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Entrevista do Acervo

'Vamos embora que o mundo arrodeou': Um papo com Chico Science, que estaria fazendo 55 anos

O cantor e compositor Chico Science em abril de 1994

Todos que entenderam o caminho que Chico Science estava trilhando podem imaginar a falta que ele faz ao nosso mundo hoje. O pernambucano, líder do movimento manguebeat, que morreu num acidente de carro em 1997, estaria completando 55 anos neste sábado. Lendo entrevistas antigas do cantor e compositor do Nação Zumibi, e ouvindo de novo trabalhos de seu grupo em meados dos anos 90, é difícil não tentar pensar em que nível de genialidade estaria Chico se tivesse alcançado a maturidade.

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Ele tinha só 28 anos quando a banda lançou "Da lama ao caos" (1994), disco que chegou com ares de manifesto cultural. "Uma antena parabólica fincada no mangue", como dizia o próprio músico. Chico estava interessado em resgatar os ritmos regionais, como o maracatu, a ciranda, o caboclinho, e misturar "todas essas coisas" com soul, rap e rock. O objetivo era falar com o universo. "Não somos um surto, não seremos a nova onda, mas uma coisa legal, que pode gerar ramificações na música brasileira".

O músico Chico Science em outro registro de 1994

O segundo álbum, "Afrociberdelia", foi ainda mais fundo na lama. Chico e seus parceiros tinham plena convicção da jazida musical que estavam remexendo. Eles tinham se tornado carangueijos soltos no espaço, mixando Kraftwerk com baixa tecnologia, mas sem esquecer das origens. "É um trabalho de resgate regional, mas conectado a uma visão de pop mundial", disse o cantor. "Temos que ser os novos hackers. É aquela coisa de pegar um arame e enfiar na lama para criar essa antena".

Lista: Cinco músicas fundamentais de Chico Science

Após a morte do artista, seus parceiros no Nação Zumbi carregaram com muita qualidade a bandeira levantada há cerca de 30 anos. Um disco após o outro, o grupo construu uma trajetória de continuidade e evolução, não apenas com canções autorais mas também com versões psicodélicas de letras de mestres como Jorge Ben e Gilberto Gil. Ainda assim, é interessante imaginar o que estaria fazendo Francisco de Assis França se estivesse ainda entre nós. Como ele traduziria em música toda a loucura que estamos vivendo?

'Não saio de casa sem minhas chaves, pra não ficar do lado de fora'

Para fazer um tributo ao cérebro que influenciou gerações de músicos desde que lançou o moviumento manguebeat, resgatamos, abaixo, uma pequena entrevista publicada no caderno "Planeta Globo", no dia 26 de maio de 1996, logo após o Nação Zumbi lançar "Afrociberdelia", aos 30 anos de idade. 

Chico Science durante o festival Hollywood Rock no Rio, em 1996

Nome de batismo: Francisco de Assis França
Data de nascimento: 13/3/66
Parada do momento: Está lançando, junto com a Nação Zumbi, o disco Afrociberdelia, o segundo do grupo
Cor: "Verde".
Time: "Íbis, do Recife".
Tipo de música:"Aquela que faz dançar, sorrir, chorar e ficar e muito ligado".
Cantor: "Aquele que canta".
Cantora: "Aquela que canta".
Animal: "Educação no Brasil".
Esporte: "Bater bola com os meus amigos".
Filme: "0 mensageiro do diabo", com Robert Mitchum.
Point: "Soparia, todas as segundas-feiras, no Baixo Pina, em Recife".
Hobby: "Andar de caiaque no Rio Capibariba, também em Recife".
Sou louco por: "Música".
Detesto: "Violência, riqueza ilícita, a falta de capacidade política no Brasil...".
Comida: "Para todos".
Qualidade: "A de ver a razão".
Defeito: "O de consertar".
Mania: "De sempre escrever o que penso".
Sonho: "Subir uma montanha com a garota que mais gosto, ficar no ponto mais alto e nunca mais descer".
Se eu ganhasse na loteria: "Seria uma surpresa muito grande, pois eu não jogo".
Presente que gostaria de dar: "Passeios".
Presente que gostaria de receber: "Viagens".
Para matar o tempo não há nada melhor do que: "De manhã, vadiar. De tarde, namorar. E de noite descansar, porque ninguém é de ferro".
Não saio de casa sem: "As chaves. Não quero ficar do lado de fora quando voltar".
Aí, galera do PLANETA GLOBO: "E tempo de Afrociberdelia. Use o seu próprio satélite. Plugue-se no mangue. E vamos embora que o mundo arrodeou"

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