Essa Academia não aprende…

seg, 28/02/11
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Gostou do Oscar 1978? Eu não. Quer dizer, gostei da festa, gostei de quase tudo que vi. Os apresentadores eram modernos – e carismáticos. O ritmo era bom – e permitia até piadas sobre o atraso atávico da cerimônia (já falo sobre isso). Os convidados estavam elegantes e descontraídos. E a distribuição de estatuetas era razoável. Tudo indicava que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood finalmente tinha chegado ao século 21. Mas aí…

Aí veio a premiação final, e a sensação foi a de que tínhamos voltados algumas décadas no tempo… Mas acho que estou me adiantando. Como talvez você já esteja esperando – afinal, este já é o quarto ano em que você encontra um post como este na segunda-feira pós-festa –, o assunto hoje é Oscar: um relato “minuto a minuto” do que eu consegui ver. Sim, porque, só lembrando, eu, hum, trabalho geralmente no domingo à noite, e invariavelmente ainda estou no “serviço” quando as primeiras estatuetas são distribuídas. Assim, tudo que posso dividir com você é o que conferi depois que o “Fantástico” terminou.

E este ano, isso significou que quando cheguei à casa de amigos que já acompanhavam a cerimônia, Anne Hathaway já estava no seu terceiro vestido – sem contar o que ela usou na entrada do tapete vermelho, como me informou minha anfitriã. Considerando que ela ainda entraria com mais cinco “modelitos” diferentes, isso dá, mais ou menos, a média de um “look” (até o cabelo mudava!) para cada 20/25 minutos! – já pensou a correria nos camarins para vesti-la e “desvesti-la” com tanta rapidez?

Mas acho que estou me adiantando… Vamos aos poucos. Meu relato começa precisamente às…

23h33

Christian Bale está no palco para receber o prêmio de melhor ator coadjuvante. Que barba era aquela? O novo visual de Batman? Será que o “cavaleiro das trevas” agora tamb��m é “feio, sujo e malvado”? Não… Bale é insípido demais para passar uma mensagem dessas. O prêmio é injusto. Geoffrey Rush, como o homem que indiretamente faz “O discurso do rei”, deveria ter levado. Bale está bem em “O vencedor”, mas pegando emprestado uma crítica que li, não me lembro bem onde – acho que foi na “New York” –, o problema com ele nesse filme é que você nunca acredita que ele está “vivendo” o personagem (a bizarra “lenda do boxe”, Dicky Eklund), mas sim “interpretando para ganhar um Oscar” o tempo todo. Certamente o prêmio para atriz coadjuvante – Melissa Leo, como a mãe de Dicky –, que já havia sido entregue antes de eu começar a assistir, foi bem mais merecido (assim como os de roteiro adaptado, para “A rede social”, e original, para “O discurso do Rei” – se bem que quem viu “Another year”, de Mike Leigh, acha que esse filme deveria ganhar nessa categoria…). Mas veja só, eu mal cheguei e já estou achando defeito? Vamos em frente!

23:40

Anne Hathway adentra então o palco – que me parece interessante, sem exageros e prático –com o que, sou informado então, é sua terceira roupa. O modelo parece um pouco exagerado (duas cores, rendas) – a ponto de ofuscar James Franco, quase mal-ajambrado em seu smoking “simplezinho”. Mas Hathaway tem um rosto tão magnético, que conquista imediatamente meu perdão, por qualquer excesso que venha a cometer durante a noite…

23:42

Hugh Jackman – que apesar de ter nascido apenas cinco anos depois de mim aparente ter 15 anos a menos que eu (um pensamento que sempre perturba este que vos escreve) – aparece elegante ao lado de Nicole Kidman – que finalmente ouviu o clamor das massas e diminuiu um pouco suas aplicações de botox. Estava bonita (este é o ano do bordado!) e (quase) natural para apresentar o Oscar de melhor trilha sonora. Que vai para Trent Raznor! Trent Reznor! Quem poderia imaginar que eu iria viver para um dia ver o cara por trás de uma das bandas mais alternativas (e geniais) de todos os tempos, o Nine Inch Nails, receber uma estatueta? Não se trata de uma aberração – sua trilha para “A rede social” é mesmo muito boa! Mas é que essa premiação tem gosto de “choque cultural” – a “velha guarda” da Academia com a música contemporânea (tudo bem, nem tão mais contemporânea assim, mas vá lá…). Novos tempos no Oscar – fico contente.

23:45

James Franco – cuja gravata borboleta ainda está me incomodando – chama Matthew McConaughey e Scarlett Johansson para apresentar os prêmios técnicos de som. McConaughey, sem graça como sempre. Já Scarlett emprestava sua beleza para o primeiro momento de glamour que conferi na noite (lembrando: não vi o tapete vermelho…). “A origem” leva as duas estatuetas (mixagem e edição de som) – e a única sensação do momento foi o que me pareceu um beijo na boca que Lora Hirschberg deu em alguém que parecia ser sua companheira! Mas eu posso estar enganado…

23:55

Lá vem aquele v��deo com os prêmios técnicos  – entregues numa cerimônia à parte, com Marisa Tomei. James Franco conqusita finalmente minha simpatia quando retoma o palco e diz: “Parabéns, nerds!”. E logo vemos Cate Blanchett deslumbrante tomando conta do palco inteiro – e aquele palco gigantesco. Imponente, com aquela beleza que parece um desafio à natureza, Cate vem com um vestido que é um adeus definitivo ao “look” despojado no Oscar. Se alguém pode vir à festa vestida de rosa, coberta de pérolas falsas da mesma cor, essa mulher é Cate Blanchett! Não é à toa que ela está lá para apresentar o prêmio para melhor figurino – “Alice no país das maravilhas” (barbada!) – e melhor maquiagem – “O Lobisomen” (que nem enfrentava competição séria… será que não é o caso de a Academia substituir esse prêmio pelo de efeitos especiais?).

00:01

Primeiro sinal de anacronismo da noite: o prêmio para melhor canção, numa época onde ninguém se preocupa em fazer uma canção que marque um filme. O que, aliás, era fácil de ver pelo vídeo apresentado com depoimentos colhidos de populares (inclusive um que eu achei que conhecia, chamado Barack Obama), falando qual foi a música de um filme que mais os marcou. Adivinha… “The time of my life”, “My heart will go on”, “Beauty and the beast” – todas as canções mais previsíveis estavam lá, até mesmo “As time goes by”, indicada pelo tal Obama… Mas aí, quando Kevin Spacey aparece para chamar duas das indicadas, você tem a certeza de que a categoria está obsoleta: nenhuma dessas canções serão lembradas em premiações futuras. Ouvimos os temas de “Toy story 3” e “Enrolados” sem a menor emoção – ou mesmo a memória de que um dia as ouvimos no cinema. Triste…

00:12

James Franco volta a me incomodar – e eu descubro o porquê: está com muita maquiagem, e me faz lembrar de Jim Carrey… Sua missão agora é chamar os apresentadores para o prêmio de melhores curtas-metragens. E finalmente vemos um cara que sabe vestir um smoking: Jake Gyllenhaal! Este sim, o primeiro apresentador realmente elegante da noite – sem exageros, com um corte perfeito, discreto e moderno. Se um dia convidado for para tal cerimônia, é assim que eu quero me vestir. Ah, mas e os prêmios? Lembra quando você nunca achava que iria ter chances de ver o vencedor nessas categorias – muito menos todos os indicados? Mas agora já existe o youtube (e derivados) – e você pode conferir não apenas “Strangers no more” (melhor documentário), como “God of love” (melhor ficção). Isto é, se você quer mesmo ver “God of love”, pois, a julgar pela performance do diretor do curta – estranha figura, que fez estranho discurso de agradecimento –, o curta tem tudo para ser um irritante “exercício de arte” – mas eu divago…

00:17

Anne vem com novo vestido – que, apesar de dourado, é elegante. E, junto com James Franco, faz uma ótima brincadeira sobre 2010 ter sido um grande ano para os musicais… Como sabemos, se você descontar uma monstruosidade chamada “Burlesque”, o gênero mal registrou nas bilheterias do cinema mundial… Mas com a ajuda daquela tecnologia que transforma qualquer diálogo em canção, eles mostraram cenas dramáticas “hilárias” – minha favorita foi aquela tirada de “Harry Potter e as relíquias da morte – parte 1”. Sensacional!

00:19

No final do ano, no “Fantástico”, apresentamos uma reportagem sobre as conversas fiadas que as vendedoras de loja mandam nas clientes para convencê-las de comprar uma roupa que não caiu exatamente bem – você já passou por isso, tenho certeza… Pois bem, num dos momentos mais engraçados da reportagem, uma vendedora aconselhava a uma cliente que estava achando que o vestido estava um pouco apertado: “O importante não é respirar querida, é ficar bonita!”. Não sei por que, essa história me veio à cabeça quando vi Oprah entrar no palco para anunciar o melhor documentário – a única chance que o Brasil tinha de ganhar uma estatueta (mesmo assim, por tabela!). Num corte inesperado de câmera, vemos os irmãos Cohen com cara de aborrecidos, como se tivessem sido obrigados a assistir o próprio “Bravura indômita” de novo – mas o que me chamou mesmo atenção nessa hora foi uma figura adolescente sentada logo atrás deles: seria Justin Bieber, ou apenas um garoto emulando aquele penteado? Melhor ficar alerta! Enfim, quem ganha na categoria é “Trabalho interno” (“Bye bye Brazil”!), e o diretor faz o primeiro protesto da noite lembrando que nenhum dos agentes financeiros responsáveis pela últimas crise econômica mundial – o tema do seu documentário – está na cadeia… Acho que vou ver esse filme hoje!

00:28

Billy Cristal faz um discurso ligeiramente longo demais depois de ter brincado com o próprio atraso da cerimônia do Oscar… “Temos que correr, vamos direto ao prêmio de filme do ano”, disse ele com humor – mas o que veio a seguir foi uma grande falação… Ter “ressuscitado” Bob Hope – um dos apresentadores de Oscar mais icônicos da história – foi um truque interessante. Mas o que causou mesmo sensação no público feminino que assistia à festa comigo foi a chegada de Jude Law ao palco… Ao lado de Robert Downey Jr, ele apresentou o prêmio para melhores efeitos especiais – “A origem” (covardia!) – e melhor montagem – “A rede social” (eu levei um tempo para entender o que eram aquelas sessões com advogados no meio da história, e teria dado a estatueta para “O discurso do rei”, mas não quero ser chato…).

00:41

Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – de vermelho!  – e ofusca Jennifer Hudson (que apesar de estar com uma cor parecida, não é páreo para Anne. Hudson chama mais duas canções candidatas – e quando vejo que é Florence Welsh (do Florence and the Machine!) que vai cantar o tema de “127 horas”, dou um pulo do sofá! O Oscar nunca esteve tão moderno! Meu entusiasmo, porém, levou um balde de água fria quando descubro que é Gwyneth Paltrow que vai cantar a música seguinte… Gwyneth, querida, larga esse microfone e volta para as telas, por favor! Quem leva o prêmio é Randy Newman, pela canção de “Toy story 3” – chata… Mas só de ter visto Florence Welsh no palco do Oscar, já ganhei a noite!

00:52

Celine Dion canta para homenagear as pessoas envolvidas com cinema que morreram no ano passado – tanta gente, que eu tive a impressão que ela teve de fazer uma versão remix da música… Em seguida, Hale Berry faz uma homenagem especial a Lena Horne, uma das primeiras atrizes (ela era primeiro cantora, é bom lembrar) negras a acontecer em Hollywood. A imagem de arquivo que vemos diz tudo – Horne estava tão maquiada e iluminada para “parecer branca”, que fica claro que o que a Academia estava fazendo ali era pedindo desculpas pelos erros (leia-se “discriminação”) do passado…

01:02

Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – sei que já escrevi isso, mas o que eu posso fazer? Ela agora está de azul – e a única palavra que eu consigo achar para descrevê-la é, desculpe, em francês: “ravissante”! Anne chama Hillary Swank – que quase desaparece perto da apresentadora oficial. Hillary, por sua vez, chama Kathryn Bigelow – que ganhou o Oscar de melhor direção no ano passado, por “Guerra ao terror”. E Kathryn chama… o diretor de “O discurso do rei”, Tom Hooper. Mau sinal…

01:06

Annette Bening faz uma breve aparição para chamar um vídeo sobre a festa dos “Oscars” especiais – um clima meio “Hollywood das antigas”. De alguma maneira, a festa parece mais íntima – e mais divertida – que a própria cerimônia a qual estamos assistindo… Mas o momento passa rápido…

01:11

Anne Hathaway, como se isso fosse possível, agora aparece ainda mais bonita – sei que já escrevi isso, mas o que eu posso fazer? Ela agora está de azul – o mesmo vestido azul que citei há pouco… Ela ainda não mudou de roupa, mas me surpreende mais uma vez com sua beleza… Ao lado de James Franco, estou convencido que eles esbanjam química – e elejo essa a melhor dupla de apresentadores em anos! Ambos chamam Jeff Bridges, que, para anunciar os indicados ao prêmio de melhor atriz, faz pequenos discursos que lembram aqueles que precedem uma eliminação no paredão do “BBB”… Mas acho que divago de novo… Outra “surpresa”… Natalie Portman vence sem muito questionamento – se bem que eu torcia secretamente para Annette Bening. Pronto, falei! Aposto que o discurso dela seria mais curto que o de Portman – que agradeceu tanta gente que, como disse uma amiga minha, só faltou a babá de seu futuro bebê… (Mas que ela estava bonita grávida, estava…).

01:20

A insuportável Sandra Bullock chega para fazer a mesma coisa que Jeff Bridges fez, só que para anunciar os candidatos a melhor ator. Ah, e sem um pingo de charme ou simpatia. Sandra, qual é o seu problema? Quem leva, claro, é Colin Firth – que faz um discurso de agradecimento ainda mais longo do que o de Natalie Portman – e eu agradeci que ele não tentou dizer o texto no mesmo estilo de seus personagem em “O discurso do rei” antes de ter se curado da gagueira… Teria levado horas!

01:32

Que decepção… E não estou falando do prêmio de melhor filme – não ainda! Mas da última roupa de Anne Hathway… Foi errar a mão justo no final? Tudo bem que eu já havia dito que ela seria desculpada de tudo esta noite, mas mesmo assim… Bem, mas ela e James estão lá para chamar Steven Spielberg, que por sua vez está lá para anunciar o filme do ano! Fiquei torcendo para Spielberg mostrar pelo menos um trailer do que será seu filme sobre Tintim, mas não rolou… Ele só veio mesmo para dizer que “O discurso do Rei” levou o Oscar 2011 – e essa sim, foi uma grande decepção… Depois de mostrar, de várias maneiras, que estava chegando à modernidade, no lugar de escolher um filme atual, do seu tempo, como “A rede social”, ou uma ousadia irreverente como “Cisne negro”, a Academia me vem com… “O discurso do rei”? Ora, faça-me um favor… A mesma Academia que premiou “Quem quer ser um milionário?” há apenas dois anos – e “Guerra ao terror” em 2010 – retrocede décadas e prestigia um filme caretérrimo. Bom, sem dúvida (ainda quero falar dele aqui neste espaço – talvez na quinta-feira). Mas super convencional… Vai entender…

01:38

Dezenas de crianças invadem o palco para cantar “Over the rainbow”, no que deveria ser um “gran finale”… Eu particularmente prefiro aquela garotada de uma escola pública de Nova York (o P.S. 22) cantando “Liztomania”, do Phoenix – mas eu entendo… Era o encerramento do Oscar… Ficou bonitinho! Só fiquei meio perturbado quando uma pequena multidão começou a invadir o palco com estatuetas na mão. Achei que era o elenco de “Quem quer ser um milionário?” que tinha voltado para a mesma performance do Oscar 2009… Mas não: eram só os premiados da noite (aparentemente todos) marcando presença, como que para dizer: “a festa só parece que homenageia o passado – nós somos o futuro”… Amém.

Sobre a réplica em tamanho real da Fontana de Trevi que estou construindo na minha casa – ou ‘De como estamos vivendo a época de ouro da desinformação’

qui, 24/02/11
por Zeca Camargo |
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Foto: Diliff/Wikimedia

A festa de cinco anos de Jack acontece no mesmo lugar onde foram seus últimos quatro aniversários – na verdade, no mesmíssimo lugar onde ele nasceu: um quarto onde ele vive trancado com sua mãe, que foi sequestrada por um homem mais velho para ser escrava sexual dele, sete anos atrás. “Temos milhares de coisas para fazer todas as manhãs”, diz Jack (que chama os objetos que o cercam por nomes próprios, com maiúscula mesmo) entusiasmado com sua rotina, “como dar um copo de água para a Planta na Pia para não derramar e depois colocar ela de volta no prato da Cômoda”. Nesse dia especial, antes de dormir, depois de ter comido seu bolo de aniversário, quase às nove horas da noite, Jack se prepara para dormir: “Corro para o Armário e me deito no meu travesseiro e me enrolo no Cobertor que é todo cinza e de feltro com detalhe vermelho. Estou bem debaixo do desenho meu que eu esqueci que estava lá. Mã enfia sua cabeça lá dentro. ‘Três beijos?’. ‘Não, cinco para o Sr. Cinco”.

Jack é o narrador de um livro fascinante que estou lendo agora: “Room” (“Quarto”) – ainda inédito no Brasil. Sua autora, Emma Donoghue, escolheu uma história especialmente escabrosa para contar – mas não totalmente implausível: a de um sequestro em que a vítima não é trocada por um resgate, mas fica em cativeiro, a serviço da mente doente de seu algoz.

Ouviu alguma história assim recentemente? Claro que sim – na televisão, ou aqui mesmo na internet. A última década do nosso século tão “desenvolvido” foi especialmente fértil para a descoberta de casos assim, que pipocavam no noticiário com frequência assustadora (o que, preocupantemente, só nos leva a crer que existem ainda mais histórias nessa linha para vir à tona!). Mas se realidade já nos oferece esses relatos de horror, qual a necessidade da ficção contribuir com alguma coisa? Ah… aí é que entra a criatividade da autora! Donoghue não quis apenas contar a experiência de uma vítima adulta, que tem a dimensão do horror pelo qual ela passa, mas de uma criança que não tem noção da atrocidade a que foi submetida.

Assim, oferecendo um novo ponto de vista, Jack é o narrador de “Room” – que divide a primeira parte do livro com apenas outros dois personagens: “o velho Nick” (que é, numa verdade horrorosa demais para ele compreeender tão jovem, seu pai); e sua mãe – que só conhecemos inicialmente por “Mã”. Surpreendentemente articulado para um garoto que cresceu nessas condições, Jack é tudo menos estúpido. Com as poucas coisas que fazem parte do seu cotidiano, ele construiu todo um universo – e que para ele faz o maior sentido. O que não está dentro do quarto, só existe na TV. Por exemplo: formiga é um bicho de verdade, pois ele vê de vez em quando passeando pela parede; mas cachorro é um “bicho de TV”. Banana é uma fruta de verdade – que chega eventualmente nas magras sacolas de mantimentos que “o velho Nick” leva nas suas visitas noturnas; abacaxi é “fruta de TV”. A divisão é tão clara para ele, que seu mundo só começa a desmoronar quando ele vê na televisão um anúncio de uma vitamina que ele toma no quarto. Como é possível aquilo – ele pergunta a sua mãe -, uma coisa existir no “quarto” e ao mesmo tempo “do lado de fora”? É ai que “Mã” começa a achar que está na hora de descobrir um jeito de tirar Jack dali. Qualquer jeito… Mas como?

Quando não escreve em diálogos, a autora usa a voz – e o raciocínio – dessa criança de cinco anos para nos conquistar. Esse é um artifício perigoso, que nem sempre dá certo: a última vez que li um livro interessante contado por uma criança foi quando descobri “O estranho caso do cachorro morto”, de Mark Haddon, há quase dez anos. (Se você não leu essa estranha obra-prima, corra para tirar o atraso: o personagem criado por Haddon não apenas é uma criança, mas autista – e se isso parece um obstáculo, não se acanhe, vá em frente, porque o livro, aqui editado pela Record, é sensacional). Felizmente, “Room” escapa das armadilhas e dos clichês para dar vida a um garoto realmente especial – mais até do que o autista de Haddon.

No raciocínio cristalino de Jack, tudo se encaixa de maneira própria e razoável. Os problemas só começam a aparecer quando sua mãe toma coragem para contar para ele que existe sim um mundo lá fora. Jack se esforça para entender essa novo “desenho do universo” – e inevitavelmente sofre com isso. Até então, tudo era bonito, tudo estava bem explicado para Jack. E se, de uma hora para a outra, nada parecia fazer mais sentido, a culpa de maneira nenhuma era dele: foram essas as condições que “o velho Nick” impôs para ele e para sua mãe.

Jack não me sai da cabeça esta semana – e não só por conta do livro, que eu estou economizando na leitura para não acabar logo (sim, ele é daqueles bons que te inspiram a fazer isso!). Jack habita meus pensamentos recentes porque ele faz um estranho paralelo com um outro tipo de criança – esta, bem real. Ela não necessariamente tem cinco anos, mas vê um mundo de um prisma mais limitado do que Jack. Sua única fonte de informação é a internet. O que faria dessa criança, claro, uma mente incrível – se ela pelo menos tivesse o mesmo talento para desconfiar das coisas que Jack, confinado em seu cubículo, tem constantemente. Vou explicar melhor…

Não quero comprar brigas, mas há algum tempo eu venho detectando um tipo de leitor que passa por aqui apenas esporadicamente – certamente porque um determinado assunto que escolhi para falar “passou pelo seu radar”. Não é o visitante regular deste espaço – o que fica claro pelo tom de seu comentário –, mas alguém que esbarra numa zona de interesse comum com a minha, mas que, ao contrário de mim (e desses outros leitores, como você, que tiram um certo prazer da leitura), não estão interessado em conhecimento, mas sim em descobrir uma nova coisa, um novo assunto, excitante o suficiente para que ele possa passar adiante (quando não me insultar, se minha opinião for contrária à dele) – e com isso, ter a ilusão de que está conectado com pessoas que se interessam pela mesma coisa (ou detestam a mesma coisa que eu resolvi elogiar).

Não se preocupe, assíduo frequentador. Não vou retomar minha recente bravata sobre minha perplexidade diante do Facebook – já me coloquei sobre isso, e não tenho nada a acrescentar. O que está me inquietando agora é a validação de algo de podemos chamar de um novo padrão de informação, um patamar “mais raso”, onde as pessoas se contentam muitas vezes em receber uma notícia apenas através de uma manchete.

Seja honesto, seja honesta: quantas coisas você lê numa página de notícias de um portal de informação e vai além justamente da chamada – ou, com um pouco de sorte, das primeiras linhas de um texto? Mesmo os leitores mais dedicados – as pessoas da minha geração, que têm paciência para desbravar um parágrafo –, muitas vezes se sentem impotentes diante de tamanha quantidade de informação que a internet joga no nosso colo todos os dias – todos os minutos, para ser mais preciso. Você pode até argumentar que isso é culpa dos próprios sites que “acostumaram” esse “novo leitor” a uma dieta de manchetes e fotos apenas – mas entrar nessa discussão é um pouco como retomar o dilema fundamental do ovo e da galinha (quem veio primeiro mesmo?).

Também concordo que boa parte do que passa por notícia hoje em dia na internet é apenas uma manchete, sem qualquer aprofundamento. E no caso de uma área que conheço relativamente bem, “notícias sobre celebridades” – o “monstro que você tem que estar constantemente alimentando”, para usar uma ótima expressão da imprensa americana –, a pressão para ter uma manchete que vai render mais cliques é ainda maior. A ponto, aliás, de uma não notícia ser notícia… Claro que existe também um bom número de repórteres – e as próprias instituições para as quais eles trabalham – que, levando adiante a nobre atividade de, hum, reportar, oferecem bons textos, boa apuração, e bons argumentos para que o leitor reflita sobre o que está acontecendo. Só que… tem alguém interessado nisso?

Essas incríveis ferramentas da internet que hoje nos ajudam a ficar conectados acabaram servindo também para que as pessoas tenham a ilusão de que estão, elas mesmas, reportando alguma coisa – quando na verdade só estão “retweetando” informações que elas nem sabem se são importantes (muitas delas são relevantes sim para o universo que quem a transmite, mas para o mundo à larga?). Qual o resultado disso? Um exército de pessoas circulando uma informação muitas vezes insignificante, quando não enganosa. Eu já deveria ter me acostumado com isso, mas sou teimoso. Ou melhor, sou otimista: ainda acho que vale a pena brigar para defender os interesses de quem quer saber mais sobre determinados assuntos, buscar uma informação mais correta, e tirar suas próprias conclusões. Por isso me dou ao trabalho de escrever sobre isso aqui hoje: para celebrar (contra minha vontade) essa “época de ouro da desinformação”!

E não faço isso apenas porque, como pessoa que tem parte de sua vida pública (devido à natureza do meu trabalho), de vez em quando sou alvo de algumas notícias distorcidas – e papagaiadas infinitamente. Minha referência é um universo maior. Quer ver? Duas vezes por dia, recebo um “feed” dos assuntos mais comentados no Twitter – no mundo e no Brasil (uma informação que qualquer um pode ter com uma rápida pesquisa na internet, mas que chega até minha caixa postal de maneira mais ordenada). E os “TT” – ou “trend topics” (“temas de tendência”, traduzindo apressadamente) – são, no mínimo curiosos. Alguns exemplos recentes:

- 15 de fevereiro: #foraadriana (campanha para tirar Adriana da casa do BBB); Torra Torra (piadas sobre o incêndio de uma confecção em SP); #siladygagafueramexicana (brincadeiras sobre a fantasia de Lady Gaga ter sido integrante do RBD)

- 17 de fevereiro: #jointhenation (rede de sanduíches divulga promoção); #abaixocalu (alunos de um colégio de São Paulo protestam contra os altos preços da cantina); Uncle Leo (internautas lamentam a morte do ator que fazia o papel de “tio Leo”, em “Seinfeld”)

- 21 de fevereiro: #sportcampeao87 e #flahexa (torcedores dos dois clubes brincam com a decisão da CBF de “dividir” o título do campeão brasileiro de 1987; Bahrein (comentários sobre o cancelamento da Fórmula 1 por lá, devido à agitação política); #imoldenough (piadas com a expressão que quer dizer “já sou velho o suficiente – supostamente para fazer coisas ilícitas, ou simplesmente tolas…)

- 23 de fevereiro: #s4fvoltou (elogios para a volta de uma festa “matinê” chamada S4F Teens); FresnoRockinRio (fãs fazem campanha para a banda tocar no festival); #thingsdevilinvented (listas de coisas que o diabo inventou, do dever escolar ao novo penteado da cantora Rihanna!)

Claro que estou pegando os exemplos mais extremos. De vez em quanto, entre os tópicos mais “tweetados”, aparece (ufa!) o nome do ditador da Líbia, ainda que nas mais diversas grafias; um protesto contra o decreto presidencial que fixa o salário mínimo; a decisão do STJ de adiar a decisão sobre o reconhecimento de uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo; e até uma coleção de frases da escritora Clarice Lispector! Mas você entendeu onde eu quero chegar: alguma dúvida sobre quais assuntos eram mais legais de “retwittar” para uma geração (e não falo aqui apenas de faixa etária) que acha que só precisa de 140 toques para estar informada?

No post anterior, comentei rapidamente (ao falar sobre o novo disco do Radiohead), sobre uma outra “nova mania”: as críticas (a um livro, filme, ou trabalho musical) que cabem num “tweet”! Que tal? Finalmente um formato perfeito para quem não quer ter opinião sobre nada – apenas “retwittar” a opinião dos outros… Por que é tão difícil as pessoas darem uma opinião original hoje em dia? – você talvez se pergunte, como eu. A resposta é óbvia! Porque para dar uma opinião é preciso “ter” uma opinião. E vamos combinar que as crianças que são o tema do post de hoje têm uma preguiça de esboçar uma opinião – quanto mais elaborar uma…

Por isso mesmo, eu prefiro a companhia literária de crianças como Jack. Seu conhecimento limitado do mundo não é, como disse, culpa sua – se ele tivesse uma internet para ajudá-lo, tenho certeza de que suas opiniões, sobre tudo e todos, seriam bem elaboradas. E, mesmo sem saber, por enquanto, o que vai acontecer (ainda não terminei o livro), estou convicto de que ele seria capaz se tornar um adulto bem mais interessante – e com muito mais assunto – do que as outras crianças que só usam alguns poucos comandos de uma ferramenta tão poderosa. E não, eu não estou falando da internet, mas da sua mente…

(Em tempo, a “réplica em tamanho natural da Fontana di Trevi” não existe, nem vai existir – em nenhuma dos lugares em que eu moro. O que ela tem a ver com o que eu quis discutir aqui hoje? Bem… tudo! Digamos que este é um teste… Quem garante que ela não vai aparecer travestida de “informação” em algum canto desse nosso admirável mundo virtual?)

Na segunda-feira, repetindo nosso ritual, vamos falar da festa do Oscar! Proteja-se!

O refrão nosso de cada dia

“Over and over again”, Clap Your Hands and Say Yeah – talvez você reclame, e com razão, que entre todos os bons refrões que indiquei até agora, nenhum era da última década (ou mesmo deste século). Pois aqui vai um bem interessante, bem alternativo, e razoavelmente contemporâneo – de uma banda que eu já declarei um dia como promissora, e espero ainda não me arrepender! Uma canção que eu chamaria de “circular” – com um vídeo (que não é mal) que respeita e amplia o sentido da música. “Acenda um novo fogo e veja ele morrer lentamente”… De fato…

Aquela ‘dancinha’…

seg, 21/02/11
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Menos de 24 horas depois de eu ter conferido o novo vídeo do Radiohead, “Lotus flower”, já era possível encontrar aqui mesmo na internet uma versão “alternativa”, com Thom Yorke fazendo a mesma coreografia com a música de Beyoncé, “Single ladies”. Pouco mais tarde, no mesmo dia, era possível assistir a outra montagem, onde o líder da banda, o único membro que aparece no clipe original, se solta ao som de “É o Tchan no Havaí” – e com resultados surpreendentes…

Eu sei, estamos na semana do Oscar – um assunto que este espaço trata com carinho (quando não com polêmica). Eu deveria estar escrevendo sobre “127 horas” – e poderia até rebater as críticas de que o filme é insuportável. Ou mesmo responder aos que acham que “O discurso do rei” é tão previsivelmente feito para agradar a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que não deveria nem ser levado em consideração pela própria… Mas para isso eu teria de ter assistido a esses filmes – algo que minha rotina recente infelizmente me impediu de fazer até agora. Já vi outros trabalhos que estão disputando estatuetas no domingo (“Inverno da alma”, “Minhas mães e meu pai”), que dariam até bom caldo para um post – mas como se concentrar nisso quando dos assuntos musicais simplesmente estão falando mais alto?

Há uma nova coleção de Tim Maia sendo lançada – que inclui o raríssimo “Racional 3″-, mas acho que isso exige um mergulho mais profundo antes de eu arriscar uma opinião. Há um rescaldo do Grammy a comentar. O novo vídeo de Britney – e uma resposta que eu queria dar aos que acharam “um absurdo” eu ter dedicado espaço recentemente à própria Britney, Lady Gaga e (o “mais grave de todos os pecados”!) Justin Bieber… Quero falar de minha obsessão reacesa por Karina Bhur, e de novas descobertas musicais que fiz – Apex Manor, Soft Circle, Russian Futurists. Mas nada (nada!) me parece tão urgente agora quanto escrever sobre o novo vídeo do Radiohead – com o perdão de Ronaldo, um novo fenômeno pop, como os exemplos de apropriação que dei no primeiro parágrafo demonstram.

Talvez você já tenha conferido. Trata-se de algo muito simples – ou ainda, de algo extremamente elaborado para parecer algo extremamente simples. Para descrever em uma frase, o clipe é uma colagem de longas sequências de Thom Yorke dançando (e eventualmente cantando) sobre a base de “Lotus flower”, a primeira faixa lançada de seu novo álbum, “The king of limbs” – a ser dissecado em breve por aqui.

(Pedindo licença para fazer jus ao meu “eu divago”… Ontem mesmo fui cair num site que fez uma compilação de críticas de “The king of limbs” no Twitter – e fiquei absolutamente encantado. Não tanto pelo conteúdo das opiniões expressadas – em não mais de 140 toques, é bom lembrar! -, mas pelo próprio exercício de discutir um trabalho tão elaborado quanto um álbum, seja ou não do Radiohead, em apenas alguns caracteres. Quer dizer que é para isso que caminha todo o pensamento crítico? Talvez seja mesmo: tudo que as pessoas querem é meia dúzia de palavras sobre um filme ou um disco – não vamos nem falar sobre livros, uma vez que são objetos compostos de bem mais do que meia dúzia de palavras… – para elas poderem retwittar, ou quem sabe até se expressar verbalmente “papagaiando” um twitter que receberam, com o objetvo final de mostrar que elas, hum, têm opiniões sobre esses produtos culturais? Não que as idéias selecionadas pelo tal site fossem rasas – veja essa, minha favorita, defendendo a banda de “ataques de 140 alfinetadas” com fina ironia: “Tenho certeza de que o Radiohead está deprimido por causa dessas críticas, uma vez que eles obviamente fazem álbuns para serem ouvidos às 9h20 da manhã em um laptop”, de CKlosterman… Brilhante, não é? A questão é que eu ainda prefiro abusar de alguns caracteres a mais – e frases, e parágrafos – para expressar minha apreciação sobre uma obra de arte pop. E é exatamente isso que vou fazer dentro em breve por aqui – e convido você a me acompanhar. Fim da divagação…).

Enfim, voltando ao clipe, Thom Yorke dança num cenário despojado – e gloriosamente mal iluminado – uma coreografia que quase parece espontânea. Imagino que a idéia era passar justamente essa liberdade – quem sabe uma crítica a vídeos ultra coreografados, como o próprio “Single ladies” (e não vamos nem entrar no território de Gaga…)? Mas em toda sua estranheza, a dança é “bonitinha” demais para ser “solta”… Quem já viu York no palco (lembra quando eles passaram por aqui?) tem direito de duvidar que ele seja tão, hum, articulado assim, que não tem ninguém por trás coreografando… Por outro lado, o próprio pop tem exemplos de artistas geniais que, de vez em quando, se soltam em gestuais inesperados – certas performances de Ian Curtis, do Joy Division, e a memorável apresentação de David Byrne, com os Talking Heads (em “Stop making sense”), me vêm à cabeça… A questão principal quando se vê o vídeo é: “o que está acontecendo diante dos meus olhos?”.

Ora, fãs do Radiohead já aprenderam a esperar qualquer coisa da banda – e sobretudo de York. Musicalmente, poucos artistas são tão imprevisíveis hoje quanto esses caras – e “The king of limbs” é só mais um exemplo disso. E mesmo em seus vídeos, o Radiohead faz questão de ser o menos convencional possível. Dentro desse raciocínio, “Lotus flower” é só mais uma surpresa que a banda aprontou… Mas o mais interessante é que, por mais estranho que o vídeo parece, seus efeitos são inegavelmente hipnóticos…

Com seus mais de 3,5 milhões de visitas (cerca de um terço do que recebeu “Hold it against me”, de Britney, lançado no mesmo dia – mas eu divago… e hoje acho que já esgotei minha cota!), o que “Lotus flower” parece demonstrar é que nem tudo está perdido no pop: ainda há espaço para provocação – e até uma certa pretensão artística. E, melhor: ela pode ser bem recebida!

As próprias paródias do vídeo que citei acima – além da de Beyoncé e É o Tchan!, tenho certeza de que outras virão… se já não estão disponíveis! -, mostram que ninguém fica indiferente a essa nova “obra” do Radiohead. Esquisito como ele sempre é – e acredite, eu já o vi bem de perto, em episódio que também contei por aqui, e posso confirmar que Thom Yorke é estranho -, o cantor desafia preconceitos, entrega-se à cândida bobagem de seus movimentos, e rende-se sem medo à câmera, que nunca lhe é generosa (em tempo, como as imagens são em banco e preto, os traços do rosto de York tornam-se ainda mais acentuados – cubistas, se você preferir). E você acha que ele está ligando?

Quando você vê o vídeo de “Lotus flower”, o que se revela é pura expressão artística. E eu confio em Thom Yorke – confio que por trás do que parece ser uma boa piada visual, ele traz as mais sérias intenções. E por isso, como quase tudo que vem do Radiohead, “compro a idéia” sem pensar duas vezes. Acho sim o clipe genial – e, mesmo ciente de que estamos em fevereiro, declaro que vai ser difícil algum artista me tocar mais visualmente do que ele.

E o mais divertido é que “Lotus flower” incomoda as pessoas – aquela “dancinha” incomoda muito muita gente (basta ver as reações aqui mesmo na internet!) – o que será que faz com que as pessoas reajam de maneira tão agressiva, e mesmo intolerável, quando vê um homem se soltando com seu corpo? Você sabe, falo de experiência própria – mas nem eu mesmo, que aprendi a sublimar essas críticas, consigo entender essa resposta ao que, no fundo, não passa de uma dança… E só por isso York já tem minha imensa admiração.

E a música? Bem, vou deixar para entrar nisso melhor quando discutir “por inteiro” o álbum “The king of limbs”. Mas posso adiantar que ela é: 1) dançante (o próprio Thom Yorke está lá para provar isso); 2) hipnótica (não só visualmente, mas também em sua sonoridade); 3) tipicamente Radiohead (da batida eletrônica ao falsete do vocal); e 4) tem um belo refrão (bem menos óbvio do que seus ouvidos talvez estejam acostumados).

Por falar em refrão, você tem se divertido com os que encontra aqui no final de cada post? Tomara que sim! Assim, aqui vai mais um para você – e vamos ver se na quinta escrevo sobre cinema… Menos de uma semana para o Oscar, eu sei…

O refrão nosso de cada dia

“Break you off”, The Roots – outro dia, em resposta à minha reclamação de que o novo disco de Kanye West não se dava ao trabalho de oferecer bons refrões, um internauta que escreveu indignado: “Desde quando hip-hop tem refrão?”… Bem… Dei a resposta clássica, citando de Afrika Bambaataa a Missy Elliot… Sem querer, deixei de fora essa pérola, de uma banda que é das melhores do gênero – e injustamente desconhecida do grande público: The Roots. O refrão vem logo de cara – simplérrimo, mas tão irresistível que alguém ali deveria ser processado por fazer você dançar mesmo sem vontade. Cuidado se for ouvir durante o expediente…

A hora de parar

qui, 17/02/11
por Zeca Camargo |
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Eu tinha tempo de sobra para falar com George Michael. Era o ano de 1998, e aquela era uma das únicas entrevistas que ele daria para a imprensa televisiva, depois do “escândalo” que revelou ao mundo que ele era homossexual – aos que não sabiam ainda nem soletrar essa palavra há doze anos (e talvez até para quem não saiba soletrá-la até hoje), vale esclarecer que esse lado da vida pessoal de um dos cantores mais populares de todos os tempos veio à tona depois que ele foi preso num banheiro público em Beverly Hill (Los Angeles, Califórnia) por ter abordado sexualmente um policial à paisana.

Bastante seletivo ao se “reapresentar” para o mundo – ali diante de um novo prisma –, Michael havia escolhido apenas três países para dar entrevista, quando lançou seu “single” chamado “Outside” – uma espécie de provocação bem-humorada com o fato de ele então ter sido obrigado a ficar “do lado de fora” (“outside”) do armário sobre sua sexualidade. Uma delas foi para a TV inglesa – se não me engano, para o “South Bank Show”. Outra foi para a TV japonesa. E a terceira, para o “Fantástico” – uma escolha bastante emocional, já que ela tinha a ver com o país de origem de seu companheiro, com quem ele vivia até 1993 (quando ele então morreu de complicações relacionadas à AIDS).

Extremamente solícito e à vontade, George Michael concedeu o privilégio de conversar durante uma hora, em Londres, numa tarde gelada de outono (inglês) – num cenário luxuosamente montado num dos hotéis mais sofisticados da cidade, o Hempel. Para você poder comparar, geralmente essas entrevistas são programadas para dez minutos – ou menos: meu recorde é apenas seis minutos com Madonna… Uma hora então, é um presente – mas por mais que eu tivesse assunto com George Michael (lembrando: era a primeira vez que ele falava sobre sua sexualidade, além de ser uma retomada de sua carreira musical), chegamos a um ponto em que os temas começaram a escassear. E olha que eu estava preparado! Por isso, talvez, num exercício de criatividade, comecei a perguntar a ele sobre o futuro de sua atividade como músico – mais especificamente, até quando ele achava que seria capaz de compor boas músicas, que agradassem a um vasto público internacional como o que ele tinha conquistado.

Com cândida honestidade, Michael respondeu que achava que iria gravar apenas mais um – talvez dois discos bons e originais. “Já estou próximo dos 40 anos”, ele disse, “e não sei se ainda posso esbanjar criatividade por muito tempo”. O que parecia uma “jogada de toalha”  grosseira para os fãs (inclusive aquele que o entrevistava), logo depois, quando fui rever o material, começou a soar como um depoimento dos mais lúcidos que eu já havia ouvido de um astro da música pop.

Admitir que sua carreira – ao menos a carreira criativa – tinha um limite, me pareceu extremamente sensato. George Michael já era um milionário na época – seu sucesso com o Wham! e na sua carreira solo já havia lhe rendido dividendos generosos para o resto da vida (que, devido ao sucesso perene de canções como “Careless whispers”, “Faith”, e “Freedom 90”, ainda iriam lhe render direitos autorais por um bom tempo). Suas composições recentes não vinham com o brilho (ou com o frescor) das músicas de outrora – a própria “Outside” era boa, mas nada próximo da genialidade pop que ele já havia demonstrado antes. Nesse cenário, admitir que logo chegaria o dia em que ele abandonaria tudo me pareceu mais do que um bom julgamento. Pareceu-me extremamente honesto.

De fato, depois do período desse encontro (final dos anos 90), ele só lançou mais um álbum – “Patience”, de 2004. E, ao que tudo indica, esse foi seu “canto do cisne”… (Que, diga-se, nem bem recebido foi pela crítica e pelo público).

Essa história voltou à minha memória, na última segunda-feira, com o anúncio oficial (antecipado pelo “Fantástico” domingo, devo acrescentar modestamente…) de que Ronaldo “Fenômeno” estaria se despedindo da carreira de jogador de futebol. Calma. Este espaço, claro, não trata de futebol – mas de cultura pop. A única outra vez em o craque foi mencionado aqui, justificando a “essência” deste blog, foi quando Ronaldo foi alvo de um outro “escândalo” (como no caso de George Michael, a palavra vem entre aspas porque o falso puritanismo do público – e da própria mídia – colaboraram para tornar um evento mundano em algo extraordinário… mas, eu divago…). Na época (idos de 2008), não se falava em outra coisa – e mais ou menos como agora (se bem que de uma maneira mais positiva), Ronaldo é o assunto “pop” da semana. Então, quero comentar…

Minha intenção, no entanto, não é fazer uma retrospectiva de sua carreira (muito menos de sua vida pessoal), nem analisar (como muitos já o estão fazendo) se os motivos apresentados por ele na sua entrevista coletiva de segunda-feira são ou não genuínos. O que me interessa na “despedida” de Ronaldo é o “timing” dela – que, mesmo sem poder dizer que futebol é um assunto que eu domino, acredito que chegou na hora certa.

Assim como George Michael (que, espero, não está pensando em fingir um retorno à sua carreira criativa, a não ser que seja com material de primeira!), Ronaldo soube a hora de parar. Os mais ranzinzas (como muitas vozes que já vi se manifestarem na internet) vão cutucar dizendo que o “adeus” chegou um pouquinho atrasado. Fãs idólatras já argumentam que a aposentadoria veio cedo demais… Mas o senso comum, pelo que pude avaliar esta semana, é de que o ponto final veio na hora que deveria vir. E por vários motivos.

Primeiro, porque ela ainda é adorado. Segundo, porque financeiramente, ele ainda vai ganhar muito dinheiro (pense em Pelé, que até hoje é protagonista de várias campanhas publicitárias, por conta de um carinho conquistado junto ao público). Terceiro, porque seu “rendimento criativo” (para não falar do físico) já vinha dando sinais de que estava no negativo… E quarto, porque tomando a atitude voluntariamente, antes de ser forçado de maneira constrangedora a literalmente pendurar as chuteiras, ele provou que tem uma qualidade que muitas pessoas esquecem de procurar nos atletas do gramado: inteligência.

Aplaudo Ronaldo de pé por sua decisão. E gostaria que mais pessoas notórias tivessem a sabedoria e a humildade de reconhecer que “chegou a sua hora”… No “show business”, temos bons exemplos dessa sensatez. Lembra-se de “Seinfeld”, um dos seriados mais originais e populares dos últimos tempos? Não foram poucos os que condenaram a decisão de suspendê-lo, quando ainda estava no auge da popularidade – mas duvido que essas pessoas hoje, mais de dez anos depois da “trágica despedida”, não concordem que foi melhor para todo mundo. O mesmo vale para “Lost” – com a possível ressalva de uma ou duas temporadas que ficaram sobrando…

Na música pop, recebemos boquiabertos, há apenas algumas semanas, a notícia de que o White Stripes não existia mais como uma banda. Lamentável, quando lembramos do brilhantismo dos seis álbuns que eles deixaram – mas bastante razoável quando comparamos os dois últimos trabalhos aos quatro primeiros… Lauryn Hill percebeu logo que seu fôlego musical não iria muito além de sua obra-prima “The miseducation of Lauryn Hill” – e nem tentou voos muito mais altos do que algumas gravações ao vivo. Aqui mesmo, no nosso sempre errante pop, os (merecidamente) venerados (Los) Hermanos  tiveram a nobreza de entrar num indefinito hiato quando acharam que não poderiam contribuir com algo honestamente original e interessante para seus fãs – bravo! Quem dera esse exemplo fosse seguido por certas bandas e artistas que já não nos oferecem nada inspirador há anos (em alguns casos, décadas!), mas que insistem em, até hoje, impor sua xepa criativa para fãs que reagem a esse material com a inércia de quem escuta uma canção da infância cuja letra não consegue se lembrar…

Você conhece algum caso assim? Não quer dividir comigo? Considerando que todo mundo um dia se aposenta, quem você acha que já deveria ter decidido encerrar a carreira para preservar seu trabalho? Não quer mandar sua sugestão? Vale para qualquer área… Você pode achar, por exemplo, que Woody Allen é um artista que deveria ter parado de fazer filmes depois de “Manhattan” (uma ideia da qual eu não poderia discordar mais, como já deixei claro neste espaço mais de uma vez)… Ou um outro diretor importante – Scorcese? Tarantino? Copolla (tipo… Sofia)?

Na televisão – algum seriado que perdeu a graça e se arrasta sem brilho para agradar um fã clube cada vez mais minguante? Ou algum outro formato que já deu o que tinha que dar? (Antes de escrever sobre apresentadores de programas jornalísticos dominicais que deveriam se aposentar, porém, manifeste sua “piada” em voz alta em frente a um espelho e veja se ela é mesmo engraçada – e não vamos nem falar de originalidade… E, sim, eu estou sendo irônico!). Quero ouvir sua opinião!

Mas sobretudo quero que você fale de música: quem – especialmente quem que já nos deu muito prazer e agora insiste em torturar um dos nossos sentidos mais belos, o da audição, com um repertório que fica léguas aquém daquilo que um dia já apresentou? Quem sabe se você apresentar um argumento bem convincente ele (ou ela ou eles ou elas) não se convence(m)?

O refrão nosso de cada dia
“Spring in Fialta”, Slow Children – em 1981 (um ano antes de existir uma banda que estouraria no Brasil com o sucesso “Você não soube me amar”), eu comprei um estranho disco de vinil chamado “Blitz”. Tratava-se de uma estranha compilação de bandas “new wave” – já em si, um estranho movimento musical que assolava o início da década (e conquistava meu coração). Em meio a toda essa estranheza (“Chihuahua”, do Bow Wow Wow, era a faixa de abertura do disco), essa música, que roubava seu nome de um conto de Nabokov, me deixou hipnotizado: um ritmo frenético, com um refrão suplicante. Cheguei a comprar o LP de estreia deles (que tem uma canção com o inesperado título “Brazilian magazines”!), mas nada ali confirmava o potencial de “Sping in Fialta” – e o Slow Children mal chegou ao segundo disco, Uma triste história…

Gaga x Bieber x Britney (e Blur x Oasis)

seg, 14/02/11
por Zeca Camargo |
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Em setembro de 1995, a questão mais palpitante do mundo para quem gostava de música pop era qual banda iria chegar ao número um da parada inglesa, Oasis ou Blur. Lembra? Oasis? Blur? A banda dos irmãos Gallagher era, por uma pequena margem (e grande torcida), a favorita, com “Roll with it”. Damon Albarn, o maior gênio pop depois de… – bem, o maior gênio pop de todos os tempos –, concorria (junto com o Blur) com “Country house”. Por meras 50 mil cópias, o Blur ganhou essa competição – mas não é por conta disso que eu trouxe essa discussão. Ao lembrar dessa “disputa apaixonada” – oriunda de uma época em que provavelmente boa parte das pessoas que vão escrever me criticando pelo post de hoje sequer eram independentes para escolher a música que queriam ouvir –, não quero reacender uma velha discussão na linha “quem é melhor, Blur ou Oasis?”, mas simplesmente perguntar: hoje, você seria capaz de assobiar uma das duas músicas?

Poucas coisas são tão efêmeras no cultura pop quanto um sucesso no topo da parada. Naquele setembro de 1995, “Roll with it” ficou em segundo lugar entre os “singles” mais vendidos na Inglaterra. Mas será que essa música era mesmo inferior a “Country house”? Seria a faixa do Blur tão superior assim, a ponto de liderar a preferência popular. Ou ainda: será que essa discussão era tão importante assim?

A pergunta me parece bastante oportuna pelo frisson que três das maiores estrelas do pop atual causaram este fim-de-semana ao “lançarem” novas canções. O verbo “lançar” está entre aspas, por razões óbvias: um lançamento oficial de uma música pop hoje em dia é algo bastante relativo: com tantos “leaks” (ou vazamentos) que rolam hoje em dia na internet, é quase impossível manter mistério – ou mesmo uma exclusividade – sobre essas “estréias”. O que não impede os artistas de insistirem em criar um clima em cima desses (hoje) pseudo- eventos – como, aliás, Lady Gaga fez com sua “Born this way”, na última sexta-feira.

Gaga, claro, é apenas um vértice desse tri��ngulo de estrelas que vem enlouquecendo o tráfego do twitter desde meados da semana passada – os outros, como você já adivinhou (aliás, está escrito no título lá em cima!), são Britney Spears e Justin Bieber – respectivamente com “Hold it against me” e “Dr. Bieber”. A histeria tem sido tanta que chego a duvidar que se, por exemplo, o ditador egípcio Hosni Mubarak tivesse renunciado à presidência do Egito, ou Ronaldo “Fenômeno” tivesse anunciado o fim de sua carreira como jogador, eu duvido que veríamos a mesma repercussão!

O quê? Mubarak renunciou? Ronaldo se aposentou? Mesmo? Calma! Estou brincando com fatos que de fato aconteceram, mas você me entendeu. Não estou fazendo aquela demagogia barata que de vez em quando aparece num comentário por aqui (e alhures!) na linha: “com tanta coisa acontecendo no mundo, vocês ficam falando de música pop?”… Só quis dar uma idéia da proporção das coisas: a tríade que atualmente impera no universo musical provocou um furacão de proporções razoáveis na internet nos últimos dias (e deve continuar provocando) deixando para trás eventos chacoalhantes da nossa vida cotidiana. Mas quem disse que as novidades desses artistas também não são “importantes” para o nosso dia-a-dia? Por isso, vamos a eles. Mas, antes de dar minha opinião sobre cada uma dessas faixas, porém, convido você a refletir um pouco sobre a importância do que está acontecendo para os “anais do pop”.

E, para isso, aqui vai uma informação, que resgatei lá dos meus tempos de MTV: sabia que a faixa que a gravadora (e mesmo os artistas) escolhem para a ser a primeira a ser lançada de um novo álbum (cuja expectativa está nas alturas) nunca é a melhor do disco? Faz sentido: se você tem uma legião de fãs ansiosos para ouviu “qualquer coisa” de uma mega banda – ou um super artista –, o natural é que você lance… qualquer coisa! As pessoas – ou melhor, os fãs – vão consumir o que quer que venha de seus ídolos. Depois desse momento inicial, aí começam a vir as músicas realmente boas, fundamentais para garantir aos fãs que eles não estavam errados: aquele é mesmo o artista que eles tanto esperavam ouvir com novo material!

Só para ilustrar, pense em “Achtung baby”, o disco de 1991 do U2. Lembra-se qual foi o primeiro “single”? “The fly” – uma faixa que, embora genial, estava longe se ser uma música fácil. Nem precisa me lembrar que ela foi “número 1” na Inglaterra (e na Austrália!) – ah, e “número 61” nos Estados Unidos… Os fãs ajudaram a fazer de “The fly” um sucesso, mas você há de convir que ela é um pouco “esquisita” – especialmente esquisita se você lembrar que ela anunciava mais uma nova fase da banda. Mas logo em seguida, como segundo “single”, veio “Mysterious ways” – e aí tudo começou a fazer sentido: sou capaz de apostar dinheiro que você não se esqueceu até hoje aqueles dois acordes que abrem a canção, mas é não consegue nem cantarolar a introdução de “The fly”… Assim, para chamar atenção para três dos mais esperados álbuns de 2011 – justamente os de Lady Gaga, Britney Spears e Justin Bieber –, seria natural que os três artistas viessem apenas com “aperitivos” do que eles são realmente capazes de mostrar.

Fãs desses três artistas, antes de sair twittando que eu estou falando mal de seus respectivos ídolos (e meus também, enquanto devoto de cultura pop), tentem pelo menos ler um parágrafo até o fim – ou melhor, eu vou facilitar: tentem ler pelo menos uma frase até o fim, justamente a seguinte. “Hold it against me”, “Born this way”, e “”Dr. Bieber” são faixas poderosas, com Spears, Gaga, e Bieber (respectivamente) esbanjando o que cada um sabe fazer de melhor. Eu mesmo tenho elogios a fazer a cada uma dessas músicas (já já!). Mas quando chamei essas canções de “aperitivo”, é na crença absoluta de que vem coisa melhor por aí! E olha que o que já ouvimos até agora já é muito bom.

Como diria a escritora americana Fran Lebowitz – uma das pessoas cujo talento para escrever (e escrever com humor eu mais invejo no mundo – quem sabe quando eu crescer vou ser igual a ela!) -, só existem dois tipos de música: “Música boa e música ruim. Música boa é música que eu tenho vontade de ouvir. Música ruim é música que eu não tenho vontade de ouvir”. E a boa notícia é que Bieber, Britney e Gaga vieram com músicas que eu tenho muito vontade de ouvir. Vamos começar por “Born this way” – já que a apresentação de Lady Gaga ontem na cerimônia do Grammy ainda está fresca na minha mente.

Por falar nela, foi só eu que reparei que a versão que ela cantou nessa festa era ligeiramente diferente dessa que está disponível desde sexta-feira no sire da cantora? Eu diria que era até ligeiramente melhor? Se a performance de Gaga – e seus surpreendentemente despojados bailarinos (também, com corpos como aqueles, quem precisa de figurino?) – pareceu discreta, especialmente quando a gente compara com outras aparições recentes, “Born this way” me conquistou – novamente. Não é difícil admitir que seu refrão não é dos mais acessíveis que Lady Gaga já gravou. Tampouco é complicado perceber porque um turbilhão de comentário (e “mash-ups”) na internet batem na tecla de que a música é fortemente inspirada em “Express yourself” – um clássico de Madonna. Mas mesmo com todos esses, hum, obstáculos, “Born this way” é “pura” Lady Gaga (Ou “pura Whitney Houston? Quem diria que ela iria agradecer à diva pela inspiração ao receber um prêmio ontem no Grammy? Mas eu divago…).

Primeiro porque o “primeiro mandamento de Gaga” foi respeitado – aquela que é a missão primordial da cantora na Terra: “Let’s dance”! “Born this way” foi feita para isso! Depois, como resistir à voz da cantora – que, se já era incrível, está cada vez mais potentes. E por último, tem a elegante mensagem anti-homofóbica da letra da música, com Lady Gaga respondendo ao mesmo tempo aos fãs no extremo da diversidade e aos críticos mais reacionários. O que não há para gostar nessa combinação?

Passemos então para Justin Bieber – que também fez uma aparição no mínimo curiosa no Grammy de ontem. (Estou aqui tentando não comentar sobre a cerimônia, o que  desviaria demais do que quero falar hoje – mesmo para meus parâmetros de divagação… Ainda assim, diga lá: você também achou a reunião de Bruno Mars, B.o.B., e Janelle Monae, uma das melhores coisas da noite, musicalmente falando? Cindy Lauper, que logo chega aqui no Brasil, aplaudiu de pé… Bom, retomando…). Antes de mais nada, que achado aquele vídeo antigo dele com Usher! Foi a escada perfeita para a apresentação que viria a seguir. Para “apresentar” a nova canção “Never say never” (mais um trampolim para a trilha sonora do filme com o ídolo que está prestes a estrear) vimos primeiro sua parceria com Jaden Smith – que pareceu agradar mais papai e mamãe Smith, sentados na platéia, do que aos fãs do próprio Bieber… Bem, mas aí veio Usher, fez seu número solo direitinho, e então fomos brindados com os dois artistas (Usher e Bieber) dançando uma coreografia muito bem ensaiada e vibrante! Calou a boca de quem achava que essa combinação seria um desastre…

Mas e “Never say never”, a canção? Boa, sim – mas, sobretudo você que é fã, não era de se esperar um pouco mais? Insisto: essa música tem mais a ver com o filme do que com o novo álbum de Bieber – e por isso, prefiro me concentrar em “Dr. Bieber”. Ainda que uma apreciação correta dessa faixa seja difícil, uma vez que “oficialmente” só conhecemos trechos da música (e nada do que eu ouvi até agora me pareceu uma sólida “versão final”). Não obstante, o que se anuncia é uma poderosa “bomba” pop – tudo em seu lugar certo: uma batida hipnótica, um verso idem (que, não por acaso, traz o nome do próprio Bieber), um óbvio apelo dançante, uma produção moderna, e ainda um toque de ousadia… será que ele emplaca como “rapper”? Antes de pensar numa resposta, atenção: se você está realmente preocupado ou preocupada com isso é porque, como diz a própria música, você já está infectado com a “febre Bieber”. Desista de procurar a cura…

Falta então falar de “Hold it against me” – da artista estranhamente ausente nessa cerimônia do Grammy: Britney Spears. Em uma frase: um grande refrão à procura de uma boa música. Sério! Eu adorei o coro de “Hold it against me”. Grudou na minha memória desde a primeira vez que o ouvi. Mas, como quase todas as construções pop hoje em dia, ela parece ter sido composta por blocos, trecho por trecho. E, embora a música toda seja consistente – e duvido que alguém consiga resistir a ela numa pista de dança – eu (como, imagino, muitos fãs), vou ficar contando as batidas entre um refrão e outro toda vez que a escutar… Na verdade, a principal frase musical é tão boa (repita comigo: “you feel like paradise, and I need a vacation tonigh, so if I say I want your body now, would you hold it against me?”) que talvez esse “resto” da faixa nem seja tão importante assim. Já consigo até imaginar o clipe – que está para estrear… “Hold it against me” tem tudo para Britney brilhar. De novo. E de novo. E de novo…

Aí estão, então, os três grandes competidores para o que parece ser a grande disputa pop deste século. O veredicto, claro, sempre que a gente fala de música pop, está nas mãos do público – e que vença o melhor! Mas, pensando na outra “luta do século” (isto é, do século 20) que mencionei no início do texto de hoje. Será que vamos estar cantando uma dessas três músicas em 2025?

O refrão nosso de cada dia

“Throwaway”, Mighty Mighty - olhando as duas primeiras indicações deste novo espaço (para entender e aproveitar, clique aqui), acho que passei a impressão errada: a de que um bom refrão tem que vir de países inesperados, como Tailândia ou Colômbia. Pois aqui está uma bom exemplo do melhor pop inglês. Não é muito recente, é verdade – o Mighty Mighty apareceu com a música “Law” numa influente compilação em fita cassete feita pelo semanário musical inglês “NME” em 1986 (o antológico “C86″), ao lado de bandas como Soup Dragons, Primal Scream e The Pastels. Não tiveram uma carreira muito brilhante, mas deixaram, em “Throwaway” um dos refrões mais memoráveis da história do pop/rock – “jogado fora… como um chiclete quando o sabor vai embora…”.

Admirável mundo novo (minha mais recente versão)

qui, 10/02/11
por Zeca Camargo |
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Li o famoso livro de Aldous Huxley (este, onde fui buscar o título para o post de hoje) quando estava na faculdade – época em que, posso afirmar com segurança, entramos em contato com livros que não esqueceremos jamais. Aliás, se eu for começar a lembrar – “O que é isso, companheiro?”, “Memórias de Adriano”, “Porcos com asas”, “O nome da rosa”, “O quarteto de Alexandria”, “Trópico de câncer”, “Morangos mofados”, “A tragédia da Rua das Flores”, “Maldição eterna a quem ler estas páginas”… – sei que vou divagar, e ainda está muito cedo para isso! Citei “Admirável mundo novo” como inspiração porque, além de evocar a visão utópico-pessimista do livro – que projeta um futuro desumano para nossa mal-fadada espécie, em meados do século 26! –, a frase é quase que um bordão pessoal para mim.

Muito tempo depois que li o livro, descobri que ela foi tirada de uma das mais belas obras de Shakespeare, “A tempestade” – e com um sentido bem diferente do que aquele que eu costumo pegar emprestado. Na voz de Miranda, uma das personagens principais da peça, ela celebra um lugar onde as pessoas são fantasticamente interessantes, cercadas de magias e encantos, num convite sedutor – e, em última análise, perverso – para que se fuja da realidade. Huxley, claro, distorce esse sentido no seu livro, ironizando o deslumbramento de Miranda para descrever um mundo talvez admirável “cientificamente”, mas execrável do ponto de vista humano e social.

Minhas intenções, humildemente, são bem mais simples do que essas… Costumo dizer que estamos diante de um “admirável mundo novo” quando me vejo cara a cara com uma nova descoberta – quase sempre tecnológica. Não precisa ser grande coisa não – me lembro, por exemplo, de ter pensado nisso quando vi o filme de animação “Aladim” pela primeira vez… (o mesmo aconteceu depois com “Toy story”, “Shrek” e “Rattatouille”…). Ou quando eu consegui mandar a primeira foto por telefone para alguém… Coisas assim.

E esta semana senti-me inspirado novamente a usar essa expressão quando descobri uma nova ferramenta na internet chamada Google Arte Project – simplesmente a coisa mais legal que poderiam ter feito para quem sempre sonhou conhecer os museus mais importantes do mundo, mas ainda está bem longe conseguir um orçamento razoável para tal façanha! É tão simples assim: com apenas alguns cliques – e, claro, uma conexão razoável de internet – você vai poder passear pelos corredores das maiores coleções de arte que o homem já conseguiu juntar.

O truque é simples: o Google usou a mesma tecnologia do Streets View, aparentemente (faço essa ressalva porque não entendo nada desse assunto, mas parece similar), mas dessa vez não para registrar casas e pessoas (e eventualmente cadáveres!) e compor um mapa “realista” da cidade, e sim as salas e obras de alguns museus que são referência universal para os amantes de arte. Eu, particularmente, nunca achei muita graça em perder meu tempo com o Street View – a não ser para conferir os instantâneos dos endereços que frequento (e, eventualmente, algum flagrante de uma figura conhecida). Um mapa, até que me provem o contrário, é sempre mais útil quando visto de cima – e, como viajante tarimbado, posso confirmar que é assim que me organizo espacialmente em qualquer lugar do mundo onde visito. Ver as ruas “de frente”, pelo menos até agora, não provou ser muito prático no sentido de ajudar a me localizar em uma cidade (sobretudo em uma cidade que não conheço). Mas quando eles resolveram aplicar o mesmo truque dentro de um museu…

Aí sim temos um “admirável mundo novo” – aquele em que qualquer pessoa que consiga chegar perto de um computador conectado à internet pode ter diante de seus olhos algumas das obras de arte mais deslumbrantes que o homem já produziu!

Algum tempo atrás, aqui mesmo neste espaço, eu comemorava a facilidade de poder acessar acervos inteiros de museus e lugares históricos através da internet. Com a intenção de se tornarem mais acessíveis pelo mundo, muitos museus estavam disponibilizando nos seus sites reproduções das obras de suas coleções. Se a qualidade dessas imagens ainda não eram ideais (muita coisa melhorou, desde comentei sobre isso, em 2007), só a notícia de que existia essa iniciativa já era para ser celebrada. Porém, o que o Google Art Project oferece vai muito além dessa proposta – não só os trabalhos de várias épocas e vários artistas estão disponíveis para apreciação (muitos deles em alta definição), mas você pode ter a sensação de estar virtualmente passeando pelos corredores dos museus, e escolhendo sobre que obras você quer saber mais, olhar mais de perto, ou simplesmente em frente de qual tela você quer deixar sua imaginação divagar (uma atividade que me é muito cara, claro). Aliás, quase exatamente como você faz num grande museu…

Por onde você quer começar? Que tal pela sala do Templo de Dendur – um “templo” mesmo, egípcio, do século 15 (antes de Cristo), que está montado quase intacto em todo seu esplendor numa das salas mais nobres do Metropolitan Museum de Nova York? Este é um dos meus lugares favoritos no mundo, uma espécie de centro de peregrinação para mim, que “me obrigo” a passar lá todas as vezes que vou à cidade, como um ritual. Vá em frente e explore mais no Metropolitan – ainda que esse não seja o mais completo passeio que você pode dar no Arts Project (são poucas as salas que estão disponíveis na íntegra, por enquanto).

Para uma experiência mais completa, posso sugerir o Museu Van Gogh, em Amsterdã? Não é um grande museu, se você pensar apenas em área construída ou mesmo em quantidade de obras no acervo. Mas ele abriga simplesmente a mais concentrada coleção de um dos artistas mais importantes – e certamente o mais cobiçado – de todos os tempos. É praticamente impossível alguém não se deixar seduzir por Van Gogh – pelas suas obras, pelas suas cores e pinceladas, pela sua loucura. Agora, mesmo que a capital holandesa esteja bem longe de seus planos, você pode conhecer cada peça desse acervo, e se perder no universo fascinante desse artista…

Ainda nas “pequenas” coleções, sugiro que você passe então para a Frick Collection, em Nova York. Nascido de uma coleção particular – digamos, uma “poderosa” coleção particular –, o museu é visita obrigatória para quem passa pela primeira vez pela cidade. Concentrado no melhor dos clássicos artistas europeus – só Vermeer (um dos artistas mais raros e admirados do mundo), a Frick tem três! – o acervo é um delírio para quem gosta de explorar arte de uma maneira mais íntima. E essa mesma “intimidade”, ainda que virtual, você pode desfrutar agora no Google Arts Project.

Pronto (ou pronta) para vôos mais altos? Então que tal passear pelo Palácio de Versailles? Esse mesmo, o “templo do luxo”, “casa dos excessos”, retiro de Luís 14… Pois ele está lá, em todo seu esplendor – e com uma definição bastante razoável, especialmente para quem nunca teve a chance (ainda!) de conhecer aquilo tudo de perto. Ah sim, os jardins também estão disponíveis para visita – e embora a sensação, ao ar livre, seja um pouco mais “congelada”, a beleza é tamanha que você pode, num simples exercício de imaginação, sentir-se circulando por lá!

Até agora, falei de museus e lugares que já tive o prazer de conhecer pessoalmente. Estou aqui exaltando a qualidade de um projeto desses, tentando não pensar nas diferenças entre ver uma coleção “ao vivo” e “virtualmente” – até porque, reconheço que ter podido visitar vários desses lugares (alguns até mais de uma vez) é sim um privilégio. Mas será que a “magia” do Art Project funciona também para lugares que eu ainda não conheci? Será que eu posso mesmo recomendar com entusiasmo uma idéia como essa – que vai aproximar milhões de pessoas a coleções únicas de arte que talvez elas jamais vão conhecer pessoalmente?

Para tirar essa dúvida, fui conferir o Museu Hermitage, que fica em São Petersburgo, na Rússia – país que nunca visitei (e você acha que eu conheço o mundo inteiro…). Apesar de já ter visto reproduções de várias peças desse acervo – e, eventualmente, até uma ou outra obra ao vivo, emprestada temporariamente para algum outro museu que eu estivesse visitando – sempre tive a maior curiosidade para ver essa que é, notoriamente, uma das coleções mais belas do mundo. A boa notícia é que, pelo menos até eu ter a oportunidade de passar por São Petersburgo, minha curiosidade está saciada – só de passear virtualmente pelos corredores do Hermitage no Google Art Project.

Mas tem muito mais… Explore o belíssimo “Nascimeto de Vênus”, de Botticelli, na galeria Ufizzi, em Florença, na Itália. Chegue perto de “Os embaixadores”, de Hans Holbein, na National gallery, em Londres. Navegue entre os Cézanne do MoMA, de Nova York. Confira cada detalhe de “Ronda noturna”, de Rembrandt, no Rijksmuseum, em Amsterdã. E, usando uma ferramenta que o próprio site oferece, construa você mesmo sua coleção de arte “virtual”. Outros museus, outras galerias – e certamente outras obras-primas devem se juntar ao projeto.

Por isso mesmo, pode comemorar: pelo menos para quem ama museus, este é sim um admirável mundo novo…

O refrão nosso de cada dia

“La culpable”, Aterciopelados – esta banda (hoje num hiato) já foi a grande promessa do rock alternativo colombiano. Existe “rock alternativo” colombiano”? – você já está se perguntando…  “E como!”, é a minha resposta. “Shakiras” à parte – uma artista cujo talento e apelo pop mundial é inquestionável – a Colômbia faz um dos melhores pop da América latina há décadas, e o Aterciopelados é uma das provas mais recentes disso. Da sua vasta coleção de ótimas canções poderia tirar uma boa dúzia de refrões, mas o de “La culpable” é meu favorito – talvez pela “harpa paraguaia” ao fundo, sublimemente entrelaçada com os vocais sôfregos do coro. Sugiro que você os explore mais…

(para entender e aproveitar melhor este espaço, clique aqui)

“É o refrão, estúpido!”

seg, 07/02/11
por Zeca Camargo |
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A intenção não é ofender… Eu apenas adaptei a famosa frase da antiga campanha que elegeu Bill Clinton presidente dos Estados Unidos (“It’s the economy, stupid”, que atacava um ponto fraco do favorito à reeleição, Bush “Pai”, que havia descuidado da questão econômica bem quando o país estava em recessão) em 1992 – e por uma causa justa: para defender a importância do refrão na música pop.

Quando comentei recentemente que um dos problemas da “pseudo obra-prima” de Kanye West, “My beautiful dark twisted fantasy” – um título que, como me ocorre agora, seria perfeito para o filme “Cisne negro” (mas eu, claro, divago) – era que o tal artista negligenciava a questão do refrão (com raras exceções) deixei claro que queria desenvolver mais o assunto. Os patrulheiros de plantão responderam previsivelmente protestando. Alguns na linha “grandes clássicos do rock/pop (e até hip-hop) não precisam de refrão” – uma idéia fácil de rebater quanto o mero exercício de lembrar algumas das melhores músicas dos Beatles. De “D’yer mak’er”, do Led Zepellin, a “Smells like teen spirit”, do Nirvana – até “Heavy cross”, do The Gossip, ou mesmo “Liztomania”, do Phoenix – os exemplos são infinitos de um feliz casamento entre “rock de verdade” (seja lá o que for isso!) e um bom refrão.

O outro tipo de “protesto” vinha de vozes que achavam que refrões só servem a artistas “fáceis”, “fabricados” ou “……..” (coloque o adjetivo pejorativo que você preferir aqui), que fazem uso desse “golpe baixo” para conseguirem espaço nas rádios – e assim abduzirem nosso gosto musical com “músicas ridículas”… Bem, sem a menor intenção de diminuir o talento de nomes manjados que fazem um enorme sucesso nas rádios (e que eu também sei apreciar) – de Britney Spears a Justin Bieber, para ficar apenas nos exemplos recentes – aqui vai uma breve lista de artistas geniais, criadores de refrões memoráveis e portadores de credibilidade, acredito, inabaláveis: David Bowie (“Changes”, “Ashes to ashes” etc.); Queen (“Love of my life”, “We are the champions” etc.); The Clash (“London calling”, “Should I stay or should I go” etc.); U2 (“I still haven’t found what I’m looking for”, “One” etc.); The Smiths (“There is a light that never goes out”, “How soon is now?” etc.); The Cure (“In between days”, “Boys don’t cry” etc.); Radiohead (“Creep”, “Let down” etc.); The Strokes (“Last night”, “Someday” etc.) – e segue…

Preciso reforçar dizendo que não endosso nenhuma desses “argumentos de protesto”? Não existe nada mais sublime, em música pop, do que o mistério de um trecho de uma música que você ouve uma vez e imediatamente quer ouvir de novo. Um bom refrão é sim uma obra de arte de primeira – e a ausência de bons exemplos numa temporada musical pode ser inquietante. A ponto de provocar reclamações ressonantes como o texto recente de Jon Pareles – um dos mais respeitados críticos de música, que escreve no “The New York Times” – sobre uma “sensação deprimente” que tomou conta dele ao tentar ouvir rádios de música pop recentemente.

A decepção de Pareles não era apenas com a mesmice e a “falta de profundidade” das canções que ele ouviu casualmente – seus exemplos eram “Dynamite”, de Taio Cuz, “Baby”, de Justin Beaber, e “Imma be”, do Black Eyed Peas. Fuçando no atual cenário alternativo, ele não encontrou também muita consolação – e olha que ele estava falando de “I want to” do Best Coast. Sua meditação segue de maneira brilhante por caminhos mais ambiciosos (e “filosóficos”) do que eu pretendo abraçar hoje aqui – como você pode conferir neste trecho, como sempre, na minha tradução apressada:

“Os bordões para lá de familiares do século 21 – muita informação e os reduzidos intervalos de atenção que são resultados disso – só crescem mais insistentes década adentro. As técnicas de gravação de ‘loop’ e ‘samples’ encoraja produtores sem imaginação a repetir algo meramente adequado à duração de uma música, no lugar de enriquecê-la. O som dos MP3s que sai pelos fones de ouvido privilegiam o que é frágil e pequeno, não o exuberante e sutil”.

Mesmo assim quero “usar” Jon Pareles como “escada” para sugerir que o problema do pop atual é agravado pela ausência de um refrão perfeito. Quem é que está preocupado com isso? E quando digo “refrão perfeito”, não estou pensando apenas em uma quadrinha bonita, com uma rima justinha, que a gente canta quase sem perceber. Pode ser apenas uma frase – por exemplo, “Hey ya!”, do Outkast! Ou mesmo só um gritinho – tipo “U-hu!”, como o Blur faz em “Song 2”. É pedir demais? Eu sei que é…

Momentos inspirados como os que citei acima são raros. O mais comum é que encontremos bons refrões que são como trabalhos de carpintaria, nos quais se percebe que um músico (ou uma banda) perdeu um bom tempo trabalhando em cima de um tema para sair com algo próximo à perfeição. O próprio Blur, que acabei de citar, tem vários composições nessa linha: “Out of time”, digamos. Raras vezes se reuniu tanta melancolia e tranquilidade numa quadrinha – que ainda vem com o toque de gênio de Damon Albarn, quando ele, antes de a música terminar, repete o último verso, não quatro (como seria de se esperar), mas cinco vezes, uma mais bela e mais triste que a outra…

Já ouviu “Oblivious”, de uma banda dos anos 80 chamada Aztec Camera? Desafio você a me apresentar um refrão mais fofo, mais apaixonado e mais sincero do que esse – que certamente também deu trabalho para sair. Pegue “Ragazzo fortunato”, do italiano Lorenzo “Jovanotti”! Redondo, bonito, uma explosão de alegria! Ou que tal um mantra hipnótico como o clássico pop “Sweet dreams (are made of this)”, do Eurythmics? Você acha que o brilhantismo de “I get around”, do Beach Boys, surgiu assim, do nada? E quantas vezes você acha que o Manic Street Preacher teve de experimentar uma frase musical que, não só contivesse, mas também adornasse e elevasse a um outro patamar o sensacional grito de guerra “If you tolerate this then your children will be next”?

Não quero dizer que é impossível fazer pop sem refrão. De vez em quando, somos brindados com uma “obra magna” que não só dispensa o “corinho” como abala nossa estrutura de ouvinte. O caso mais óbvio, claro, é “Bohemian rhapsody”, do Queen – que do alto dos seus mais de seis minutos nos fez acreditar, pelo menos por algumas semanas de 1975, que a ópera era o novo pop! Nada em “Paranoid android”, do Radiohead, se parece com um refrão – o que não torna a faixa menos fundamental. Eu citaria aqui “Eduardo e Mônica”, do Legião Urbana, não fosse o fato de a música, que não repete nenhum verso (fora a introdução “Quem um dia irá dizer…”), tem sim um refrão disfarçado – o tema musical que é retomado a cada estrofe da saga do casal. Nesse sentido sou mais Caetano Veloso com seu “Ele me deu um beijo na boca”, com seu versos aparentemente soltos que sem esforço (e sem repetição) se encaixam na música simples, valorizando a batucada…

Aliás, nem é preciso que a música seja longa para ela poder esnobar o refrão – e mesmo assim conquistar seus ouvidos. Alguns músicos argentinos, em particular, são muito bons nisso – fora Juana Molina, que é mestre nisso e já foi bastante citada neste espaço, sugiro que você confira os mantras musicais de El Robot Bajo el Agua (“De frente”, “Dale que va”, e sobretudo a belíssima “Vertiente”, que não tem nem sombra de um estribilho), e ainda o bizarro e sublime som do A-tirador Laser, do músico Lucas Marti, que assina talvez a mais bela canção sem refrão que eu conheço, “Atemporal”.

(Parênteses necessário: os argentinos são muito bons também de refrão, como você pode conferir em trabalhos de artistas como Migue Garcia, Rubin, Gabo Ferro, La portuaria – “y muchos otros”. E é um prazer, como vou explicar em breve, encontrar, em outras línguas, exemplos de que o encanto do refrão é universal!).

Mas é que o apelo de um trechinho de música instantaneamente reconhecível é irresistível – e inquestionável. E foi por isso que eu considerei o último álbum de Big Boi (“Sir Lucious left foot – The son of Chico Dusty”) bem melhor do que o de Kanye West (“My beautiful dark fantasy”). Ainda acha que eu exagero? Então seja honesto ou honesta: que música você preferiria ouvir em “loop” por meia hora, “Power” (Kanye) ou “Tangerine” (Big Boi)? A segunda, claro, que tem refrão, claro!

Qual o problema de se apoiar numa estrutura dessas? Longe de ser apenas uma muleta, um bom refrão é um trampolim para um reconhecimento maior e uma aceitação quase universal. Duvida? Então pergunte a Lulu Santos, que há mais de duas décadas produz um refrão mais cativante que o outro – e se você nunca cantou um deles, só posso sentir pena… Acha Lulu “pop demais”? Que tal então Tim Maia? Lembra de “A semana inteira, fiquei te esperando…”? Tenho certeza de que você vai completar os versos sem eu precisar te ajudar…

Nosso pop – apesar de algumas bandas, especialmente as mais contemporâneas, ainda insistirem em apertar versos que não cabem em truncadas frases musicais, e muitas vezes nem rimam (você sabe de quem estou falando) – tem exemplos impecáveis dessa ourivesaria musical. Como “Fácil”, do Jota Quest. Ou “Passe em casa”, dos Tribalistas. Ou quase tudo do Skank. Ou “Me adora”, da Pitty. Ou (e eu sei que muitos vão parar de ler este texto por aqui), “Bolha de sabão”, de Cláudia Leitte. Ou (e aqueles que não pararam de ler na última frase, certamente vão parar nesta) “Ei, psiu, beijo me liga”, digamos, com Michel Teló…

E talvez seja por isso que nossa música viaja tão bem – e disso eu entendo. Quando chego em qualquer lugar do mundo, logo que falo que sou brasileiro, a conversa invariavelmente termina em música (depois de uma escala, claro, no futebol!). Nós temos esse “poder” – o da música – e temos o privilégio de ele ser bem disseminado pelo nosso modesto planeta. Mas para já ir encerrando o texto de hoje, queria defender outros pops – outros refrões. Por um motivo simples: se mal temos tempo de ouvir tudo de bom (e de ruim) que é produzido no pop brasileiro, que chance temos de conhecer o que é feito no resto do mundo?

Pois eu estou aqui para ajudar… e provar que esse apelo do refrão é, como já mencionei, universal! Para isso, peço primeiro para você deixar de lado seus pré-julgamentos. Vamos usar, para isso, uma banda que (muito provavelmente) você não conhece: El Canto del Loco, da Espanha. Deparei-me com o trabalho deles quando, no ano passado, pesquisava coisas legais para comprar numa visita rápida que fiz a Madri. Nunca tinha ouvido falar nada deles antes – e logo quando ouvi a primeira música que apareceu no youtube, enlouqueci. Ela era “Besos” – a melhor evidência incontestável de que os caras nasceram para cuspir um refrão bom atrás do outro. Depois vieram mais: “Canciones” (com seu “rock de breque”); “Zapatillas” (com um refrão ainda mais irresistível que o de “Besos”; “Años 80” (que muitos talvez achem que seja uma balada ordinária, mas eu prefiro chamar de “uma armadilha para seus ouvidos”); “Son sueños” (uma balada que talvez você ache ainda mais ordinária, mas que eu acho ainda mais genial); “Peter Pan”…

Convido então você a fazer esse exercício: ouvir o trabalho de uma banda (supostamente) desconhecida e ver se você se encanta com sua música, independente de que língua ela seja cantada. Aliás, vou fazer melhor: a partir de hoje, para produzir um dossiê de evidências de que não existe nada mais poderoso do que um bom refrão, eu vou oferecer a você, no final de cada texto, uma música que eu acho que traz um exemplo perfeito disso.

Toda segunda e toda quinta eu vou tentar sempre te surpreender – e, para isso, independente do assunto que eu estiver comentando, vou indicar uma música no final do post, sob o subtítulo “O refrão nosso de cada dia”. Algo simples, apenas um parágrafo e um link – para quem sabe te ajudar a matar uns minutinhos da sua aborrecida aula/rotina/insônia…

Vou aceitar suas sugestões também – mande músicas que você acha que tem refrões perfeitos, em qualquer língua, de qualquer gênero. Assim podemos fazer juntos uma “Enciclopédia do bom refrão”. Sem vergonha de cantar junto (mesmo errado). E tenho dito!

O refrão nosso de cada dia

“Fai yen”, Ream Daranoi – uma jóia encontrada na recente compilação de faixas de jazz e pop gravadas na Tailândia, entre meados nos anos 60 e 70, do disco “The sound of Siam” (você o encontra aqui). Meu tailandês está “um pouco enferrujado”, mas quem disse que você precisa entender uma palavra para ser embalado por essa voz? O que eu chamo de um bom começo para esse nosso espaço…

Como convencer seu namorado a assistir a ‘Cisne negro’

qui, 03/02/11
por Zeca Camargo |
categoria Todas

Diga para ele que é um filme sobre sexo entre duas mulheres disfarçado numa história de balé! Como você que gosta de cinema provavelmente já desconfia, “Cisne negro” – que tem ampla estréia nacional nesta sexta-feira – conta a história de uma bailarina, Nina (Natalie Portman), que sonha em pegar o grande papel principal de uma das mais importantes coreografias da história da dança clássica. Ou seja, um filme sobre balé, que só por ter esse tema já oferece uma resistência forte a milhares de namorados (e noivos e maridos) que acham que já gastaram sua cota para filmes, hum, “sensíveis” de todo o século 21 quando foram arrastados para assistir a “O segredo de Brokeback”.

(“Cisne negro” e “Brokeback” não poderiam ser filmes mais diferentes, eu sei – tanto na temática, como na condução e direção. Mas você sabe como essas coisas se confundem na cabeça de quem está acostumado a esperar por uma sequência de “Transformers” ou “Velozes e furiosos” – que já está, acredite, na sua quinta reencarnação – como se fosse o grande acontecimento cinematogr��fico da temporada… Mas eu, claro, divago).

Enfim, antes de elogiar “Cisne negro” – que merece sim, muitos elogios -, quero bater palmas para os executivos da Fox Searchlight (a produtora do filme), que certamente, ao se darem conta de que estavam diante de um “filme de arte” que tinha tudo para se tornar uma superprodução, a não ser pelo fato de que ele girava no limitador universo do balé – que, potencialmente, teria mais apelo ao público feminino -, decidiram “apimentar” o roteiro com uma cena de sexo entre Nina e uma rival sua na companhia, Lily (Mila Kunis), uma sequência de fazer inveja a Stephen Dorff em “Um lugar qualquer” (mais sobre esse filme, daqui a pouco).

Com essa “isca” – devem ter pensado os executivos -, todo mundo sai contente do cinema: ela viu um filme de superação de uma fantasia tipicamente feminina (que garota nunca sonhou, nem de leve, ser uma “prima ballerina”?), e ele teve de aguentar longas sequências de pontas e tutus, mas por outro lado viu um outro tipo de fantasia sua ser recompensada. E com louvor…

Acontece que “Cisne negro”, que vi numa pré-estréia na última terça-feira, não é um filme tão simplesmente bidimensional como estou propondo neste começo de texto, explicitamente para provocar. Na verdade, quem quer convencer alguém de ir ao cinema para ver “Cisne negro” tem bem mais do que um simples argumento para isso. Essa produção – que é uma das mais cotadas para o Oscar de melhor filme (a conferir no próximo dia 27) – deve agradar não apenas aos amantes do balé, ou de cenas de belas mulheres ensinando aos homens “como se faz”, mas também a quem gosta de um bom filme de suspense (até de terror!); ou de um bom “thriller” psicológico; ou de uma boa história de manipulação (Nina tem que driblar duas, a da sua mãe e a do diretor da companhia); ou de uma trama que confunde alucinação com realidade; ou ainda, quem admira uma boa direção de arte e fotografia na tela grande.

São, na verdade, tantos motivos para gostar do filme que eu seria incapaz de dizer o que realmente me fisgou em “Cisne negro”. Numa sinopse rápida, ele narra a luta de Nina para ser não apenas uma bailarina tecnicamente perfeita, mas também insuperável na emoção ao dançar. Thomas (o diretor da companhia, numa boa interpretação de Vincent Cassel – quando ele não é bom?) acha que ela é perfeita para dançar o cisne branco, mas não o negro – e parte para uma série de provocações para desabrochar seu lado mais obscuro, sem saber que em casa, Nina já tem sua cota de loucura por conta da obsessão de sua mãe (que deixou a carreira de balé para cuidar da filha) em vê-la brilhar nos palcos.

Nina – que é uma travação só – vai atrás dessa sua “outra personalidade”, com consequências ao mesmo tempo desastrosas e triunfantes. Dirigido por Darren Aronofsky – de quem só vi “Pi” (genial) e “Réquiem para um sonho” (impressionante) -, “Cisne negro” é, enfim, um filme sobre uma obsessão. E, com tal, é melhor você estar preparado para imagens fortes. Que tipo de imagens fortes? Pense numa mistura de sangue, pele e pena – você não vai se decepcionar…

Dito isto, a sessão de “Cisne negro” é uma maratona. Não tanto emocional – uma vez que as transformações de Nina são quase previsíveis (e eu diria que Natalie Portman, de quem sou fã, não nos fornece as nuances necessárias para que possamos acompanhar sua evolução – não vou aplaudir se o Oscar de melhor interpretação feminina for para ela, como alguns estão prevendo). Mas uma maratona visual, um desafio para seus olhos (não foram poucas as vezes que as mulheres do grupo que estava comigo viraram o rosto para evitar a grande tela…). E quem conseguir atravessá-la pode se considerar um vencedor!

(Falando nisso, não é curioso que outro forte candidato ao prêmio de melhor filme este ano, “O vencedor” – que também estréia nesta sexta no Brasil, mas não é tão poderoso assim -, seja justamente sobre um clichê de obsessão masculina, o boxe, fazendo um inesperado contraponto com “Cisne negro”? O quê? Você acha que eu estou divagando?).

Digo mais: quem atravessar a “maratona do Cisne” vai ter o prazer de sair do cinema discutindo o final do filme de maneira apaixonada, como não fazíamos desde de… bem, desde “A origem”! E, se possível – por exemplo, se o jantar depois do filme incluir alguns chopes e caipirinhas (ou mesmo algumas taças de vinho) -, você vai ser capaz de discutir até o sexo oral que Lily aplica em Nina… E se alguém na mesa tiver tido a chance de assistir a “Um lugar qualquer”, certamente fará piada com o fato de uma cena similar no novo filme de Sofia Copolla ter um desfecho tão diferente, quando seu protagonista, o ídolo hollywoodiano Johnny Marco (interpretado pelo ator Stephen Dorff), leva para cama uma mulher que acabou de conhecer numa festa e, depois de rápidas preliminares, adormece com a boca entre as pernas de sua presa…

Tudo a ver… Afinal, “Um lugar qualquer” registra o aborrecido cotidiano de um “mega star” do cinema – um universo que, como boa parte da crítica sempre lembra de colocar, é bem familiar à Sofia (filha de Francis Ford…). A vida de Johnny é chata. Chata assim: ele vive no Chateau Marmont, um dos hotéis mais sofisticados de Los Angeles, cenários de incontáveis aventuras da fauna hollywoodiana; seus passatempos são passear na sua Ferrari e assistir duas “pole dancers” (tradução: “dançarinas do queijo”) contratadas para fazer uma coreografia erótica privada no seu quarto, e eventualmente oferecer sexo, quando ele não dorme antes do fim da “performance”; ah, e acompanhar sua filha de 11 anos nas rotinas mais banais (a cena de maior “ação” no filme é quando os dois jogam “Guitar hero”!).

Sem nenhum charme, sem nenhum floreio, Sofia desenvolve sua história a passos lentos – em outro contraste radical com “Cisne negro”. Se neste filme temos câmeras frenéticas e cortes abruptos para ilustrar as coreografias, em “Um lugar qualquer” vemos Cleo (a filha de Johnny, interpretada por Elle Fanning – um sopro de vida numa história de semi-zumbis) fazer toda uma coreografia sobre patins de gelo num plano aberto, e os únicos cortes são para o pai, sozinho na arquibancada, trocando mensagens de texto no seu celular. Enquanto Nina cruza Nova York em sinistros trajetos de metrô, Johnny desfila monotonamente de Ferrari por Los Angeles (a cena de abertura de “Um lugar qualquer” é particularmente aborrecida); e enquanto o público que vemos em “Cisne negro” é uma sofisticada claque que sabe apreciar um bom balé em roupas elegantes, Johnny se vê diante de uma bizarra platéia numa premiação da TV italiana (onde ele é homenageado), composta de exageradas “madonnas” em Versace e velhos babões vestindo ternos semi-impecáveis, todos gritando como se aquilo fosse um bacanal.

Esta cena surreal de “Um lugar qualquer” é o único momento de maior barulho no filme. Fora o ronco da Ferrari, você mal lembra que os personagens conversam. Mas é nesse estranho vácuo sonoro que o filme de Sofia ressoa alto. Mesmo descontando possíveis pontos de identificação deste que vos escreve com o personagem de Dorff (afinal, guardadas as devidas proporções, eu tenho cá uma parte da minha vida que é pública), achei que o filme é uma interessante meditação sobre nosso mundo moderno em geral.

Poucos são, claro, os que vivem num patamar tão isolado (e ao mesmo tempo tão exposto) quanto Johnny Marco. Nem por isso, não podemos tirar belas lições da solidão do personagem – e quem sabe até achar no filme, enfim, um caminho para uma liberação maior de tudo que faz a gente pegar um telefone no meio da noite e dizer (exatamente com essas palavras ou não) para alguém que você ainda acha que ama: “Eu não sou nada”…

(No último post, esbocei o desejo de continuar o debate sobre a importância do refrão na música pop. Mas também alertei para os perigos de, numa temporada de Oscars como estamos agora, minha atenção ser desviada por um ou outro filme competidor. Assim, estou adiando a tal discussão para segunda-feira, pode ser? Se eu não for novamente abduzido por Hollywood!)