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Garotos lutam por protagonismo em esporte dominado por mulheres

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Faz calor na academia Magger, na periferia de S�o Gon�alo, cidade da Baixada Fluminense. O lugar � simples, os equipamentos esportivos tamb�m, assim como o entorno do bairro. Uma mureta baixa separa a �rea dos tatames da piscina. Em uma das paredes, um trecho da B�blia. Nas outras, desenhos, propagandas, pre�o das sess�es de massagem e avisos aos frequentadores. Lutadores de jiu-jitsu, carat� e capoeira e alunas de zumba andam para l� e para c� sem dar aten��o ao que acontece no pequeno tablado no meio da academia.

Os alunos do professor Paulo Martins saltam, rolam, torcem o corpo, riem e se divertem na aula de gin�stica r�tmica. Seria uma cena banal, n�o fosse um detalhe: o grupo � formado por meninas e meninos.

A gin�stica r�tmica (GR, para os �ntimos) � um dos esportes mais pl�sticos da Olimp�ada -sozinhas ou em grupo, as atletas fazem acrobacias utilizando aparelhos como bola, arco e fitas. � tamb�m a �nica modalidade ol�mpica em que s� mulheres competem oficialmente.

Como a pr�tica n�o � oficial, � raro encontrar aulas de gin�stica r�tmica para meninos no Brasil. Alguns professores simplesmente se recusam a permitir garotos em seus grupos. O preconceito � grande, algo como o que as mulheres enfrentaram ao come�arem a jogar futebol. (Nos �ltimos anos, o Comit� Ol�mpico Internacional intensificou a luta pela maior participa��o feminina nos Jogos. Em Londres-2012, elas estavam em todas as disputas. Agora, s� os homens t�m barreiras a superar.)

Martins sente essas dificuldades no dia a dia. Ele se aventurou na gin�stica por incentivo dos pais. Depois, por sugest�o de seus professores, passou a dar aula para crian�as. No in�cio, s� havia meninas. Hoje, ensina 27 garotos, oito deles na Magger.

"Os meninos vieram me procurar, e fui pesquisar sobre GR masculina. Encontrei informa��es na Europa e passei a desenvolver esse trabalho. Por mais que o treino seja parecido, a gin�stica masculina � diferente", diz.

Mas o maior obst�culo n�o est� nas diferen�as em treinos ou coreografias. O melhor aluno de Martins, por exemplo, tem 16 anos e � um atleta promissor. Seus pais, no entanto, n�o aceitam sua escolha. No dia em que Serafina visitou a academia, o garoto foi barrado pela m�e enquanto caminhava para a aula. Ele havia cortado o cabelo para aparecer bem nas fotos que ilustrariam a reportagem. Estava orgulhoso.

"Ele � o melhor atleta que j� formei, dedicado e disciplinado. Mas os pais n�o o aceitam como ele � e impedem seu desenvolvimento. � dif�cil lidar com o preconceito. J� vi pais mudarem de ideia depois de verem a evolu��o dos filhos. Mas muitos ainda veem como esporte 'de menina'", diz Martins.

Dois outros alunos contaram hist�rias mais animadoras. Pedro Paulo Neto da Silva, 15, e Dell Gomes Neto, 16, come�aram fazer aulas de gin�stica r�tmica na escola, com apoio dos pais. Eles costumam procurar
coreografias de ginastas na internet para tentar repetir em casa.

"Eu j� fazia outros esportes, como capoeira, mas gostei da GR. Acho errado o preconceito. Falam que n�o d� futuro, que n�o � coisa de homem, mas o que importa � as pessoas fazerem o que gostam. Eu sou gay e n�o tenho problema com isso. Tenho amigos que fazem GR e n�o s�o gays", diz Pedro.

Se depender da federa��o internacional (FIG), eles n�o estar�o em p� de igualdade com as meninas t�o cedo. A entidade diz que, ap�s consultar seus filiados, decidiu n�o chancelar a gin�stica r�tmica masculina. Outra modalidade "de menina", o nado sincronizado, quebrou o paradigma em 2014 e agora tem provas de duplas mistas. A disputa j� acontecer� no Mundial de Kazan, em agosto. Mas n�o h� tempo de inclu�-la na Olimp�ada do Rio-2016.

Na �sia e na Europa, as barreiras t�m sido vencidas com mais facilidade. A Espanha organiza torneios com frequ�ncia. No Brasil, esporadicamente acontecem campeonatos ou apresenta��es, mas � dif�cil conseguir apoio e at� atletas para competir. A confedera��o brasileira afirmou, via assessoria de imprensa, que s� pode chancelar competi��es oficiais da FIG, mas acha "toda pr�tica esportiva louv�vel".

A inser��o dos meninos no esporte foi tema da tese de doutorado de Johanna Coelho na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. �rbitra de gin�stica, ela conheceu diversos meninos que sonhavam ser atletas e criou uma p�gina no Facebook para trocar informa��es.

"Os meninos que s�o apresentados � gin�stica na inf�ncia e n�o viram o esporte antes na TV o encaram como uma atividade f�sica como todas as outras. Essa coisa do que � de menino e o que � de menina � uma constru��o da sociedade", diz Johanna.

Na academia de S�o Gon�alo existem exemplos pr�ticos disso. Sentada � beira do tablado, com a filhinha de dois anos no colo, Sheila assistia � aula da filha mais velha, Kauanni, 10, ao lado dos meninos. E j� planejava dar sequ�ncia � nova tradi��o familiar com Kau�, 9.

"Quando as aulas de futebol dele acabarem, ele vem treinar GR. � um menino muito flex�vel", diz. "N�o entendo porque alguns pais n�o deixam. Se a crian�a tem o dom, voc� tem que deix�-la se desenvolver. E n�o � o esporte que vai definir a sexualidade de algu�m."

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