Indígenas comemoram, em setembro, vitória em julgamento no STF que derrubou o marco temporal, em Brasília — Foto: Reuters/Ueslei Marcelino
Os partidos Rede Sustentabilidade e PSOL, e Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) apresentaram na noite desta quinta-feira (28) ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação que pede a derrubada da lei que estabelece um marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
A ação foi apresentada no mesmo dia em que o Congresso promulgou e retomou a validade de trechos vetados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), entre os quais o que estabelece que os povos indígenas somente terão direito à demarcação das terras ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
No pedido à Corte, que terá relatoria do ministro Gilmar Mendes, as siglas e a Apib argumentam que o critério viola uma série de princípios constitucionais e que o texto aprovado pelo Legislativo enfrentou irregularidades durante a sua elaboração.
Segundo eles, a lei "pretende alterar a Constituição da República e desfigurar os direitos nela inscritos pelo constituinte originário, impondo, aos povos indígenas, retrocessos, violências e proteção deficiente".
"Resta nítido que a norma não atende a parâmetros mínimos de constitucionalidade, a infligir alteração substancial aos direitos dos povos indígenas e buscar inviabilizar seus direitos fundamentais às suas terras", afirmam.
O marco temporal é uma tese defendida pela bancada do agronegócio no Congresso e rejeitada por indigenistas.
O argumento, que estabelece a data de promulgação da atual Constituição como critério para validar a ocupação dos povos, entrou em vigor após ter sido promulgada pelo presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Também passou a valer trecho que abre brecha para garimpo nos territórios indígenas.
A medida vai contra decisão do STF, que considerou, em setembro deste ano, a regra inconstitucional.
Congresso derrota governo e retoma marco temporal para demarcação de terras indígenas
Disputa judicial
Na ação, as siglas pedem que o Supremo conceda uma liminar (medida cautelar) para suspender a validade de diversos trechos da lei, entre os quais o que estabelece o marco temporal para as demarcações.
As legendas argumentam que o texto contraria a tese fixada pelo STF no julgamento que invalidou a tese do marco temporal, em setembro deste ano.
"Este dito 'marco temporal' consiste em referência arbitrária, que não encontra qualquer amparo no texto constitucional em vigor, como em qualquer outra experiência normativa constitucional ou infraconstitucional brasileira."
Além das ações que pedem a derrubada da lei, na quinta, a Corte recebeu um pedido contrário — ou seja, para validar a lei. PP, PL e Republicanos querem que a Corte declare que a norma, após a entrada em vigor dos trechos que tinham sido inicialmente vetados, está de acordo com a Constituição.
Na ação, que será relatada pelo ministro Gilmar Mendes, as siglas argumentam que a lei "já nasce no meio de grande disputa política e de questionamentos quanto à sua constitucionalidade".
"Diante desse cenário, é bastante provável e previsível que se instale discussão jurisdicional quanto à validade da nova lei após a derrubada dos vetos, inclusive no âmbito do próprio STF, por meio da propositura de ações individuais e ações do controle concentrado de constitucionalidade", afirmam.
Para as siglas, a decisão do Supremo a respeito do marco temporal representou uma mudança de entendimentos anteriores sobre o tema, que levavam em conta as orientações fixadas no caso da reserva Raposa Serra do Sol.
Em razão disso, avaliam, a atuação do Congresso teria sido no sentido de garantir a segurança jurídica, consolidando em lei a decisão tomada naquela ocasião.
"[A aprovação do marco temporal] foi um ato político de reafirmação da competência constitucional e legislativa do Congresso Nacional e, enquanto tal, não pode ser objeto de controle de constitucionalidade do STF, especialmente em contexto de promulgação de conteúdo que até então era a própria jurisprudência do Tribunal", argumentam.
No julgamento sobre a demarcação da reserva da Raposa Serra do Sol, no entanto, a Corte tinha deixado claro que a decisão sobre a área valia apenas para aquele caso específico.
Ao analisar a regra para demarcação de terras indígenas de forma mais ampla, o Supremo estabeleceu um entendimento a ser aplicado a situações semelhantes.