Em busca do perfeito “parapapá”

qui, 30/08/12
por Zeca Camargo |
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“Nî ni ni ní, ni ni ní, niníí / Ni ni ni ni, niní”. Confesse: você, como eu, já acordou mais de uma vez com esse refrão na cabeça – pelo menos algum dia das três ou quatro últimas semanas. Eu não tenho vergonha de admitir isso – muito menos de dizer, logo no primeiro parágrafo, que eu vou fazer mais um post cujo “gancho” (como a gente fala no jargão jornalístico para justificar uma pauta) é o incrível vídeo de Nissim Ourfali para o seu “bar mitzvá” (eu sei, no último post, eu escrevi a festa com “h”, mas agora me corrijo, depois de ter percebido, no próprio vídeo do Nissim, que ele prefere a grafia aportuguesada). Não quero, porém, tripudiar sobre o assunto – imagino que o garoto (e sua família: tenho relatos de filhos de amigos meus que estudam no mesmo colégio que sua irmã mais velha, que são de cortar o coração) já passou por bons bocados com seu vídeo que já está próximo dos dois milhões de acessos. O que me interessa aqui hoje é o poder de um refrão bem feito. E aí, claro, o mérito não vai para o Nissim nem para o time de produtores que cometeu o crime menor de expor o garoto a um papel constrangedor – seja em cima da baleia ou simulando uma tirolesa. Quem merece o duvidoso aplauso é a dupla sueca Carl Falk e Rami Yacoub. Quem?

Bem-vindo, bem-vinda, ao fascinante mundo dos verdadeiros criadores de sucessos: uma lista de nomes totalmente desconhecidos (a não ser que você seja “da indústria”, ou melhor, da indústria fonográfica) que, há anos, põem na boca de seus ídolos os sucessos que você acorda cantando sem pensar. Falk e Yacoub são os autores oficiais de “What makes you beautiful” – o “megahit” que foi a base para o bar mitzvá de Nissim e, “de quebra”, lançou a carreira do One Direction, o grupo que ressuscitou um gênero que mais de uma geração considerava morto e enterrado (até, acreditava, alguns, para o bem da humanidade): o das “boy bands”. N’Sync, Backstreet Boys, Take That, Westlife, New Kids on the Block, Menudo – você conhece os suspeitos. One Direction (como qualquer busca simples na internet vai te informar) surgiu da mente do grande cara por trás do programa da TV inglesa “X Factor” – aquele que o Sílvio Santos inventou há anos com o modesto nome de “Show de Calouros”, mas que foi repaginado e agora é um sucesso internacional (menos, ironicamente, por aqui) -, Simon Cowell. Foi ele que viu os garotos nos bastidores do seu show e achou que juntos eles dominariam o mundo. Bingo!

(Num artigo recente na “The New Yorker”, Sasha Frere-Jones, ao comentar sobre os garotos, tem a tirada mais cruel: “O que o One Direction realmente parece, no entanto, é um bando de garotas. A banda toca um tipo de pop rock que foi popularizado, nos últimos dez anos, por mulheres”. E segue dando exemplos como P!nk e Kelly Clarkson – sem esquecer, claro, de Kate Perry! Mas eu, já sei, divago…)

Ali nascia mais um veículo para canções totalmente pré-fabricada por profissionais que entendem do assunto e ganham milhões de dólares para cuspirem conquistadores de paradas de sucesso. Falk e Yacoub, apesar de eu tirar o chapéu para o êxito de “What makes you beautiful” (realmente todos os trechos dessa música são irresistíveis!), são pequenos jogadores num cenários de nomes que são ainda mais respeitados. Curiosamente (ou não, se você se lembrar da longa tradição daquele país no pop, que vai de Abba a Roxette a Ace of Base, e inclui até Peter Björn and John, Robyn, The Hives e The Cardigans – para satisfazer os mais alternativos) o maior mestre pop dos últimos dez, quinze anos, vem também da Suécia. O nome dele é Max Martin – e se você acha que eu estou exagerando, dê uma conferida na sua página da Wikipédia, e veja se você reconhece alguns artistas com quem ele já trabalhou. Se você quiser continuar na Escandinávia, tem uma dupla de da Noruega chamada apropriadamente de Stargate (“Portal das estrelas”), que já assinou hits para Rihanna e Wiz Khalifa. E a lista fica ainda maior quando atravessamos o Atlântico.

Por exemplo, sabe qual foi a música do verão americano, não sabe? (Lembrando que o verão lá é agora, termina junto o nosso inverno, agora em setembro). “Call me maybe”, de uma canadense relativamente desconhecida chamada Carly Rae Jepsen. Múltiplos de 140 caracteres já foram gastos na internet para decidir se a música foi um sucesso apenas por conta do endosso de Justin Bieber (ele mesmo, alguém que não economiza em produtores para criar sucessos – e eventualmente até compô-los) ou se ela tem seus próprios méritos. Sem a pretensão de encerrar de vez o assunto, para mim está claro que “Call me maybe” seria um sucesso de qualquer maneira – por uma simples razão: seu refrão poderoso. E como Carly Rae conseguiu isso? Com a velha forma, acredito, de 1% de inspiração e 99% de transpiração.

Uma das coisas mais fascinantes do pop é justamente o quão pouco espontâneo ele é – e não estou falando dos anos mais recentes não, mas de um fenômeno que vem desde os primórdios da parada de sucesso, nos anos 50 e 60. Já ouviu falar da “fábrica da Motown”? Pois então, durante boa parte dos anos 60, Barry Gordy Jr. criou literalmente uma “usina” de sucessos, usando artistas tão talentosos – para citar apenas alguns – como The Supremes e um tal de Jackson 5… Se você for procurar os créditos de cada música, no entanto, vai sempre encontrar nomes recorrentes – e desconhecidos do grande público: “operários” do pop que estavam por trás de compor um sucesso atrás do outro.

Não estou aqui diminuindo o talento individual de artista nenhum. Do próprio Michael Jackson a Lady Gaga, o pop sempre teve prodígios suficientes para garantir o brilho de um trabalho autoral. Mas o que quero celebrar aqui hoje – e questionar também – é o dom que certas pessoas têm de colocar uma música no nosso ouvido para a eternidade. Celebrar, e ao mesmo tempo questionar: será que nós, brasileiros, habitantes do país da música, somos capazes de nos esforçar o suficiente para atender a demanda do mundo pop de hoje?

Por aqui, o talento para a música sempre foi algo que “tiramos de letra”. O Brasil, felizmente, é terra fértil de compositores, músicos e cantores – e os sucessos que emplacamos através das décadas (alguns deles internacionais) vieram como “presentes das musas”, algo que os deuses, de tão encantados com a beleza desta paisagem e a alegria deste povo, ofereciam “de mão beijada”. Desde que sou criança, vi essa queda musical ser comemorada com orgulho. O que era sucesso nunca pareceu fruto de um trabalho, mas de um natural desdobramento de qualidades criativas desses artistas. E talvez essa tenha mesmo sido a realidade, pelo menos até que a nosso gosto pop ficou um pouco mais internacional e os artistas (e compositores e produtores) começaram a perceber que, se o suor não superasse a imaginação, não ia ter música deles nas rádios, nas novelas, e na memória das pessoas.

Quando isso começou a acontecer? Eu tendo a achar que isso chegou aqui no início dos anos 80, por conta de um cara chamado Ritchie – um excelente músico inglês que se encantou com o Brasil e, ainda que de maneira indireta, ensinou esse povo aqui que o pop também é uma fórmula matemática. Para entender o que foi a febre de “Menina veneno” – o sucesso que lançou a carreira de Ritchie no Brasil – você tem que ter no mínimo uns 40 anos. Os mais jovens, lamento, vão ter que acreditar em mim ou fazer sua pesquisa na internet para acreditar que ele foi mesmo o responsável pelo primeiro “monstro pop” do nosso cenário. Coladinho nele vieram nomes como RPM e Cazuza – e hoje, Ivete, Teló (mais sobre ele daqui a pouco), Jota Quest, Gaby e até mesmo Los Hermanos e Maria Rita devem um pouco de seu sucesso ao caminho que Ritchie abriu.

Arrisco dizer que nenhum desses artistas – que eu admiro e eventualmente até já entrevistei – teria a lucidez de reconhecer isso. De certa maneira, acho que o “ranço da Musa” ainda assombra nossos compositores e artistas, como se a aceitação de que eles um dia quiseram intencionalmente criar uma coisa popular fosse uma espécie de pecado criativo. Usando com ironia a música de 1975 de Gilberto Gil, é como se o mantra “Essa é pra tocar no rádio” (que, ironicamente, é uma das músicas menos fáceis de tocar no rádio que esse grande músico já compôs) fosse uma transgressão a ser escondida e não uma confissão auxiliadora.

Como uma triste consequência, nosso pop permanece infinitamente aquém do seu potencial de nos hipnotizar como súditos. Sei, claro, de processos de criação de alguns álbuns contemporâneos que são extremamente cuidadosos e esforçados. Mas também já ouvi de vários artistas que a seleção do que gravar passa mais por um filtro intuitivo do que “técnico” – tipo, “se eu ouvir e achar que o povo vai gostar, é porque vale a pena entrar no disco” (com o fator “Musa” novamente tendo uma participação desproporcional nessa escolha). Ou, pior, temo que muitos lançamentos sejam feitos com base no critério de dois artistas “pop sertanejo” bem jovens (e, para mim, desconhecidos) que outro dia ouvi conversando durante um voo. “Terminou de gravar o novo CD?”, perguntava um deles. E o outro respondia: “Olha se naquilo que eu gravei essa semana, eu não deixei de cantar nenhuma letra e não tem erro de português, por mim, pode lançar!”. Pois é… Pelo menos ele se preocupava com os erros de português…

O mesmo não pode ser dito do novo sucesso – ou, melhor dizendo, da nova promessa de sucesso – de Michel Teló, “É nóis fazê parapapá”. Calma, não estou aqui de professor primário pegando no pé de uma concordância errada (preciso explicar?) – eu mesmo de vez em quando dou uma distraída aqui neste espaço (e corrijo assim que alguém me chama atenção). Minha questão com “Parapapá” não é essa, mas… Será que esses dois artistas, bons o suficiente para nos trazer dois dos maiores sucessos de todo o tempo do nosso pop – “Assim você mata o papai” e “Ai se eu te pego”  (eu sei, eu sei, cada uma com seus devidos autores) – ao escolherem algo para cantar junto, esforçaram-se mesmo para escolher o melhor refrão… pra tocar no rádio, ou simplesmente pegaram o primeiro corinho fácil e saíram gravando logo antes que a temperatura de suas respectivas carreiras esfriasse?

Ouvi “Parapapá” algumas vezes – e fã que sou de “Papai” e “Te pego”, não consegui ver nada de diferente nela. Parece apenas uma variação da onda de músicas com eufemismos para sexo – “Tchun tcha”, “Lê lê lê”, e quejandos – sem o brilho e o entusiasmo dos sucessos anteriores. Uma solução fácil para uma carreira nada simples: a de astro pop. Será que vale a “lei” dos dois garotos que vi conversando no avião, “gravou, tá bom”? O ciclo de vida de um artista hoje é tão curto, que eu até consigo entender essa vontade de não sumir de cena – para não ser esquecido. Mas é bom lembrar que tudo tem um preço – e até mesmo as grande “boy bands” um dia desapareceram (longa vida ao One Direction!). E que se alguém não tomar cuidado, suas músicas logo vão deixar de ser grandes refrões que fazem a gente se apaixonar para se transformarem apenas num amontoado de sílabas que, hum, não fazem sentido.

Nesse cenário preguiçoso, Luan Santana me parece uma exceção. Outro dia ouvi seu  novo trabalho, “Quando chega a noite”, inteirinho – e fiquei realmente surpreso com a preocupação do cantor em “acertar” cada uma de suas faixas, como se fosse uma lição de casa. Tudo, claro, sem perder a espontaneidade e o carisma que ele tem como artista. Mas me aprofundar nesse álbum significaria agora estender um pouco mais esse texto de hoje, que já está deveras longo. Aqui lanço então essas questões e encerro o post – esperando, quem sabe, que você contribua para o debate.

E enquanto você pensa o que responder, cante comigo: “Duas irmãs e um irmãozinho…”.

O refrão nosso de cada dia

White light”, George Michael - surpreso ou surpresa de ver George Michael por aqui? Achei que num post sobre o poder da criação musical ele não poderia ficar de fora. Por isso, aqui vai sua mais nova música – que ninguém tem muita paciência de escutar, afinal esse é aquele cara que toca “Freedom” em noite de flashback, não é mesmo? Pois dê a você mesmo – ou a você mesma – essa chance. Além de ser uma ótima música para a pista de dança, este é um clipe lindo, que tem todo o imaginário da carreira de Michael desfilando, de top models a policiais. E até uma zebra! Apenas para registro, ele tem menos acessos do que o bar mitzvá do Nissim. São esses os tempos que vivemos…

Mais legal do que quando vamos pra Baleia

seg, 27/08/12
por Zeca Camargo |
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A gente para uma semana – e olha o que acontece! Nissim Ourfali é a nova Rebecca Black! Não cabe a mim explicar esse novo e estranho fenômeno – que, para alguns, claro, já é um evento da era mesozoica, uma vez que o bar mitzvah do Nissim já teria sido superado por Gina Indelicada. Eu não criei essas coisas, caro leitor, cara leitora – não tenho nada a ver com elas. Apenas as vi passar com inesperada intensidade pela tela do meu computador (que, ao contrário daquele que Nissim canta com louvor, não é um PC – e eu não posso deixar de elaborar que se nosso garoto tivesse um Mac, as críticas a sua pessoa seriam menos cruéis, mas eu, claro, divago).

À beira dos 50 anos, já tendo visto as mais bizarras manifestações culturais virem e irem, eu já deveria ter criado uma espécie de imunidade para me proteger desse tipo de, hum, atração! Eu já devia saber que os debates culturais não conhecem limites em sua (pouca) profundidade – e que não é agora que eu vou criar caso com 1.619.751 pessoas (o número de visitante para o vídeo do Nissim no YouTube). De minha parte, confesso que o refrão que dá título ao post de hoje é realmente irresistível (graças, claro, ao One Direction), e que não tenho conseguido começar meu dia bem sem ouvir Nissim cantá-lo pelo menos uma vez. Mas, fora essa distração ligeira, preferi preencher esses dias em que tive de descansar (por conta de uma infecção pulmonar) na passividade feliz que um espectador de cinema um dia já teve – isto é, antes de as pessoas se sentirem obrigadas a twittar sua impressão sobre cada cena que estão vendo na grande tela, transformando uma sala de projeção em um grande palco iluminado.

Apesar de a programação de estreias das distribuidoras não colaborar, teimosamente obriguei-me a ir ao cinema nesses dias. Preenchi boa parte desse meu tempo “livre” (período de convalescência nunca é exatamente tempo livre, já que você está preocupado em ficar bom logo!) lendo e ouvindo música, claro. (Alt-J, já adianto, fez-me boa companhia, bem como Antony and The Johnsons com seu novo disco gravado ao vivo, um japonês enlouquecido chamado Shintaro Sakamoto, e uma banda nova chamada Purity Ring). Mas o cinema também reclamou seu espaço, já que fazia tempo que eu não ia ver um filme que não fosse uma obrigação – algo que eu me sentisse compelido a assistir simplesmente porque a onda pop passaria inevitavelmente por ele (“Cavaleiro das trevas” etc.).

Assim, foi com renovado entusiasmo que encarei duas recentes estreias alternativas – ok, uma delas nem tão alternativa assim, mas pelo menos não se tratava de uma grande produção baseada em um super-herói… E acabei me divertindo mais do que seu eu tivesse ido pra Baleia (e juro que essa vai ser minha última referência ao bar mitzvah do Nissim Ourfali!).

Vou começar com “O ditador” – que eu acho que tem mais chances de você também ter visto. Esse é o novo filme de Sacha Baron Cohen – que talvez você conheça melhor pelo nome de Borat (e, com um pouco de sorte, até como Brüno). Das poucas coisas que este blog pode se orgulhar é de existir há tempo suficiente para ter acompanhado a carreira de Choen no cinema desde o início. Em dezembro de 2006 já assinalava aqui o pequeno abalo sísmico que foi a chegada de “Borat”. E, quase três anos depois, desdobrei-me em elogios para “Brüno”. Agora chegou a vez de Aladeen – o adorável tirano que governa o estrategicamente bem localizado país conhecido por Wadiya como se fosse seu parque de diversões particular. Trata-se de mais um personagem impagável criado por Cohen – quase tão bom quanto o próprio Borat – e que me fez rir como eu achei que não seria mais possível desde o meu diagnóstico de princípio de pneumonia…

Diferente de seus outros filmes porém, “O ditador” não é apresentado como um documentário – nem mesmo um “falso documentário”. As aventuras de Aladeen em Nova York são definitivamente roteirizadas – e é impossível não se perguntar se o resultado não teria sido diferente se Cohen não tivesse tomado esse caminho. Eu mesmo não consigo entender essa decisão. Será que ele achou que, depois da novidade de “Borat” e uma “segunda vida” em “Brüno”, sua cara seria conhecida demais para que ele tentasse emplacar como um terceiro “personagem da vida real”? Ou teria o ator considerado a trama de “O ditador” absurda demais para que pudesse ser filmada como algo da vida real?

Tendo a descartar essa última possibilidade, uma vez que – se você se lembra bem dos filmes anteriores – as situações criadas por Borat e Brüno eram absurdas o suficiente para que fossem praticamente inviáveis de serem filmadas. Isso, como sabemos bem, nunca foi um obstáculo para Choen. Minha suspeita é a de que ele resolveu tentar uma abordagem nova dessa vez – simplesmente para tentar alguma coisa diferente. Com isso, a maneira como nos acostumamos a ver Cohen nas telas sofre algum prejuízo – não exatamente na sua graça (a boa notícia é que ele continua extremamente engraçado), mas na sua ousadia.

Sacha Baron Cohen faz o possível para não parecer menos irreverente – mesmo preso às linhas de um roteiro. Como você já podia esperar, as cenas mais engraçadas são também as mais grosseiras – como na impagável sequência em que Aladeen é responsável por um parto natural no chão da mercearia em que trabalha (“Má notícia”, diz ele para a mãe, “É uma menina! Quer que eu jogue no lixo?”). O “politicamente correto” não passa nem perto de nenhum diálogo – judeus, muçulmanos, cristãos, negros, gays… todos são indiscriminadamente maltratados. Mas eu teria preferido o choque de ver as mesmas cenas num contexto de realidade – nem que fosse só para ver a reação natural das pessoas diante das atrocidades que Aladeen desfila.

Insisto: “O ditador” é extremamente engraçado – ainda mais quando você olha o que foi lançado na última temporada sob o surrado rótulo de comédia. Cohen ainda está anos-luz na frente de qualquer comediante do cinema atual – e eu vou assistir a qualquer coisa que tenha seu nome pelas próximas décadas. Mas esse humilde fã pediria que, da próxima vez, ele tivesse a ousadia de desafiar a caretice vigente não com uma ficção, mas com uma ponta realidade.

O outro filme bom que fui ver esses dias me deixou ainda mais satisfeito – e sem precisar provocar uma risada. Eu adorei o novo filme de Fernando Meirelles, “360” – na contramão de muitos críticos que andei lendo na internet, e de boa parte do público que se atreveu a pagar ingresso para ver um trabalho que, à primeira vista, não podia ser mais diferente daquele filme que lançou o diretor numa carreira internacional: “Cidade de Deus”.

Alguém ainda se lembra de “Cidade de Deus”? A imprensa, claro, está aí justamente para não deixar ninguém esquecer que este é o trabalho seminal de Meirelles – e teimosamente insiste que todo filme que ele fizer para o resto da sua vida seja medido em função dele… Bobagem. É o mesmo tipo de cobrança tosca que Woody Allen sofre desde “Noivo neurótico, noiva nervosa”; ou Scorsese desde “Touro indomável”. Bons diretores – e Meirelles certamente faz parte dessa lista – devem ter espaço para se exercitar, experimentar coisas diferentes, até oferecerem algo tão genial quanto o “carro-chefe” que os tornou famosos. Os dois diretores que citei acima têm carreiras repletas de altos e baixos – e mesmo em momento “baixos”, produziram coisas fantásticas! O cinema é uma forma de expressão tão grandiosa que quase não permite margem para erros – ou acertos menores: ou o diretor emplaca um trabalho genial atrás do outro ou sua reputação é logo colocada em jogo.

Estou aqui a explicar o óbvio, eu sei. Mas é que eu ainda me incomodo com críticas tacanhas que automaticamente condenam um trabalho no mínimo interessante, só porque ele não é o “trabalho de gênio” que o próprio crítico está esperando… Qual o problema de gostar de um filme “apenas” bem feito? “360” é exatamente isso. Se for para colocar numa escala do trabalho do próprio diretor, ele está, claro, aquém de “Cidade de Deus”. Aquém também de “O jardineiro fiel” – talvez meu filme favorito do diretor. Mas é bem melhor que “Ensaio sobre a cegueira”. O bom desafio, porém, é olhar para “360” sem compará-lo com nada. Tenho certeza de que essa é a melhor maneira de aproveitar esse filme.

Resumir seu enredo aqui é um exercício inútil. Meirelles trabalha dessa vez com uma história circular: uma rotina ordinária na vida de uma garota eslovena que resolve entrar no mercado da prostituição dá início a uma série de eventos aparentemente independentes mas que estão, como vamos concluir até o final do filme, estranhamente conectados – e tudo volta para a história inicial da prostituta. São detalhes demais – e construções minuciosas demais – para eu perder tempo aqui com elas. O que interessa é que ao longo de quase duas horas você fica totalmente seduzido por vidas absolutamente ordinárias, fascinado menos pela possibilidade de que aquelas sejam suas histórias também do que pela habilidade do diretor em nos conduzir ao sabor do acaso que embala os próprios personagens.

Esse mérito, Meirelles divide com atuações maravilhosas – desde nomes desconhecidos para o grande público, como Vladimir Vdovichenkov, até nobres ganhadores de Oscar como Anthony Hopkins (seu discurso num encontro do AA, depois de uma das sequências mais climáticas do filme, é uma “aula máster” que qualquer ator, em qualquer estágio da carreira, deveria ser obrigado a assistir!). Tão encantado eu fiquei com o trabalho de todo elenco, que na conclusão de “360” (que chegou tão rápido que me pegou de surpresa) eu tive vontade de fazer uma coisa que não faço há anos: comprar outro ingresso e assistir a tudo de novo logo em seguida.

Infelizmente não pude fazer isso, pois tinha uma consulta marcada – na expectativa vã de que eu já estivesse magicamente curado dos meus aborrecidos sintomas. Mas pelo menos fiquei feliz de ter aproveitado essa minha folga com dois filmes que, só para variar, não insultavam minha inteligência.

O refrão nosso de cada dia
“This is for Matilda”, Alt-J h – falei que Alt-J foi ótima companhia para mim nesse período de recuperação – e não estava brincando. Ouça você também essa que é uma das melhores faixas do seu álbum de estreia, “An awesome wave” – e veja se você concorda comigo sobre fato de esse ser, desde já, um dos melhores discos de 2012! Acho que já sei a resposta…

 

“Satisfaction”

seg, 20/08/12
por Zeca Camargo |
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Caro leitor, cara leitora. Não sou de jogar a toalha. Mas também não sou de fazer as coisas pela metade. Por isso escrevo este breve parágrafo apenas para dizer que esta semana – em virtude de projetos pessoais (2013, pelo menos para mim, já está aí!) e mais um compromisso com minha saúde – vou deixar de publicar aqui por uma semana. Sei que conto com a sua compreensão. Segunda que vem retomamos. Como “passatempo”, deixo aqui essa foto, tirada na frente de um registro histórico: a fechada antiga de um dos aeroportos por onde passei nos últimos meses. Foram vários – como você talvez tenha acompanhado. Mas uma coisa eu garanto: até esse aeroporto, “despojado” como era então, pareceu-me num estado melhor do que qualquer um dos nossos aeroportos brasileiros – que, só lembrado, aguardam algumas dezenas de milhares de visitantes que virão para a Copa e para as Olimpíadas. Será que você consegue adivinhar que aeroporto é esse? Boa semana!

A festa é nossa

seg, 13/08/12
por Zeca Camargo |
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“Ladies and gentlemen, I shall now introduce you to Mr. Renato Sorriso”. A frase – que, rapidamente, quer dizer “Senhoras e senhores, eu agora vos apresento o Sr. Renato Sorriso” – não foi dita ontem na cerimônia de encerramento das Olimpíadas de Londres, durante a sensacional festa de encerramento do evento. Mas quando as luzes se apagaram e todas as atenções focaram no que a próxima cidade-anfitriã iria apresentar como “cartão de visitas” para a festa em 2016, era como se os alto-falantes do estádio olímpico – que já haviam suportado todo tipo de tributos (Freddie Mercury!) e insultos (Taio Cruz – fala sério!) – anunciassem a frase acima em altos brados. Nada, porém, foi dito – e, mesmo assim, mostrando que, pelo menos neste canto do mundo, a gente ainda sabe falar muita coisa só com o corpo, o gari mais famoso do nosso Carnaval deixava claro para todos (e em qualquer língua) que, quando o assunto é festa, pode deixar que nós aqui mandamos bem.

A escolha de abrir nossa apresentação com Renato Sorriso pareceu, a este humilde blogueiro, das mais felizes. Eu sei o que você – e quase todo mundo – estava esperando. Uma bateria de escola de samba? “Garotas de Ipanemas”? Mulatas notas 10? Índios em plumagens coloridas? “Bachianas brasileiras”? Um “exército de Giseles Bündchens”? De certa maneira, essas coisas acabaram todas aparecendo na relativamente curta participação do Brasil. Mas antes de tudo – e para dar o tom – o que o inglês viu (e o resto do mundo também) foi um cara totalmente desconhecido exercitando o nosso esporte favorito: a busca da alegria com obstáculos!

Nas modalidades esportivas já conhecidas não tivemos a mais feliz das Olimpíadas (e, por favor, não me provoque com o vôlei masculino – confiando na minha operadora de telefone, driblei um domingo ocupado achando que eu poderia assistir ao Brasil x Rússia no meu “smartphone”, até que no meio do crucial terceiro set, recebo um recado dizendo que eu excedi meu limite, que eu achei que não existia pela pequena fortuna que pago pelo meu plano, e que se eu quisesse continuar utilizando a internet, deveria pagar mais R$ 0,10 por megabite… isso, claro, se eu conseguisse acessar o site da operadora para aceitar o novo “negócio”, o que era praticamente impossível; privado então da torcida direta, pedi socorro a uma amiga também fanática por vôlei, que foi me enviando a triste escalada russa no placar por mensagens de texto, o que fez de mim talvez o único torcedor de vôlei ontem que sofreu ponto a ponto por whatsapp! – mas eu, claro, divago…). Com um total de 17 medalhas, parece que fomos bem na quantidade, mas não exatamente na qualidade – “apenas” 3 ouros, como reclamou boa parte da imprensa e da torcida -, o que colocou uma perigosa pulga atrás da orelha tanto de atletas como de patrocinadores para 2016.  Nas categorias “informais”, no entanto, essa modesta introdução traz junto a promessa de que as próximas Olimpíadas serão talvez as mais divertidas do milênio (alguém que estiver lendo isso em 3001, por favor, confirme essa previsão): a gente vai mostrar que essa confraternização esportiva vai ser, no mínimo, divertida!

Se você torceu o nariz para esse meu esboço de ufanismo, calma. Ninguém mais do que eu – como quem me acompanha aqui há um bom tempo sabe bem – faz uma campanha tão ferrenha contra os clichês (e inclui aí, claro, os clichês “nacionalistas”). Mas entenda: aquilo ali é uma festa mundial. E, por mais piegas que isso pareça, é uma das poucas oportunidades de mostrar para todos os outros países porque o seu é diferente. Ao ter sido escolhido como sede das próximas Olimpíadas, o Rio eleva sua vocação de “cartão postal” à potência máxima – e tenho a convicção de que, se a gente não tirar partido disso agora, vamos deixar escapar uma grande chance de nos renovarmos diante de todo o planeta! Pelo que vi ontem lá em Londres, começamos a aproveitar esse momento muito bem. Dirigido por duas mentes brilhantes – as de Cao Hamburguer e Daniela Thomas – o espetáculo usou todos os clichês que eu listei acima – dos índios (catapultados ao século 21 com cocares de LED) às “Giseles”, resumidas sensualissimamente na figura de Alessandra Ambrósio (não vou ficar aqui descrevendo o passo a passo do show que você encontra sem dificuldade aqui mesmo na internet). Mas ao mesmo tempo apresentou um Brasil que eu mesmo gostei de ver – com clichês e tudo!

Senti-me representado. E até um pouco mais: vingado! Sim, porque o sentimento, depois do desfile de bandas e artistas pop na cerimônia de abertura – que só mesmo um país como a Inglaterra, tão fundamental na história da música no último meio século é capaz de oferecer – era, confesso, de ligeira humilhação. Naquela sexta-feira, 27 de julho, entre um salto de paraquedas da Rainha e uma declamação de Kenneth Branagh, nós vimos Dizzie Rascal, Arctict Monkeys e Paul McCarteny (para citar apenas alguns artistas que se apresentaram ao vivo no estádio olímpico) e ouvimos de David Bowie a Sex Pistols a Soul II Soul a New Order a Frankie Goes to Hollywood – etc. etc. etc… E para não deixar dúvidas quanto a essa “hegemonia” pop, lá estavam ontem, The Who, Annie Lennox, George Michael, Spice Girls – e, bem, Taio Cruz…

Diante dessa seleção imbatível, nós aqui começamos o inevitável, o mais-que-previsível exercício masoquista de tentar fazer uma lista de artistas brasileiros que hipoteticamente estariam na Rio 2016 – e que pudesse ser comparada a essa. Entre pagodeiros, cantores de axé, sertanejos, neo-sertanejos, bregas, emos, folks, emepebistas e tantos outros alvos fáceis, poucas propostas sérias sobraram. Mas o que mesmo quem encarou o exercício dessa escalação um pouco mais a sério não percebeu é que tentar reproduzir o mesmo feito que os ingleses nesse sentido é um projeto totalmente fútil. Não tenho dúvida de que vamos ter muita música quando a festa abrir por aqui – e minha esperança é a de que a gente vá de Jobim a Teló, de Vinícius a Amarantos, de Sandy a Pitty, de Lamartine à Rita Lee, de de RC a Lulu (mais sobre isso, daqui a pouco). Mas esse será apenas um aspecto da nossa apresentação.

Assim como Renato Sorriso ganhou a todos com o poder do seu anonimato (internacional, claro, já que entre nós ele é bastante conhecido), o que nós temos que mostrar é um Brasil intangível, que apenas começa nas imagens, viaja pelos sons e se resume na imaginação de cada um. Quem souber conduzir esse trajeto dos sentidos – seja a dupla que já mostrou que é boa nisso, seja quem mais vier se agregar a esse time – vai ganhar algo muito mais valioso do que um punhado de medalhas: o reconhecimento de ter sabido para o mundo o que é ser brasileiro.

Não estou diminuindo o valor nem o poder das medalhas. Só eu sei o quanto lamentei o fato de não termos saído com ouro da já citada final do vôlei masculino ontem de manhã. Mas aquele brilho que os atletas vitoriosos carregam no pescoço serão meros reflexos da alegria que nenhuma expressão facial ou corporal consegue conter. Precisa de um exemplo, hum, “visual”? Lembre-se das meninas do vôlei comemorando a vitória no último sábado. Está com a imagem delas no pódio explodindo de alegria? É disso que eu estou falando.

Nossa maior habilidade não está no domínio de uma bola – ou um remo, ou uma rédea, uma vela, uma vara, uma raquete. Está na capacidade de inventar outras coisas com o que nos for oferecido. Com o perdão do clichê (mais um!), futebol aqui – mesmo os que ainda não se conformaram com a derrota para o México na final de ontem vão concordar – vira arte. Ginástica vira samba. Suor vira ponto. E ouro vira festa. A gente é capaz de inventar, de se virar, de transcender. É nisso que nossos atletas já estão pensando, de olho em 2016. Dificilmente bateremos a trinca dourada desse último pódio – Estados Unidos, China, Reino Unido. Mas se liga, Cazaquistão (e isso, para quem passou despercebido, é uma brincadeira!). Nas raias, quadras, campos, pistas, ringues, águas – onde for – a gente vai criar alguma coisa especial cuja promessa estava clara no abraço que Seu Jorge, BNegão e Marisa Monte mandou para o mundo inteiro ontem à noite.

Numa cerimônia que parecia que tinha mais finais que um filme de Spielberg, o que o Brasil fez não foi um encerramento: foi um abre alas. (E olha que nem colocamos a comissão de frente de Paulo Barros ainda na avenida…). Foi como uma carta de intenções, um esboço de compromisso. Vocês querem chegar em 2016? Bem-vindos! É isso que a temos a oferecer: o conforto de uma química que, especialmente hoje em dia (como diria até Madonna) incomoda a muitos, mas que em última análise só nos dá prazer. Somos mestres da mistura. E é isso que temos para mostrar.

Ia terminar no texto de hoje falando justamente de uma dessas misturas que deram muito certo – essa que conferi recentemente no Rio: Lulu Santos cantando Roberto Carlos. Mas me dei conta que isso não é assunto para rodapé! Assim, mais uma vez, adio esse tema – pela própria importância que quero dar a ele. Não sem antes assinalar (e já apresentando o “Refrão nosso de cada dia” de hoje) que minha sugestão para o “set” list da Rio 2016 vem justamente de Lulu. Muitos não colocariam essa música entre suas dez favoritas do seu vastíssimo repertório. Eu, porém, faço questão de assinalá-la como uma das mais preciosas que o cantor já compôs. E que, por uma casualidade feliz, traz uma letra que tem tudo a ver com o espírito olímpico que certamente vai tomar conta de todos nós. “Nós somos muitos, não somos fracos…”. Sabe qual é? Se precisar de ajuda, clique aqui . E até daqui a quatro anos – quer dizer, até quinta!

Uma novela por capítulo

qui, 09/08/12
por Zeca Camargo |
categoria Todas

“Avenida Brasil”, terça-feira, 07 de agosto de 2012: Jorginho descobre quem é seu avô; Darkson declara seu amor por Tessália – que o rejeita, volta para casa e quase pega um flagrante de seu marido, Leleco, com a ex-mulher, Muricy; Muricy, para evitar o pior, esconde-se embaixo da cama do casal; na mansão de Tufão, a família está em polvorosa porque Carminha sumiu mais uma vez; enquanto isso, Adauto coça seu pé…; Verônica protesta diante de sua filha Débora contra a mudança de Monalisa do bairro suburbano do Divino para seu prédio na Zona Sul do Rio; Cadinho sofre para cumprir sua nova rotina de “guarda compartilhada” entre suas três mulheres; Olenka pede para se separar de Silas; no baile funk, Leandro provoca Suellen chamando seu marido, Roni (que é apaixonado por ele), de “amiguinha”; e Nina, de maneira triunfal, marca mais um ponto na sua vingança contra Carminha, armando um flagrante seu com Max no barco que ele comprou com o dinheiro da própria vilã.

Fiz questão de dar a data em que tudo isso foi ao ar para quem por ventura for ler isso no futuro não ter a impressão que essa é a descrição do capítulo final de “Avenida Brasil”. Não estamos sequer na última semana – nem no último mês. Essas não são nem mesmo as “emoções finais” da novela que fez o brasileiro redescobrir o prazer de se ver novela. Esse foi apenas mais um capítulo da trama de João Emanuel Carneiro. No dia seguinte, a vida de todos esses personagens seguiu seu curso – alguns de maneira mais engraçada (Muricy e Leleco), outros em contornos mais trágicos (Carminha e Max). E a nossa vida, de pobres (e encantados) telespectadores, parou por mais alguns minutos de uma noite deliciosamente tensa.

Você certamente não precisa de mais um texto elogioso para a novela que conquistou todo o Brasil – e o autor dessa obra-prima da cultura pop tampouco precisa de mais um comentário laudatório sobre seu talento, nem aqui (um dos primeiros posts do blog foi sobre minha paixão por “Cobras e lagartos”) nem em nenhum outros espaço, para consolidar sua consagração. (E, só para fechar, a última coisa que “Avenida Brasil” precisa – que isso fique bem claro para os espertos de plantão que já estão se armando para mandar um comentário dizendo que fui obrigado a escrever isto hoje aqui porque trabalho na mesma emissora que produz e transmite a novela – é um empurrãozinho deste humilde blog para ganhar alguns pontos na audiência…). Mas resolvi discutir sobre isso hoje com você (adiando mais uma vez falar sobre o show de Lulu Santos cantando Roberto Carlos – que eu ia até juntar com a entrevista que fiz com Maria Rita sobre esse seu show cantando Elis, e que deve ir ao ar no “Fantástico” deste domingo), enfim, escolhi falar sobre “Avenida Brasil” de novo (a primeira vez foi na estreia) porque justamente esse capítulo da última terça-feira beirou a perfeição.

Não estou falando de outras tantas perfeições que a novela já conquistou – a do texto, da direção, da captação de imagem, de linguagem visual, e, claro, das inúmeras interpretações marcantes. Mas a perfeição de conter todo o universo de sua história em um capítulo singular – algo que é, certamente, um trunfo de João Emanuel. Eu até já tinha percebido isso, mas não havia elaborado – até que terça-feira, as coisas se encaixaram. Como eu já desconfiava desse “truque” da novela? Aqui vai uma ilustração.

Algumas semanas atrás, convidei um casal de amigos cineastas para jantar em casa – ela de certa forma mais ligada ao universo da televisão do que ele, mas ambos relativamente distantes da sedução de “Avenida Brasil”. Como costumo deixar claro desde a estreia, quando faço um convite desses, peço para meus convivas chegarem ou antes das 21h10 ou depois das 22h30 – uma vez que, nesse intervalo de tempo, ainda que eu consiga adiantar alguma coisa do jantar, a possibilidade de interatividade social é praticamente zero. Desrespeitando essa regra, o casal chegou pouco depois de a novela ter começado – mas não antes do “oi oi oi”, ou seja, da apresentação. Foram recebidos, claro, com uma frieza glacial, e a recomendação de que “perturbassem” o ambiente o mínimo possível enquanto a novela estivesse no ar (o casal, desnecessário dizer, é muito próximo e querido, então espero que você entenda que todo esse tom que usei era de ironia). Assim, por “livre e espontânea coação”, eles acabaram acompanhando o capítulo daquele dia – que, diga-se, não tinha nada de especial: não era “o da virada” nem o de uma grande revelação, apenas mais um.

Semana passada, para agradecer aquele jantar, foi a vez de eles me convidarem – e adivinhe o que eu ouvi? “Pode chegar antes da novela, que a TV vai estar ligada o tempo todo enquanto a gente estiver cozinhando”! O que significa isso? Que eles já estavam definitivamente “conquistados” pela novela. Com um capítulo apenas? Eu acho até que eles assistiram a mais uns dois ou três antes de “viciarem” definitivamente. Mas parte da sedução, tenho certeza, estava na capacidade que João Emanuel tem de contar a história toda – de maneira diferente, sempre com novos elementos – a cada capítulo. Basta ver um deles para você saber para quem deve torcer, de quem você vai rir, quem vai te fazer chorar, quem está com problemas, quem sofre e quem se diverte.

Essa “revolução” – seria inocente de minha parte afirmar o contrário – não surgiu de uma hora para outra. Há uma boa década, já não vemos mais novelas como aquelas que esperavam uma semana para que a trama andasse um centímetro, enquanto histórias paralelas iam “enchendo linguiça” (uma expressão que, se me lembro bem, ouvi pela primeira vez ainda criança, da boca da minha mãe, reclamando de uma novela muito parada). Mas João Emanuel – que já havia imprimido um ritmo delirante a suas narrativas em “Cobras e lagartos”, e provou que era capaz de surpreender não apenas no humor mas também no drama com “A favorita” – pegou esse “novo espírito” e fez ele valer com esteróides!

Não é que tudo é rápido em “Avenida Brasil”. Tudo é intenso. E ninguém está dizendo que a história muda de uma hora para outra de rumo, como num texto que não sabe para onde ir. Pelo contrário: ele está contando sempre a mesma história. Mas com a paciência de quem tira cada camada transparente de pele de uma cebola, ele vai desvendando aos pouco novas nuances de uma trama maior. Cito de cabeça, mas tenho quase certeza de que foi em uma entrevista nas páginas amarelas de “Veja” que ele admitiu sua inspiração “dostoievskiana” – refletida em sua capacidade de construir personagens cheios de paradoxos. Nina, Carminha, Max, Tufão – e até, se você quiser, Silas, Olenka, Suellen, Roni… -, todos são pintados como seres carregados de contradição. O que, se este fosse um texto menos cuidadoso, poderia arriscar até que é esse o motivo de tamanha identificação com o público. Mas isso seria uma interpretação fácil demais.

Entre tantas explicações para o sucesso de “Avenida Brasil”, fico com a do próprio autor que – se não me engano, nessa mesma entrevista que citei (lembrando, de memória) – disse que a engenhosidade da trama está em construir e descontruir, todo dia (isto é, todo capítulo), alguma parte da história. Exemplo recente: Carminha manda Max jogar Nina no mar, ele leva ela no barco, ameaça a “mocinha” (você, não tenho dúvidas, entendeu as aspas), ela o convence que quem está sendo enganado é o próprio Max, e o plano volta à estaca zero. É disso que o povo gosto. E o povo, hum, somos nós!

Há pouco mais de dois meses de a novela terminar, eu já converso com todo mundo com a ansiedade de quem teme ficar sem assunto depois do último capítulo. E, como fiz com o casal que foi jantar lá em casa, não paro de tentar converter novos fãs – na esperança vã e quem, com uma legião cada vez maior de admiradores, “Avenida Brasil” dure até a Copa de 2014! De todas as maneiras possíveis. Há pouco tempo também, para jogar na roda dessa conversa um amigo meu que havia passado um ano fora do Brasil (na Alemanha, o mais distante possível da órbita da televisão brasileira), eu fiz uma espécie de “mapa” da trama de “Avenida Brasil”, como um presente de boas-vindas na sua chegada:

Foi um sucesso – até mais entre amigos que já assistiam a novela do que para o “novato”. Como os fãs da novela vão reparar, algumas das conexões que coloquei ali já estão desatualizadas (vide os “núcleos” Cadinho e Suellen), e alguns personagens importantes (como o Santiago, avô de Jorginho) ainda não haviam aparecido – manter um “gráfico” desses atualizado, com as reviravoltas da novela, é tarefa hercúlea. Mas quis reproduzi-lo aqui só para você se divertir e ver como eu estou, hum, levando a sério essa que é a melhor diversão que a TV brasileira nos proporciona há tempos! O espírito com que fiz esse “mapa” é tão lúdico quanto o do texto que estou acabando de escrever – e que quero terminar e mandar para o G1 antes de o capítulo de hoje começar. Algo, claro, que eu não posso perder.

Esse amigo para quem fiz essa brincadeira não se aplicou muito no estudo da trama de “Avenida Brasil” (não está fácil desatar os laços alemães!), mas de vez em quando esbarra em uma cena sem querer . Vai que ele assiste a novela hoje, não entende alguma coisa, e me pede uma explicação. Eu não posso deixar ele sem resposta!

O refrão nosso de cada dia

“Canta comigo essa keta”, S.S.P. – em 1998, estive em Angola e conheci dois garoto que faziam um rap “a capella” que, segundo eles, seria um grande sucesso internacional. Mostrei os dois num episódio da série que fazia então no “Fantástico” (chamada “Aqui se fala português”) e foi um sucesso! Não exatamente aquele “mundial” que eles estavam esperando, mas, alguns anos depois desse encontro, “Keta” (por mérito próprio) foi um dos primeiros “hits” de “kuduro” a vazar as fronteiras angolanas e abrir espaço para um gênero musical vibrante, original, e muito dançante. Então cante com eles essa “musiketa” (a explicação para o nome). O refrão dessa canção é mega contagiante! Você ainda não entendeu porque estou celebrando o “kuduro” aqui hoje? Oi, oi, oi…

Ser ou não ser Batman

seg, 06/08/12
por Zeca Camargo |
categoria Todas

A boa notícia é que “O cavaleiro das trevas ressurge” não é “Hamlet”. A má notícia é que “O cavaleiro das trevas ressurge” não é “Hamlet”. Dependendo de quem você perguntar, esta é a mais original das partes da trilogia Batman assinada por Christopher Nolan, ou a mais fraca delas. A que melhor explora todas as nuances psicológicas do personagem, ou a que o deixa sossegado para ser simplesmente um justiceiro bom de briga (e pode apostar que vai ter gente achando que isso ou aquilo é bom e ruim…). Eu mesmo, depois do fiasco pseudo-filosófico que o diretor apresentou no segundo filme, devo dizer que saí satisfeito do cinema depois de assistir a “Ressurge”. Finalmente eu vi um bom filme de “polícia x bandido” (mais sobre isso daqui a pouco), e peguei-me torcendo por um super-herói não porque ele carrega nos ombros todo o peso da humanidade, mas simplesmente porque você quer que o bem vença o mal.

Quando há apenas algumas semanas reclamei de “Os vingadores” (aqui mesmo neste espaço), disse que um dos problemas do filme era o diálogo – ou melhor, a pretensão do diretor e dos roteiristas de dar um sentido maior a textos que são meras escadas para cenas de ação. Admiradores mais apressados logo defenderam “Vingadores” acusando-me de esnobismo cultural – com aquele velho e tolo argumento de que se alguém quer “arte”, que vá assistir a um filme “cabeça”… No afã de me atacar, porém, passaram por cima do ponto central do meu argumento, que era justamente o de que um filme como “Vingadores” não deve querer ser mais do que um grande e superficial entretenimento.

O “pecado” que esses filmes contemporâneos de ação cometem é, pois, querer passar um verniz de erudição num produto que é essencialmente de consumo rápido. Aliás, minha desconfiança é a de que roteiristas e diretores fazem isso exatamente por culpa de terem participado de algo tão comercial – “já que estamos ganhando milhões”, eles devem pensar, “devemos ter a obrigação de fingir que isso é cultura”… Isso até não seria um problema, se essa, hum, “visão” dos criadores não contaminasse a própria experiência dos espectadores – especialmente a dos fãs de quadrinhos, que sempre procuram validar seu entusiasmo por essa forma de entretenimento com uma profundidade existencial que beira o constrangimento.

Que ninguém me entenda mal. Cresci lendo quadrinhos também. De “The Spirit” a “Chico Bento”, passei por todos os gêneros, como qualquer garoto interessando em fugir um pouco do aborrecido cotidiano que aparentemente cerca nossa infância e adolescência. Confesso que Batman nunca foi meu favorito, pelos menos nos quadrinhos – eu era muito mais Homem-aranha (e Thor e Hulk e Capitão América). O “Cruzado Encapuzado” só chamou minha atenção no ultra kitsch seriado de TV dos anos 60 – e talvez por isso eu sempre tive dificuldade para levá-lo a sério. Os primeiros longa-metragens do herói (inclusive a versão de Tim Burton) estavam mais para esse universo lúdico do que para o personagem mais denso e complexo que ressurgiu nos quadrinhos, quando eu então já procurava outras leituras.

Levou um tempo até Christopher Nolan adotar esse “novo” Batman, mas quando isso aconteceu, uma esperança surgiu – não só nos fãs já convertidos, mas neste que vos escreve. Aquele primeiro “Batman begins” (2005) deixou-me muito animado. Ali estava um filme “de super-herói” que não apenas fazia questão de me tratar como uma pessoa inteligente, mas também, com base na ótima matéria-prima dos quadrinhos originais, colocava o personagem num contexto que, se não era totalmente novo, era refrescante. Batman foi reapresentado com uma perspectiva interessante e me conquistou imediatamente. Mas aí veio “O cavaleiro das trevas”…

Tudo que tinha para dizer deste filme já foi dito aqui mesmo neste blog – não preciso alugar você com repetições. Mas, apenas para podermos discutir “Ressurge”, devo dizer que fiquei atônito com a já dita pretensão do filme. Sem contar a interpretação magistral de Heath Ledger – alguém um dia vai ter coragem de viver o Coringa nas telas depois dele? – o filme era um nó atrás do outro: diálogos pretensiosos, romances inconvincentes, filosofias baratas, um roteiro de pontas soltas, e sequências de ação sem pé nem cabeça. (Quando escrevi isso na época, fãs hidrófobos retrucaram com truculência, alegando que um filme, que era então uma das quatro maiores bilheterias da história não poderia ser tão ruim assim – um argumento tão tíbio, que hoje é até constrangedor, quando a gente vê que ele ficou para trás de “baluartes” do bom cinema como “Transformers: o lado oculto da lua” e “Piratas do Caribe: navegando em águas misteriosas”… mas eu divago!).

Se “O cavaleiro das trevas” foi essa “ducha de água fria” de ambição – um delírio de grandeza –, sua “ressurreição” é magistral. Para trás ficaram aquelas “bobagens metafísicas”, as “subtramas” sem sentido, as distrações com baboseiras pseudo espirituais (ainda que algumas delas sobrevivam, inofensivamente, no exílio de Bruce Wayne na prisão), a gratuita fotografia “de arte”. No lugar disso, “O cavaleiro das trevas ressurge” oferece um herói desafiado e banido (com credibilidade), conversas pertinentes (as de Bruce com Alfred são especialmente equilibradas), simples momentos de conquistas que significam muita coisa (a “chaminé” da prisão, talvez a mais emblemática delas), um vilão que é a pura personificação do mal (sem possibilidade de interpretações psicológicas do seu caráter), uma virada na trama digna da reputação do diretor de “A origem”, e um desfecho que não apenas faz sentido, como deixa todo mundo na plateia com um sorriso estampado (até mesmo com a possibilidade de que – atenção “brigada do spoiler”, se não quiser se chocar, pare de ler por aqui e só retome depois do próximo parágrafo! – uma próxima trilogia, se vier mesmo, conte com a presença de… Robin!).

(Segue o alerta para a “brigada do spoiler”: vou falar dessa “surpresa” no final do filme. Mas se você já viu o filme, siga adiante: você vai gostar dessa ironia. Eu mesmo não havia percebido quando assisti ao filme, mas um amigo depois me chamou a atenção para um pequeno “deslize biográfico” nessa revelação de que Blake, o personagem vivido por Joseph Gordon-Levitt, tem o potencial para ser o Robin no futuro. Quando uma pessoa sugere no final que ele deveria usar seu primeiro nome – justamente Robin – é que a nossa ficha “cai”: é ele! Mas como qualquer fã de Batman sabe bem, o nome verdadeiro de Robin é… Dick Grayson! Tudo bem: Nolan fez um filme tão bom que somos capazes de lhe conceder essa “licença poética”. Mas que ficou esquisito, isso ficou…).

(Os que estavam com medo do “spoiler” podem retomar aqui a leitura). Esses pontos positivos que assinalei serviam responder aos pontos negativos do segundo filme da trilogia. Mas “Ressurge” ainda nos diverte por outras razões: uma Mulher-gato sensacional (como se outro adjetivo fosse possível para descrever Anne Hathaway em qualquer papel…); uma “batcaverna” que é o novo padrão para quem quiser pensar num esconderijo com estilo no cinema; uma Nova York – perdão, uma Gotham – que é parte glamour e parte escuridão, na mesma medida; e uma disputa de “mocinhos x bandidos” à moda antiga – que é, afinal, tudo que a gente quer ver quando compra um ingresso para um filme assim.

Um dos melhores momentos de “O cavaleiro das trevas ressurge” para mim é uma espécie de “batalha final”, quando todos os policiais de Gotham, recém-libertados dos subterrâneos da cidade, enfrentam uma horda de mercenários (comandadas pelo grande vilão Bane). Vista de cima, uma longa rua é tomada por duas “colunas” de gente – os “bonzinhos” e os “mauzinhos” – que estão avançando em direção uma da outra, para um bom quebra-quebra. Quem precisa de mais do que isso?

Torço para que a (relativa) simplicidade do final da trilogia de Nolan sirva de exemplo para os inevitáveis filmes de super-heróis que minha geração (e, temo, algumas que virão depois da minha) será (serão) obrigada(s) a encarar. Afinal de contas, para que tanta densidade para um personagem que, no fundo, no fundo, convenhamos, é só um cara vestido de morcego?

Mostre-me uma boa luta de bem contra o mal. Como diria o próprio Hamlet, “o resto é silêncio”…

O refrão nosso de cada dia

“Escuadras”, Nacho y los Caracoles – ele fez de novo… Mais de uma vez teci elogios entusiasmados aqui para esse músico argentino (que, entre tantas encarnações, nos deu, ao lado de outros dois músicos também sensacionais, o incrível “Alvy, Nacho y Rubin interpretan a Los Campos Magnéticos”). Numa viagem outro dia a Buenos Aires, porém, descobri seu álbum mais recente com Los Caracoles: “Canta”! Absolutamente TUDO é bom – na verdade, tudo fica bom na voz de Nacho. Mas eu queria destacar aqui, como uma introdução, a faixa “Escuadras”. Você conhece essa música – mas não vou contar agora de quem é (apesar de o título em espanhol estragar um pouco a brincadeira). E justamente porque você a conhece bem, eu tenho que admitir que, apesar da minha enorme admiração por quem assina a autoria (alguém que já entrevistei várias vezes, e cujas músicas canto de cor), essa versão ficou melhor que a que a versão original. Insisto: amo a canção como ela foi concebida. Mas há alguma coisa na transcrição para o “castellano” (“castejano”, no belíssimo sotaque portenho) que a transforma. A (novamente) voz de Nacho? A pegada latina? O arranjo? A cascata de cordas? O violoncelo que entra a certa altura? Ouça e veja se pode me ajudar a definir o que é. “Presto atención a mis amigos, ellos son mi segunda piel, mi cápsula potectora” – que “maravilla”! “Mi alegría y mi cansancio”…

Essa canção é para você?

qui, 02/08/12
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Tenho que começar agradecendo a você que me escreveu sobre a “trilogia Madonna” (que comecei a escrever na semana passada). Deu trabalho, mas, pelas suas palavras, senti-me mais que recompensado. Por outro lado, sempre que a gente embarca num projeto “de fôlego”, acaba deixando algumas coisas de lado. “O cavaleiro das trevas ressurge”, por exemplo, já está nas nossas telas há quase um mês – e eu ainda não escrevi uma linha sobre o filme. Ou ainda, às vésperas da abertura de mais uma Bienal Internacional do Livro, em São Paulo (evento que, desta vez, fui convidado a ser curador), devo ainda a você uma boa rodada de novas leituras. Sem falar que eu tive de resistir a uma ou duas tentações para não escrever sobre “Avenida Brasil” – de novo!) Mas depois desses anos todos, espero, você já está acostumado (ou acostumada) ao ritmo deste blog. E por isso mesmo, peço paciência!

Porque meu assunto de hoje aqui não é nenhum desses que enumerei. Na verdade, nem é um assunto formal – é mais uma comentário sobre várias coisas que já discutimos aqui, como por exemplo, a relação ultra superficial que as pessoas tem com as outras (“celebridades” ou não) na internet. Não quero nem me aprofundar nisso, porque a canção que tenho para mostrar para você agora já diz tudo. Recebi de uma colega de profissão e amiga pessoal o link para esse vídeo na semana passada – e achei brilhante! Quem o assina é uma trupe de humoristas chamada Clever Pie, junto com a comediante inglesa Isabel Fay.

Em poucas palavras, “Thank you hater” – o nome da música no clipe” – é um, hum, tributo, à nobre função conhecida por “internet trolling”. Na falta de uma tradução melhor, quem não conhece a expressão pode entendê-la como “a arte de preencher o tempo sendo ao mesmo tempo gratuitamente agressivo e inócuo com alguém que você nem conhece, enquanto dá um tempo entre múltiplas visitas a sites pornográficos”. (Se você tem uma definição melhor para ajudar quem é novo no assunto, por favor, fique à vontade para enviá-la num comentário).

Ir mais além do que isso é tirar o seu prazer de assistir a essa pequena obra-prima do humor inteligente. Então, sem mais, aqui está – basta clicar na linha abaixo (logo depois do link, reproduzo a letra da música no original, para você acompanhar – e, em seguida, a tradução para o português). Aproveite (e não deixe de mandar um comentário grosseiro se você achou que a música fala de você!).

 ”Thank you hater”, Clever Pie e Isabel Fey

Aqui a letra original:

Well hello friend Mister Insightful!
Thank you for your comment on my little Youtube clip!
Most people say you’re cruel and spiteful,
But you’re right, how do I sleep at night? I am a massive prick.

They call you hater well they’re just jealous
Your constructive pearls of wisdom give me thrills I can’t deny
How will we know if you don’t tell us
We could improve our Youtube channels by “fucking off and dying”?

Some might say you are a…
Sexually aggressive, racist, homophobe, misogynistic,
Cowardly, illiterate, waste of human skin,
Sexually aggressive, racist, homophobe, misogynistic,
Cowardly, illiterate, waste of human skin,
But I say: thank you beautiful stranger.

I love the way you don’t upload things
You know we’d be too dazzled by your cinematic vision
But you’re there on every comment string
Where you teach us, just like Jesus but while wanking like a gibbon.

I’m really sure that if I met you
You probably wouldn’t rape me like you promised that you would
We are like “that”; I really get you
You’re right about that laughing kid, he is a total “cnut”.

(Instrumental)

You wished me cancer and misspelled “cancer”
But I know that it’s a metaphor. You hope that I will grow,
Just like the tumour you hoped would kill me
Inside the tits on which you said you’d also like a go.

You said that girls shouldn’t do funny
But you’d fuck me double hard and let your mates go after you.
Oh what a line you lovely honey.
Are you on e-harmony? Oo! I’ll join the queue!

Some might say you’re a…
sexually aggressive, racist, homophobe, misogynistic,
cowardly, illiterate, waste of human skin,
sexually aggressive, racist, homophobe, misogynistic,
cowardly, illiterate, waste of human skin.

But if it wasn’t for you my darling,
I would never have written this tune.
Some might say that You’re So Vain,
But this song is all about you!

Aqui, a tradução:

Bem, olá amigo, Sr. Perspicaz!
Obrigado por seu comentário no meu pequeno clipe no Youtube!
A maioria das pessoas dizem que você é cruel e vingativo,
Mas você está certo, como posso dormir à noite? Eu sou uma grande imbecil.

Chamam-lhe de “Odiador”, mas eles estão apenas com ciúmes.
Suas pérolas de sabedoria construtivas me emocionam, eu não posso negar.
Como saberíamos dessas coisas se você não nos mostrasse
Que poderíamos melhorar nossos canais YouTube simplesmente “nos f**endo e morrendo”?

Alguns podem dizer que você é um …
Sexualmente agressivo, racista, homofóbico, misógino,
Covarde, analfabeto, um desperdício de pele humana…
Sexualmente agressivo, racista, homofóbico, misógino,
Covarde, analfabeto, um desperdício de pele humana…
Mas eu digo: obrigada, belo desconhecido.

Eu amo o jeito que você não posta nada: você sabe que nós ficaríamos muito deslumbrados com a sua visão cinematográfica.
Mas você está presente em cada trecho dos comentários
Onde você nos ensina, como Jesus, enquanto se masturba como um gibão.

Tenho certeza de que se eu te encontrasse, você provavelmente não iria me estuprar como você prometeu que faria.
Somos “assim ó”; eu te entendo.
Você está certo sobre aquele garoto rindo, ele é um “babca” total.

(Instrumental)

Você desejou que eu tivesse câncer e nem sabe soletrar “câncer”
Mas eu sei que é uma metáfora. Você espera que eu cresça,
Assim como o tumor que você torcia que me matasse,
Dentro dos peitos que você disse que também gostaria de brincar.

Você disse que as meninas não devem fazer graça
Mas me f***ria duro mesmo e depois madaria seus amigos.
Oh, que frase adorável, meu bem.
Você está em harmonia virtual? Oh! Eu vou entrar na fila!

Alguns podem dizer que você é um …
Sexualmente agressivo, racista, homofóbico, misógino,
Covarde, analfabeto, um desperdício de pele humana…
Sexualmente agressivo, racista, homofóbico, misógino,
Covarde, analfabeto, um desperdício de pele humana…
Mas eu digo: obrigado belo desconhecido.

Mas se não fosse por você, meu querido,
Eu nunca teria escrito esta música
Alguns podem dizer: “Você é tão vaidoso”
Mas esta canção é todinha sobre você!