximar famílias e captar, pelo menos um pouco, a atenção dos mais novos que, segundo ele, "vivem" no celular.

“O circo é uma magia, então a gente trabalha com o espírito, a alma da plateia, não digo só criança não. A gente não brinca, a gente ensaia, a gente cria, para trazer os jovens de novo no circo, para eles esquecerem o celular. Quando eles entram no circo, a magia entra dentro deles. Eles esquecem o celular e participam do espetáculo.”

O esforço vale a pena. Basta observar a plateia por alguns minutos que já é possível encontrar olhares atentos e rostos curiosos acompanhando o que acontece no picadeiro.

O circo Top Irmãos Mello fica em Sorocaba até as primeiras semanas de junho. Mais informações sobre os espetáculos podem ser obtidas nas redes sociais.

Família atenta ao espetáculo do circo que está montado na zona norte de Sorocaba (SP) — Foto: Rodrigo Santos/TV TEM

'Casei dentro do circo'

Embaixo e ao redor da lona estendida em um ponto da Avenida Dom Aguirre, em Sorocaba, existe mais de um século de história. O circo Portugal começou na cidade de Braga, em Portugal, e veio para o Brasil por volta de 1890.

Atualmente, está na 8ª geração e é abrigo para famílias inteiras, como a de Valéria Farfan, de 45 anos, que atualmente se apresenta com acrobacias aéreas ao lado do marido, José Roberto Farfan. A história do casal é marcada pelo circo. Se conheceram e até fizeram a cerimônia de casamento no picadeiro.

“Eu casei dentro do circo, que era nosso sonho casar dentro do picadeiro. E minhas filhas nasceram, já estão meio encaminhadas. A vida é assim, é bem diferente da cidade. Na cidade, a pessoa trabalha fora e volta para casa. Aqui não, aqui a gente trabalha no circo, mora aqui, convive 24h com o marido, filhos. Os filhos vão para a escola, mas é tudo aqui," comenta Valéria.

Valéria Farfan, artista circense, se apresentando junto com o marido José Roberto — Foto: Fernando Belon/TV TEM

A filha mais velha, Nicole, de 16 anos, já participa dos espetáculos. E a menor, Melissa, de 8 anos, dá sinais de que a vida no circo também a "fisgou" e diz que conta os dias para poder começar a aprender os números que assiste desde que nasceu.

"Quando eu crescer, eu quero ser contorcionista. Eu acho um número bem bonito. Eu vou conhecer o mundo, porque o circo dá a volta no mundo," diz a menina.

Valéria e a filha, Melissa. Família é tradicional de circo — Foto: Pâmela Ramos/TV TEM

O circo leva arte e magia, mas também gera empregos. Atualmente, o circo Portugal emprega cerca de 120 pessoas em seu quadro fixo. Segundo o diretor de marketing, Diogo Araújo, a empresa também contrata pessoas quando se instala em uma nova cidade.

“Porque a gente precisa de pessoas na portaria, recebendo o público, então a gente traz pessoas da cidade para trabalhar. Na montagem do circo também a gente precisa de um trabalho mais braçal, então sempre aparece gente para ajudar nessa estrutura. E acaba que muita gente se apaixona por essa vida no circo e acaba indo embora com o circo.”

Diogo Araújo, diretor de Marketing do circo Portugal — Foto: Pâmela Ramos/TV TEM

São 900 toneladas de equipamentos e estrutura. Na plateia do Portugal, cabem cerca de 1 mil pessoas. A criação de novas atrações para os espetáculos passa por vários setores da empresa, que buscam alinhar o material à tendência de cada temporada.

"Tem dois números internacionais que foram agregados ao espetáculo no Brasil, que é o 'homem-bala', atração que veio de Las Vegas, nos Estados Unidos, e o show de raios laser, que é um número com mais de 150 pontos de luzes, atração que veio da Itália", cita Diogo Araújo.

Circo montado na zona leste de Sorocaba usa modernidade e tecnologia para atrair público

Circo montado na zona leste de Sorocaba usa modernidade e tecnologia para atrair público

A modernidade aliada à tecnologia pode ser vista em todos os circos, dos mais simples aos mais luxuosos. Mas não deixar o espetáculo se perder em meio às inovações tecnológicas e manter a tradição de séculos de história é uma preocupação de quem conduz a arte. E se tem personagem mais tradicional em um circo do que o palhaço, ainda não foi criado.

Com apenas 18 anos, Luís Portugal sabe bem a responsabilidade que carrega ao vestir o figurino.

"Ele [o palhaço] é a alma do circo. É um dos momentos altos do espetáculo, o público, às vezes, não espera que o número seja legal, divertido, e se surpreende."

A figura do palhaço arranca risadas de crianças e adultos, mas também pode causar medo em pessoas de todas as idades. Para Luís, ajudar a plateia a vencer este medo é quase uma missão especial.

"A gente procura ter uma maquiagem mais leve do que era antigamente. Procura interagir mais com as crianças. Quando acaba o espetáculo, vamos circular pela praça de alimentação, tirar foto com o público. Tem uma ou outra criança que a mãe fala 'ele tem medo' e aí eu me aproximo devagar. Nossa vontade é fazer essas pessoas perderem o medo e sairem do circo contentes", afirma.

Palhaços interagem com a plateia durante espetáculos em Sorocaba (SP) — Foto: Fernando Belon/TV TEM

Michel Kikuchi, 46 anos, acumula funções no circo. É equilibrista, faz alguns números junto com os palhaços e participa do "globo da morte", atração muito chamativa em vários circos.

"Eu comecei a fazer o 'globo da morte' com 16 anos, mas até hoje eu treino um pouco todos os dias. Precisa de preparação física, estar em dia com o psicológico,, manter a calma",

Michel Kikuchi, de 46 anos, se apresenta como equilibrista em circo internacional — Foto: Fernando Belon/TV TEM

Michel diz que procura acolher os jovens que chegam ao circo. "Tem que dar espaço para as gerações que vem. Incentivar os jovens que estão no circo, apoiar, ensinar. Pois o circo não pode morrer."

O circo Portugal encerra a temporada em Sorocaba na sexta-feira (31). Para saber mais sobre os espetáculos, acesse as redes sociais do circo.

Família assiste a espetáculo circense em Sorocaba (SP) — Foto: Rodrigo Santos/TV TEM

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