Maria e Sergey deambulam pelas salas do Palácio do Grilo. A luz do entardecer torna mais loiro o cabelo loiro de Maria. Lá fora, no jardim, o vento embala a vegetação. Há música: francesa, instrumental, violinos. O casal deixa-se levar. Há mais de 200 divisões para visitar. Devagar, vagueiam por entre as portas do palácio inacabado e observam cada detalhe.

Há mais gente pelos vários espaços do palácio. Andam por ali, há quem salte, há quem grite, há quem se deite, languidamente no chão. Todos parecem estar noutra dimensão, noutro tempo. Mas não. Estão em Lisboa. No Palácio do Grilo, no Beato, que abriu ao público em junho deste ano.

O Palácio do Grilo foi imaginado pelo 1º Duque de Lafões, D. Pedro Henrique de Bragança, no século XVIII. O duque, descendente ilegítimo de D. Pedro II, imaginou “um lugar que também não é um lugar e isso pode permitir à alma o voo que mais lhe convém”. As palavras entre aspas terão sido escritas num caderno deixado pelo duque e descoberto três séculos mais tarde, por Julien Labrousse, que trocou Paris por Lisboa e comprou o palácio, em 2020.

Agora, concretizou o sonho do 1º Duque de Lafões. Organizou as palavras deixadas por ele, pôs mãos à obra, e preparou o palácio para receber visitas, seguindo e adaptando os desejos do Duque expressos no “inspirador” caderno.

Em cada página é possível encontrar a descrição de cada uma das divisões. “No Grilo quero que todos os quartos, tanto na decoração como na função, sejam montados para nós, para ficarmos lânguidos e sonharmos melhor do que em qualquer outro lugar no mundo”, terá escrito D. Pedro de Bragança.

Três séculos depois, o projeto foi concretizado e a atmosfera etérea deste fim de tarde no Palácio do Grilo testemunha-o. Praticamente intocado desde a sua construção, todo o ambiente criado pelo mobiliário, música ambiente, atores que atuam de improviso (mas inspirados pelas palavras do duque) levam-nos para uma outra dimensão, para os sonhos, para um filme ao vivo, o que se quiser.

O objetivo é precisamente que “as pessoas possam deambular, descobrir e viver um pouco no domínio do fantástico e do extravagante”, explica Julien Labrousse, “ao mesmo tempo que atores e bailarinos atuam” espalhados pelas várias divisões. Espalhadas pelas divisões há também mesas e cadeiras onde é possível experimentar a ementa do restaurante e as bebidas do bar. Há ainda divisões do Palácio do Grilo que funcionarão como residências artísticas ou poderão ser alugadas para eventos privados. 

Palácio do Grilo restaurante beato xabregas século xvii antigo
O restaurante do Palácio do Grilo está aberto todo o dia, para almoços, jantares e lamches, com uma atmosfera única. Foto: Inês Leote

É “numa dimensão do fantástico” que Maria Kozhevnikova e Sergey Zhesterev, o casal do início desta história, estão. A viverem em Lisboa desde setembro, os dois jovens russos tiram fotografias em todas as divisões, aproveitam a luz do lusco-fusco e observam tudo o que o Palácio do Grilo tem para oferecer.

“É uma experiência impressionante. É fascinante como um lugar destes está no meio da cidade”, diz Maria. “Não sei que partes do palácio foram restauradas, há vidros partidos, há salas mais cuidadas. É encantador”, elogia a jovem, questionando-se sobre qual será a dinâmica do espaço no inverno.

Palácio do Grilo, um T200 para descobrir no Beato

Julien e a sua equipa prepararam as mais de 200 divisões do Palácio do Grilo para receber o público. Com apenas algumas peças novas de mobiliário e decoração, a equipa de Labrousse quis que o cenário ficasse fiel às origens e à época e, por isso, no interior do palácio, é possível encontrar conjuntos de pintura mural da autoria de Cirilo Wolkmar Machado ou azulejos dos séculos XVIII e XIX, que integram as salas temáticas do Palácio do Grilo, como a Sala da Academia, a Sala de Vénus ou a Sala Chinesa.

A capela, de planta retangular, alberga um painel de talha dourada da segunda metade do século XVIII. Nesta última divisão, não haverá qualquer performance, “por respeito à família que ali celebrava as missas”, explica Julien.

A propriedade, que tem mais de 7000 m2, esteve na família dos Duques de Lafões desde 1759 até Julien Labrousse a ter adquirido em 2020. O último duque, D. Afonso Caetano de Bragança, morreu em 2021, tendo habitado o palácio até este ser comprado por Julien, em 2020.

Julien Labrousse
Julien Labrousse, empresário francês responsável por espaços com o Elysée Montmartre e o Le Trianon, em Paris, comprou o Palácio do Grilo em 2020 e abriu-o a Lisboa em junho de 2022. Ambiciona que o espaço se torne um cartão de visita da cidade. Foto: Inês Leote

O francês, amante de arquitetura, produtor e gestor de espaços culturais como o Elysée Montmartre e o Le Trianon, duas salas de espetáculo parisienses, já tinha um investimento em Portugal – um eco hotel no Cabo Espichel. Acrescenta agora ao património o Palácio do Grilo, que vê como um “museu de artes performativas; algo que faz falta nas cidades” e gostava que fosse um “cartão de visita de Lisboa”.

Passado um mês da abertura, o empreendedor faz o balanço. “Está a funcionar muito bem. Há sempre pequenas coisas a acontecer e o público gosta. Vamos lendo o público e vamos adaptando. Temos tido quase sempre reservas para a hora do jantar”. Explica também que ao fim de semana é quando há mais visitantes e que alguns não sabem ao que vão e ficam confusos. “Há quem venha só beber um copo e depois percebe o que há por descobrir aqui”. Outros vêm para explorar todos os recantos deste espaço nobre e acabam por jantar.

Palácio do Grilo restaurante beato xabregas século xvii antigo

Mais de duas centenas de divisões por descobrir, de um lugar que não é um lugar, é o que o visitante quiser, um restaurante, um bar, um teatro performativo, um museu, uma máquina do tempo, o Palácio do Grilo.

A entrada é gratuita e o palácio está aberto todos os dias das 11 da manhã à meia-noite.

O jornalismo que a Mensagem de Lisboa faz une comunidades,
conta histórias que ninguém conta e muda vidas.
Dantes pagava-se com publicidade,
mas isso agora é terreno das grandes plataformas.
Se gosta do que fazemos e acha que é importante,
se quer fazer parte desta comunidade cada vez maior,
apoie-nos com a sua contribuição:


* Daniela Oliveira nasceu no Porto, há 22 anos, mas a vontade de viver em Lisboa falou mais alto e há um ano mudou-se para a capital. Descobrir Lisboa e contar as suas histórias sempre foi um sonho. Estuda Ciências da Comunicação na Católica e está a fazer um estágio na Mensagem de Lisboa. Este artigo foi editado por Catarina Pires.

Entre na conversa

4 Comentários

  1. Gostei muito de tudo o que vi nas fotos e li nos textos que as acompanhavam. Fiquei com muita interesse de lá ir. Espero de fazê-lo em breve. Parabéns.

Deixe um comentário