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Bob Wolfenson abre ba� de fotos de moda, nus e arte nos 46 anos de of�cio

Bob Wolfenson
autorretrato do fot�grafo Bob Wolfenson para revista Serafina
Autorretrato do fot�grafo Bob Wolfenson para revista Serafina

"Bob, igual a nome de cachorro", diz Bob Wolfenson, 62, a uma funcion�ria do restaurante de comida por quilo pr�ximo ao seu est�dio, na zona oeste de S�o Paulo. Antes de adotar o "nome de cachorro", o fot�grafo – conhecido por retratos e ensaios de nu da �poca em que a "Playboy" ainda era a "Playboy" – chamava-se Roberto.

O pai, Jacob, n�o conheceu Bob. Conheceu o Beto. Morreu devido a um c�ncer quando o filho tinha 15 anos, o que for�ou Roberto, o Beto, a se tornar Bob. Naquele momento, em 1970, o adolescente que gostava de pol�tica e viria a estudar ci�ncias sociais na USP teve de arranjar um emprego.

Acabou sendo jogado na fotografia. Por interm�dio de um amigo de sua irm�, Silvia, virou assistente de Chico Albuquerque (1917-2000) na editora Abril. Era office-boy de um dos pioneiros da foto de publicidade no pa�s, descontando cheques e carregando trip�s. Quarenta e seis anos depois, Bob � um dos maiores fot�grafos do pa�s.

Embora tenha se cristalizado como "fot�grafo de mulher pelada", o paulistano criado na comunidade judaica – e comunista – do Bom Retiro transita entre diferentes esferas.

Bob Wolfenson
Gisele B�ndchen posa em Paraty (RJ) em 2003, para a "Vogue"
Gisele B�ndchen posa em Paraty (RJ) em 2003, para a "Vogue"

Na parede de seu escrit�rio na Vila Leopoldina, mant�m tr�s grandes fotos penduradas na parede. Ao lado de Gisele B�ndchen de pernas abertas e com um short jeans min�sculo, est�o uma imagem de "Belvedere", ensaio que virou livro em 2013, e a fotografia que tornou cl�ssica a sobrancelha arqueada de Caetano.

Bob Wolfenson
Caetano Veloso em foto de 1988 para a "Vogue"
Caetano Veloso em foto de 1988 para a "Vogue"

Al�m de editoriais de moda, retratos e ensaios autorais, ser� curador da mostra dedicada a Otto Stupakoff (1935-2009) no Instituto Moreira Salles do Rio a partir de dezembro.

VIRANDO BOB

Bob virou Bob por culpa de uma professora de ingl�s que namorava um de seus amigos. O apelido pegou. Quando passou a colaborar com a revista cultural "Pop", uma amiga perguntou a ele se conhecia um fot�grafo chamado Roberto Wolfenson. Roberto, que todos conheciam como Bob, obviamente sabia quem era o fot�grafo. Assumiu a alcunha de vez nos anos 1980, e at� sua m�e, Maria, aderiu.

Ap�s quatro anos na Abril, onde diz que se sentia em uma reparti��o, iniciou a carreira de fot�grafo. Em pouco tempo j� havia realizado diversos trabalhos para publica��es, entre eles retratos de artistas como Rita Lee e Elis Regina. Decidiu, por�m, dar um passo para tr�s e ir aos EUA em 1982 para trabalhar como assistente e descobrir como "ser o que achava que poderia ser". Curiosamente, quando foi a Nova York, voltou a ser Roberto, nome de pron�ncia tortuosa em ingl�s.

Bob Wolfenson
Rita Lee e sua jaguatirica de estima��o em retrato para a "Pop", nos anos 1970
Rita Lee e sua jaguatirica de estima��o em retrato para a "Pop", nos anos 1970

Enviou cartas a cinco fot�grafos que admirava: Richard Avedon, Irving Penn, Barry Lategan, Arthur Elgort e Bill King – o �nico a responder. L�, na "Hollywood da fotografia", onde o "fosso entre EUA e Brasil era monumental", Bob viu "como as coisas eram feitas".

"Mas era um inferno, um lugar barra pesad�ssima." King estimulava a rivalidade entre seus assistentes – eram cinco –, cheirava muita coca�na e era r�spido, afeito a esc�ndalos em frente aos retratados.

Abandonou o emprego ap�s brigar com um colega, que o empurrou.

O temperamento do ex-patr�o n�o combina com o de Bob, como lembra Andr� Passos, assistente do fot�grafo entre 1992 e 95.

Bob prefere o sarcasmo. "Ele deixa a pessoa envergonhada de outro jeito. � muito ir�nico." Se Bob se sentiu em Hollywood ao conhecer o est�dio de King, Passos diz que se viu entrando no Taj Mahal.

Parte dessa ironia vem da matriz judaica e tem um qu� de Woody Allen. A m�e era uma judia mais tradicional, mas o pai, comunista fervoroso, "foi quem a levou para a esb�rnia", brinca o filho, um "judeu laico". A ascend�ncia aparece mais em sua forma��o cultural – cita David Grossman, Am�s Oz e Philip Roth, todos de origem judaica, entre os escritores que leu recentemente.

Bob Wolfenson
Grupo de judeus ortodoxos feita para o projeto "N�soutros", emem Crown Heights, Nova York, em 2013
Grupo de judeus ortodoxos feita para o projeto "N�soutros", em Crown Heights, Nova York, em 2013

Ao voltar para o Brasil ap�s um ano e meio fora, aproveitou o status de assistente de King e ganhou espa�o no mercado de moda, com trabalhos para as marcas Riachuelo e C&A, cujos editoriais at� ent�o eram dominados por J.R. Duran, com quem travaria uma rivalidade cordial na "Playboy" anos depois.

Bob Wolfenson
Editorial de moda da "Elle" de 2012
Editorial de moda da "Elle" de 2012

Bob j� tinha fotografado para a revista antes de ir a Nova York e passou a ser colaborador frequente da publica��o no final dos anos 1980. No in�cio da d�cada seguinte, os duelos com o espanhol radicado no Brasil ganharam for�a � medida que ambos viraram estrelas t�o importantes quanto as mulheres que posavam – os cach�s giravam em torno de R$ 25 mil, cerca de 5% do que as protagonistas recebiam.

"Eles procuravam n�o manifestar essa rivalidade, que claramente existia", recorda Ricardo Setti, diretor da "Playboy" entre 1994 e 99. "Um se esfor�ava para ser melhor do que o outro, mas era algo civilizado, n�o era cafajeste."

Bob admite que se sentia estimulado pela concorr�ncia, embora a disputa fosse mais fomentada por terceiros. Certa vez, uma editora de moda que acompanhava uma sess�o de fotos disparou: "Ai, a espanhola n�o faz foto assim!". "A� ia l� e mostrava minhas fotos para o Duran. Depois, pegava as fotos dele e mostrava para mim."

"Tive a sorte de ter um concorrente como ele", afirma Duran. "Nunca me considerei rival. Como sempre competi bastante comigo mesmo, n�o tinha tempo para me preocupar com o que os outros faziam."

A suposta rivalidade, conta Duran, era dilu�da em jantares nos quais comparavam o que uma mesma pessoa dizia sobre cada um deles. Aponta o ensaio que Bob fez de Mait� Proen�a em 1996 para a edi��o de anivers�rio da "Playboy" como o melhor trabalho do colega.

Bob Wolfenson
Reprodu��o de p�gina da "Playboy" de Mait� Proen�a, fotografada na Sic�lia em 1996
Reprodu��o de p�gina da "Playboy" de Mait� Proen�a, fotografada na Sic�lia em 1996

Na Sic�lia, a atriz, que exigiu Bob como o fot�grafo, interage com crian�as, mulheres e senhores de um vilarejo, numa est�tica que marcou o ponto em que ele passou a trabalhar para a publica��o da forma como queria, "um jeito de fotografar nu que punheteiro de plant�o n�o gosta".

Deixou de colaborar com a "Playboy" por volta de 2003, quando a dire��o da revista mudou e a nova chefia come�ou a dar ideias de como as imagens deveriam ser feitas. Passou cinco anos fora, at� fazer a capa da atriz global Nanda Costa.

NU CIR�RGICO

Bob compara o nu ao trabalho de um cirurgi�o. Para o m�dico, a opera��o daquele dia � mais uma em sua rotina. Para o paciente, o evento mais importante da vida.

H� dois meses, o cirurgi�o virou paciente para tratar uma apendicite. O m�dico, sisudo no primeiro momento, virou s� sorrisos quando o assistente o avisou que estava operando um "fot�grafo muito conhecido". Recuperado, voltou a correr de 6 a 10 km, h�bito que cumpre ao menos quatro vezes por semana. "Ele acorda bem-humorado, �s 6h, cantando. D� at� raiva", conta a filha Helena.

Fora a corrida, a paix�o � o futebol. Santista, sofre hoje de uma esp�cie de s�ndrome de Estocolmo. Gosta de assistir aos jogos do Barcelona, que nos �ltimos anos roubou Neymar e aplicou duas goleadas no time brasileiro.

Miro, outro fot�grafo que conseguiu casar moda e publicidade, diz que o fato de Bob conciliar ensaios autorais e encomendas editoriais ampliou seu tr�nsito.

Bob Wolfenson
Desfile de moda em Porto Alegre, em 2007
Desfile de moda em Porto Alegre, em 2007

"Fot�grafo de moda � visto com maus olhos por outros fot�grafos em geral. Ele conseguiu circular entre todos de forma brilhante."

Se num dia faz o retrato de um ator, noutro fotografa a captura de armas, brinquedos e animais – tema de "Apreens�es", de 2010. Em 2002, criou sua pr�pria revista, a "s/n�".

IGUAL, MAS DIFERENTE

Bob circula e volta sempre ao mesmo lugar. Casado com Mariza "h� mil�nios" – n�o se recorda o tempo exato, mas a conheceu em 1979.

O pai de Helena, Isabel e Francisca, esta filha do primeiro casamento da mulher, quer ter a opini�o final de tudo, elas dizem, mas � generoso.

Bob Wolfenson
A filha Helena em foto de 1998, publicada no livro "Encaderna��o Dourada" (2004)
A filha Helena em foto de 1998, publicada no livro "Encaderna��o Dourada" (2004)

Isabel � atriz e Francisca, diretora de TV. Com Helena, Bob compartilha duas predile��es: Caetano e fotografia. A filha do meio escolheu seguir um caminho parecido ao do pai. Al�m de fot�grafa, morou uma temporada em Nova York. Ensaiaram um projeto � dist�ncia, no qual trocavam fotos da cidade de suas respectivas �pocas.

Conserva amizades de inf�ncia, como o apresentador de TV Serginho Groisman, o arquiteto Andr� Vainer e o ator e diretor Cac� Rosset. Com os tr�s, al�m de Jair de Oliveira, irm�o de cria��o do fot�grafo, formou uma mesa de p�quer que resistiu durante 20 anos – o encontro minguou h� sete anos.

Nos jogos, permeados de piadas de judeus e casos da �poca escolar, o Rat�o, codinome que Bob ganhou dos companheiros, destacava-se, ao lado de Serginho. "Quando comecei a participar das mesas, tinha casa pr�pria, autom�vel. Hoje eu vivo da caridade alheia. Culpa dos 'mouses'", brinca Cac�.

Vainer, que conhece Bob desde que o fot�grafo tinha dez anos de idade, diz que ele n�o mudou muito desde ent�o. "Essa coisa de mudar a personalidade, deixar tudo para tr�s, � coisa de filme americano, n�o � assim na vida real." Bob ainda � Roberto, o Beto.

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