Compare imagens das cheias de 1941 e de hoje em Porto Alegre
A cheia que invade o Guaíba, em Porto Alegre, bateu um novo recorde e passou da maior enchente que ocorreu na Capital, em 1941. As últimas medições do município apontavam para um nível de 4,77 metros na sexta-feira (3)– um centímetro a mais do que há 83 anos, quando o nível chegou a 4,76 metros. Já neste sábado (4), o nível ultrapassou os 5 metros.
Fernando Dornelles, professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, afirma que, curiosamente, ambas as cheias (a de agora, e a de 1941) ocorreram em maio. O especialista diz que o mês é atípico, visto que o acúmulo de águas no Guaíba ocorre, normalmente, na transição entre o inverno e a primavera.
"[Em 1941] foram 24 dias de chuva na bacia que drena para o Guaíba. Então, foi uma subida bem mais gradual do que a gente está vendo agora. Naquele período nós tivemos acumulados de mais de 870 milímetros", afirma.
Especialistas divergem sobre a designação do Guaíba, localizado na capital Porto Alegre, – se é um rio, lago, estuário ou outro curso d'água. O governo do estado e a prefeitura de Porto Alegre utilizam a nomenclatura "lago".
As chuvas que atingem o Rio Grande do Sul deixaram mais de 50 mortos. A Defesa Civil soma 42.221 pessoas fora de casa, sendo 9.581 pessoas em abrigos e 32.640 desalojadas, que recebem abrigo nas casas de familiares ou amigos. Ao todo, 300 dos 496 municípios do estado registraram algum tipo de problema, afetando 422.307 mil pessoas.
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Compare enchentes no Mercado Público:
O especialista alerta que o número de afetados deve aumentar nos próximos dias.
"Talvez o pior ainda esteja por vir na semana que vem", projeta Fernando Dornelles.
Há previsão de que a força da chuva diminua no domingo (5), mas ganhe força novamente na quarta-feira (8), em uma combinação que liga o vento sul à cheia do Rio Jacuí.
Compare enchentes na Rua Voluntários da Pátria:
As imagens da época mostram que o nível da água ultrapassou o Mercado Público de Porto Alegre e chegou à Rua da Praia, a algumas centenas de metros do Guaíba, com barcos sobre as ruas.
Um estudo publicado por Dornelles juntamente com outros autores ("A histórica cheia de 1941 na Bacia Hidrográfica do Guaíba"), revela que 15 mil pessoas foram atingidas, desabrigando 70 mil pessoas, em um período que a capital tinha cerca de 272 mil habitantes. Um terço das indústrias e do comércio ficaram inundados.
Já nesta sexta-feira (3), a prefeitura registrava 709 pessoas acolhidas em abrigos temporários na cidade. A população atual de Porto Alegre é de 1,3 milhão de habitantes.
Também nesta sexta, após o nível do Guaíba marcar 4,6 metros, a cheia invadiu a rede de esgoto do centro de Porto Alegre. Com isso, baratas deixaram as tubulações e tomaram ruas e edifícios da região.
O Mercado Público, que foi fechado em razão dos temporais, registrou a presença dos insetos. As baratas também foram vistas em ruas como a Siqueira Campos e a Mauá, próximas ao cais de Porto Alegre.
Na época, além da chuva incessante, o papel de um vento sudoeste, segundo o estudo, teria represado as águas da Lagoa dos Patos e por consequência as empurrado para o Guaíba, contribuindo para o alagamento. Uma situação semelhante se repete agora.
A cheia de 1941 chegou a motivar a construção do Muro da Mauá, que liga o Guaíba ao Centro Histórico da Capital. Erguida entre 1971 e 1974, a edificação tem três metros abaixo do solo e outros três acima dele, percorrendo 2.647 metros de comprimento. O muro é uma das partes de um sistema anticheias, que conta com diques e comportas.
Apesar da proteção, o muro enfrenta problemas de vazamento nas comportas. Para conter o extravasamento do Guaíba, a prefeitura precisou colocar sacos de areia, que impedem apenas parcialmente a passagem da água.
Dornelles diz que o projeto original contava com vedações de borrachas, com parafusos, que não são vistas hoje. O professor também afirma que a forma como são alocados as barreiras é inadequada. Ele diz que os sacos deveriam ser intercalados.
Temporais no RS
Fortes temporais atingem o Rio Grande do Sul desde o último fim de semana - e devem persistir por mais dias.
Na quinta (2), o governador Eduardo Leite (PSDB) se referiu à tragédia como "o maior desastre climático" da história do Rio Grande do Sul e decretou estado de calamidade, já reconhecido pelo governo federal.
Este é o quarto desastre climático a atingir o Rio Grande do Sul em menos de um ano. Em 2023, três eventos ocorreram em junho, setembro e novembro, deixando 80 mortos.