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seg, 10/03/14
por Bruno Medina |

Olá, o endereço do blog Instante Posterior mudou. As novas postagens estarão em https://g1.globo.com/pop-arte/blog/instante-posterior/

De volta para a realidade

qua, 05/03/14
por Bruno Medina |

“No Carnaval, alegoria de pobre dura pouco”, sentencia o conhecido provérbio a respeito da desalentadora sensação que assola a quarta-feira de cinzas, dia que, por tradição, coloca um ponto final no período de folia e nos arremessa impiedosamente de volta à rotina. Adeus diversão com os amigos, fantasias criativas, cerveja gelada a qualquer hora, clima de pegação. Alô reunião de alinhamento, terno e gravata, café velho na garrafa térmica e clima de “alguém aí vai tomar um esporro”. Em adição ao que foi dito, ao menos para mim, neste ano a data teve um sabor ainda mais amargo, visto que coincidiu com outra grande decepção, ocorrida a milhares de quilômetros de distância de qualquer possível manifestação carnavalesca.

Explico: ontem à noite caiu na rede um vídeo que, ao longo dos últimos 25 anos, foi aguardado com ansiedade pela minha geração. Clicar no botão “play” não seria, portanto, apenas o ato de iniciar a exibição da peça publicitária de um produto potencialmente revolucionário – para dizer o mínimo –, mas sim um evento histórico que corresponderia a um verdadeiro acerto de contas com a tecnologia e a nossa concepção de progresso, em outras palavras, a realização de um sonho de infância.

E eis que, de repente, um DeLorean cruza a tela. O carro para e seu característico abrir de portas para cima revela um envelhecido Christopher Lloyd como condutor. Enquanto o ator caminha por um estacionamento vazio, sua voz em off relembra – como se fosse necessário – “De Volta para o Futuro II”, mais especificamente, um emblemático objeto que compunha a visão futurista de 2015 que se tinha no já longínquo ano de 1989, e que tornou-se um protagonista involuntário do filme: o hoverboard ou, em bom português, o skate voador.

Na sequência, um aviso em fundo preto confirma que o que estávamos prestes a assistir era de fato um experimento real. Lloyd, orgulhoso e emocionado, entrega a prancha para ninguém menos do que Tony Hawk e, em poucos segundos, o skatista mais famoso de todos os tempos estava realizando manobras no ar, sem se dar conta de que, no instante em que subiu naquele skate sem rodas, estabelecia um novo paradigma para seu esporte e, por que não, para a humanidade.

Assim que o vídeo terminou, assisti de novo, e de novo, afinal era dif��cil de acreditar no que meus olhos haviam acabado de testemunhar. Minha reação imediata foi repassar o link para um colega da 5a série, com quem desperdicei incontáveis recreios discutindo a viabilidade do skate voador e de tantas outras maravilhas tecnológicas que deveriam estar ao alcance na época em que o filme se ambientava. O pano de fundo destas conversas, obviamente, não era o advento científico da nossa espécie, mas sim nós mesmos: como vai ser minha vida em 2015? Será que ainda seremos amigos? Será que ainda vou ter cabelos com 37? Um bom emprego, uma casa grande? E os meus filhos, será que vão ser crianças comportadas? De certa forma, para mim e para meu colega, o hoverboard simbolizava a contagem regressiva para um futuro ainda distante que, ao chegar, deveria nos encontrar como homens realizados, vivenciando o ápice de nossas existências.

Então aqui estamos nós, na iminência de 2015, e me pergunto por onde andará meu colega, que a essa altura é apenas um rosto sem nome ao sabor de memórias imprecisas. Quanto ao skate voador, uma análise um pouco mais atenta do vídeo revela indícios que apontam se tratar de uma farsa, ou seja, mais um desses virais muito bem realizados que envolvem celebridades em situações inverossímeis, prestando a credibilidade que possuem a campanhas publicitárias. Ainda não se sabe ao certo o que reuniu Christopher Lloyd, Tony Hawk, Moby e Terrell Owens em torno do lançamento deste produto fictício, e nem quais são as intenções de quem está por trás desta papagaiada toda, mas, no site, o mostrador da máquina do tempo está ajustado para dezembro de 2014.

Avaliando com o distanciamento possível, me parece claro que, apesar das evidências indicarem o contrário, por alguns instantes que fosse, não só eu como muitos dos meus contemporâneos quiseram acreditar que o skate voador enfim era uma realidade, e que, em breve, seríamos nós a voar sobre ele e a acreditar que realmente nos tornamos as pessoas que um dia sonhamos ser.