Por Thaís Espírito Santo, g1 Rio


Angela Davis, filósofa e ativista — Foto: João Cotta/ Divulgação/ TV Globo

A filósofa e ativista Angela Davis esteve no Rio de Janeiro para participar do Festival LED - Uma luz na educação e classificou como "momento assustador" a questão do PL 1904 - que equipara aborto ao crime de homicídio. Ela pondera, entretanto, que é necessário ter esperança em dias melhores.

A ativista, que falou com jornalistas na quinta-feira (20), véspera de sua participação no LED, comentou também a prisão dos acusados de serem os mandantes da morte da vereadora Marielle Franco. Para Davis, não basta punir os assassinos de Marielle para alcançar Justiça, mas realizar os sonhos que ela tinha na política, como uma forma de manter seu legado.

“Temos que tentar realizar seus sonhos [de Marielle], aprecio o que ela estava fazendo em termos de se livrar do autoritarismo militar e de desafiar a violência das incursões policiais” .

“Acho que é bom que as pessoas finalmente saibam que foi uma conspiração que envolveu a polícia e o delegado [Rivaldo Barbosa]. Eu penso na Marielle o tempo todo. Você sabe o quanto teria sido realizado nos últimos cinco anos, nos últimos seis anos?”

Em seguida, ela contou que comprou uma placa em um retrato de Marielle Franco em uma loja de Santa Teresa quando esteve na cidade antes da pandemia.

“Bem, eu abracei os sonhos da Marielle e acho que eles [e os meus] se cruzam. Acho que ela também diria que quer ver o fim do capitalismo”.

Angela Davis é uma das atrações do Festival LED

Angela Davis é uma das atrações do Festival LED

Amor pela Bahia

Além de Santa Teresa, Davis contou que ama ir à Bahia em suas férias e que quer voltar logo ao local, assim que possível. É apenas a segunda vez que ela vem ao Rio e, embora tenha vindo mais cedo para aproveitar a cidade, pegou um resfriado.

Sobre a recente polêmica do PL 1904, que equipara o aborto ao crime de homicídio e restringe direitos de vítimas de estupro, Davis declarou que não se pode acreditar que os direitos das mulheres são algo garantido para toda a vida. Ela lembrou ainda que há anos, mulheres se opuseram a esterilização forcada de mulheres pobres.

"Mas este é um momento assustador. Como eu disse, sempre temos que defender nossas vitórias que nunca podemos assumir", afirmou.

“E como eu estava dizendo, muitos de nós nos opusemos fortemente à forma como a luta pelo direito ao aborto era conduzida, porque não girava em torno da questão mais ampla da justiça reprodutiva", comentou.

“Muitos de nós argumentamos que deveríamos, é claro, lutar pelo direito ao aborto, mas todos nós lutamos ao mesmo tempo contra o abuso da esterilização porque um grande número de mulheres indígenas estava sendo esterilizado à força, um grande número de mulheres negras no Sul [dos Estados Unidos] estava sendo esterilizado", lembrou.

Para ela, o direito de escolha tem estado com mulheres brancas de classe média que têm acesso a medicina segura e de qualidade, ao contrário de mulheres negras e pobres.

Angela explica ainda que o movimento de luta não é feito em manifestações nas ruas a todo tempo, porque as pessoas precisam trabalhar para manter o sistema capitalista.

“ É importante reconhecer o papel que as manifestações de massa desempenham na construção de movimentos, mas não é só estar nas ruas. Nas ruas, conhecem o grande número de pessoas que estão conosco, mas isso não é a única coisa importante”.

“Estar nas ruas é a manifestação, mas não é o movimento. A manifestação é a face pública de um movimento que está sendo organizado todos os dias. É como John Burgess disse, é como o ensaio. É o ensaio para a revolução. Mas você não pode esperar que isso aconteça todos os dias. Sem um movimento expressivo nas ruas, muitas pessoas se sentem desmotivadas e sem esperança - como se estivessem sozinhas na luta", acrescentou.

“Nós temos que descobrir como gerar esperança. Bem, eu sempre confio em Mariame Kaba que dizia que a esperança é uma disciplina que você tem que aprender", lembrou.

Davis falou ainda sobre sua relação com outra intelectual, autora, ativista, professora e filósofa, a mineira Lélia Gonzalez, que conheceu em em 1970, quando ela visitou os Estados Unidos..

“Fiquei muito emocionada com isso. Acabei assinando uma petição para ela ganhar o Prêmio Nobel”.

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