Música bizarra futurista

ter, 31/03/09
por Bruno Medina |

No intuito de resumir o ainda em curso período de pré-produção do quarto álbum de sua banda, Julian Casablancas ateve-se à sucinta declaração sobre os dias em estúdio com os Strokes: “parte das novas músicas foi inspirada em coisas dos anos 70… mas temos também uma canção bizarra futurista”. Creio que, assim como os demais fãs do quinteto nova-iorquino, também fui levado a contemplar o significado da intrigante definição. O que diabos significa isto?

Uma possível resposta não tardou a chegar. Veio de Tel Aviv, pelas mãos e ouvidos de Kutiman, produtor musical que durante dois meses permaneceu trancafiado em sua casa, aparando as arestas de performances instrumentais postadas no Youtube por gente comum. Os mais de cem vídeos selecionados foram mixados e compilados em sete composições de sua autoria.

A proposta do projeto intitulado de ThruYOU é obter música da sobreposiç��o de fragmentos individuais, tão dispares quanto o trompete desafinado de um aprendiz ou a didática vídeo-aula ministrada por um professor de guitarra. As intervenções são mínimas, apenas colagens e pequenas edições que não interfiram na essência caseira –e aparentemente caótica-  que decorre do complexo quebra-cabeças sugerido pela sincronização dos trechos.

O resultado soa algo semelhante à orquestra youtube, trabalho desenvolvido por meu colega Marcelo Camelo; a diferença, no entanto, fica por conta deste último priorizar uma montagem mais abstrata, que tem na imprevisibilidade, e não na precisão, seu maior trunfo.

Favor não confundir as duas iniciativas citadas com aquelas audições virtuais realizadas pelo Youtube para constituir uma orquestra sinfônica real. Neste caso, o recurso foi empregado não para criar música, e sim para selecionar os participantes que se apresentarão ao vivo e de maneira presencial dia 15 de abril, no Carnegie Hall.

Mas por que ThruYOU merece atenção especial, em meio a tantas iniciativas irmãs já disponibilizadas na web? Bem, a resposta é simples. Se o projeto do israelense não é exatamente pioneiro, ao menos possui a enorme qualidade de soar consistente. Enquanto a maioria dos vídeos classificáveis nesta mesma categoria se resumem a clipes engraçadinhos baseados numa esperta edição de imagens, o foco de Kutiman está aonde realmente deveria: em fazer boa música.

Para os que ainda não se convenceram dos méritos inerentes ao que acabaram de assistir, proponho um exercício. Visualizem este como sendo o primeiro passo de uma longa trilha a ser percorrida, rumo a uma não tão improvável época em que o método demonstrado seja o padrão vigente de produção musical. Se este vídeo fosse o 14 Bis, imaginem o que poderíamos esperar da era dos Jetsons?

Estou certo de que, em sua afirmação, o vocalista dos Strokes nada pretendia além de confundir seus fãs. O futuro pode até dar pinta nas músicas da banda, mas algo me diz que está bem mais próximo de ThruYOU. 

No, no, no: o ‘rehab’ musical

sex, 27/03/09
por Bruno Medina |

É provável que o enredo soe familiar: jovem artista obtém grande êxito comercial em seu disco de estreia e, motivado pelo sucesso –digamos- fácil, ou pela inerente massificação do repertório, resolve mudar completamente de ares. Sob influências que a esta altura soam nada menos do que libertadoras, encanta-se com o rol de possibilidades a seu dispor, e percebe a chance de oferecer ao público recém conquistado o que julga ser mais honesto: as músicas que emergiram das vivências do período anterior, de intensa exposição.

O que poderia ser classificado como aprendizado ou evolução, aos olhos dos executivos das gravadoras é motivo suficiente para disparar a sirene de alerta; seguindo a lógica vigente na indústria fonográfica atual, com o perdão do trocadilho, devo dizer que não é assim que a banda toca. Na cartilha dos altos lucros não está prevista nenhuma alteração na fórmula. Por que arriscar o novo se o “mais do mesmo” já provou funcionar?

Aparentemente este é o dilema do Klaxons. A banda britânica ainda é pouco conhecida por aqui (estiveram no TIM Festival do ano passado), mas lá fora goza de certo prestígio por conta da boa repercussão de “Myths of the near future”. O aguardado segundo álbum já estava quase saindo do forno quando o processo foi abruptamente interrompido pelos executivos:

“nós realmente fizemos um disco denso e psicodélico. Fizemos um álbum pesado e isto não é a coisa certa para nós, eu sei disso. A princípio, e para todos os efeitos, nós somos uma banda pop”. Assim referiu-se ao puxão de orelha Jamie Reynolds, integrante do trio. Denso e psicodélico? Taí, eu queria ouvir este disco, talvez os fãs também quisessem.

O que surpreende nesta declaração é o conformismo, o aparente desprendimento de jogar no lixo meses de trabalho em prol de uma fidelidade ao gênero. Seria a motivação por trás das músicas “densas” menos digna do que o dedo intrometido do gerente de marketing da gravadora?

O que talvez Jamie e seus colegas não estejam conseguindo alcançar é o revés da situação. Como será recebido este disco, sabidamente fruto da conciliação do desejo da banda com interesses comerciais? E o principal: como este passo atrás incidirá nas futuras pretensões dos Klaxons? O tempo vai dizer.

Claro que existem muitas semelhanças entre o caso descrito e o dramalhão mexicano que se apoderou do lançamento do “Bloco do Eu Sozinho”. Nosso segundo disco foi mais do que rejeitado pela extinta Abril Music. Foi execrado, achincalhado, definido por termos que nem ouso repetir, sentenciado a servir como prova cabal da maior estupidez testemunhada na história da música brasileira. Isto considerando que a banda tinha dois anos de carreira e já havia vendido mais de 200 mil cópias. 

As previsões aterradoras nos apavoravam, óbvio, mas felizmente resistimos à pressão. Chegamos a ser expulsos da gravadora, negociamos nosso retorno e, de quebra, conseguimos convencer os caciques a manter o repertório original. O rebento foi jogado às traças nos pontos de venda, sem qualquer empenho na divulgação. Fomos entregues à própria sorte. A recompensa, no entanto, não tardou a vir, e hoje me orgulho muito de termos seguido nossa convicção, de termos confiado no mérito daquelas músicas. Nos momentos de angústia persistia a certeza de que não havia outro caminho a ser seguido.

A mesma encruzilhada se anuncia para Amy Winehouse. No caso dela, porém, existem agravantes. Além de ter sido a mais cultuada celebridade do biênio passado, pesam na balança os 11 milhões de “Back to Black” vendidos. No mínimo espera-se que seu terceiro álbum desempenhe papel fundamental neste apagar de luzes da era do disco físico, quem sabe um dos últimos grandes fenômenos desta década.

Alheia à toda expectativa e refém de sua própria condição emocional, Amy foi para o Caribe se desintoxicar, afastou-se dos escândalos, fez alguns amigos, escreveu novas canções e voltou para Londres, toda satisfeita com a nova fase. Apesar da produtividade demonstrada ser um indício pra lá de positivo, o resultado musical foi considerado apenas insatisfatório. “Ela parece ter perdido sua marca registrada vintage/soul e agora está muito influenciada pelo reggae. Seus chefes não acham apropriado uma mudança de estilo tão radical, e disseram isto para ela”, declarou uma fonte próxima à cantora.

Pobre Amy. Não bastassem as sucessivas internações por alcoolismo e abuso no consumo de drogas, agora também querem despacha-lá para o “rehab” musical. Se fosse ela mandava todo mundo às favas e bancava este disco. Para quem já tem fama de louca não custa rodar a baiana…

Sobre o show de São Paulo:

ter, 24/03/09
por Bruno Medina |

sinceramente não sei se há muito o que dizer sem soar piegas ou redundante. Foi incrível. Quando no início da tarde começou a chover, pensei que a lama e a possibilidade de ficar com as roupas molhadas até a madrugada dissuadiriam muita gente de chegar cedo para conferir nosso show. 

Cogitei o pior, e pude vislumbrar o melancólico quadro na transmissão da TV: meia dúzia de gatos pingados em frente ao palco, resistindo bravamente à intempérie, debaixo de seus guarda-chuvas, envoltos em capas de plástico improvisadas ou segurando as mochilas por sobre as cabeças.

Felizmente a trágica profecia não se cumpriu; desde a abertura dos portões já era possível sentir, do backstage, o enorme entusiasmo do público. As nuvens se dissiparam e o burburinho e a ansiedade só faziam aumentar enquanto a Chácara se enchia. Quando pisamos no palco veio a grata surpresa, era muita gente! 

Claro que já tocamos para públicos maiores do que aquele, mas não sabíamos o que esperar após um período tão longo sem visitar a cidade. Festivais costumam propiciar plateias gigantescas, mas não necessariamente garantem apresentações calorosas. 

Na noite do último domingo, no entanto, aquele mar de gente nos transmitiu uma sensação muito reconfortante. Tanto que a energia emanada pela multidão conseguiu neutralizar boa parte da costumeira apreensão, decorrente de tantas câmeras de TV apontadas para nós. 

A essa altura já sabíamos que os quatro haviam optado por usar blusas xadrez (há quem acredite que tenha sido combinado, marketing, né?) e que havíamos conseguido derrubar a limitação de volume imposta por sermos a banda de abertura, o que, de certa maneira, nos deixou ainda mais à vontade.

Reconheço que os decibéis extras e as alterações no set list fizeram diferença. O show foi quente, o público superou mesmo as melhores expectativas e acho que o reflexo disto influenciou bastante nosso desempenho.

Quando tocamos “A Flor” foi emocionante ver as cabecinhas saltitantes até o final do gramado. Sem dúvida um dos momentos deste show que levarei comigo. 

Findada a empreitada, espero que tenhamos conseguido corresponder às expectativas de vocês, que por tanto tempo aguardaram por estas duas apresentações. Espero, também, termos honrado a responsabilidade de participar deste evento histórico.

Para nós valeu a oportunidade de convivência nestas três semanas, de relembrar boas histórias, de tocarmos juntos novamente músicas que significam tanto para tanta gente, e de reviver a maravilhosa atmosfera que envolve qualquer show do Los Hermanos. Muito obrigado! E agora? 

Agora a vida segue. Nos vemos por aqui.

fotos: Daigo Oliva

Primeiras impressões

sáb, 21/03/09
por Bruno Medina |

Passei aqui rapidinho porque não consegui resistir à tentação de dividir com vocês minhas impressões sobre o show de ontem. Foram tantas as sensações, do início até o fim da noite, que eu poderia escrever páginas e páginas sem hesitar. O bom senso, no entanto, me recomenda poupá-los ao menos das considerações deste fã do Radiohead.

Basta dizer que foi um pouco sui generis testemunhar Thom Yorke requebrando as cadeiras enquanto tocávamos “Morena” na passagem de som. Ou então que cruzar com sua palidez britânica no corredor dos camarins remeteu a um pitoresco passeio pelo museu de cera; porque era realmente difícil acreditar que os caras estavam ali na sala ao lado, conferindo e-mails de porta aberta.

Quanto ao nosso show, permitam-me mais uma vez agradecer imensamente a todos que possibilitaram este inesquecível reencontro. Faltam-me palavras para descrever a emoção de tocar de novo aquelas músicas, de ouvir o coro em uníssono de nossos fãs entoando os já conhecidos versos. Adorei a experiência de tocar “Cher Antoine” pela segunda vez na vida (se alguém tiver prova de outras execuções, por favor me corrijam).

Poderia sintetizar a noite passada como um daqueles momentos em que a própria vida parece um filme, como quando assistimos quase inebriados ao desenrolar dos acontecimentos. Tudo foi perfeito, a exceção de dois pormenores: a desconfiança de que a ordem do roteiro não favoreceu algumas músicas e a chateação que foi descobrir, ao final do show, que havia uma limitação imposta ao volume de nossa apresentação, por sermos a banda de abertura. Infelizmente o fato não chega a ser novidade no Brasil quando bandas nacionais e estrangeiras dividem o mesmo palco.

Se a improvável –porém digna de elogio- pontualidade do evento desguarneceu nossa plateia, deixando a ver navios os fãs retidos pelo rush ou pelo horário de saída do trabalho, também não deve ter contribuído muito para os ânimos o volume do show, descrito por muitos como incompatível com as dimensões da Apoteose. Bom, basta torcer para que em São Paulo o fato de nossa apresentação ser transmitida pela TV comova a patrulha dos decibéis. 

Contagem regressiva

qua, 18/03/09
por Bruno Medina |

Desculpem-me pela falta de assiduidade neste espaço. Os dias têm sido muito corridos por conta dos preparativos para os shows deste final de semana e realmente não tenho tido a oportunidade de escrever com a costumeira frequência. Hoje encerraremos a bateria de ensaios; tudo devidamente recordado, harmonia na ponta dos dedos, banda afiada, como nos velhos tempos!

O set list também já está definido. Quero, inclusive, aproveitar o ensejo para agradecer aos inúmeros leitores que enviaram sugestões de repertório através da seção de comentários. Sabemos que não será possível agradar a gregos e troianos no que se refere às músicas escolhidas para as apresentações, no entanto, tentaremos mesmo assim. Não quero estragar a surpresa, mas antecipo que constam da lista duas que não tocávamos faz uns bons 8 anos. Haja memória.

Enquanto os shows não vêm, quem quiser obter maiores detalhes sobre a rotina das duas últimas semanas pode ler a entrevista que concedi ao Globo Online. No site do jornal está disponível um videozinho captado durante os ensaios.

A foto aí de cima foi tirada por nosso estimado produtor Alex, durante uma pausa no estúdio. Bom, acho que por ora é só. Nos vemos – espero – em breve!

Já vai tarde!

sex, 13/03/09
por Bruno Medina |

Tomado pelo receio de já estar irremediavelmente atrasado, decidi averiguar porque tanto se fala sobre a tal da La Roux. O “synth duo” britânico de eletropop tornou-se habitué das páginas dos mais prestigiados veículos musicais desde o lançamento do single “Quicksand”, em novembro passado. O nome da banda provém do francês (la roux = a ruiva), em menção ao proeminente topete vermelho usado pela vocalista Elly Jackson.

No clipe de estreia a moça canta ao volante de um modelo esportivo que faz lembrar a Super-Máquina, iluminada pelos reflexos azuis e vermelhos dos letreiros de néon que margeiam a estrada. Como se a mera descrição deste cenário não houvesse deixado explícito, ainda há a marcação precisa de um beat eletrônico servindo de base para sintetizadores sobrepostos, o que, de imediato, remete qualquer ouvinte ao cerne dos anos 80.

No mais, La Roux envereda por um pop bem produzido, de melodias engenhosas e impregnado de influências vintage. Apesar da qualidade encontrada nas músicas, fica a impressão de que o pentenado –ao melhor estilo Radical Chic- me será fundamental no futuro para destacá-los entre tantos grupos que optaram por emular Depeche Mode, Joy Division e New Order em pleno século XXI.

Quando os óculos escuros espelhados, as roupas de cores cítricas e os mullets voltaram à moda no final dos anos 90, não era difícil prever que a onda oitentista se apoderaria também da música. De repente os timbres graves, a distorção podre e a introspecção angustiada do Grunge perderam força, cederam espaço aos figurinos coloridos, às letras descompromissadas e à sonoridade festiva, a qual, não por acaso, o movimento se opunha.

Como bem se sabe, este fenômeno de ação e reação não chega a ser novidade, o culto à duas décadas atrás tornou-se fenômeno recorrente. Seguindo a regra, às vésperas de 2010, o natural seria estarmos tirando blusões quadriculados do fundo do armário, cultivando o franjão que esconde metade do rosto ou às voltas com expressões do tipo “New Garage”. Mas por que será que isto não está acontecendo?

Bom, a resposta mais completa deve estar sendo elaborada por algum estudo acadêmico, provavelmente já em curso. Por hora, para que sigamos à diante, basta constatar o óbvio: os anos 80 não querem ir embora.

Se a dificuldade em dizer adeus à década das ombreiras segue uma tendência mundial, aqui no Brasil é ainda mais grave. Os pilares do Rock BR, da massificação de um conceito de cultura jovem, bem como o relaxamento dos “anos de chumbo” remontam a esta época, fazendo dela um importante marco na constituição da identidade nacional. É certo que os aspectos citados contribuíram também para o bem sucedido regresso à ativa de bandas oriundas do período.

As festas temáticas, os almanaques, a nostalgia da infância e o estabelecimento de um nicho mercadológico bastante definido, foram determinantes para prolongar a duração da febre dos 80. Felizmente alguns bons artistas como Léo Jaime souberam tirar vantagem da maré que lhes era favorável, aproveitando o ensejo para dar continuidade as carreiras interrompidas.

Ao contrário do que possa aparentar, não tenho nada contra os anos 80 ou qualquer iniciativa em prol de reeditá-los. O que não me agrada é quando tenho a sensação de que a década, assim como seus desdobramentos estéticos, preenche a lacuna consequente da falta de novos rumos artísticos. Reviver o passado pode ser ótimo quando este fornece elementos a serem incorporados em adição à criações inéditas e originais. O que vejo em La Roux, no entanto, não pode ser meramente considerado influência, mas sim uma tentativa de se apropriar de algo que já provou ter dado certo.

Penso que é chegado o momento de agradecer aos anos 80 pelas valiosas contribuições e deixá-lo partir de uma vez, evitando que suas qualidades se desgastem ao ponto de não mais as reconhecermos.

The Beautiful People

ter, 10/03/09
por Bruno Medina |

Mesmo os mais ufanistas brasileiros hão de admitir que, se comparados aos resultados obtidos por nações até de menor expressão, são muitos os aspectos que distanciam este país de sua notória áurea de grandiosidade. Quando o intuito da pesquisa é, por exemplo, obter um ranking relacionando indicadores de desenvolvimento, tais como distribuição de renda, violência, corrupção, saúde ou educação, vixê…, aí é que percebemos o quanto ainda é preciso melhorar.

Caso isto sirva de consolo, existe ao menos uma categoria em que nossa liderança parece ser incontestável: segundo dados obtidos em pesquisa divulgada ontem, o Brasil foi apontado como o país que possui o maior número de usuários de sites de relacionamento no mundo. Cerca de 80% dos brasileiros que navegam pela internet estão inscritos em algum tipo de rede social.

Aproveitando-se de nossa aparente compulsão por trocar scraps, e deste gigantesco mercado que desconhece qualquer limite de expansão, uma nova empresa se lança à acirrada disputa pelos cliques dos internautas tupiniquins; a partir desta semana poderemos nos orgulhar de pertencer ao seleto grupo de agraciados com o acesso ao beautifulpeople.com.

Enganam-se, entretanto, os que pensam que o endereço possui relação com a irônica canção de mesmo nome composta anos atrás por Marilyn Manson, embora o anticristo superstar, sob determinado ponto de vista, possa ser considerado quase um visionário.

O link direciona para a página principal de um site cujo funcionamento não difere em quase nada do Orkut ou do Facebook, à exceção de que, como o próprio nome sugere, são aceitos apenas usuários comprovadamente bonitos. Feio não entra. Na prática isto significa que narigudos, orelhudos, testudos, dentuços, vesgos, carecas, espinhentos e gordinhos devem se poupar do tempo perdido e nem se candidatarem a uma vaga.

Para estes é diminuta a probabilidade de aprovação perante o criterioso júri, formado pelos próprios membros da comunidade. Estatísticas comprovam que apenas um em cada cinco aspirantes norte-americanos passam pelo estreito funil. Entre os dinamarqueses é pior, só um a cada onze são admitidos!

Recomenda-se aos usuários do sexo masculino que pretendam preencher o cadastro on-line não hesitarem em postar aquele instantâneo do passeio no iate do papai, montando o mangalarga no haras da família ou ao volante do carrão importado. Informações sobre a renda do candidatos, especialmente se ela for polpuda, costumam torná-los um tanto mais belos. Posto isto me pergunto, caso se candidatasse e enviasse a foto acima, o quão bonito Marilyn pareceria às usuárias, do alto de seus milhões de discos vendidos.

Há quem comemore a invenção como um grande advento da paquera virtual, visto que o processo de seleção do site já elimina boa parte dos pretendentes que não teriam qualquer chance de sucesso. Questões éticas e filosóficas à parte, algo me diz que isto vai ser uma febre no Brasil. 

Tudo tem seu preço (?)

sex, 06/03/09
por Bruno Medina |

O que Michael Jackson, Mahatma Gandhi e Che Guevara têm em comum? Eu explico, antes de permitir que a pergunta se mantenha em suspenso por tempo suficiente para afetar ideologias alheias. Posso começar dizendo que são personagens fundamentais a qualquer narrativa que se proponha a sintetizar o século passado, ou que tratam-se de ícones cujos rostos não passariam incógnitos nem nas mais remotas áreas do planeta.

Também não seria falso afirmar que, cada qual a seu modo, o americano, o indiano e o argentino souberam perpetuar sua fama através das décadas, e que despertaram paixões e idolatria de milhões. Que mais? Bom, acho melhor parar por aqui. Prosseguir citando coincidências entre os três representa considerável aumento na probabilidade de gerar atritos escabrosos que culminem numa enxurrada de comentários desaforados.  

A despeito do que possam pensar os prezados leitores, Michael, Gandhi e Che possuem ao menos um incontestável ponto de convergência em suas biografias: todos tiveram seus pertences pessoais postos à venda em um leilão. No caso específico do mártir da revolução cubana, o que estava a disposição de seus admiradores mais abastados ironicamente veio à tona pelas mãos de seu assassino.

Foi um ex-agente da CIA, diretamente envolvido na captura e consequente morte de Che, quem teve a ideia de guardar por quase quarenta anos os macabros souvenires. Considerando o lance inicial do lote, fixado em US$100 mil, mecha de cabelo, impressões digitais e fotos do corpo do guerrilheiro revelaram-se um grande investimento a longo prazo. Que o diga o ex-agente, que numa só tacada trucidou o sonho socialista e ainda fez um troco para a própria aposentadoria.

Mais estranho talvez seria imaginar que um legítimo altruísta desprovido de qualquer apego material como Gandhi, após a morte, seria alvo do interesse de investidores. Os característicos óculos redondos em aro dourado, uma sandália velha, uma tigela de metal e um relógio de bolso usados pelo pacifista foram arrendados ontem pela bagatela de US$ 1,8 milhão. O comprador disse, ao menos, que os objetos serão doados ao povo da Índia. Melhor assim…

Aos possíveis interessados resta apenas a oportunidade de levar para casa os bens de Michael Jackson, em leilão a ser realizado em sua terra natal no mês que vêm. As luvinhas de brilhantes –aquelas do clipe de “Billie Jean”-, figurinos utilizados em apresentações do cantor, pinturas, esculturas, prêmios, o ônibus que o transportou em uma turnê e até (pasmem) o portão de entrada do rancho Wonderland poderão ser adquiridos por quem dispuser de valores a partir de US$ 20 mil.

Em se tratando do rei do pop não chega nem a causar espanto que ele mesmo tenha resolvido botar preço em objetos, digamos, tão inusitados. Em tempos de eBay, Michael não conseguiu enxergar problema algum em garantir o leite das criancinhas (opa!) e o pagamento de suas exorbitantes dívidas processuais através da liquidação de seus bens. Haja vista a recente notícia dos shows que fará em Londres, e da possibilidade deles alavancarem uma turnê mundial que pode chegar a render US$ 400 milhões ao ídolo, os fãs já esperam por um novo bazar dentro dos próximos dez anos.

Acho que o que mais me impressiona nesta história de leilões é compreender como os compradores parecem não se importar com as tortuosas trajetórias realizadas por estes objetos. Aliás, que maneira estranha de se homenagear quem se admira! Sinal dos tempos. E que tempos.

Perdeu, playboy!

qua, 04/03/09
por Bruno Medina |

Neste exato momento me encontro naquela desconfortável situação de não estar certo quanto ao recebimento de um importante e-mail que enviei. Antes de que se sugira o óbvio é preciso lembrar de que o teor de certas mensagens (e, acreditem, este é o caso), assim como determinados destinatários, não encorajam a iniciativa de se tirar a dúvida.

Sempre nestas horas o receio é aparentar impaciência ou ansiedade. Ceder a tentação de enviar um singelo “recebeu?” nem sempre consiste numa boa ideia, porque o sujeito pode muito bem estar demasiadamente ocupado para escrever, ou pior, dispondo do tempo que julga necessário para considerar uma resposta à altura.

Este é o revés da praticidade propiciada pelas mensagens eletrônicas, o preço a ser pago à tecnologia. E-mails atravessam longas distâncias num piscar de olhos, mas é preciso estar consciente da capacidade que possuem de sumir sem deixar vestígios.

No tempo em que as trocas importantes ainda se davam majoritariamente por correio, apesar da demora inerente ao processo, havia a segurança do rastreamento, dos carimbos, dos controles e registros. Um primoroso trabalho de equipe em que etapas se sucedem de maneira organizada e eficiente.

Cartas, envelopes e telegramas permitem estimativas quanto ao prazo de entrega, e daí a desconfiança se algo não estiver conforme o previsto. Malas extraviadas são um pesadelo, mas ao menos se anunciam logo no momento da chegada e rendem indenizações. E-mails importantes apenas desaparecem, de maneira covarde, na surdina, sem dar ao remetente a chance de reenvio, sem que a outra parte sequer tenha conhecimento de que um dia existiram.

Possuo uma desconfiança, quase certeza, de que o provedor no qual possuo endereço eletrônico faz 10 anos não se relaciona muito bem com um outro, extremamente popular. É um conflito de linguagem, questão de egos, uma pinimba, sei lá. Digamos que uns 20% das mensagens que envio (ou que não recebo) estão sujeitas ao intempério das máquinas, e não há nada que se possa fazer quanto a isto. Já reportei o problema ao departamento técnico e eles negam esta possibilidade, embora eu saiba que coisas deste tipo vivam acontecendo por aí. Pelo jeito minhas mensagens extraviadas vão continuar caindo para conta do acaso.

Imagino quantas propostas profissionais, quantos pedidos de desculpas, quantas declarações de amor permanecem sem resposta, relegadas ao buraco negro dos servidores. E por favor não me digam que habilitar a confirmação de recebimento é uma opção, basta lembrar o que sentimos quando recebemos uma destas. É chato.

Por mais que tenha me empenhado, não consegui encontrar na web uma resposta convincente para elucidar o que acontece às mensagens que não chegam ao seu destino. Elas saem de nossas caixas de itens enviados para onde? Para o nada? Quem sabe não estejam todas juntas, aguardando resgate numa dimensão paralela como os sobreviventes de “Lost”?

Atualmente tenho atribuído a superstição quando desconfio que o e-mail não foi. Prefiro pensar que o destino se encarregou de desviá-lo, e que o futuro reservará melhor oportunidade de envio. Olhando para trás, concluo que existem amigos por quem tenho menor estima desde que supostamente deixaram de responder a convites ou tecer comentários sobre boas novas noticiadas. Agora também não faria sentido algum tentar tirar a história a limpo. Mais um para conta do acaso.

A verdade, meus caros, é que desde que passamos a confiar nossa comunicação ao meio virtual nos tornamos reféns. Há vezes em que as circunstâncias me levam a acreditar que exista uma inteligência artificial, dotada de um tremendo espírito de porco, que passa os dias a nos confundir e nos atormentar a troco de diversão. Ciente disto, toda vez que clico no botão “enviar”, impossível controlar a voz interna que adverte: “perdeu, playboy!”.