Cinema

Por Célio Silva — Rio de Janeiro

Quando lançou "Lady Bird: A Hora de Voar", em 2017, a então atriz e diretora iniciante Greta Gerwig conseguiu ir mais longe do que muito cineasta de carreira mais duradoura.

Ela conquistou público e (parte da) crítica e foi lembrada pelas grandes premiações daquela temporada, culminando em sua indicação para Oscar de Melhor Direção.

Passado o hype, ficou no ar a dúvida: será que foi sorte de principiante ou ela veio para ficar como cineasta? Se continuar a mostrar o que ela fez em "Adoráveis Mulheres", a resposta é, felizmente, "sim".

Asssita ao trailer do filme 'Adoráveis Mulheres'

Asssita ao trailer do filme 'Adoráveis Mulheres'

Gerwig, diretora e roteirista, conta de uma maneira muito particular o livro "Mulherzinhas", escrito por Louisa May Alcott. Após diversas adaptações para o TV e para o cinema, a versão mais lembrada é a de 1994, estrelada por Winona Ryder.

A diretora já disse em entrevistas que leu o livro de Alcott muitas vezes quando era criança. E isso fica claro pelo cuidado e pela paixão que pode ser notada a cada cena de seu filme. Isso desperta no espectador o mesmo amor que ela possui pela obra original.

A trama é centralizada na família March, que luta para se manter unida durante os anos da Guerra Civil de Secessão nos Estados Unidos.

Em especial as quatro filhas Jo (Saoirse Ronan, a "Lady Bird'), Meg (Emma Watson, de "Harry Potter"), Amy (Florence Pugh, de "Midsommar") e a caçula Beth (Eliza Scanlen).

Saoirse Ronan, entre Florence Pugh e Emma Watson, estrela 'Adoráveis Mulheres' — Foto: Divulgação

As quatro têm aptidões artísticas. Jo quer ser escritora, Meg tem potencial para ser atriz (embora tenha mais vontade de se casar e ter filhos do que suas irmãs), Amy deseja se tornar pintora e Beth se destaca na música.

As jovens contam com o apoio e os conselhos da mãe, Marmee (Laura Dern, de "Jurassic Park"), uma mulher altruísta que sempre pensa no bem estar dos outros. Ela faz o possível para ajudar os mais necessitados, enquanto espera que o marido volte da guerra.

Por outro lado, há a Tia March (Meryl Streep), que usa sua ironia para mostrar às irmãs que o mundo é bem pior do que elas imaginam.

Enquanto busca seu lugar no mundo, Jo tem de lidar com questões impostas pela sociedade local, ao mesmo tempo que encontra em seu vizinho, Theodore "Laurie" Laurence (Timothée Chalamet, de "Me Chame Pelo Seu Nome" e "Ladybird"), uma amizade que jamais teve com um rapaz.

À medida que o tempo passa, o jovem rico, porém um tanto arrogante, vai se aproximando cada vez mais não só de Jo, mas de suas irmãs.

Meryl Streep participa da nova versão de 'Admiráveis Mulheres' — Foto: Divulgação

Presente e passado

Para contar essa história clássica de uma maneira que não pareça datada, Greta Gerwig acerta em misturar passado e presente.

São muitas idas e vindas temporais (representados pela fotografia que muda de cor quando quer mostrar um período diferente do outro).

O ritmo nunca cansa e faz com que o espectador (principalmente aquele que nunca leu o livrou ou viu alguma versão anterior) queira acompanhar Jo e suas irmãs com muito gosto.

A diretora também acerta em humanizar suas personagens ao lidar com conflitos que não se diferem muito dos que muitas pessoas têm que lidar na época atual, sem apelar para o melodrama, um problema que pode atingir até os cineastas mais tarimbados ao lidar com esse material. Até mesmo o humor está na dose certa, sem forçar a barra. E isso é um grande mérito.

Jo (Saoirse Ronan, de pé) apresenta uma peça com suas irmãs Meg (Emma Watson) e Amy (Florence Pugh) em 'Adoráveis Mulheres' — Foto: Divulgação

O elenco jovem

Vale destacar também a boa direção de atores de Gerwig, que deixa o elenco convincente em seus papéis. Talvez Emma Watson esteja um pouco abaixo de suas colegas. Ela acaba se tornando a menos interessante das irmãs March.

Ainda mais se compararmos com o trabalho feito pela ótima Saoirse Ronan como a protagonista. A atriz está cativante, tanto nos momentos mais leves quanto nos mais densos.

Florence Pugh parece estar cada vez mais conquistando espaço em grandes produções (em breve, será ainda mais conhecida por sua participação no filme da Viúva Negra, da Marvel).

Como Amy, Pugh se destaca mesmo com um papel que parece fútil em alguns momentos, mas com alguns ressentimentos a respeito de si mesma e da vida que levou. Nas cenas em que precisa emocionar, é impecável. Já Eliza Scanlen não chega a brilhar, embora seja competente.

Saoirse Ronan e Timothée Chalamet voltam a contracenar juntos em 'Adoráveis Mulheres' — Foto: Divulgação

Entre os homens, o que fica mais em evidência é Chalamet, que volta a mostrar ótima química com Saoirse Ronan.

O jovem ator consegue tornar Laurie um personagem que não ganha a antipatia do público nem mesmo quando é cruel com alguém que lhe quer bem, graças à forma que encontrou para deixá-lo interessante com seus conflitos pessoais.

E o elenco veterano

O veterano Chris Cooper (ganhador do Oscar por "Adaptação") chama a atenção como o amargurado, mas de bom coração, pai de Laurie.

Laura Dern consegue tornar convincente o bom caráter e a firmeza de Marmee. Meryl Streep não tem muitas oportunidades para tornar a Tia March um pouco mais do que a caricatura da personagem rica e antipática. Mesmo assim, a recordista de indicações ao Oscar mostra seu habitual talento.

Com muita graça e uma linguagem que transita entre o moderno e o tradicional, "Adoráveis Mulheres" se mostra um bom drama.

O filme consegue se comunicar tanto com o público antigo quanto com o mais jovem. Desde que ele esteja disposto a ver mais do que tiros e explosões em produções com roteiros rasos.

Se Greta Gerwig e suas 'Mulherzinhas' forem lembradas em premiações como o Oscar, não seria uma surpresa, mas sim uma justiça.

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