Por Gustavo Foster e Matheus Beck, g1 RS


Hospital da Brigada Militar em Porto Alegre — Foto: Osmar Nólibus / BM

A Polícia Federal cumpriu nesta quinta-feira (25) quatro mandados de busca e apreensão contra pessoas envolvidas nos testes com proxalutamida em pacientes com Covid-19 em hospitais do Rio Grande do Sul. As ações, feitas a pedido do Ministério Público Federal (MPF), foram realizadas em Porto Alegre e em Brasília, no Distrito Federal, e apuram os crimes de contrabando, falsidade ideológica e distribuição e entrega de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais a consumo, sem o registro no órgão de vigilância sanitária.

Na quarta (24), o MPF ingressou com duas ações civis públicas contra os responsáveis pelos testes. Não foram divulgados, no entanto, os nomes nem o número de suspeitos envolvidos nos mandados cumpridos nesta quinta. Também não é confirmada a relação entre as ações de quarta e o cumprimento dos mandados de quinta.

Sem evidência de eficácia no tratamento da Covid, a proxalutamida teria sido usada em testes feitos antes de autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para importação do remédio e sem consentimento da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).

As duas ações com as quais o MPF ingressou na quarta-feira tratam dos testes realizados no Hospital da Brigada Militar (BM), em que são responsabilizados a União, dois pesquisadores, o estado do Rio Grande do Sul e dos testes realizados no Hospital Arcanjo São Miguel, de Gramado, na Serra do Rio Grande do Sul, em que são responsabilizados o município, dois funcionários do hospital, além dos mesmos dois pesquisadores e a União.

Se condenados, os réus podem ter que pagar multa de, no mínimo, R$ 10 milhões em cada uma das ações.

Nas redes sociais, o médico Flávio Cadegiani, apontado como responsável pelos estudos da proxalutamida no país, publicou nesta quinta-feira uma série de mensagens em que diz que "hoje a PF fez busca e apreensão na minha casa e clínica. Estou muito tranquilo porque não há absolutamente nada de errado, e se forem sérios ainda pedirão desculpas".

Hospital Arcanjo São Miguel, de Gramado, na Serra. — Foto: RBS TV/Reprodução

Entenda o caso

Segundo reportagem do jornal Matinal, o Hospital da Brigada Militar, em Porto Alegre, utilizou o medicamento para tratar pacientes internados com Covid-19. Cerca de 50 pacientes teriam recebido a droga. Em Gramado, o MPF apurou a aplicação do medicamento no Hospital Arcanjo São Miguel. O MPF aponta que 63 pacientes do hospital completaram o tratamento com o uso de proxalutamida.

A proxalutamida é uma substância que bloqueia a ação de hormônios masculinos, testada no tratamento de câncer e não acessível em farmácias, além de não ter sido aprovada em nenhum país. O medicamento é produzido por um laboratório chinês. O uso do medicamento era defendido pelo presidente Jair Bolsonaro contra a Covid-19, assim como fez anteriormente com a cloroquina e a ivermectina, remédios sem eficácia comprovada contra o coronavírus.

MPF investiga testes com proxalutamida feitos em hospital de Porto Alegre

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A Anvisa afirmou que não havia autorização de importação do medicamento. "Não houve solicitação de Licença de Importação para a substância Proxalutamida no Brasil no período de janeiro de 2018 até 9 de agosto de 2021", explicou em agosto de 2021. A agência ainda apontava que dois estudos com seres humanos foram autorizados no país, nenhum deles no RS.

Posteriormente, a Anvisa suspendeu, de maneira cautelar, a autorização de importação e de uso da substância em estudos. A entidade também decidiu abrir um processo administrativo "para apuração de possíveis infrações sanitárias" sobre os documentos ou informações apresentados pelos importadores para que a agência autorizasse a importação irregular, sob indício de fraude.

Já a Conep confirmava uma pesquisa autorizada em Brasília, que não foi executada. Depois, ela foi expandida para o Amazonas e outros estados, como o Rio Grande do Sul, o que já feria a exigência de ajustes na autorização de monocêntrica para multicêntrica, além de outras irregularidades.

O pedido para uso no RS aconteceu, segundo a Conep, somente depois da divulgação dos casos pela imprensa. Naquele momento, a pesquisa já estava suspensa definitivamente devido a inúmeras falhas na condução e com encaminhamento da avaliação ao MPF.

Na época, o Comando da Brigada Militar divulgou nota admitindo o teste do medicamento no hospital da corporação. Uma sindicância interna foi aberta para apurar o caso. A BM alegou que informações preliminares davam conta de "que o estudo obedeceu as exigências dos órgãos competentes e as normas legais aplicáveis aos procedimentos em questão".

Já o Hospital Arcanjo São Miguel, de Gramado, confirmou ter participado do estudo. A instituição sustentou que a pesquisa científica era não regulatória, ou seja, sem fins de registro, e que não teria necessidade de autorização da Anvisa para a sua realização. Além disso, alegou que seguia o protocolo aprovado pela Conep.

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