Eventos de SP t�m at� 4h de fila; desist�ncia chega a 76% das pessoas

Verdadeiras provas de resist�ncia, elas pedem esfor�o f�sico e paci�ncia. Mas, ainda que quilom�tricas e demoradas, as filas para exposi��es e restaurantes da cidade n�o deixam de atrair gente.

Pesquisa feita na capital pelo Datafolha nos dias 29 e 30 de julho com 805 pessoas mostra que 62% dos que frequentam exposi��es pegam filas. Dos que v�o a restaurantes, 46% gastam tempo na espera.

O percentual � maior ainda em outras atividades de lazer: 83% das pessoas dizem encontrar filas em shows e 80% em cinemas. Mas nem sempre vale a pena: 76% dos entrevistados j� desistiram de alguma atividade para n�o ter de aguardar.

Quem decidiu entrar no mundo de bolinhas da artista japonesa Yayoi Kusama no �ltimo fim de semana, por exemplo, passou at� seis horas debaixo de chuva. E pegou mais meia hora de fila para cada instala��o. A exposi��o "Obsess�o Infinita", no Instituto Tomie Ohtake, em Pinheiros, recebeu mais de 500 mil visitantes, sendo 43 mil deles em seu encerramento (nos dias 26 e 27 do m�s passado).

Na mostra "Castelo R�-Tim-Bum", sobre o programa da TV Cultura no MIS (Museu da Imagem e do Som), no Jardim Europa, a situa��o est� parecida e deve se repetir at� o t�rmino do evento, em 12 de outubro.

"Como cerca de 70% do p�blico n�o leva crian�as, a procura n�o deve diminuir depois das f�rias", diz Andr� Sturm, diretor do museu.

Ali, s� 2.200 ingressos est�o dispon�veis por dia, o que leva as pessoas a chegarem cada vez mais cedo.

Julia Audrey, 22, e Ludmilla Falsarella, 27, sa�ram de Ribeir�o Preto, no interior paulista, s� para ver a exposi��o na semana passada. Foram a um bar � noite e depois seguiram direto para o museu. Chegaram �s 5h30 e ficaram em primeiro lugar.

"Estava escuro e pedimos para um guarda noturno abrir o estacionamento", conta Julia. �s 7h, com um frio de 13�C, as duas j� tinham a companhia de mais de cem pessoas, duas horas antes da abertura.

Eventos que atraem multid�es —como a apresenta��o do confeiteiro Buddy Valastro, do programa "Cake Boss", no shopping Eldorado— t�m sido frequentes na cidade. Na Oca, no parque Ibirapuera, a mostra "Mayas: Revela��o de um Tempo sem Fim" tem espera de uma hora nos fins de semana. Na Barra Funda, o p�blico que vai at� a mostra dos grafiteiros osgemeos, no Galp�o Fortes Vila�a, chega a aguardar at� duas horas e meia para ver as obras.

As longas filas, no entanto, n�o s�o algo tipicamente paulistano ou brasileiro. Grandes museus como o Louvre e o d'Orsay, em Paris, s�o famosos por seus acervos e pelo tempo de espera para v�-los. Em julho do ano passado, o MoMA de Nova York chegou a ter filas de 13 horas para a instala��o "The Rain Room" (na qual os visitantes caminhavam em uma simula��o de chuva sem se molhar).

"� um fen�meno globalizado, que existe em qualquer lugar do mundo", afirma o professor de psicologia da PUC-SP H�lio Deliberador. "Mas, na cultura brasileira, tudo que tem uma demanda maior se torna bom, bonito, importante."As filas atraem mesmo os desavisados. Na pesquisa feita pelo Datafolha, 20% das pessoas admitem j� terem entrado em uma sem saber para o que ela servia.

ADAPTA��ES

Para dar conta da demanda, os museus t�m feito uma s�rie de mudan�as. O MIS ampliou o hor�rio de visita��o, aumentou a lota��o de 150 para 180 pessoas por hora e passou a vender os ingressos por lote. Quem chega �s 12h30, por exemplo, s� consegue entrada para as 21h. "Assim as pessoas podem fazer algo nesse meio-tempo. Foi sugest�o de um visitante da exposi��o sobre o David Bowie", conta o diretor Andr� Sturm.

Um lote de ingressos foi vendido pela internet na semana passada, mas esgotou em menos de uma hora.

O museu ainda precisou contratar mais monitores para a exposi��o. Os funcion�rios passam na fila durante a manh� e no in�cio da tarde para informar sobre os hor�rios dispon�veis. A tarefa n�o � f�cil: um deles leva dez minutos para convencer um grupo que chega depois das 13h que n�o adianta mais esperar.

O Instituto Tomie Ohtake tamb�m refor�ou sua equipe nas �ltimas semanas, ampliou o hor�rio de visita��o e come�ou a fechar a fila �s 18h. O p�blico passou a ser orientado para n�o demorar dentro das instala��es. "Foi decepcionante esperar cinco horas para ter que ver tudo t�o r�pido", reclamou o estudante William Contesini, 25, que esteve l� no pen�ltimo dia da exposi��o de Yayoi Kusama. "Se soubesse que demoraria tanto, n�o teria ficado."

Para o psic�logo Fabio Iglesias, da Universidade de Bras�lia, que pesquisou o assunto em seu doutorado, o importante � informar o tempo de espera (leia na p�g. 46). "Deixar as pessoas no escuro gera uma rea��o pior do que intrusos [fura-filas]", diz.

O esquema dos parques da Disney, que recebem mais de 50 milh�es de pessoas por ano, serve de exemplo de gest�o. L� existe um sistema que d� uma estimativa de tempo para o visitante entrar na atra��o.

Como a exposi��o "Castelo R�-Tim-Bum" vai at� outubro, por enquanto o MIS n�o cogita abrir durante a noite para dar conta do p�blico —o que foi feito tr�s vezes na mostra "Impressionismo: Paris e a Modernidade", no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), em 2012, que recebeu 325 mil pessoas.

Quem cuidou do esquema no CCBB foi a Expomus, empresa especializada na montagem e na log�stica de exposi��es. "Realocamos parte da verba de divulga��o para contratar gente e alugar equipamentos para organizar a fila", diz Maria Ignez Mantovani Franco, presidente da Expomus.

PROGRAMA PRINCIPAL

Em alguns restaurantes, clientes ass�duos transformam a fila em atra��o principal. "� um espa�o importante de intera��o social. Um lugar para ver e ser visto", diz o psic�logo Fabio Iglesias. A afirma��o do especialista � confirmada nos dados: 73% dos entrevistados pelo Datafolha afirmam puxar conversa com desconhecidos e tentar fazer amizade enquanto aguardam.

Isso � comum entre os clientes de restaurantes como o Paris 6, no Jardim Paulista, e o Spot, em Cerqueira C�sar, que costumam ter filas de duas horas. "Aqui a espera � o pr�prio programa. � at� mais divertido e bem melhor para paquerar", diz Fl�vio Engel, 43, que vai ao Spot uma vez por semana com os amigos. Na semana passada, o grupo desistiu de uma mesa para ficar do lado de fora.

Editoria de Arte

Boa parte de quem vai provar os pratos nordestinos do Mocot�, na zona norte, tamb�m prefere comer na cal�ada a esperar at� tr�s horas para conseguir um lugarzinho.

"Os gar�ons j� me serviram at� do outro lado da rua enquanto eu esperava", ri a advogada Ana Paula de Carvalho, 41. "Ajuda o fato de eles servirem bem do lado de fora."

Para quem n�o acha a espera a melhor parte do programa, a solu��o � fugir dos hor�rios de pico —nos restaurantes, a partir das 12h30 para o almo�o e das 19h30 para o jantar. Nos museus, o volume � maior nos dias de entrada gratuita e nos fins de semana. As filas costumam ser menores nos primeiros dias das mostras.

Para alguns eventos, no entanto, evitar a fila � imposs�vel. No MIS, nenhum dia ou hor�rio tem espera menor do que tr�s horas. � preciso ter paci�ncia, levar protetor solar, guarda-chuva e �gua. Seguir as dicas � importante, pois eventos que fizeram sucesso em outras cidades j� est�o na agenda de S�o Paulo, como as exposi��es do pintor espanhol Salvador Dal� (1904-89) no Instituto Tomie Ohtake, a partir de 15 de outubro, e da artista perform�tica s�rvia Marina Abramovic, em mar�o de 2015, no Sesc Pompeia.

'FILAS PROVAM QUE NEM TODA MULTID�O � CA�TICA'

Fabio Iglesias, professor de psicologia da Universidade de Bras�lia

As pessoas ficam agressivas durante a espera?
Elas tendem a assumir comportamentos irracionais em multid�es. No entanto, a fila � um sistema de organiza��o bastante sofisticado, que as pessoas formam de maneira quase intuitiva. � prova de que nem sempre a multid�o tende ao caos.

Brasileiro adora fila?
A fila � uma coisa que parece ruim, perda de tempo. Mas, no fundo, ela expressa uma prova social. N�o � que brasileiro adore fila, � um fen�meno universal: quando tem muita gente que parece gostar de algo, as pessoas acham que aquilo est� aprovado, � melhor.

O que mais deixa o p�blico furioso?
A falta de informa��o sobre o tempo de espera. Avisar que o aguardo vai ser de 50 minutos � melhor do que uma fila de cinco minutos sem aviso. Outra coisa que irrita � as pessoas perceberem que a capacidade de atendimento � maior —por exemplo, quando a fila est� grande e h� guich�s fechados.

Quais estrat�gias mais usadas para furar fila?
As pessoas puxam papo com algu�m no come�o para legitimar a intrus�o e confundir quem est� atr�s: ser� que essa pessoa j� estava antes ou � amigo da pessoa na frente? Outra estrat�gia � fingir que n�o viu o fim da fila e entrar no meio "distra�do" ou falando ao celular.

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