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Artista franc�s Christian Boltanski cria obras com batimentos card�acos

Em algum ponto remoto do deserto do Atacama, no Chile, sinos presos a fr�geis hastes met�licas balan�am com as fortes rajadas de vento comuns por ali. Elas est�o fincadas no terreno de acordo com a posi��o dos astros no c�u em 6 de setembro de 1944, dia em que nasceu Christian Boltanski.

Em S�o Paulo, o artista franc�s se prepara agora para inundar todo o andar t�rreo da galeria Bar�, nos Jardins, a partir do dia 1� de agosto, com o som das batidas de seu cora��o, um ru�do que serve de m�trica para pulsos el�tricos e piscar de luzes que far�o vibrar todo o espa�o.

Daquela vis�o singela de sua floresta de sinos no meio do deserto, que agora pode ser vista em v�deo na Bienal de Veneza, � instala��o card�aca paulistana, Christian parece celebrar a vida em sua obra. Filho de um judeu de origem russa e de m�e parisiense, nasceu numa capital francesa rec�m-libertada da ocupa��o nazista. Os traumas do Holocausto moldaram seus trabalhos durante d�cadas —instala��es que n�o raro pendem para o t�trico e o fantasmag�rico.

Na mais dram�tica delas, o artista levou uma pilha imensa de roupas usadas ao suntuoso Grand Palais, em Paris. Debaixo do delicado teto de ferro e vidro do museu, uma esp�cie de guindaste cavoucava os trapos, jogando tudo de um lado para o outro. Era uma alus�o aos corpos apodrecendo nas valas comuns dos campos de concentra��o. Em mais de um trabalho, ali�s, o artista relembrou os horrores da Segunda Guerra, quase sempre pelo ponto de vista das crian�as.

Esse retrato carregado da inf�ncia voltou a dar as caras h� quatro anos, quando Christian criou uma estrutura que funcionava como m�quina de nascimentos no pavilh�o franc�s da Bienal de Veneza, uma obra depois exibida na Casa Fran�a-Brasil, no Rio.

Ali, imensas engrenagens que lembram as rotativas de um jornal faziam circular imagens de rostos de beb�s, contando nascimentos de um lado e mortes do outro. "� verdade que a experi�ncia da guerra me formou, mas eu falo de outras coisas al�m disso. Sinto que, quanto mais eu trabalho, mais vou me curando desses fantasmas", diz o franc�s.

"Se seus pais tivessem feito amor um minuto antes ou depois do que fizeram, voc� seria outra pessoa. Quero dizer que cada cora��o bate de um jeito diferente, tem sua pulsa��o."

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AUTORRETRATO SONORO

Christian fala de batidas do lado esquerdo do peito com certo conhecimento de causa. Numa casinha que virou ponto de peregrina��o de amantes da arte contempor�nea na ilha de Teshima, no Jap�o, seus "Arquivos do Cora��o" re�nem grava��es dos batimentos card�acos de 120 mil pessoas, formando uma c�mara de resson�ncia para o ru�do de vidas an�nimas. Ali e em outros lugares onde a obra foi exposta, como Londres e Bolonha, os visitantes podem registrar seus pr�prios batimentos e passar a fazer parte da obra. "� uma quest�o de identidade", diz. "No Brasil, decidi mostrar minhas pr�prias batidas card�acas como um autorretrato. Estou me apresentando para o p�blico."

Na condi��o de celebridade das artes pl�sticas, Christian talvez nem precisasse do gesto. Essa n�o ser�, ali�s, a primeira vez que o artista mostra sua obra no Brasil. No ano passado, montou uma selva de pr�dios de papel�o no Sesc Pompeia, edif�cios estampados com nomes que tirou de listas telef�nicas da metr�pole em mais uma tentativa de catalogar vidas humanas.

Em paralelo � exposi��o na galeria Bar�, o franc�s tamb�m vai ocupar agora um grande espa�o da Oca, no parque Ibirapuera, como parte de uma exposi��o que celebra a ideia da inven��o e come�a no dia 4 de agosto.

Usando l�mpadas como elemento central, um aceno � imagem que os quadrinhos e desenhos animados sempre associaram a uma ideia genial, Boltanski volta � carga t�trica de seu imagin�rio com um emaranhado de luzes —583 delas, o n�mero de horas que deve durar a mostra— que v�o apagando uma a uma a cada 60 minutos, numa agonia lenta e luminosa.

Essa delicadeza contrasta com outro trabalho do franc�s tamb�m na Bienal de Veneza, que vai at� novembro na cidade italiana. L�, na entrada do pavilh�o principal dos Giardini, um v�deo do in�cio da carreira dele mostra um homem sentado no ch�o, tossindo litros de sangue, como se vomitasse as pr�prias v�sceras. A obra � de 1969, e o artista explica que j� n�o est� mais nesse lugar, reconhecendo certo otimismo que aflora em seus trabalhos mais recentes. As l�mpadas na Oca, mesmo falando de um ocaso, t�m mais a ver com a despedida de uma fase e a entrada em outra, um desejo de transforma��o.

No caso, Christian assume seu desejo, cada vez mais expl�cito, de ser monumental. "N�o me interesso mais por trabalhos que possam ser pendurados na sala de um apartamento", diz o artista. "Gosto de que as pessoas se percam dentro dos trabalhos. Quero mergulhar o p�blico em outro universo. � uma arte total."

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