Celebrando o ano que termina

qui, 31/12/09
por Paulo Coelho |
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O guerreiro viveu todos os dias do ano que passou, e mesmo que tenha perdido grandes batalhas, sobreviveu e está aqui. Isso é uma vitória.

Esta vitória custou momentos difíceis, noites de dúvidas, intermináveis dias de espera. Desde os tempos antigos, celebrar um triunfo faz parte do próprio ritual da vida.

A comemoração é um rito de passagem.

Os companheiros olham a alegria do guerreiro da luz, e pensam: “por que faz isto? Pode decepcionar-se em seu próximo combate. Pode atrair a fúria do inimigo”.

Mas o guerreiro sabe o motivo de seu gesto. Ele se beneficia do melhor presente que a vitória é capaz de trazer: confiança.

O guerreiro celebra o ano que passou, para ter mais forças nas batalhas de amanhã.

Pagando três vezes pela mesma coisa

qua, 30/12/09
por Paulo Coelho |
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Conta uma lenda da região do Punjab que um ladrão entrou numa fazenda e roubou duzentas cebolas. Antes de conseguir fugir, foi preso pelo dono do lugar, que o levou diante do juiz.

O magistrado pronunciou a sentença: pagar dez moedas de ouro. Mas o homem alegou que era uma multa muito alta, e o juiz, então, resolveu oferecer-lhe mais duas alternativas; receber vinte chibatadas ou comer as duzentas cebolas.

O ladrão resolveu comer as duzentas cebolas. Quando chegou na vigésima-quinta, seus olhos estavam inchados de tanto chorar e o estômago queimava como o fogo do inferno. Como ainda faltavam 175, e viu que não aguentaria o castigo, ele pediu para receber as vinte chibatadas.

O juiz concordou. Quando o chicote bateu em suas costas pela décima vez, ele implorou para que parassem de castigá-lo, porque não suportava a dor. O pedido foi obedecido, mas o ladrão teve que pagar as dez moedas de ouro.

– Se você aceitasse a multa, teria evitado comer as cebolas e não sofreria com o chicote – disse o juiz. – Mas preferiu o caminho mais difícil, sem entender que, quando se faz algo errado, é melhor pagar logo e esquecer o assunto.

Aceitando a compaixão

ter, 29/12/09
por Paulo Coelho |
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- Como purificamos o mundo? – perguntou um discípulo.

Ibn al-Husayn respondeu:

- Havia um sheik em Damasco chamado Abu Musa al-Qumasi. Todos o honravam por causa de sua sabedoria, mas ninguém sabia se era um homem bom.

Certa tarde, um defeito de construção fez com que desabasse a casa onde o sheik vivia com a sua mulher. Os vizinhos, desesperados, começaram a cavar as ruínas; em dado momento, conseguiram localizar a esposa do sheik.

Ela disse: “Deixem-me. Salvem primeiro o meu marido, que estava sentado mais ou menos ali”.

Os vizinhos removeram os destroços no lugar indicado, e encontraram o sheik. Este disse: “Deixem-me. Salvem primeiro a minha mulher, que estava deitada mais ou menos ali”.

“Quando alguém age como agiu este casal, está purificando o mundo inteiro”.

Três golpes precisos

seg, 28/12/09
por Paulo Coelho |
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- Como posso saber a melhor maneira de agir na vida? – perguntou o discípulo ao mestre.

O mestre pediu que construísse uma mesa.

O discípulo cravava os pregos com três golpes precisos. Um prego, porém, estava mais difícil e o discípulo precisou dar mais um golpe. O quarto golpe enterrou o prego fundo demais, e a madeira foi atingida.

-Sua mão estava acostumada com três marteladas – disse o mestre.

– Você se acostumou com o que fazia e perdeu a habilidade.

“Quando qualquer ação passa a ser apenas um hábito, ela deixa de ter sentido, e pode terminar causando dano. Cada ação é uma ação, e só existe um segredo: jamais deixe que o hábito comande seus movimentos”.

Um novo passo em falso

sáb, 26/12/09
por Paulo Coelho |
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Como nada muda da noite para o dia, o guerreiro dá um novo passo em falso e mergulha mais uma vez no abismo.  Os fantasmas o provocam, a solidão o atormenta. Como agora tem mais consciência de seus atos, não pensava que isso fosse tornar a acontecer.

Mas aconteceu. Envolto pela escuridão, ele se comunica com seu mestre.

“Mestre, caí de novo no abismo”, diz. “As águas são fundas e escuras”

“Lembra-te de uma coisa”, responde o mestre.  “O que afoga não é o mergulho, mas o fato de permanecer debaixo d´água”.

E o guerreiro usa o resto de suas forças para sair da situação em que se encontra.

Pode ser pecado

sáb, 26/12/09
por Paulo Coelho |
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Amigo do escritor francês Marcel Proust, o abade Arthur Mugnier foi responsável pela conversão ao catolicismo de muitos famosos artistas do seu tempo. Mesmo vivendo numa época moralista, Mugnier procurava lembrar a todos que a ideia central de Cristo é a alegria da redenção, e não as torturas da culpa.

Certa vez o abade foi abordado por uma de suas paroquianas, que – embora já tivesse 75 anos de idade – estava preocupadíssima com os pecados da carne.

-Caro abade – disse ela – de vez em quando me surpreendo olhando meu corpo nu no espelho. Isto é um pecado?

E a resposta do abade veio rápida:

-Não, madame. Isto é um equívoco.

Nasrudin e o ovo

qui, 24/12/09
por Paulo Coelho |
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Certa manhã, Nasrudin – o grande místico sufi que sempre fingia ser louco – colocou um ovo embrulhado em um lenço, foi para o meio da praça de sua cidade, e chamou aqueles que estavam ali.

- Hoje teremos um importante concurso! – disse – Quem descobrir o que está embrulhado neste lenço, eu dou de presente o ovo que está dentro!
As pessoas se olharam, intrigadas, e responderam:

- Como podemos saber? Ninguém aqui é capaz de fazer adivinhações!

Nasrudin insistiu:

- O que está neste lenço tem um centro que é amarelo como uma gema, cercado de um líquido da cor da clara, que por sua vez está contido dentro de uma casca que quebra facilmente. É um símbolo de fertilidade, e nos lembra os pássaros que voam para seus ninhos. Então, quem pode me dizer o que está escondido?

Todos os habitantes pensavam que Nasrudin tinha em suas mãos um ovo, mas a resposta era tão óbvia, que ninguém resolveu passar vergonha diante dos outros. E se não fosse um ovo, mas algo muito importante, produto da fértil imaginação mística dos sufis? Um centro amarelo podia significar algo do sol, o líquido ao redor talvez fosse um preparado alquímico.

Não, aquele louco estava querendo fazer alguém de ridículo.

Nasrudin perguntou mais duas vezes, e ninguém se arriscou a dizer algo impróprio. Então ele abriu o lenço e mostrou a todos o ovo.

- Todos vocês sabiam a resposta – afirmou. – E ninguém ousou traduzí-la em palavras.

“É assim a vida daqueles que não tem coragem de arriscar: as soluções nos são dadas generosamente por Deus, mas estas pessoas sempre procuram explicações mais complicadas, e terminam não fazendo nada”.

Quem ainda deseja esta nota?

qui, 24/12/09
por Paulo Coelho |
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Cassan Said Amer conta a história de um palestrante que começou um seminário segurando uma nota de 20 dólares e perguntando:

- Quem deseja essa nota de 20 dólares?

Várias mãos se levantaram, mas o palestrante pediu:

- Antes de entregá-la, preciso fazer algo.

Amassou-a com toda fúria, e insistiu:

- Quem ainda quer esta nota?

As mãos continuaram levantadas.

- E se eu fizer isso?

Atirou-a contra a parede, deixou-a cair no chão, ofendeu-a, pisoteou-a e mais uma vez mostrou a nota – agora imunda e amassada. Repetiu a pergunta, e as mãos continuaram levantadas.

- Vocês não podem jamais esquecer esta cena – comentou o palestrante.

– Não importa o que eu faça com este dinheiro, ele continua sendo uma nota de 20 dólares. Muitas vezes em nossas vidas somos amassados, pisados, maltratados, ofendidos; entretanto, apesar disso, ainda valemos a mesma coisa.

Posso ajudar?

qua, 23/12/09
por Paulo Coelho |
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Assim que abriu a igreja, o padre viu uma mulher entrar, sen­tar-se no banco da frente, e colocar a cabeça entre as mãos. Duas horas depois, reparou que a mulher ainda estava ali, na mesma posição.

Preocupado, resolveu aproximar-se:

“Posso fazer algo para ajudar?”, perguntou.

“Não, obrigada”, respondeu ela. “Eu já estava conseguindo toda ajuda que preciso, quando o senhor me interrompeu”.

O jesuíta Anthony Mello comenta: “num mosteiro não estava escrito Não fale. Estava escrito: Fale apenas se puder melhorar o silêncio”.

Conversando com o Mal

ter, 22/12/09
por Paulo Coelho |
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Às vezes, o Mal persegue o guerreiro. Então, com tranqüilidade, ele o convida para a sua tenda.

O guerreiro pergunta ao Mal: “você quer me ferir ou me usar para ferir os outros?”

O Mal finge não ouvir. Diz que conhece as trevas da alma do guerreiro.

Toca em feridas não cicatrizadas e clama vingança. Lembra que conhece algumas armadilhas e venenos sutis que o ajudarão a destruir seus inimigos.

O guerreiro da luz escuta. Se o Mal se distrai, ele faz com que retome a conversa e pede detalhes de todos seus projetos.

Depois de ouvir tudo, levanta-se e vai embora. O Mal falou tanto, está tão cansado e tão vazio, que não conseguirá acompanhá-lo.